STJ: Falta de fundamentação leva a anulação de interceptações telefônicas da Operação Sevandija

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a ilegalidade das provas obtidas por meio de interceptações telefônicas na Operação Sevandija, deflagrada para investigar uma organização criminosa envolvida em crimes contra a administração pública no município de Ribeirão Preto (SP).

Para o colegiado, a autorização judicial para as interceptações não apresentou fundamentação concreta nem demonstrou por que seria indispensável afastar o direito dos investigados à intimidade.

A decisão da Sexta Turma se aplica a todos os processos derivados da operação que tenham se baseado em provas colhidas nas interceptações, mas o juiz de primeiro grau deverá analisar, em cada caso, os efeitos da declaração de nulidade.

Ao acolher o pedido da defesa, o relator do recurso em habeas corpus interposto por um dos réus, ministro Rogerio Schietti Cruz, manifestou sua “profunda tristeza” por ter de anular provas em um caso de grande complexidade e gravidade – especialmente porque a decisão implica o reconhecimento de deficiência na atuação judicial.

“É importante registrar isso, porque criticamos muitas vezes a polícia e o Ministério Público, mas também devemos reconhecer as falhas do próprio Poder Judiciário”, afirmou.

O Tribunal de Justiça de São Paulo considerou que a decisão do juízo de primeiro grau que deferiu a interceptação dos telefones dos investigados e as suas prorrogações – requeridas pelo Ministério Público – foram válidas, o que levou a defesa a entrar com o recurso.

Interceptação e suas prorrogações não tinham fundamentação concreta
No julgamento do recurso, o ministro Rogerio Schietti destacou que a decisão que quebrou o sigilo telefônico não fez nenhuma referência aos fatos apresentados no requerimento do Ministério Público, nem indicou as razões pelas quais o juízo considerava imprescindível, para o prosseguimento das investigações, a medida invasiva da privacidade.

O ministro também observou que nem mesmo os nomes dos investigados foram mencionados na decisão inicial que autorizou a interceptação, tampouco nas prorrogações concedidas. Conforme assinalou Schietti, o juízo apenas se reportou “às folhas dos autos em que consta essa representação”.

De acordo com o relator, a Sexta Turma entende que o juiz pode apoiar sua fundamentação em argumentos alheios, mas, em tais casos, deve pelo menos reproduzi-los e explicitar que os ratifica.

Direito à inviolabilidade das comunicações telefônicas não é absoluto
O ministro ressaltou que o direito fundamental à intimidade de comunicação – contido no artigo 5º, inciso XII, da Constituição Federal – não é absoluto e pode ser afastado excepcionalmente.

Schietti explicou que a medida, determinada por ordem judicial devidamente fundamentada, visa subsidiar investigação criminal ou instrução processual penal, devendo ser concedida quando os meios tradicionais de apuração não forem capazes de produzir provas consistentes, e pode – como decidiu a Sexta Turma em julgamento recente – ser prorrogada tantas vezes quantas forem necessárias, contanto que haja a indispensável fundamentação.

Deve ser verificada a existência de provas independentes
Segundo Rogerio Schietti, após descartar todas as provas viciadas pela ilicitude, o juízo de primeiro grau deverá identificar se há outros elementos probatórios que justifiquem a continuidade do processo.

“Não há como aferir se a declaração de nulidade das interceptações macula por completo o processo penal, ou se há provas autônomas que possam configurar justa causa para sustentar o feito apesar da ilicitude reconhecida”, concluiu o ministro.

Processo: RHC 119342

STJ vê estelionato em ações de grupo acusado de explorar pirâmide financeira

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a ação penal por crime contra a economia popular e por estelionato contra um grupo acusado de operar esquema de pirâmide financeira envolvendo investimentos em criptomoedas. O grupo responde também por lavagem de dinheiro e associação criminosa.

Ao dar provimento parcial ao recurso em habeas corpus de um dos acusados (decisão estendida aos corréus), a turma apenas afastou a imputação de estelionato pelos prejuízos genéricos causados a um número indeterminado de vítimas cooptadas por meio da internet – ainda que algumas delas tenham sido identificadas.

Seguindo o voto do relator, ministro Ribeiro Dantas, o colegiado entendeu que a denúncia baseada em acusações genéricas de cooptação de vítimas pela internet não caracteriza delitos autônomos de estelionato. A decisão tem como objetivo evitar a dupla punição dos réus pelo mesmo fato (princípio do non bis in idem).

