TJ/RO nega pedido de advogado que teria usado Inteligência Artificial e inventado jurisprudência na petição

Durante o julgamento sobre um caso de roubo, foi detectada a invenção de jurisprudência do TJRO pelo advogado de defesa do réu e foi encaminhado para Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional em Rondônia (OAB-RO) por falta de ética profissional na elaboração da petição (pedido feito em nome do cliente). O advogado teria usado ferramentas de inteligência artificial (IA), nas elaboração do texto (razões) do recurso de apelação, pois os números processuais, jurisprudências e magistrados registrados no processo não existem.

A apelação foi julgada pela 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia. Ao apreciar o caso constante de roubo no processo, o relator, desembargador Francisco Borges registrou uma grave impropriedade nos documentos apresentados. “Verifica-se que a defesa (o advogado), ao tentar reforçar seus argumentos, transcreveu trechos de supostas jurisprudências deste Egrégio Tribunal de Justiça de Rondônia, indicando, inclusive, nome de desembargadores fictícios (Fulano de tal, Beltrano de Tal e Cicrano) como relatores de tais julgados.

Para o relator, a atitude do profissional, além de prejudicar a defesa do seu cliente, a lisura profissional, a integridade do processo penal, caracteriza, em tese, infração disciplinar prevista no artigo 34, inciso XVI, do Estatuto da Advocacia (Lei no 8.906/94), que dispõe ser infração deturpar o teor de dispositivo de lei, de citação doutrinária ou de julgado.

A decisão colegiada dos julgadores da 2º Câmara Criminal mantiveram a condenação do réu à pena de 6 anos, dois meses e 20 dias de reclusão no regime inicial semiaberto.

O julgamento ocorreu durante a sessão eletrônica de julgamento realizada entre os dias 7 e 11 de julho de 2025. O caso também foi pauta nas sessões da 1ª e 2ª câmaras criminais desta terça-feira, 22, devido à gravidade da conduta em prejuízo à defesa do cidadão que buscava seu direito de apelação.

Apelação Criminal n. 7061269-89.2024.8.22.0001 – Crime de Roubo.

TJ/MT: Vara Criminal deve julgar caso de agressão contra criança 5 anos

Uma criança de apenas cinco anos foi vítima de agressão física supostamente cometida pelo padrasto, no município de Lucas do Rio Verde. O caso mobilizou autoridades policiais e resultou em um pedido de medidas protetivas urgentes. Devido a um impasse se o caso deveria ser julgado pela Vara Cível ou Criminal levou ao julgamento no Tribunal de Justiça de Mato Grosso sobre a jurisdição.

Segundo o boletim de ocorrência registrado pela Polícia Militar, vizinhos acionaram a guarnição após ouvirem gritos vindos da residência. Ao chegarem no local, os policiais encontraram a mãe da criança abraçando o filho e, inicialmente, alegando que teria caído da cama. No entanto, ao ser levado ao hospital, os profissionais de saúde constataram múltiplos sinais de agressão física. A criança, após ser acalmada, revelou ao médico que havia sido agredida pelo padrasto.

O caso foi encaminhado inicialmente à 2ª Vara Cível da Comarca de Lucas do Rio Verde, que declinou da competência para julgar o pedido, citando o artigo 23 da Lei nº 13.431/2017, que estabelece regras para o atendimento de crianças e adolescentes vítimas de violência. A decisão destacou que “as ações penais que apurem crimes envolvendo violência contra crianças e adolescentes devem tramitar nas varas especializadas […]; no caso de não criação das referidas varas, devem tramitar nos juizados ou varas especializadas em violência doméstica, independentemente de considerações acerca da idade, do sexo da vítima ou da motivação da violência”.

