STJ: Juiz não pode decretar prisão quando MP requer medidas menos gravosas

Para a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), não cabe ao juiz converter a prisão em flagrante em preventiva quando o Ministério Público (MP) solicita a aplicação de medidas cautelares menos gravosas. Segundo o colegiado, a imposição de medida mais gravosa do que a postulada viola o sistema acusatório e a imparcialidade judicial.

Com base nesse entendimento, a turma, por maioria, deu provimento ao recurso especial do MP de Goiás para afastar a prisão preventiva de um homem. Ele havia sido preso por suposta prática de tráfico de drogas – previsto no artigo 33, caput, da Lei de Drogas –, após a polícia apreender em sua posse 354,475 g de maconha.

Na audiência de custódia, embora o órgão ministerial tenha solicitado expressamente a liberdade provisória do acusado, com aplicação de medidas cautelares alternativas, o juízo optou pela sua prisão preventiva, considerando a quantidade de droga apreendida. O Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) manteve a decisão, por entender que o magistrado não estaria vinculado ao pedido do MP e poderia decidir de maneira diversa, desde que previamente provocado.

Ao STJ, o MP alegou violação dos artigos 282, parágrafo 2º, e 311 do Código de Processo Penal (CPP), sustentando a ilegalidade da prisão preventiva, que teria sido decretada de ofício pelo juiz.

Impor medida mais severa sem provocação compromete o sistema acusatório
O ministro Joel Ilan Paciornik, cujo voto prevaleceu no julgamento, ressaltou que o artigo 311 do CPP estabelece que a prisão preventiva só pode ser decretada mediante provocação, sendo proibida a adoção de medidas cautelares ex officio no processo penal.

Nesse contexto, segundo o magistrado, ao impor de ofício uma medida mais gravosa do que a requerida, a decisão do juízo singular ultrapassou os limites da provocação, contrariando os artigos 282, parágrafo 2º, e 311 do CPP.

O relator destacou ainda que a imposição de medida mais severa sem provocação compromete a imparcialidade judicial e o sistema acusatório, rompendo a paridade de armas entre acusação e defesa.

“Não se trata de submeter o juiz à vontade do órgão acusador, mas de exigir a observância da legalidade estrita em matéria de restrição da liberdade pessoal, cujo controle jurisdicional há de respeitar as funções institucionais de cada parte”, concluiu.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2161880

TJ/MG: Motorista acusado de furto deve ser indenizado

Trabalhador alegou ter sido injustamente constrangido durante entrega de carga de cimento.


A 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) confirmou sentença da 5ª Vara Cível da Comarca de Betim e determinou que um motorista vítima de falsa acusação de furto receba indenização por danos morais.

O motorista de caminhão realizava entrega de carga de cimento asfáltico em uma empresa de pavimentação, em dezembro de 2012, durante a madrugada, quando foi abordado por um empregado do local sob suspeita de tentativa de desvio de parte da carga. A empresa acionou a Polícia Militar, que registrou boletim de ocorrência. Posteriormente, na instauração do inquérito, a Polícia Civil concluiu que não existiam provas que confirmassem a acusação. Assim, o motorista não foi indiciado.

O homem decidiu entrar com ação contra a companhia. Os documentos anexados ao processo demonstraram que a abordagem foi motivada por denúncia de um empregado sem qualquer elemento objetivo que corroborasse com a suspeita. Em 1ª Instância, o juízo condenou a empresa e determinou o pagamento de R$ 10 mil, em indenização por danos morais.

“Exposição indevida”

Nas razões recursais, a empresa sustentou que seu funcionário agiu corretamente ao acionar a Polícia Militar diante da presença do motorista nas dependências da empresa fora do horário de funcionamento. Por sua vez, a vítima recorreu por considerar reduzido o valor da condenação.

A relatora do caso, desembargadora Shirley Fenzi Bertão, pontuou que a empresa que acusa injustamente o trabalhador de furto no ambiente de trabalho, expondo-o à abordagem policial, pratica ato ilícito indenizável por dano moral.