Pirâmide financeira disfarçada de negociação de criptomoedas
De acordo com o processo, o grupo acusado utilizava uma plataforma eletrônica, chamada Vik Traders, para atrair investidores com a promessa de ganhos acima da média, por meio de compra e venda de criptomoedas. O grupo disponibilizava alguns resgates iniciais, mas logo as vítimas deixavam de receber os valores investidos.

Também era simulada uma operação de marketing multinível, vinculando a participação no negócio à atração de novos investidores.

O Ministério Público acusou o grupo de crime contra a economia popular (artigo 2º, IX, da Lei 1.521/1951) e também de estelionato (artigo 171, caput, do Código Penal), pois houve vítimas identificadas, com seus prejuízos individualizados, e algumas foram abordadas por aliciadores.

A defesa impetrou habeas corpus pleiteando o trancamento da ação penal em relação a todas as denúncias de estelionato, sob o argumento da ocorrência de bis in idem, mas o pedido foi indeferido. No recurso dirigido ao STJ, a defesa insistiu que a dupla acusação decorreria do mesmo fato.

Identificação de vítimas, por si, não caracteriza estelionato
O ministro Ribeiro Dantas afirmou que, enquanto o crime contra a economia popular visa a obtenção de ganhos ilícitos em detrimento de pessoas indeterminadas, o de estelionato é dirigido contra o patrimônio individual.

Conforme o ministro, a identificação das pessoas lesadas de forma genérica e dos prejuízos que elas sofreram pode vir a ser importante para a avaliação da pena-base em caso de condenação, mas essa especificação de vítimas “não deve caracterizar infração penal autônoma, sob pena de dupla punição dos réus pelos mesmos fatos”.

Dantas destacou o entendimento da Terceira Seção segundo o qual, no crime contra a economia popular, o objetivo não é enganar vítimas determinadas, mas qualquer um que demonstre interesse no negócio oferecido. Ele também mencionou julgado recente em que a Sexta Turma estabeleceu que a mera identificação das vítimas no crime contra a economia popular não autoriza a responsabilização do agente pela prática simultânea de estelionato.

Intermediadores aliciavam vítimas específicas
O ministro observou que, para a imputação do estelionato, é necessário que a fraude seja contra o patrimônio de vítima determinada, diretamente induzida em erro.

Analisando as informações do processo, Ribeiro Dantas constatou que algumas vítimas, em vez de serem simplesmente atraídas ao esquema fraudulento pelo site que prometia ganhos irreais, foram induzidas pessoalmente a entrar na pirâmide financeira por intermediadores que agiam em nome da empresa investigada, que as convenceram a adquirir pacotes de criptomoedas.

“Paralelamente ao ato voltado contra o público em geral (site para angariar vítimas), verificam-se condutas autônomas de aliciadores voltadas contra o patrimônio particular de vítimas específicas”, apontou o ministro ao reconhecer a possibilidade, em tese, do concurso de crimes entre o delito contra a economia popular e o estelionato.

Veja o acórdão.
Processo: RHC 161635

STJ reconhece prejuízo de réu preso que não acompanhou oitiva de testemunhas por falta de transporte

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, reconheceu o prejuízo de réu preso que, por falha do Estado, não pôde comparecer à audiência de inquirição de testemunhas arroladas pelo Ministério Público. Segundo o colegiado, não se pode admitir que o Estado seja ineficiente no cumprimento de suas obrigações mínimas, como transportar o preso para a audiência previamente marcada.

Ao negar provimento ao recurso especial do Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS), a turma observou que o réu, processado por furtar uma bicicleta, tinha o direito de estar presente e de participar dos atos de instrução processual, para exercer sua defesa em juízo.

De acordo com os autos, o juízo processante requisitou a presença do réu, preso preventivamente por outra acusação, à Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe), para que ele participasse da audiência de instrução e julgamento na data marcada. A Susepe, porém, informou que não poderia fazer o transporte do réu. Na audiência, foram ouvidas duas testemunhas da acusação, e o acusado foi representado por defensor dativo.