Já a 2ª Vara Criminal da mesma Comarca, ao receber os autos, também se declarou incompetente. Alegou que “a situação de vulnerabilidade que está, em tese, sendo exposto o menor, não se amolda à situação de violência doméstica e familiar contra a mulher ou violência de gênero delineada na Lei nº 11.340/06 – Lei Maria da Penha, visto que a vítima é uma criança do sexo masculino”.

A questão foi submetida à Turma de Câmaras Criminais Reunidas do TJMT. Por unanimidade, os desembargadores reconheceram como competente a 2ª Vara Criminal da Comarca de Lucas do Rio Verde.

No voto, o relator, desembargador Rui Ramos Ribeiro, enfatizou que o objetivo da Lei nº 13.431/2017 é garantir a proteção integral da criança ou adolescente, inclusive no que se refere à tramitação prioritária e ao atendimento especializado.

“Enquanto não sobrevier a regulamentação específica do art. 23, parágrafo único, da Lei n. 13.431/2017, a competência para o processo e julgamento da lide, quando houver vítima criança ou adolescente, independentemente se do sexo masculino ou feminino, será das varas de violência doméstica e familiar, especialmente porque a segurança a ser fornecida à vítima menor deve ser imediata”.

A decisão do Tribunal confirma uma diretriz já consolidada: na ausência de varas especializadas em crimes contra crianças e adolescentes, cabe às varas de violência doméstica e familiar a responsabilidade de garantir um julgamento célere, humano e protetivo.

TJ/RN: Homem é condenado por violência doméstica contra companheira com socos e estrangulamento

A Justiça condenou um homem por dois crimes de lesão corporal cometidos no contexto de violência doméstica. As agressões ocorreram em 2016, em Macau, após o homem, que estava embriagado, agredir fisicamente sua companheira e, em seguida, o padrasto dela, que tentou intervir. A decisão é da 1ª Vara da Comarca de Macau/RN.

Segundo os autos do processo, o réu chegou à residência em que morava com sua companheira em visível estado de embriaguez. Ele desferiu um golpe de estrangulamento (conhecido como mata-leão) e um soco no rosto da companheira. Além disso, o réu também empurrou a mulher sobre a cama. A vítima conseguiu fugir para a casa da mãe. Ao chegar no local, o padrasto dela tentou interceder e acabou sendo atingido por uma paulada no rosto, que lhe causou fratura no maxilar.

As agressões foram confirmadas por laudos periciais. A lesão causada na mulher foi classificada como leve. Já a do padrasto foi considerada grave, fazendo com que ele realizasse cirurgia, além de ser afastado de suas atividades habituais por mais de 30 dias. O próprio réu confessou parcialmente os fatos, admitindo ter agredido o padrasto. Entretanto, o homem negou lembrar da violência contra a companheira.

Em sua decisão, a magistrada responsável pelo processo evidenciou a gravidade da conduta do acusado, que mesmo sem antecedentes criminais, agiu de forma violenta e sob efeito de álcool. A tentativa da defesa de descaracterizar a responsabilidade penal com base no estado emocional do réu causado pela embriaguez não foi aceita, uma vez que, de acordo com o artigo 28 do Código Penal, a ingestão voluntária de álcool não exclui a imputabilidade do agente.

Com isso, as penas foram fixadas em um ano de detenção pelo crime contra a companheira e dois anos de reclusão pelo crime contra o padrasto, somadas devido ao concurso material de crimes. A pena será cumprida, inicialmente, em regime aberto.

STJ: Assistência jurídica prevista na Lei Maria da Penha é obrigatória, inclusive no tribunal do júri

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a assistência jurídica qualificada prevista na Lei Maria da Penha é obrigatória, inclusive nas ações submetidas ao tribunal do júri. Segundo o colegiado, a nomeação automática da Defensoria Pública como assistente é medida de tutela provisória, válida na ausência de manifestação expressa da vítima – a qual pode optar por advogado particular a qualquer tempo.

O entendimento foi firmado no julgamento de recurso especial do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), que questionava a atuação da Defensoria como representante dos interesses da mãe, do irmão e do filho de uma vítima de feminicídio, reconhecidos judicialmente como vítimas indiretas.

