TJ/GO: Motorista bêbado que tentou atropelar motociclista vai a júri popular

O motorista David Mendes Batista, de 43 anos, acusado de tentar matar Vinicius Henrique Gonçalves de Araújo por atropelamento, vai a júri popular, nesta terça-feira (6), no auditório do Fórum Cível de Goiânia, no Park Lozandes. O crime aconteceu no dia 6 de dezembro de 2021, na Avenida C-4, esquina com a Avenida C-1, em frente ao Restaurante Simbora, no Jardim América, nesta capital. O julgamento vai começar por volta das 8h30, sob a presidência do juiz Jesseir Coelho de Alcântara, da 3ª Vara dos Crimes Dolosos contra a Vida e Tribunal do Júri de Goiânia.

Consta do inquérito policial que, no dia do fato, David Mendes Batista conduzia perigosamente em via pública sua caminhonete, com a capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool (especificamente 0,69 mg de álcool por litro de ar alveolar). Num determinado momento, na Avenida C-1, o denunciado efetuou uma manobra arriscada, “fechando” Vinícius Henrique Gonçalves de Araújo que conduzia sua motocicleta, e ainda avançou na direção da vítima.

A vítima buzinou e, então, o denunciado voltou para seu lado da pista. Ato contínuo, Vinícius alcançou David ao parar no semáforo, oportunidade em que protestou diante da atitude despropositada do denunciado. Neste instante, exaltado pelo fato da vítima ter tirado satisfações consigo, David deu marcha à ré e, em seguida, agindo com “animus necandi” deliberadamente atirou sua caminhonete sobre a motocicleta da vítima, arrastando-a por vários metros, sendo absolutamente previsível que Vinícius fosse atropelado e poderia ser morto.

Ainda, conforme os autos, enquanto estava com a caminhonete sob seu corpo, Vinícius instintivamente arrastou-se no asfalto e conseguiu se esquivar, tendo sofrido escoriações. David seguiu arrastando a motocicleta que estava presa embaixo do veículo, e somente parou quando colidiu com um carro estacionado na via. A Polícia Militar foi acionada, e o denunciado autuado em flagrante delito, tendo sido submetido ao teste de alcoolemia, que constatou sua embriaguez.

STJ: Inconsistência em reconhecimento fotográfico e falta de outras provas justificam absolvição por roubo e estupro em ônibus

Por constatar sérias inconsistências e indevidas interferências no procedimento de reconhecimento pessoal do suspeito, bem como grave falha na persecução penal, relativamente à produção de provas, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) absolveu um homem condenado por roubo e estupro no interior de um ônibus no Rio de Janeiro.

Para a relatora, ministra Laurita Vaz, além das irregularidades no reconhecimento, houve falha na produção de provas. A acusação teria deixado de produzir algumas provas de suma importância que poderiam dirimir o cenário de incerteza quanto à autoria dos crimes, comprovando-se a tese acusatória ou até mesmo atestando-se a inocência do acusado.

O fato aconteceu em 2018: dois homens armados anunciaram o assalto, ocasião em que subtraíram vários pertences dos passageiros, incluindo o aparelho celular da vítima, uma mulher jovem. Em seguida, um dos criminosos teria constrangido a denunciante, mediante grave ameaça de mal físico, a praticar atos libidinosos com ele.

No departamento de polícia, ao lhe serem apresentadas as fotos, a vítima disse ter ficado em dúvida entre dois indivíduos, momento em que o policial teria alertado que um deles (irmão gêmeo do acusado) já estaria preso, influenciando, assim, no reconhecimento feito pela vítima.

O juízo de primeiro grau condenou o denunciado a 15 anos de reclusão, em regime inicial fechado, por roubo e estupro. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro manteve a sentença.

Reconhecimento foi marcado por inconsistências e interferências indevidas
A relatora do habeas corpus, ministra Laurita Vaz, acolheu a argumentação da Defensoria Pública do Rio de Janeiro de que a prova era sugestionada. Na fase do inquérito, ao serem apresentadas as fotos dos possíveis autores do crime, a vítima indicou ter ficado na dúvida com relação a dois possíveis suspeitos, irmãos gêmeos, o que levou um policial a informá-la que uma das pessoas mostradas se encontraria preso, do que decorreu a consequência lógica da impossibilidade de ele ser o autor do crime, influenciando, assim, o reconhecimento pela vítima do suspeito na outra fotografia.