Para o MP, ausência do réu na audiência seria nulidade relativa
Na sentença que condenou o réu, o juiz entendeu que a audiência de inquirição de testemunhas não deveria ser anulada, pois não teria havido prejuízo ao acusado, uma vez que seu defensor esteva presente, o que lhe teria assegurado o contraditório e a ampla defesa. No entanto, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) anulou o processo a partir da data da audiência.

No recurso ao STJ, o MPRS sustentou que a ausência do acusado na audiência de instrução seria nulidade relativa, que exige, para o seu reconhecimento, a demonstração de prejuízo à defesa.

Pedir que a defesa detalhe prejuízo é exigir “prova diabólica”
O relator do recurso, ministro Sebastião Reis Júnior, observou que o réu tem o direito de acompanhar a coleta de provas na ação penal e que a ocorrência da oitiva de testemunhas sem a sua presença viola os princípios da autodefesa e da ampla defesa.

O magistrado destacou que, no caso em análise, a ausência do réu na audiência de inquirição de testemunhas não pode ser imputada ao acusado, pois o transporte de presos era da responsabilidade exclusiva do Estado.

O ministro endossou o entendimento do TJRS segundo o qual a ausência do acusado, em razão da desídia estatal, não é motivo idôneo para relativizar as suas garantias e configura nulidade insanável.

“É evidente o prejuízo do réu que, por falha do Estado, tem cerceado o seu direito de comparecer ao depoimento das testemunhas arroladas pelo órgão acusador, ocasião em que foi representado por um advogado dativo com quem nunca tivera contato. Exigir que a defesa indique os detalhes de um prejuízo é exigir a chamada ‘prova diabólica’, tendo em vista que não há como a parte provar como o processo seguiria caso estivesse presente na audiência”, concluiu o ministro ao negar provimento ao recurso especial.

Processo: REsp 1794907

TJ/SP mantém condenação de pilotos e dono de helicóptero utilizado para tráfico de drogas

Penas fixadas em nove anos e oito meses.


A 5ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão da 2ª Vara da Comarca de Arujá que condenou três homens acusados de tráfico de drogas e organização criminosa. A pena foi fixada em nove anos e oito meses de reclusão, em regime inicial fechado.

Consta nos autos que dois dos réus eram pilotos de helicóptero, destacados pela organização criminosa para pilotarem as aeronaves que eram utilizadas para o transporte de drogas, após estas serem previamente preparadas para receber grande quantidade de entorpecentes. Já o terceiro acusado foi apontado como o proprietário registral. As investigações chegaram até os réus após a prisão de três indivíduos que estavam em posse de 93,4 kg de cocaína na cidade de Vargem Grande Paulista. Com eles a polícia obteve a informação de que o helicóptero dos réus era utilizado para transportar drogas para o estado de São Paulo.

De acordo com a relatora do recurso, desembargadora Claudia Fonseca Fanucchi, a prova oral, documentos referentes ao registro da aeronave apreendida, laudo pericial do helicóptero, exame toxicológico, diário de bordo e outros elementos probatórios demonstram que que os réus “integravam e dividiam, de forma ordenada e concatenada, o exercício de funções relevantes no contexto da organização criminosa, especialmente voltada à narcotraficância”.

A magistrada frisou que foram observadas diversas adaptações no helicóptero para facilitar o transporte de drogas , como “galões para armazenar combustível, bomba hidráulica acoplada a uma mangueira, para assegurar maior autonomia dos voos, sem a necessidade de reabastecimento em locais formalizados ou sem que fossem registrados os locais por onde pousara, sem desprezar, ainda, a ausência dos estofamentos dos quatro bancos traseiros, de modo a apontar para a utilização do espaço para o armazenamento de drogas (próximos dos quais inclusive foram localizados os resquícios de cocaína)”.

O julgamento teve a participação dos desembargadores Damião Cogan e Pinheiro Franco. A decisão foi unânime.

Processo nº 0001018-76.2018.8.26.0535

TJ/RN nega devolução de veículo que pode ter ligação com esquema criminoso

A Câmara Criminal do TJRN manteve a sentença da 4ª Vara Criminal de Natal, a qual indeferiu o pedido de um homem para restituição de um carro. Ele alegou ser o legítimo proprietário do automóvel apreendido durante a operação policial que investigava esquema criminoso de compra e venda de veículos de origem ilícita. Segundo o órgão julgador, ao destacar os artigos 118 e seguintes do Código de Processo Penal, é “descabido” se falar em resgate, na esteira dos precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o qual define a permissão de tais bens antes do ‘trânsito em julgado’ (fim de prazo legal para admissão de recursos) da ação, mas sob alguns condicionantes.