O 2º Tribunal do Júri do Rio de Janeiro havia deferido o pedido de assistência qualificada formulado pela Defensoria Pública. O MPRJ recorreu, mas o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro manteve a decisão. No STJ, o órgão ministerial sustentou, entre outros pontos, que a lei não prevê a possibilidade de a Defensoria Pública representar simultaneamente o acusado e os interesses da vítima ou das vítimas indiretas, razão pela qual requereu a revogação da decisão.

Defensoria pode atuar na defesa do acusado e na proteção da vítima
Em seu voto, o ministro Joel Ilan Paciornik, relator do recurso, rejeitou o argumento do MPRJ, pois tal entendimento levaria à conclusão ilógica de que dois advogados privados pertencentes à mesma seccional da OAB estariam impedidos de representar partes opostas no mesmo processo.

Paciornik destacou que a natureza institucional da Defensoria Pública não impede que defensores distintos, dotados de independência funcional – conforme assegura o parágrafo 6º do artigo 4º da Lei Complementar 80/1994 –, atuem simultaneamente na defesa do acusado e na proteção dos interesses da vítima, desde que não haja coincidência entre os profissionais designados para cada função.

Estado deve fornecer assistência jurídica completa
O ministro ressaltou que a Lei Maria da Penha, em seus artigos 27 e 28, impõe de forma obrigatória a prestação de assistência jurídica qualificada às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

Para o magistrado, a conjugação desses dispositivos legais reafirma o dever do Estado de fornecer assistência jurídica completa, em consonância com o artigo 134 da Constituição Federal, que atribui à Defensoria Pública a orientação e a defesa dos necessitados. “Tais dispositivos de lei não criaram uma nova modalidade de intervenção de terceiros, apenas preconizaram a presença de advogado ou defensor público a fim de orientar, proteger e fazer valer os direitos da vítima de violência doméstica do sexo feminino”, disse.

Ao analisar a incidência desse direito nos processos de competência do tribunal do júri, o relator afastou qualquer restrição à assistência jurídica qualificada nos casos de feminicídio. Paciornik frisou que a expressão utilizada no artigo 27 da Lei Maria da Penha – “em todos os atos processuais, cíveis e criminais” – deve ser interpretada de forma ampliativa, reforçando a necessidade de uma assistência especializada e humanizada também no âmbito do tribunal do júri.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

TJ/SC: CAC é condenado por porte ilegal de arma ao se demorar fora do trajeto entre casa e clube

Tribunal entendeu que CAC descumpriu regras ao prolongar parada com pistola e munições no carro.


A 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) manteve a condenação de um colecionador, atirador e caçador (CAC) a dois anos de reclusão por porte ilegal de arma de fogo, conforme o artigo 14 do Estatuto do Desarmamento. O colegiado também negou a devolução da arma, das munições, dos acessórios e da fiança pagos pelo réu.

O homem foi abordado por policiais militares em um posto de combustíveis no bairro Rio Grande, em Palhoça, por volta das 23h30min. Na oportunidade, portava uma pistola municiada, três carregadores e nove munições dentro do carro. O clube de tiro onde ele havia treinado encerrara as atividades às 18h, e a abordagem ocorreu fora do trajeto autorizado para transporte de armamento conforme a guia de tráfego.

Na primeira instância, a 2ª Vara Criminal da comarca de Palhoça condenou o réu à pena de dois anos em regime aberto. A defesa recorreu e alegou que não havia provas suficientes para sustentar a acusação. Disse também que a denúncia era inválida por se basear apenas nos depoimentos dos policiais, e que o réu havia apenas passado na casa de um primo antes de ir abastecer o carro. Pediu ainda a devolução da arma, das munições, dos acessórios e do valor da fiança.