Já no âmbito judicial o reconhecimento foi confirmado, mas a ministra apontou que a vítima relatou que o agressor teria certas características físicas, como cavanhaque e uma marca na sobrancelha, características que não podem ser observadas na foto do réu mostrada pela polícia.

Nesse sentido, Laurita Vaz destacou que o reconhecimento de pessoas, embora seja meio de prova aceito pela legislação, deve ser analisado e valorado com cautela, dado que a própria falibilidade humana pode comprometer, mesmo de forma involuntária, o acerto por parte do sujeito reconhecedor.

“Em que pese a vítima tenha confirmado o reconhecimento em juízo, nem sequer consta a informação de que novo procedimento foi feito com a observância das formalidades exigidas pelo artigo 226 do Código de Processo Penal (CPP). Ainda que tenha ocorrido a confirmação, não há como garantir a fiabilidade da prova, pois uma vez que a testemunha ou a vítima reconhece alguém como o autor do delito, há tendência, por um viés de confirmação, a repetir a mesma resposta em reconhecimentos futuros, pois sua memória estará mais ativa e predisposta a tanto”, declarou.

Dever estatal não pode ser cumprido da maneira cômoda
Laurita Vaz também ressaltou que houve grave falha na produção de provas. A denúncia indica que haveria outros passageiros no veículo no momento dos fatos, todos eles, potenciais testemunhas da ação delitiva. No entanto, nenhum dos referidos passageiros, à exceção da vítima da violência sexual, foi ouvido, seja em juízo ou no departamento policial.

A ministra recordou que, durante a investigação, a autoridade policial requisitou à empresa responsável pelo ônibus informações sobre a existência de imagens do momento dos fatos, tendo a empresa reportado não notar nenhuma ação anormal na gravação durante o intervalo de tempo mencionado pela autoridade, e se prontificado a enviar os arquivos contendo as imagens para os órgãos estatais competentes. Apesar disso, a autoridade policial e o Ministério Público estadual se mantiveram inertes e não solicitaram as imagens.

Laurita explicou que essa conjuntura processual configura o que a doutrina processualista-penal denomina de perda de uma chance probatória, a qual dispõe que o Estado não pode perder a oportunidade de produzir provas contra o acusado, tirando-lhe a chance de um resultado pautado na certeza ou na incerteza.

“Apesar de os fatos serem gravíssimos e de ser dever do Estado não incorrer em proteção insuficiente aos bens jurídicos merecedores de tutela penal, essa obrigação não pode ser cumprida da maneira mais cômoda, com a prolação de condenações baseadas em prova frágil, mormente quando possível a produção de elemento probatório que, potencialmente, possa resolver adequadamente o caso penal. É de se concluir, portanto, que a prova produzida não pode lastrear, por si só, o decreto condenatório, impondo-se a absolvição do paciente”, concluiu a ministra.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

O princípio ‘non reformatio in pejus’ e a sua aplicação pelo STJ

Quando o réu condenado em ação penal recorre da decisão, certamente não espera que, ao analisar os argumentos da defesa, o tribunal venha a piorar a sua situação processual – aumentando o tempo de pena, por exemplo. Essa hipótese, de fato, é vedada pelo princípio non reformatio in pejus, segundo o qual não é possível agravar a situação do réu no julgamento de recurso exclusivo da defesa.

Amplamente admitido pela doutrina e pela jurisprudência, o princípio está previsto, em especial, no artigo 617 do Código de Processo Penal (CPP).

Com base na impossibilidade da reformatio in pejus, após o julgamento de segunda instância, muitas partes recorrem ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) sob a alegação de indevida piora da sua situação no processo. A corte firmou vasta jurisprudência sobre o tema – ora acolhendo, ora rejeitando a tese de violação do princípio.