“A empresa, ao não apurar, com o mínimo de rigor, a denúncia recebida, agiu com negligência, permitindo que suspeita infundada se transformasse em acusação pública, com consequências notórias à esfera moral do autor.”

Os desembargadores Rui de Almeida Magalhães e Marcelo Pereira da Silva seguiram o voto da relatora.

Processo nº 1.0000.25.105019-1/001

TJ/DFT mantém condenação de mulher por estelionato com comprovante falso de PIX

A 1ª Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) manteve a condenação de uma mulher pelo crime de estelionato após ela apresentar comprovante falso de transferência bancária para obter produtos sem realizar o pagamento. A pena fixada foi de um ano, cinco meses e 18 dias de reclusão em regime semiaberto.

Em julho de 2024, a acusada compareceu a uma loja de pneus automotivos no Distrito Federal e solicitou a compra de quatro pneus no valor total de R$ 1.480,00. Ela se identificou com nome falso e informou que faria o pagamento via PIX. A ré apresentou à funcionária um comprovante de transferência, mas o documento era fraudulento. Para manter o engano e postergar a conferência bancária, ela ainda iniciou negociação para a compra de mais quatro rodas veiculares. Após a ré deixar o estabelecimento com os produtos, a funcionária verificou a conta bancária da empresa e constatou que nenhum valor havia sido depositado.

A defesa interpôs recurso, mas não apresentou teses técnicas específicas. Limitou-se a requerer o reexame integral da matéria pelo Tribunal com base no efeito devolutivo amplo do recurso. O Ministério Público, por sua vez, manifestou-se pelo não provimento do apelo.

Ao analisar o caso, a relatora do processo destacou que a materialidade e a autoria do crime foram comprovadas pelo conjunto probatório, que incluiu o depoimento coeso da vítima, o testemunho de agente policial, o reconhecimento fotográfico realizado na fase investigativa e a própria confissão da ré em juízo. Segundo o voto, “a confissão encontra-se em perfeita harmonia com os demais elementos de prova”, já que a acusada admitiu a prática delitiva e detalhou o método utilizado na fraude.

A Turma também validou a dosimetria da pena aplicada. A pena-base foi elevada em razão dos maus antecedentes da ré, que possui 38 passagens policiais, todas por estelionato, e pela conduta social desfavorável, uma vez que o crime foi cometido durante o cumprimento de pena por outro delito. Na segunda fase, o colegiado confirmou a compensação parcial entre a agravante da multirreincidência e a atenuante da confissão espontânea, com preponderância da primeira.

O regime semiaberto foi mantido com fundamento no quantum da pena, na reincidência e nas circunstâncias judiciais desfavoráveis. A substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos foi considerada inviável ante a ausência dos requisitos legais.

A decisão foi unânime.

Processo:0722178-30.2024.8.07.0020

TJ/SC: Mulher em prisão domiciliar não consegue remição de pena por cuidar de filho e mãe

Cuidados com familiares não têm caráter laboral para redução do tempo de pena, aponta decisão.


A 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) decidiu negar o pedido de uma mulher que cumpre pena em prisão domiciliar para reduzir o tempo de condenação com base nos cuidados prestados à mãe, vítima de AVC, e ao filho adolescente.

A defesa argumentou que a reeducanda deveria ter direito à remição da pena — o desconto de um dia de prisão para cada três de trabalho — por exercer atividades de cuidado familiar, uma aplicação de forma ampliada do artigo 126 da Lei de Execuções Penais.

Os desembargadores, no entanto, entenderam que não há provas suficientes de que os cuidados são prestados diretamente pela apenada, nem que seria possível fiscalizar a atividade, já que ela cumpre prisão domiciliar. O colegiado também observou que o filho não está em idade de amamentação, o que diferencia o caso de precedentes que reconheceram a remição em situações semelhantes.

A desembargadora relatora do processo destacou que o cuidado com familiares, embora nobre, decorre de obrigações legais e morais e não se enquadra como trabalho para fins de remição, especialmente quando não há controle sobre a atividade realizada.

“Os cuidados aos infantes e idosos decorrem de determinação legal e, nos termos delineados nos autos, não são suficientes para demonstrar circunstância excepcional que autorize a remição da pena”, afirmou a desembargadora relatora.