A relatora do recurso rejeitou a versão da defesa. Ela destacou que o acusado demorou mais de cinco horas para percorrer um trajeto dentro do mesmo município, o que não se mostra crível. “Ainda que o acusado tenha permanecido no clube até o fechamento (18h), sua residência fica no mesmo município do clube de tiro, de modo que não parece crível que ele tenha demorado mais de cinco horas para realizar o trajeto”, afirmou.

A desembargadora também ressaltou que, à época dos fatos, o Decreto n. 9.846/2019 não permitia paradas em locais diversos durante o trajeto. A norma autorizava apenas o deslocamento direto entre o local de guarda autorizado e os de treinamento, sem exceções para visitas ou permanências em outros lugares.

Por fim, o colegiado entendeu que não havia respaldo legal para o transporte de arma municiada naquelas condições e manteve a negativa de devolução dos itens, considerados instrumentos do crime. Quanto à fiança, a sentença já havia previsto sua utilização para quitar custas, multa e prestação pecuniária, com devolução apenas de possível saldo restante. Por isso, também foi negado o pedido de devolução integral. A decisão de negar o recurso foi unânime entre os desembargadores da 5ª Câmara Criminal.

Apelação Criminal n. 5000426-40.2023.8.24.0045

TRT/MT condena locadora por prisão de trabalhador com veículo com registro de furto

Após ser detido por cerca de seis horas e conduzido à delegacia sob suspeita de furtar o carro da empresa, o ex-empregado de uma locadora de veículos garantiu na Justiça do Trabalho o direito a receber R$10 mil de indenização por danos morais. O carro, que tinha registro ativo de furto, havia sido recuperado meses antes, mas a locadora de veículos não atualizou a informação junto aos órgãos de segurança.

Por unanimidade, a 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso (TRT/MT) concluiu pela culpa da empresa na situação “vexatória e humilhante”, com lesão à honra e à imagem do trabalhador.

O episódio ocorreu em fevereiro de 2024, quando o trabalhador foi autorizado a usar um veículo da frota para realizar a vistoria de outro carro vendido pela empresa. Já no local do serviço, foi abordado em público por policiais e levado à Delegacia Central de Várzea Grande, mesmo uniformizado e identificado como funcionário da locadora. Ele só foi liberado após o delegado constatar a falha no registro e confirmar sua inocência.

A detenção, registrada em boletim de ocorrência, ocorreu porque o carro ainda constava como furtado no sistema da polícia do Rio de Janeiro, mesmo após ter sido recuperado e devolvido à empresa quase um ano antes. Segundo o trabalhador, durante toda a ocorrência, nenhum representante da empresa prestou apoio jurídico ou presencial. Após registrar queixa nos canais internos, ele foi dispensado sem justa causa.

Em sua defesa, a empresa alegou que, após o veículo ter sido recuperado em 2023, caberia à autoridade policial retirar a restrição do sistema, não sendo sua obrigação acompanhar essa atualização. Também afirmou que não contribuiu para a detenção do trabalhador.

O argumento não convenceu o desembargador Tarcísio Valente, relator do recurso na 1ª Turma do TRT. Para ele, o tipo de atividade desenvolvida pela locadora impõe um dever redobrado de zelo quanto à regularidade documental e jurídica dos veículos utilizados. “Não se mostra crível que uma empresa do ramo de locação e venda de veículos não diligencie junto aos órgãos competentes — ainda que por meio de empresas especializadas — sobre a existência de qualquer tipo de restrição nos veículos que disponibilizava para locação ou venda, notadamente sobre furtos ou roubos”, pontuou o relator.

Ele destacou ainda que, como o veículo utilizado pelo trabalhador já tinha registro anterior de furto,a averiguação seria ainda mais necessária. “Uma venda ou locação de um bem em tal situação com certeza traria sérios imbróglios e necessidade de reparação”.