Restabelecimento da pena fixada em sentença não viola princípio non reformatio in pejus

O provimento de recurso especial do Ministério Público que leva ao restabelecimento da pena fixada em sentença não configura violação do princípio non reformatio in pejus, ainda que só a defesa tenha interposto apelação. O entendimento foi adotado de maneira unânime pela Sexta Turma ao negar provimento ao agravo regimental no AREsp 1.895.594.

No caso dos autos, o réu foi condenado por homicídio qualificado tentado a 14 anos de reclusão, tendo o juízo de primeira instância fixado a pena-base em dois anos acima do mínimo legal, diante da valoração negativa da culpabilidade do agente e das circunstâncias do crime. No julgamento da apelação, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) considerou que o aumento da pena havia sido desproporcional e a readequou para 13 anos.

Em decisão monocrática, o relator no STJ, ministro Rogerio Schietti Cruz, apontou que o tribunal de segundo grau não se pronunciou sobre a culpabilidade e fixou a pena-base considerando seis meses para cada circunstância judicial negativa. Isso, segundo o ministro, foi insuficiente para os objetivos de reprovação e prevenção do crime. “Deve, portanto, ser restabelecida a sanção fixada pelo juízo de primeira instância – 14 anos de reclusão –, haja vista a valoração desfavorável de duas vetoriais”, afirmou.

O réu recorreu da decisão monocrática, sustentando ter havido reformatio in pejus, porque apenas a defesa interpôs apelação e, portanto, o Ministério Público estadual não poderia ter recorrido ao STJ, em decorrência do trânsito em julgado para a acusação.

Schietti explicou que, embora somente a defesa tenha recorrido da sentença, a diminuição da pena pelo tribunal estadual deu ao órgão acusatório a legitimidade para interpor o recurso especial, a fim de que fosse mantida a condenação nos termos fixados em primeira instância. Nessas circunstâncias, não seria possível falar em reformatio in pejus.

Proibição da reformatio in pejus deve ser analisada item por item no dispositivo da pena

No julgamento do HC 251.417, de relatoria do ministro Rogerio Schietti Cruz, a Sexta Turma definiu que, para o exame dos limites da proibição de reforma para pior, deve ser analisado cada item do dispositivo que fixou a pena, e não apenas a quantidade total da reprimenda.

De acordo com os autos, um homem foi condenado a 25 anos de reclusão por, junto com outras pessoas, praticar um assalto e, na sequência, matar a vítima. A sentença, na primeira etapa da dosimetria, considerou negativas a culpabilidade, a personalidade do agente e as circunstâncias do crime.

O tribunal de segunda instância, em apelação exclusiva da defesa, manteve a análise desfavorável somente das duas últimas circunstâncias judiciais, mas não alterou a pena aplicada, pois a julgou necessária e suficiente para a punição e a prevenção do crime.​​​​​​​​​​​​

No STJ, Schietti observou que a proibição de reforma para pior garante ao réu o direito de não ter sua situação agravada, direta ou indiretamente. “Não obsta, entretanto, que o tribunal, para dizer o direito – ao exercer, portanto, sua soberana função de juris dictio –, encontre motivação própria, respeitada, insisto, a imputação deduzida pelo órgão de acusação, a extensão cognitiva da sentença impugnada e os limites da condenação imposta no juízo de origem”, declarou.

Contudo, o relator explicou que a proibição da reforma para pior diz respeito a cada item do dispositivo da pena, e não apenas à quantidade total da reprimenda. Nesse sentido, segundo o magistrado, se o tribunal admite uma atenuante excluída pelo juiz de primeiro grau, ou exclui uma agravante admitida por este último, deve reduzir o total da pena, não podendo mantê-la intacta.

“Deve ser reconhecido o constrangimento ilegal no ponto em que o tribunal de origem, na apelação da defesa, considerou desfavoráveis ao paciente duas circunstâncias judiciais – em vez das três valoradas na sentença –, mas não reduziu a pena básica, aumentando a quantidade de pena atribuída às vetoriais remanescentes”, disse o ministro ao conceder o habeas corpus e redimensionar a pena para 23 anos e quatro meses.