O colegiado baseou-se em jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que reconhece o direito à remição apenas em casos de mulheres encarceradas que cuidam de filhos em idade de amamentação dentro das unidades prisionais, sob fiscalização direta. Com isso, o recurso foi negado por unanimidade, e a pena permanece inalterada.

Agravo de Execução Penal n. 8000664-51.2025.8.24.0008

STJ: Prática de ato libidinoso com pessoa dormindo configura estupro de vulnerável

Ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou que a prática de ato libidinoso com uma pessoa enquanto ela dorme configura estupro de vulnerável (artigo 217-A, parágrafo 1º, do Código Penal), não sendo possível a desclassificação da conduta para o crime de importunação sexual (artigo 215-A do CP). Com esse entendimento, o colegiado restabeleceu a condenação do réu à pena de oito anos de prisão.

De acordo com a denúncia do Ministério Público, o réu tocou a genitália da vítima enquanto dormiam na mesma cama. Segundo o processo, ela acordou assustada, sem entender o que havia acontecido, e voltou a dormir, mas o ato se repetiu, sem permissão.

O homem foi condenado em primeiro grau por estupro de vulnerável, mas o TJSP desclassificou o crime para importunação sexual, por avaliar que a vítima estava acordando no momento do delito e que sua percepção podia estar alterada. Além disso, não teria sido comprovada a incapacidade de resistência. Para a corte local, ainda que a conduta do réu seja repugnante, ele não constrangeu a vítima por meio de violência ou grave ameaça.

Em decisão monocrática, o relator no STJ, ministro Joel Ilan Paciornik, deu provimento ao recurso especial do Ministério Público para restabelecer a sentença. A decisão do ministro foi confirmada pelo colegiado da Quinta Turma.

Dolo específico de satisfazer a lascívia configura estupro de vulnerável
Paciornik observou que as provas do processo demonstram claramente que o crime sob julgamento foi estupro de vulnerável, pois se verificou que o abusador, com o objetivo de satisfazer a própria lascívia, praticou ato libidinoso contra pessoa que não podia oferecer resistência.

“Nessa medida, diante da presunção absoluta de violência, há de se acolher a pretensão recursal do Parquet para restabelecer o decreto condenatório em razão da efetiva ofensa ao bem jurídico tutelado pelo tipo penal”, destacou.

De acordo com o relator, o STJ tem precedentes nos quais, em casos semelhantes, bastou a presença do dolo específico de satisfazer a lascívia para que ficasse caracterizado o crime de estupro de vulnerável. Nessas hipóteses – prosseguiu –, é inadmissível a desclassificação para o crime de importunação sexual.

Ainda citando a jurisprudência da corte, Paciornik lembrou que a palavra da vítima tem especial relevância em crimes contra a dignidade sexual, especialmente quando amparada em outras provas reunidas na origem do processo.

“Assim, a materialidade do crime de estupro de vulnerável não se esvazia pela ausência de vestígios de prática sexual atestada em exame pericial, até porque a prática de atos libidinosos, comumente, não deixa vestígios materiais”, concluiu o ministro.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

STJ: Candidato a escrivão de polícia que responde a ação penal deve ser excluído, mesmo sem condenação definitiva

A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou legítima a exclusão de um candidato a cargo público na área de segurança, devido – entre outros fatos – à circunstância de estar respondendo a um processo criminal sem condenação definitiva. O candidato havia sido aprovado nas quatro primeiras fases do concurso para escrivão da Polícia Civil do Pará, mas foi eliminado na subfase de investigação criminal e social. Para os ministros, a exigência de idoneidade moral para ingresso nesse tipo de carreira é consistente com a Constituição.

A exclusão do candidato ocorreu depois que o Núcleo de Inteligência da Polícia Civil do Pará informou que ele respondia a uma ação penal pelo crime de homicídio qualificado, bem como já teria sido expulso da Polícia Militar e tentado o suicídio. O candidato impetrou mandado de segurança no tribunal estadual, mas o pedido para continuar no concurso foi negado.