O desembargador ressaltou que, assim como a empresa tem o dever de garantir a legalidade dos veículos oferecidos a seus clientes, o mesmo cuidado deve ser adotado em relação aos empregados. “Ainda que o bem não fosse disponibilizado para venda ou locação, as diligências deveriam ter sido realizadas antes de se permitir que um funcionário utilizasse o veículo para o labor, já que se espera ser este o procedimento padrão em empresas do ramo em que a empresa atua”, reiterou o desembargador.

Dano moral

A decisão da 1ª Turma reformou sentença da 4ª Vara do Trabalho de Cuiabá, que havia negado a indenização por entender que não houve culpa da empresa. No entanto, o TRT considerou que a omissão foi evidente ao permitir que o empregado utilizasse um carro com restrição criminal ativa no sistema policial.

Diante da omissão, da gravidade da situação e dos impactos emocionais gerados, a 1ª Turma do TRT/MT fixou o valor da indenização em R$10 mil, montante considerado compatível com os danos sofridos e proporcional à capacidade econômica da empresa.

Após a decisão, o trabalhador e a empresa firmaram um acordo, dando início à solução definitiva do caso.

PJe 0000624-36.2024.5.23.0004

STJ: Assistente de acusação não pode recorrer para condenar o réu por crime estranho à denúncia

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que o assistente de acusação não tem legitimidade para interpor recurso com o objetivo de condenar o réu por delito diferente daquele imputado na denúncia.

No caso em análise, a denúncia oferecida pelo Ministério Público do Ceará apontava três crimes previstos no Código de Trânsito Brasileiro, em concurso material (artigo 69 do Código Penal): condução de veículo com capacidade psicomotora alterada por álcool (artigo 306), homicídio culposo na direção de veículo sob influência de álcool (artigo 302, parágrafo 3º) e lesão corporal culposa na direção de veículo com capacidade psicomotora alterada por álcool (artigo 303, parágrafo 2º).

A sentença condenou o réu pelos três delitos, mas reconheceu o concurso formal (artigo 70 do CP) entre o homicídio e a lesão corporal.

O assistente de acusação recorreu por entender que existiria dolo eventual na conduta do acusado, e requereu o julgamento pelo júri popular – pedido que foi acolhido pelo Tribunal de Justiça do Ceará, o qual anulou a sentença e determinou a remessa do caso para uma das varas do tribunal do júri de Fortaleza.

Recursos do assistente devem estar alinhados com o conteúdo da denúncia
O relator do caso no STJ, ministro Ribeiro Dantas, explicou que o artigo 271 do Código de Processo Penal permite ao assistente “propor meios de prova, requerer perguntas às testemunhas, aditar o libelo e os articulados, participar do debate oral e arrazoar os recursos interpostos pelo Ministério Público, ou por ele próprio, nos casos dos artigos 584, parágrafo 1º, e 598”.

Segundo o ministro, o STJ “tem flexibilizado o rigor dessa regra, de modo a reconhecer a legitimidade do assistente de acusação para, quando já iniciada a persecução penal pelo seu órgão titular, atuar em seu auxílio e supletivamente, na busca pela justa sanção, podendo apelar, opor embargos declaratórios e até interpor recurso extraordinário ou especial”.

Contudo, Ribeiro Dantas esclareceu que é fundamental que os recursos apresentados pelo assistente de acusação estejam alinhados com o conteúdo da denúncia. Dessa forma, observou, se a sentença modificar a classificação da conduta para um delito diferente daquele originalmente imputado pela acusação, o assistente terá legitimidade para recorrer.

“No entanto, a situação inversa não é permitida. Em outras palavras, se o réu for condenado pelo delito especificado na denúncia, o assistente de acusação não tem legitimidade para interpor recurso visando à condenação por um delito distinto”, afirmou.