Segundo a jurisprudência do órgão superior, a devolução depende do fato de os bens apreendidos não interessarem ao processo e de não haver dúvidas quanto ao direito sobre eles reivindicado.

De acordo com o atual julgamento, o pedido é relacionado a um bem que ainda interessa ao processo por se tratar de um caminhão reboque possivelmente utilizado para o transporte de veículos de origem ilícita, sendo prudente que se aguarde o final das investigações ou até mesmo da instrução processual, devendo ser salientado que a autoridade policial, nos autos do processo nº 083817904.2022.8.20.5001, requereu a utilização provisória do bem, nos termos do artigo 133-A, do CPP, com o parecer favorável do Órgão Ministerial.

Conforme a relatoria do voto, a Suprema Corte já definiu que, no plano da restituição dos bens acautelados judicialmente, tem-se que a retenção somente se justifica na hipótese de persistir interesse à investigação ou ao processo, nos termos do artigo 118 do Código de Processo Penal, ficando vedada, ainda, a restituição de coisa cuja licitude se possa questionar (artigo 119, CPP).

Apelação Criminal nº 0836563-91.2022.8.20.5001

TJ/SC: Veículo de comunicação RBS e jornalista são condenados por racismo

O juiz da 2ª Vara da Fazenda Pública da comarca de Joinville, Roberto Lepper, condenou solidariamente um veículo de comunicação e um jornalista ao pagamento de indenização no valor de R$ 15 mil, por danos morais coletivos, em razão de uma nota publicada no jornal com narrativa preconceituosa.

A denúncia refere-se a uma publicação de outubro de 2013, na qual o profissional discorre sobre as vagas de emprego disponíveis em Joinville. Em um trecho, a nota dizia: “O perfil ideal de trabalhador procurado é homem, branco, de 25 a 35 anos de idade.”Em sua decisão, o magistrado anotou: “Ainda que os réus bradem que a nota era estatística e não representava a opinião pessoal do jornalista ou a visão do grupo (de comunicação), fato é que, da forma como o texto foi veiculado, fica evidenciado que o trabalhador ideal no mercado de trabalho deveria ser branco e ter entre 25 e 35 anos de idade. No texto, sintético, não há indicativo de que a afirmação teria sido lastreada em estudo atribuído à Associação Brasileira de Recursos Humanos em Santa Catarina. Aliás, o jornalista, ao depor em juízo, afirmou que esse dado foi extraído de conversas informais travadas com empresários, o que revela que não consistia num dado estatístico.”

O juiz entendeu que o referido texto jornalístico difundiu, para o leitor mediano, uma carga de preconceito racial, o que fere o Código de Ética do Jornalismo Brasileiro. “A manifestação de pensamento imbuída em contexto de discriminação racial é conduta que deve ser censurada, principalmente porque não se insere no direito de liberdade de expressão, protegido constitucionalmente”, ressaltou o magistrado na decisão.

Processo n. 0805596-81.2014.8.24.0038

STF: Ampliação de autoridades com foro especial em Roraima é inconstitucional

Dispositivo previa foro por prerrogativa de função a diretores-presidentes de entidades da administração indireta e ao reitor da universidade estadual.


O Supremo Tribunal Federal (STF) declarou inconstitucional dispositivo da Constituição de Roraima que atribuía foro no Tribunal de Justiça local a diretores-presidentes das entidades da administração estadual indireta e ao reitor da universidade estadual. A decisão unânime foi tomada na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6511, na sessão virtual finalizada em 13/9.

Simetria
A norma invalidada atribuía ao Tribunal de Justiça estadual (TJ-RR) a competência para processar e julgar crimes comuns praticados pelos ocupantes desses cargos. O voto do ministro Dias Toffoli, relator da ADI, conduziu o entendimento unânime da Corte, ao aplicar a jurisprudência recente (ADI 2587) de que os estados devem observar o modelo adotado na Constituição Federal.

Segundo Toffoli, a Constituição de Roraima violou as regras de reprodução automática da Constituição Federal em relação às autoridades destinatárias da prerrogativa de foro.