No recurso ao STJ, alegou, entre outros pontos, que a exclusão do concurso por responder a ação penal não concluída extrapolou os limites do edital, além de ofender o postulado constitucional da presunção de inocência.

Carreiras de segurança exigem critérios mais rigorosos para ingresso
O relator do recurso, ministro Marco Aurélio Bellizze, explicou que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), firmada no Tema 22 da repercussão geral, considera que a mera existência de boletim de ocorrência, inquérito policial ou termo circunstanciado de ocorrência, ou a simples instauração de ação penal contra o cidadão, não podem ser causa de eliminação na fase de investigação social de concurso público.

“Em regra, apenas as condenações penais com trânsito em julgado são capazes de constituir óbice para que um cidadão ingresse, mediante concurso público, nos quadros funcionais do Estado”, disse o relator.

Contudo, o ministro ponderou que, no próprio julgamento do Tema 22, o STF admitiu que o entendimento fosse mitigado em virtude das circunstâncias específicas do caso concreto, a serem avaliadas pelo julgador, sobretudo quando se tratasse de concurso para carreiras da segurança pública, entre outras que lidam diretamente com a vida e a liberdade da população. Nesses casos, a jurisprudência aceita que sejam exigidos critérios mais rigorosos de acesso aos cargos públicos.

Bellizze lembrou ainda que o STJ possui entendimento de que a investigação social também analisa a conduta moral e social no decorrer da vida do candidato, com o objetivo de examinar o padrão de comportamento dele quando ingressar na carreira policial.

Ao verificar os motivos pelos quais o candidato foi eliminado, bem como a jurisprudência do STF e do STJ, além das regras do edital do concurso, o ministro concluiu que não houve qualquer ilegalidade na exclusão, mesmo considerando que, posteriormente, ele foi absolvido pelo tribunal do júri da acusação de homicídio qualificado.

Veja o acórdão.
Processo: RMS 70921

CNJ: Desembargador será julgado por assédios morais e sexuais cometidos contra servidoras

O plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou, por unanimidade, na 13ª Sessão Ordinária de 2025, nesta terça (14/10), a abertura de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) contra o desembargador paranaense Luís César de Paula Espíndola por diversos atos de assédio moral e sexual cometidos desde a década de 80 contra servidoras do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR).

Os conselheiros também mantiveram o afastamento cautelar do magistrado por condutas incompatíveis com o exercício jurisdicional e profissional. No julgamento da Reclamação Disciplinar 0003915-47.2024.2.00.0000, o corregedor nacional de Justiça, ministro Mauro Campbell Marques, trouxe testemunhos das vítimas de assédio moral e importunação sexual coletados durante a inspeção da Corregedoria no TJPR.

Fatos

O episódio mais recente da conduta de Espíndola ocorreu na última sessão da 12ª Câmara Cível, em julgamento para manutenção de medida protetiva proposta pelo Ministério Público Estadual em favor de uma criança de 12 anos, assediada por um professor.

Nesse julgamento, que tratava de aprovar medidas de proteção para a criança, o único voto divergente foi de Paula Espíndola, que proferiu falas de culpabilização da vítima e de descaso com o combate ao assédio, com a desigualdade de gênero, e sobre a violência contra mulheres e meninas. “Os homens é que estão sendo assediados pelas mulheres, hoje em dia. As mulheres estão andando com cachorrinhos, estão loucas atrás de homens”.

O advogado Luiz Fernando Casagrande Pereira apontou o descaso que o magistrado tinha com o Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero. “Ele adotava seu próprio protocolo”, disse. O representante da OAB revelou o uso irregular de funcionárias do gabinete como empregadas domésticas e cuidadoras da mãe do desembargador. Ele também afirmou que as servidoras seguiam “protocolos de sobrevivência” para lidar com o desembargador, como o de não ficarem sozinhas com ele em nenhum momento.

Entre os fatos relacionados está sua condenação pela prática de violência doméstica na Ação Penal 835/DF (2014/0142022-0), tendo como vítima sua irmã, Maria Lúcia de Paula Espíndola, também desembargadora do mesmo Tribunal. O ministro Mauro Campbell ressaltou a necessidade da manutenção do afastamento do desembargador do Tribunal não apenas para reparar os danos causados, mas também para prevenir futuras vitimizações.