Ao lembrar que essa é a linha adotada pelos precedentes do tribunal, o relator mencionou que, no julgamento do HC 539.346, foi reconhecida a legitimidade do assistente para recorrer contra a desclassificação de crime de competência do tribunal do júri. No entanto, no caso, o ministro observou que a pretensão do assistente se manteve dentro das balizas traçadas na denúncia.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2194523

STJ: Estelionato sentimental gera direito a indenização de danos morais e materiais

​A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, que o estelionato sentimental, caracterizado pela simulação de relacionamento amoroso com o objetivo de obter vantagem financeira, configura ato ilícito passível de indenização por danos morais e materiais – estes relativos às despesas extraordinárias decorrentes da relação.

O colegiado firmou esse entendimento ao negar provimento ao recurso especial de um homem condenado por induzir sua ex-companheira a pegar empréstimos em seu benefício, valendo-se de um envolvimento afetivo simulado.

A vítima, uma viúva 12 anos mais velha que o réu, disse ter repassado ao homem cerca de R$ 40 mil durante a relação. Após ela negar novo pedido de dinheiro, ele a abandonou e o vínculo entre ambos passou a ser marcado por conflitos. A mulher, então, ingressou com ação judicial pleiteando reparação por estelionato sentimental.

O juízo de primeira instância condenou o réu a pagar R$ 40 mil por danos materiais e R$ 15 mil por danos morais, decisão que foi mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. No recurso ao STJ, o homem alegou inexistência de ato ilícito e de dano indenizável, sustentando violação dos artigos 186 e 927 do Código Civil.

Valores transferidos não decorreram de obrigações naturais de um relacionamento
A relatora do recurso especial, ministra Isabel Gallotti, explicou que o artigo 171 do Código Penal exige, para a configuração do estelionato, três requisitos: obtenção de vantagem ilícita em prejuízo de outrem, uso de meio fraudulento e indução ou manutenção da vítima em erro.

Segundo a ministra, tais elementos ficaram plenamente caracterizados no caso em julgamento, uma vez que os valores transferidos pela mulher não decorreram de obrigações naturais de um relacionamento, mas sim do atendimento a interesses exclusivamente patrimoniais do réu.

A relatora ressaltou que o homem tinha consciência da vulnerabilidade emocional da mulher e se aproveitou dessa condição para simular uma relação amorosa e manipular os sentimentos dela. Para isso, conforme apontou a ministra com base no processo, ele se utilizou de estratégias enganosas, como relatar falsas dificuldades financeiras e exercer pressão emocional para obter o dinheiro de forma fácil e rápida.

Gallotti também afirmou que, embora os pagamentos tenham sido feitos voluntariamente, sem qualquer coação direta, isso não descaracteriza o ato ilícito, uma vez que a essência do estelionato está justamente na ilusão criada pelo agente, fazendo com que a vítima atue enganada – no caso, sem perceber a inexistência do alegado vínculo afetivo.

“Dessa forma, como consequência da simulação do relacionamento e das condutas com o objetivo de obter ganho financeiro, em princípio, é devida à vítima indenização a título de danos materiais, pelas despesas extraordinárias decorrentes do relacionamento, e de danos morais, pela situação vivenciada”, concluiu.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2208310


Estelionato sentimental é um termo usado para descrever um golpe ou fraude em que alguém engana outra pessoa fingindo interesse ou amor com o objetivo de obter vantagem financeira ou patrimonial.

Em outras palavras: quando alguém finge se apaixonar ou manter um relacionamento amoroso só para tirar dinheiro ou bens da outra pessoa.

Geralmente, quem pratica o estelionato sentimental:

  • Ganha confiança e afeto da vítima;
  • Finge amor, compromisso ou casamento;
  • Inventa problemas ou dívidas para pedir dinheiro;
  • Some ou rompe o contato depois de obter o que queria.

*Fonte: Carmela.IA

TJ/MG: Delegada que atirou em direção a policiais civis não vai à júri popular

Juíza sumariante entendeu que não houve intenção de matar e que somente uma das vítimas foi alvo de disparo.