Efeito devolutivo da apelação permite nova ponderação acerca dos fatos

Em outro julgamento relevante da Quinta Turma, foi definido que o efeito devolutivo da apelação autoriza o tribunal de segundo grau, quando instado a se manifestar sobre a dosimetria da pena e a fixação do regime prisional, a fazer nova ponderação dos fatos e das circunstâncias do crime sem incorrer em reformatio in pejus, mesmo que só a defesa tenha recorrido, mas desde que não seja agravada a situação do réu.

No caso, o réu foi condenado por estupro de vulnerável, em regime inicial fechado. A defesa apelou, e o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) – entendendo que não ficou provada a condição vulnerável da vítima – desclassificou a conduta para o crime de estupro, o que resultou na redução da pena, mantido o regime fechado.

Em habeas corpus, entre outras questões, a defesa alegou reformatio in pejus por parte do TJMG, pois a corte teria valorado negativamente a culpabilidade, enquanto o juízo sentenciante negativou apenas as consequências do crime.

O relator no STJ, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, observou que os tribunais de segundo grau, quando provocados a se manifestar sobre algum critério da dosimetria, ficam autorizados a reanalisar inclusive as circunstâncias judiciais e a rever todos os termos da individualização da pena definidos na sentença.​​​​​​​​​​​​

Dessa forma, segundo o magistrado, possibilita-se nova ponderação dos fatos e das circunstâncias em que ocorreu o delito, ainda que seja em recurso exclusivo da defesa, sem que ocorra reformatio in pejus, desde que não se aumente a pena final do acusado ou se agrave o regime de cumprimento – o que, no caso dos autos, não ocorreu.

“Apesar de o tribunal local ter valorado negativamente mais uma circunstância judicial, a pena do paciente foi efetivamente reduzida, uma vez que aplicada fração mais branda de aumento”, declarou.

Fundamentos da dosimetria podem ser revisados sem caracterizar reformatio in pejus

A jurisprudência do STJ considera que, mesmo havendo recurso exclusivo da defesa, é possível a revisão dos fundamentos da dosimetria da pena, desde que não seja modificada a quantidade de sanção imposta, sem que tal procedimento caracterize indevida reformatio in pejus.

Com esse entendimento, ao julgar o AREsp 993.413, a Quinta Turma manteve decisão monocrática do relator, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, que – em análise de recurso especial do Ministério Público – reformou acórdão de segundo grau para restabelecer o aumento de pena aplicado na sentença a um homem condenado por roubo.

O juízo de primeiro grau condenou o réu e, com base no critério quantitativo, por reconhecer a presença de duas majorantes (concurso de agentes e ameaça com arma de fogo), aumentou a pena em três oitavos.

No entanto, o Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) reduziu o acréscimo para o mínimo de um terço, aplicando a Súmula 443 do STJ. Embora admitisse que a conduta do réu foi mais reprovável do que a média nesse tipo de crime, a corte local considerou que eventual acréscimo de fundamentação, a fim de manter o aumento da pena em três oitavos, caracterizaria reformatio in pejus.

No STJ, o relator apontou que, nos termos da jurisprudência do tribunal, o princípio non reformatio in pejus prevê que o julgador não está vinculado aos fundamentos adotados na instância anterior; ele apenas não pode agravar a pena, o que seria inadmissível em recurso exclusivo da defesa. Reynaldo Soares da Fonseca disse também que a conclusão acerca da existência de peculiaridades que justificam o aumento da pena em três oitavos não exigia revisão das provas – o que seria inviável em recurso especial –, apenas a sua revaloração.

Com esses fundamentos, reconhecendo as peculiaridades do caso concreto que configuravam uma conduta mais reprovável – além do concurso de quatro agentes e do uso de arma de fogo, houve troca de tiros com a polícia –, o ministro considerou inaplicável a Súmula 443 e fixou o aumento da pena em três oitavos.

Princípio impede recurso especial adesivo da acusação

Para a Sexta Turma, a interposição de recurso especial adesivo pelo Ministério Público, veiculando pedido contra o réu, conflita com a regra non reformatio in pejus, segundo a qual a pena não pode ser agravada quando somente a defesa recorre.