Imparcialidade, isenção e dignidade

A menção ao histórico de violência e a falta de responsabilização adequada, como a prescrição de casos anteriores, foi destacada pelo ministro corregedor como uma falha sistêmica que deve ser enfrentada de forma contundente. Campbell disse ser essencial que o Poder Judiciário se comprometa a garantir um ambiente seguro e respeitoso a todos os membros, especialmente mulheres. “O fato de que houve condenações por crimes de lesão corporal contra familiares apenas reforça a urgência de se abordar as questões comportamentais desse magistrado. (…) A prevenção de novas vitimizações deve ser uma prioridade”, reforçou.

O corregedor nacional de Justiça disse ainda que a permanência de magistrados que não cumprem normas éticas compromete a confiança da sociedade na justiça.

O presidente do CNJ, ministro Edson Fachin, salientou a importância da responsabilização na construção de um Estado mais transparente e eficiente. “Juízes erram e devem ser responsabilizados, e as instituições são fundamentais. Legisladores erram, e devem ser responsabilizados, e o Poder Legislativo é fundamental para o Estado de Direito. Gestores erram, e devem ser responsabilizados, quando cometem atos de improbidade”, disse.

Presidente do Comitê de Combate ao Assédio, a conselheira Renata Gil ressaltou a importância das inspeções da Corregedoria Nacional de Justiça e afirmou que o Tribunal paranaense deveria ter acompanhado o caso mais de perto com seu Comitê de Assédio, o que deve ser feito a partir de agora, inclusive com acompanhamento das vítimas. Ela disse que o CNJ também observará o desdobramento do caso, assim como a prática das audiências e dos julgamentos com perspectiva de gênero. “Salta aos nossos olhos o tempo que esses atos ilícitos foram praticados. Esse caso evidencia a importância da criação de comitês de assédios eficientes e eficazes, e que sejam fiscalizados pelo CNJ”, disse Renata Gil, que também é Ouvidora Nacional de Justiça.

STJ Autoriza prefeito de São Bernardo do Campo (SP) a retornar ao cargo

O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Reynaldo Soares da Fonseca autorizou, nesta sexta-feira (10), que o prefeito afastado de São Bernardo do Campo (SP), Marcelo de Lima Fernandes, retorne ao cargo. Ele havia sido suspenso da função pública em agosto deste ano, no contexto da Operação Estafeta, que apurou os crimes de organização criminosa e lavagem de dinheiro na gestão do município.

Acolhendo parecer do Ministério Público Federal (MPF), o relator considerou que os fundamentos que justificaram o afastamento – especialmente a necessidade de garantir a efetividade das investigações – não existem mais, tendo em vista que já houve o cumprimento das medidas de busca e apreensão, a reunião das provas iniciais e o oferecimento e o recebimento da denúncia.

Além de permitir o retorno ao cargo de prefeito, o ministro confirmou sua decisão anterior que havia revogado a imposição de recolhimento domiciliar noturno, nos fins de semana e nos feriados, e flexibilizado a proibição de sair da comarca de São Bernardo do Campo, autorizando o político a circular livremente no estado de São Paulo por até sete dias sem prévia comunicação ao juízo.

Leia também: Relator flexibiliza cautelares contra prefeito de São Bernardo do Campo (SP), mas mantém afastamento

TJSP não indicou motivos atuais para manutenção do afastamento
Reynaldo Soares da Fonseca lembrou que as medidas cautelares devem permanecer válidas apenas enquanto forem indispensáveis para eliminar riscos concretos ao processo, à ordem pública ou à futura aplicação da lei penal.

Em relação ao afastamento do cargo de prefeito, o ministro esclareceu que solicitou ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) a reavaliação da necessidade de manutenção da medida, porém a corte estadual confirmou a decisão com base em argumentos genéricos e desatualizados, além de não indicar a relação dos fatos apurados com o exercício da função de chefe do Executivo municipal.