A juíza sumariante do 1º Tribunal do Júri, Ana Carolina Rauen Lopes de Souza, impronunciou a delegada M.Z, pelos crimes de tentativa de homicídio praticados contra três policiais civis e desclassificou a denúncia do crime de tentativa de homicídio em relação a uma quarta vítima, também policial civil, determinando, assim, a redistribuição do processo para uma das varas criminais comuns.

A delegada foi denunciada pelos crimes de tentativa de homicídio, com agravante de terem sido praticados contra agente de segurança pública, por quatro vezes e ainda pelo crime de resistência a ato legal.

De acordo com a denúncia, no dia 21 de novembro de 2023, equipes especializadas de policiais civis foram acionadas e mobilizadas para irem até a casa da delegada.

Consta na denúncia que a acusada estava de licença saúde, por questões mentais, e deveria ter voltado a trabalhar naquela data, porém não o fez.

Também, segundo a denúncia, ela teria postado na mesma data, em rede social, mensagens que sugeriram intenção suicida de sua parte, o que, segundo a denúncia, motivou que as equipes especializadas comparecessem ao local, juntamente com uma profissionais do Hospital da Polícia Civil e uma equipe do Corpo de Bombeiros.

Uma equipe subiu até o apartamento residencial da delegada.

Durante a abordagem, a delegada se mostrou muito agitada e nervosa e teria solicitado às equipes que deixassem o local, pois ela não estaria precisando de ajuda, o que não foi atendido, segundo os policiais, por entenderem que o estado emocional agitado em que a encontraram justificava a continuidade da operação.

Diante do impasse, uma outra equipe da Coordenadoria de Recursos Especiais da Polícia Civil (Core), compareceu e assumiu os trabalhos, liderados por um negociador.

Consta do documento apresentado pelo Ministério Público que depois de horas de tentativas infrutíferas para que a delegada deixasse o apartamento e os acompanhasse, ela saiu de arma em punho exigindo que os policiais deixassem o hall de entrada de seu apartamento.

Ela teria batido com a arma no escudo do negociador, momento em que um segundo policial tentou atingi-la, sem sucesso, com uma arma não letal de descarga elétrica.

Nesse momento, a delegada teria reagido e disparado um tiro em direção ao negociador, e voltado em direção ao seu apartamento, quando um terceiro policial tentou atingi-la com uma arma calibre 12, municiada com balas de borracha.

De acordo com a denúncia, a delegada reagiu novamente e efetuou vários disparos na direção dos policiais.

Decisão

Ao analisar a denúncia, a juíza Ana Carolina Rauen avaliou se os disparos teriam sido intencionais ou acidentais, se a acusada teria agido ou não com dolo (intenção) de matar uma ou mais vítimas, ou agido em legítima defesa.

Ela observou ser “praticamente incontroverso nos autos o envolvimento da ré com os disparos de arma de fogo que ocorreram no interior do seu prédio residencial”.

Porém, considerou que a forma escolhida pelas equipes da Polícia Civil para abordagem da delegada em sua residência, “para atender e impedir uma aparente intenção de autoextermínio”, teve um impacto essencial em todo o ocorrido.

Ela avaliou que as ações culminaram com figuração da suposta pessoa a ser protegida como homicida, e os policiais que teriam ido ao local para garantir a sua integridade física, como vítimas, “que acabou tomando uma proporção avassaladora e que perdurou mais de 30 (trinta) horas, com vasta cobertura midiática”.

De acordo com a decisão da juíza Ana Carolina Rauen, a ré não agiu com intenção homicida.

A juíza observou que no primeiro evento, a ré disparou uma única vez, depois de ter sido alvo do disparo de dispositivo eletrônico.

Também corroborou esse entendimento, o fato de a acusada recuar e voltar para adentrar ao seu apartamento, “mesmo possuindo mais munições, de modo que, se realmente quisesse, poderia ter efetuado mais disparos contra a vítima, a fim de efetivamente atingi-la”.