Em razão da segurança jurídica, tendo em vista que a norma questionada está em vigor há mais de 12 anos, o ministro Dias Toffoli votou para que os efeitos da decisão sejam conferidos a partir do julgamento da ADI.

Processo relacionado: ADI 6511

STJ: Responsabilização penal de empresa não é transferida com incorporação

A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria, decidiu que a responsabilização penal de empresa incorporada não pode ser transferida à sociedade incorporadora. O colegiado fixou o entendimento de que o princípio da intranscendência da pena, previsto no artigo 5º, inciso XLV, da Constituição Federal, pode ser aplicado às pessoas jurídicas.

De acordo com o processo, o Ministério Público do Paraná ofereceu denúncia contra uma sociedade empresária agrícola, imputando-lhe a prática do delito previsto no artigo 54, parágrafo 2º, inciso V, da Lei 9.605/1998, pelo suposto descarte de resíduos sólidos em desconformidade com as exigências da legislação estadual. A controvérsia que chegou ao STJ diz respeito ao fato de a empresa acusada originariamente ter sido incorporada por outra.

Após a decisão que rejeitou as preliminares da defesa, a empresa incorporadora impetrou mandado de segurança, alegando a extinção da punibilidade diante do encerramento da personalidade jurídica da ré originária da ação penal – a sociedade empresarial agrícola. Assim, por aplicação analógica do artigo 107, inciso I, do Código Penal (CP), que trata da morte do réu, seria inviável o prosseguimento da ação contra a incorporadora. O Tribunal de Justiça do Paraná concedeu a segurança.

No recurso encaminhado ao STJ, o Ministério Público sustentou que tanto o princípio da intranscendência da pena como o artigo 107, inciso I, do CP têm incidência restrita às pessoas naturais, únicas capazes de morrer, sobretudo porque as penas patrimoniais previstas na Lei 9.605/1998 poderiam ser assumidas pela incorporadora.

Pretensão punitiva estatal não se confunde com obrigações transmissíveis
O relator do recurso, ministro Ribeiro Dantas, observou que a incorporação é uma operação societária típica, por meio da qual apenas a sociedade empresária incorporadora continuará a existir, na qualidade de sucessora de todas as relações patrimoniais da incorporada, cuja personalidade jurídica é extinta.

O magistrado apontou que a sucessão da incorporada pela incorporadora se opera quanto a direitos e obrigações compatíveis com a natureza da incorporação, conforme se conclui a partir dos artigos 1.116 do Código Civil e 227 da Lei 6.404/1976.

“A pretensão punitiva estatal não se enquadra no conceito jurídico-dogmático de obrigação patrimonial transmissível, tampouco se confunde com o direito à reparação civil dos danos causados ao meio ambiente. Logo, não há norma que autorize a transferência da responsabilidade penal à incorporadora”, declarou Ribeiro Dantas.

Princípio da intranscendência da pena vale também para pessoas jurídicas
Para o relator, a extinção legal da pessoa jurídica ré – sem nenhum indício de fraude – leva à aplicação analógica do artigo 107, inciso I, do CP, com o consequente término da punibilidade.

O ministro destacou, ainda, que o princípio da intranscendência da pena pode ser aplicado às pessoas jurídicas, o que reforça a tese de que a empresa incorporadora não deve ser responsabilizada penalmente pelos crimes da incorporada.

“Se o direito penal brasileiro optou por permitir a responsabilização criminal dos entes coletivos, mesmo com as peculiaridades decorrentes da ausência de um corpo biológico, não pode ser negada a eles a aplicação de garantias fundamentais utilizando-se dessas mesmas peculiaridades como argumento”, concluiu o relator ao negar provimento ao recurso especial do Ministério Público.

Processo: REsp 1977172

TRF1: Princípio da insignificância não se aplica ao crime de garimpo de ouro em terra indígena

A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) condenou um homem pela prática de garimpo de ouro na Terra Indígena Yanomami – crime ambiental e também contra o patrimônio da União. Dessa forma, o Colegiado confirmou a sentença da 2ª Vara da Seção Judiciária de Roraima após julgar os recursos interpostos pelo réu e pelo Ministério Público Federal (MPF).

Em seu recurso, o MPF requereu a condenação do réu por associação criminosa. Isso porque, ao informar que não foi ao garimpo explorar ouro por meios próprios, teria confirmado a associação com outros indivíduos que lá estavam com o mesmo objetivo.