“Assim, embora tenha formalmente respondido à determinação do STJ, materialmente não atendeu à exigência de fundamentação nova e contemporânea, convertendo o reexame em mera reprodução de argumentos pretéritos, desprovidos de base fática atual”, comentou.

Sem fundamentação, afastamento representa “sanção política antecipada”
O ministro avaliou que o afastamento de um agente político eleito configura “medida de extrema gravidade”, pois representa intervenção direta na vontade popular manifestada nas urnas. Mesmo que haja demonstração concreta da necessidade da medida, o magistrado destacou que a jurisprudência do STJ prevê um limite de 180 dias para o afastamento, prazo prorrogável apenas excepcionalmente e de maneira fundamentada.

“Se, de um lado, há prazo máximo claramente definido pela jurisprudência, justamente para evitar afastamentos prolongados e sem reavaliação periódica, de outro, não há prazo mínimo para a sua duração. Essa ausência de prazo mínimo reflete o caráter instrumental da medida, que deve perdurar apenas enquanto subsistirem os motivos que a justificam. Assim, uma vez ausentes risco atual ou fundamentação concreta que demonstre a indispensabilidade da restrição, não há qualquer razão legítima para a manutenção do afastamento”, apontou.

Ainda segundo o relator, o prolongamento injustificado do afastamento, somado à falta de fundamentação contemporânea e à ausência de demonstração de risco concreto, transformou a medida cautelar contra o prefeito em “verdadeira sanção política antecipada”.

“Ao determinar de plano a medida por prazo alongado – um ano, tempo que representa um quarto do período de governo municipal –, o tribunal de origem acabou por criar uma espécie de ‘cassação judicial temporária’ do mandato eletivo, sem condenação e sem previsão legal, o que é manifestamente incompatível com o Estado Democrático de Direito”, concluiu.

Processo: HC 1037262

Crime, castigo e perdão: o instituto do perdão judicial na jurisprudência do STJ

Previsto em vários dispositivos legais, o perdão judicial é um instituto que permite à Justiça deixar de aplicar a pena ao réu, mesmo que a sua culpa seja constatada ao longo do processo. É uma das causas de extinção da punibilidade, de acordo com o artigo 107, parágrafo IX, do Código Penal (CP), mas sua aplicação só é possível em situações expressamente previstas na lei.

Para conceder o perdão, o juiz deverá considerar não apenas o sofrimento físico e psicológico enfrentado pelo acusado ou os vínculos familiares isolados, mas também as circunstâncias específicas de cada crime que admite esse benefício. Nesta matéria especial, são apresentados alguns casos em que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) se manifestou sobre o instituto.

Abalo emocional não pode ser presumido
Em 2020, a Quinta Turma manteve decisão das instâncias ordinárias de não aplicar o perdão judicial a um motorista que, após ingerir bebida alcoólica, perdeu o controle do veículo que dirigia em alta velocidade e colidiu com um poste, o que causou a morte do seu amigo que estava no banco do carona.

O relator do agravo regimental no REsp 1.854.277, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, lembrou que o perdão judicial é ato de clemência por parte do Estado, que deixa de aplicar a pena, afastando assim a punibilidade do infrator.

No entanto, o ministro explicou que a aplicação desse instituto requer a avaliação do magistrado para verificar se o autor foi suficientemente abalado em seu estado físico ou emocional. No caso – acrescentou –, para eventualmente chegar a uma conclusão diversa daquela adotada na instância de origem, o STJ precisaria reexaminar as provas do processo, o que é vedado pela Súmula 7.

Em outra ocasião, em 2025, o colegiado reafirmou o entendimento de que o perdão judicial não se aplica sem a comprovação de que o agente que praticou a conduta sofreu um abalo emocional significativo. Em contexto semelhante, um homem foi condenado por homicídio culposo na direção de veículo pela morte de seu primo.

No STJ, o relator do HC 953.524, ministro Messod Azulay Neto, apontou que o instituto do habeas corpus foi utilizado como substituto de recurso próprio e que não foi verificada coação ilegal patente que justificasse a concessão da ordem de ofício.