Ao julgar o REsp 1.595.636, o ministro Sebastião Reis Júnior, relator, afirmou que há dúvidas acerca do cabimento de recurso adesivo no processo penal, em razão da falta de previsão no CPP. No caso específico de recurso especial criminal, segundo ele, nem o CPP nem a Lei 8.038/1990 previram essa hipótese. “Mesmo quando se entende cabível recurso adesivo em matéria criminal, inclusive o especial, também há ressalvas acerca da possibilidade de utilização desse recurso pelo Ministério Público” apontou.

O magistrado ressaltou que, não havendo norma do CPP sobre alguma questão, o artigo 3º do código admite a sua integração por meio de outros diplomas legais, inclusive o Código de Processo Civil (CPC). Contudo, segundo o ministro, nessa integração de normas, é preciso tomar cuidado para que a interpretação dada à regra utilizada para suprir a omissão não conflite com preceitos do CPP.

De acordo com Sebastião Reis Júnior, admitir a interposição de recurso especial adesivo do Ministério Público, com algum pedido contra o réu, conflita com a regra do artigo 617 do CPP, que proíbe a reformatio in pejus.

“Em razão da relação de subordinação, o recurso adesivo ministerial somente poderia ser conhecido caso fosse conhecido também o recurso da defesa, ou seja, a admissão do recurso defensivo acarretaria ao réu um efeito negativo, qual seja, o de que o recurso acusatório adesivo também passaria a ser analisado, caracterizando uma reformatio in pejus indireta”, concluiu.​​​​​​​​​​​​

Reconhecimento da continuidade delitiva não leva à redução obrigatória da pena

A Sexta Turma, ao julgar o HC 301.882, decidiu que o reconhecimento da continuidade delitiva não importa na redução obrigatória da pena definitiva fixada em cúmulo material, pois há a possibilidade de aumento da pena do delito mais grave em até o triplo, nos termos do artigo 71, parágrafo único, do Código Penal (CP).

No caso, o réu foi condenado a 30 anos de reclusão, em cúmulo material de dois delitos de homicídio qualificado com decapitação e esquartejamento das vítimas. Na revisão criminal, foi reconhecido crime continuado, mas sem alteração da pena final. A defesa, então, sustentou a ilegalidade da dosimetria adotada pelo tribunal de segunda instância, por haver acrescentado circunstância judicial desfavorável em recurso exclusivo da defesa.

O ministro Antonio Saldanha Palheiro, relator, apontou que é pacífica a distinção entre os institutos da continuidade delitiva e da pena-base, apesar de aparentemente partilharem a necessidade de valoração de vetoriais semelhantes, mesmo porque cada crime permanece independente na cadeia delitiva, tanto que se permitem dosimetrias distintas para cada evento.

“A distinção entre os referidos institutos permite, inclusive, a valoração da mesma circunstância fática sob dois aspectos distintos, sem infringência ao princípio do ne bis in idem”, afirmou Saldanha.

Nesse sentido, o magistrado destacou que a pena definitiva foi mantida no mesmo montante, modificados somente os institutos penais sem o decote de qualquer vetorial negativa ou causa de aumento. “É de se considerar que a pena definitiva do agente não foi aumentada, o que afasta a alegação de reformatio in pejus”, concluiu o relator.

Tribunal não pode agravar situação do réu mesmo se houver erro na soma das penas

No julgamento do HC 250.455, a Sexta Turma entendeu que, no âmbito de recurso exclusivo da defesa, o tribunal de segundo grau não pode agravar a pena imposta ao condenado, ainda que reconheça equívoco na soma das penas aplicadas.

No caso julgado, o réu foi condenado a nove anos de reclusão por tráfico de drogas e associação para o tráfico. O tribunal de segundo grau negou provimento à apelação da defesa e, de ofício, corrigiu o erro aritmético da sentença, concluindo que a pena imposta totalizava, na verdade, nove anos, sete meses e seis dias de reclusão.

O ministro Nefi Cordeiro (aposentado), relator, explicou que, como o Ministério Público não questionou o erro material, o tribunal não poderia conhecê-lo de ofício, sob pena de configuração da reformatio in pejus.

O magistrado ressaltou que o STJ possui jurisprudência firmada no sentido de que configura inegável reformatio in pejus a correção de erro material no julgamento da apelação – ainda que para sanar evidente equívoco ocorrido na sentença condenatória – que importa em aumento da pena, sem que tenha havido recurso do Ministério Público para isso.