Por outro lado, o réu alegou que no momento da prisão em flagrante não estava executando o crime e que não houve laudo pericial para constatar o dano ambiental. Sustentou, ainda, que a condenação se baseou apenas nas provas produzidas no inquérito policial e pediu a aplicação do princípio da insignificância ao crime ambiental porque não foi demonstrado prejuízo.

Prisão em flagrante – Analisando o processo, a relatora, desembargadora federal Maria do Carmo Cardoso, argumentou que o réu confessou em juízo, no interrogatório, que “estava realizando a atividade de garimpo de ouro, embora diga que não fez quase nada nos 10 dias, porque sabia que a Polícia iria fazer uma operação, correu para o meio do mato para se esconder e esperar” e que sabia estar em terra indígena. O testemunho dos fiscais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) confirmou que o apelante foi preso em flagrante em ação de garimpo ilegal e desmatamento, frisou.

A magistrada destacou que o garimpo de ouro em terras indígenas, área de proteção ambiental, torna inviável a incidência do princípio da insignificância porque a atividade, além de lesar o patrimônio público indisponível, estimula outros crimes pela presença de muitas pessoas em áreas protegidas, causando danos ambientais colaterais e à saúde, além da violência inerente a essa atividade. No caso, prosseguiu, não há necessidade de laudo pericial porque a mera retirada do minério sem autorização é suficiente para consumar o crime.

Quanto à apelação do MPF, a relatora entendeu que não há provas suficientes para imputar o crime de associação criminosa. Concluindo o voto, a desembargadora federal informou que o valor da prestação pecuniária resultante da substituição da pena privativa de liberdade deve ser reduzido de R$ 2.000,00 para meio salário mínimo dada a evidente situação de pobreza do réu.

O voto da magistrada foi acompanhado por unanimidade pela Turma.

Processo: 0000880-75.2016.4.01.4200

TRF1: Anistiado político não deve devolver valores recebidos de boa-fé por erro da Administração Pública

Os descontos realizados no contracheque de um anistiado político a título de ressarcimento ao erário devem ser cancelados, assim como eventual valor retido indevidamente. Essa foi a decisão da 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) ao manter a sentença da 9ª Vara Federal do Distrito Federal favorável ao anistiado.

Consta dos autos que o requerente trabalhava como aeronauta da Viação Aérea São Paulo (VASP) quando foi demitido por razões políticas em virtude da sua participação em movimento grevista. Em 1993, foi reconhecida sua condição de anistiado político, sendo-lhe concedida aposentadoria excepcional de anistia, nos termos do art. 150 da Lei nº 8.213/91.

Após o advento da Lei nº 10.559/2002, o autor afirmou que requereu ao Ministério da Justiça (MJ) o reconhecimento da sua condição de anistiado com a consequente substituição da aposentadoria excepcional pela prestação mensal permanente e continuada, o que foi deferido, tendo a Comissão de Anistia fixado essa parcela em montante correspondente ao valor que o servidor receberia se na ativa estivesse, na forma determinada pelo art. 6º da Lei nº 10.559/2002.

No entanto, o requerente alegou que após a instauração de tomada de contas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) a Comissão de Anistia revisou o seu processo, concluindo pela redução do valor da prestação mensal que lhe foi concedida, bem como pela restituição dos valores supostamente pagos de forma indevida, ato que entendeu ser ilegal, pois os valores foram recebidos de boa-fé.

Confiança administrativa – Analisando o processo, o relator, desembargador federal Souza Prudente, verificou que as quantias em discussão foram, de fato, recebidas de boa-fé pelo trabalhador anistiado, ainda que tenham sido pagas em decorrência de um erro da Administração Pública na interpretação da lei.

“Há de se prestigiar os princípios da segurança jurídica e da confiança administrativa, sendo, ainda, que a Lei nº 10.559/2002 deve ser interpretada e aplicada à luz de seus fins sociais e objetivos específicos a caracterizar a aposentadoria excepcional anteriormente recebida pela parte autora como verba de natureza alimentar”, prosseguiu o magistrado na mesma linha de entendimento da jurisprudência do TRF1 e do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

A decisão foi unânime.

Processo: 0015601-46.2012.4.01.3400


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