Ela ainda observou que as provas apresentadas não permitem concluir que os demais disparos, efetuados pela delegada em resposta aos disparos de balas de borracha, foram direcionados aos outros policiais, pois se encontravam alinhados em fila indiana, atrás do fosso do elevador.

Por essas conclusões, a juíza Ana Carolina Rauen Lopes de Souza impronunciou a delegada em relação às imputações de tentativas de homicídio de três das vítimas e desclassificou a imputação inicial de tentativa de homicídio, com relação ao negociador, para crime de competência do juízo comum, que deverá ser indicado pelo juiz criminal que receber o processo.

A decisão ainda determinou a revogação das medidas cautelares impostas à delegada.

TJ/MT: Maus-tratos contra crianças antes da Lei Henry Borel devem ser julgados pelos Juizados Especiais

A Turma de Câmaras Criminais Reunidas do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) decidiu, por unanimidade, que o Juizado Especial Criminal da Comarca de Cáceres é o juízo competente para julgar um caso de maus-tratos contra duas crianças, ocorrido em 2020, antes da entrada em vigor da chamada Lei Henry Borel (Lei nº 14.344/2022).

A controvérsia girava em torno de um conflito de competência entre o Juizado Especial Criminal e a 1ª Vara Especializada de Família e Sucessões de Cáceres, que também exerce atribuições na área da infância e juventude. O caso diz respeito à denúncia apresentada pelo Ministério Público contra a mãe e o padrasto de dois irmãos, de 8 e 9 anos à época dos fatos, sob a acusação de maus-tratos (art. 136 do Código Penal).

O relator do caso, desembargador Marcos Machado, destacou que o artigo 148 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) não atribui à Vara Especializada da Infância e Juventude a competência para julgar crimes praticados contra crianças, mas apenas os crimes cometidos por elas ou situações relacionadas a sua proteção.

“O fato descrito da denúncia – maus-tratos contra criança – não atrai a competência da Justiça Especializada da Infância e Juventude, ao considerar que o art. 148 do ECA foi omisso acerca do julgamento de crimes praticados contra crianças ou adolescentes”, afirmou o relator.

Além disso, mesmo após a entrada em vigor da Lei Henry Borel, que determina que a Lei dos Juizados Especiais (Lei 9.099/95) não se aplica a crimes cometidos contra crianças e adolescentes, a Turma entendeu que essa regra não pode ser aplicada retroativamente, já que os fatos ocorreram em abril de 2020.

“A inovação legislativa promovida pela Lei nº 14.344/2022 constitui novatio legis in pejus, sendo vedada sua retroatividade, conforme os artigos 5º, XL, da Constituição Federal e 2º do Código Penal”, observou o relator em seu voto.

A decisão ressalta ainda que, na ausência de previsão legal expressa e organização judiciária específica, o Judiciário não pode ampliar a competência das varas especializadas, sob pena de violar o princípio do juiz natural previsto no artigo 5º, inciso LIII, da Constituição Federal.

Lei Henry Borel

A Lei Henry Borel (Lei nº 14.344/2022) foi criada para estabelecer mecanismos de prevenção e enfrentamento à violência doméstica e familiar contra crianças e adolescentes, em moldes semelhantes à Lei Maria da Penha. A norma determina, entre outras medidas, que crimes cometidos contra menores de idade não podem ser julgados sob os procedimentos da Lei dos Juizados Especiais, independentemente da pena prevista.

A lei leva o nome de Henry Borel Medeiros, um menino de 4 anos que morreu em março de 2021, no Rio de Janeiro, em circunstâncias que indicam fortes indícios de agressões dentro de casa. O caso ganhou repercussão nacional e provocou ampla comoção pública, tornando-se símbolo da luta contra a violência infantil no Brasil.

Processo nº 1000603-73.2023.8.11.0000


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