Ademais, o ministro salientou que o sofrimento insuportável do réu não pode ser presumido apenas pelo parentesco com a vítima, circunstância que, por si só, não indica a existência de um abalo emocional suficiente para justificar a aplicação do perdão judicial. O fato de o motorista ter dado carona à vítima, segundo Messod Azulay Neto, “também não comprova haver amizade íntima entre eles”.

Benefício foi concedido a indivíduo que matou irmão por engano
Por outro lado, no REsp 1.871.697, a Sexta Turma concedeu o perdão judicial e julgou extinta a punibilidade de um homem condenado por homicídio culposo depois de matar o próprio irmão enquanto tentava atingir um desafeto.

O tribunal de origem negou o benefício, por entender que a comprovação do parentesco e o relato de sofrimento no interrogatório não bastaram para demonstrar o abalo psicológico do acusado.

O relator no STJ, ministro Rogerio Schietti Cruz, lembrou que, em relação à interpretação do artigo 121, parágrafo 5º, do CP, a doutrina exige um vínculo prévio de conhecimento entre os envolvidos. Nessa situação – explicou –, “só sofre intensamente o réu que, de forma culposa, matou alguém conhecido e com quem mantinha laços afetivos”.

O ministro considerou que o fato de serem irmãos e a demonstração da conduta imprudente foram suficientes para justificar a incidência do benefício. “O que se pretende é conferir à lei interpretação mais razoável e humana, sem jamais perder de vista o desgaste emocional (talvez perene) que sofrerá o acusado dessa espécie de delito, uma vez que era irmão da vítima”, declarou.

Colaboração premiada não basta para autorizar o perdão
No AREsp 2.452.224, a Quinta Turma negou provimento ao agravo regimental interposto por um ex-funcionário público que buscava a concessão do perdão judicial diante de sua colaboração premiada.

O recurso chegou ao STJ após as instâncias ordinárias não concederem o perdão, limitando-se a aplicar a redução da pena em dois terços. A defesa sustentou, entre outras razões, que não haveria restrição legal para a concessão do benefício em decorrência de o infrator ter ocupado cargo público à época dos fatos.

Para o relator, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, é o magistrado que, na dosimetria da pena, deve avaliar se há ou não a presença dos requisitos legais para a concessão do perdão judicial. No caso em discussão, ele destacou que a decisão do tribunal de origem foi proporcional e fundamentada de forma suficiente.

O ministro ressaltou que, para a concessão do perdão, devem ser observadas não apenas a extensão e a qualidade da colaboração efetivada, mas também a personalidade do colaborador, a natureza, as circunstâncias, a gravidade e a repercussão social do fato criminoso, de acordo com o artigo 4º, parágrafo 1º, da Lei 12.850/2013.

Concurso formal não estende perdão para todos os delitos
A Sexta Turma entendeu que, nos crimes cometidos em concurso formal, não pode haver a extensão dos efeitos do perdão judicial concedido a um deles para o outro. Na origem do caso, um indivíduo foi condenado por homicídio culposo de seu namorado e de um amigo, quando dirigia de forma imprudente.

O tribunal de segunda instância considerou não ter sido comprovada nos autos a existência de vínculo pessoal entre o infrator e o amigo capaz de justificar o perdão. Na opinião do relator do REsp 1.444.699, ministro Rogerio Schietti Cruz, entender pela desnecessidade da comprovação de tal vínculo serviria como argumento de defesa para todo e qualquer caso de delito de trânsito com vítima fatal.

O ministro observou que, embora o concurso formal tenha sido instituído na legislação com o objetivo de beneficiar o acusado, impondo-lhe a pena com base em apenas um dos crimes, não deixa de haver um acréscimo correspondente à punição pelos demais delitos. E, mesmo assim, de acordo com Schietti, não há previsão legal de extensão da absolvição, da extinção da punibilidade ou mesmo da redução da pena pela prática de um dos crimes em concurso formal.

“Tratando-se o perdão judicial de uma causa de extinção da punibilidade de índole excepcional, somente pode ser concedido quando presentes os seus requisitos, devendo-se analisar cada delito de per si”, disse.

Hipóteses de aplicação do perdão judicial não podem ser ampliadas
A Sexta Turma, no agravo regimental no AREsp 2.140.215, afirmou que o perdão não pode ter sua aplicação estendida a hipóteses diferentes daquelas expressas em lei, nos termos do artigo 107, inciso IX, do Código Penal.

A defesa requereu a aplicação do instituto alegando que o condenado, durante a prática do crime de roubo, foi atingido por um tiro disparado por um guarda municipal e, em consequência da lesão, ficou paraplégico.

De acordo com o relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, tanto a doutrina quanto a jurisprudência do STJ entendem que as hipóteses que admitem a aplicação do perdão judicial são taxativas, geralmente relacionadas a crimes culposos. Conforme apontou, “sempre existe um dispositivo a sinalizar a intenção do legislador em beneficiar o acusado”.

O ministro reforçou que não há previsão legal para a concessão da medida em casos de roubo. Segundo esclareceu, a analogia, mesmo quando a favor do réu, pressupõe omissão na lei, o que não ocorre no caso, já que o Código Penal define expressamente quando o perdão judicial pode ser aplicado, não cabendo ao julgador decidir.

Não há concessão de perdão judicial na fase de admissibilidade
Em 2020, analisando processo em segredo de justiça, a Corte Especial entendeu que não há possibilidade de aplicação do perdão judicial na fase de admissibilidade de queixa-crime, pois, para a sua concessão, é necessária a análise do mérito.

A autora do voto que prevaleceu, ministra Maria Thereza de Assis Moura, lembrou que, nos crimes contra a honra, o perdão judicial está fundamentado no artigo 107, inciso IX, combinado com o artigo 140, parágrafo 1º, do CP. Segundo ela, antes de conceder esse benefício, o juiz precisa verificar determinadas circunstâncias, para só então deixar de aplicar a pena imposta.

Para a ministra, “o legislador deixou claro que a concessão do perdão judicial pressupõe a existência de uma decisão de mérito, fase que não se confunde com o juízo de admissibilidade da queixa-crime”.

Processos: REsp 1854277; HC 953524; REsp 1871697; AREsp 2452224; REsp 1.444.699 e AREsp 2140215

TJ/RN: “Ambiente intimidatório” justifica desaforamento de júri

O Tribunal Pleno do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN) voltou a debater as teorias do “Ambiente Intimidatório” e da “Pressão Social e Comunitária”, durante o julgamento de mais um pedido de desaforamento de Júri Popular, formulado pela 4ª Promotoria de Justiça de Ceará-Mirim (RN).

Os temas foram discutidos em virtude da alegação de violação à ordem pública e comprometimento da imparcialidade do Conselho de Sentença, já que os réus são apontados como integrantes de um grupo de extermínio que teria envolvimento em mais de uma centena de homicídios entre 2016 e 2018.

“O risco à imparcialidade dos jurados é evidente, dado o contexto de violência e intimidação associado ao grupo de extermínio, que pode criar um ambiente intimidatório, prejudicando a liberdade de decisão dos jurados”, explicou o relator do recurso. Ele ressaltou que a presença de membros de um grupo de extermínio conhecido por sua violência gera receio de que os jurados sejam influenciados pela necessidade de autoproteção, comprometendo a independência do julgamento.

Segundo os autos, entre as dezenas de inquéritos policiais instaurados para apurar os 123 delitos contra a vida praticados na cidade de Ceará-Mirim (RN), um total de 109 tem aparente relação com a atuação do grupo de extermínio, levando em conta que alguns inquéritos policiais se referem a triplos e/ou quádruplos assassinatos.

Conforme a decisão, a doutrina da “pressão social e comunitária” aborda a influência que a pressão social pode exercer sobre os jurados, sobretudo em comunidades onde grupos de extermínio são vistos como “justiceiros” ou “protetores”, situação em que os jurados podem se sentir pressionados a entregar um veredicto favorável aos réus para alinhar-se com a opinião popular ou evitar represálias.

“Resta comprovado o risco à imparcialidade na sessão de julgamento, acaso seja realizado na Comarca de origem, imperiosa a procedência do pedido de Desaforamento formulado”, reforçou o relator, ao determinar a transferência do júri para a Comarca de Natal (RN).


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