Esta notícia refere-se aos processos: AREsp 1895594; HC 251417; AREsp 993413; REsp 1595636; HC 301882 e HC 250455

TRF1: Pagamento de fiança pode ser dispensado quando comprovada a hipossuficiência do réu

A 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) concedeu habeas corpus para garantir a liberdade provisória a um homem que apresentou documento de identidade com nome falso durante abordagem realizada pela Polícia Rodoviária Federal (PRF). Ele foi preso em flagrante, e o Juízo da 2ª Vara da Subseção Judiciária de Ji-Paraná/RO condicionou a liberdade provisória do preso ao pagamento de fiança no valor R$ 13.200,00.

O pedido que chegou ao TRF1 alegou que o paciente é uma pessoa de baixa renda e recebe Auxílio Brasil, não tendo condições de arcar com o pagamento da fiança.

Ao analisar o processo, o relator, desembargador federal César Jatahy, explicou que o artigo 350 do Código de Processo Penal estabelece que, “nos casos em que couber fiança, o juiz, verificando a situação econômica do preso, poderá conceder-lhe liberdade provisória, sujeitando-o às obrigações constantes dos arts. 327 e 328 do CPP e a outras medidas cautelares, se for o caso”.

Sem prejuízo das demais medidas – Segundo o magistrado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem o entendimento que a imposição de fiança, quando afastada pelo magistrado os pressupostos da prisão preventiva, não possui o condão de justificar a manutenção da prisão cautelar, especialmente quando o réu se declarou pobre e comprovou essa situação.

Portanto, concluiu o relator, deve ser imposta a concessão da liberdade provisória ao paciente, independentemente de pagamento da fiança arbitrada, sem prejuízo das demais medidas substitutivas da prisão preventiva estabelecidas pela autoridade impetrada.

O desembargador ressaltou que caso seja descumprida qualquer das condições impostas, o benefício deverá ser revogado e o mandado de prisão expedido.

A 4ª Turma decidiu conceder a ordem de habeas corpus conforme o voto do relator, garantindo a liberdade provisória ao paciente, independentemente do pagamento de fiança.

Processo: 1000197-64.2023.4.01.0000

TRF1 nega revisão criminal à condenada por tráfico internacional de mulheres e formação de quadrilha

O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) negou a revisão criminal pedida pela defesa de uma mulher condenada pela Justiça Federal em 2010 por tráfico de mulheres (na forma qualificada) e formação de quadrilha. A tentativa de reverter a decisão da Justiça Federal envolveu uma suposta sentença absolutória sobre o mesmo fato advinda da justiça suíça. No entanto, o Tribunal entendeu que a defesa não foi capaz de demonstrar a procedência do pedido de revisão criminal.

Os crimes praticados pela condenada a 8 anos e 4 meses de reclusão envolveram o tráfico de mulheres do estado de Goiás. Do Brasil, as mulheres eram enviadas à Suíça para se prostituírem em um bar no país estrangeiro. De acordo com os autos, algumas eram, inclusive, menores de idade.

O relator do processo, juiz federal convocado Saulo Casali Bahia, cujo voto foi acompanhado por unanimidade pela 2ª Seção do Tribunal, argumentou que a defesa alegou, como principal argumento, que havia trânsito em julgado de sentença penal absolutória. A decisão foi relativa aos mesmos fatos pelos quais a mulher teria sido condenada no Brasil, constituindo coisa julgada e, por isso, “fulminando” a competência da justiça brasileira para apreciar a questão, nos termos do art. 7º, inciso II, b, e § 2º, d, do Código Penal (CP).

A revisão criminal foi ajuizada com fundamento no art. 621, incisos I (quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos) e II (quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos), ambos do Código de Processo Penal (CPP).

O magistrado, ao votar, afirmou que a defesa nada aduziu sobre a existência concreta de depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos que pudessem dar suporte à revisão criminal, derrubando a hipótese de ser ajuizada pelo art. 621, inciso II do CPP.

Sentença na Suíça – Quanto à hipótese de revisão criminal por sentença contrária à evidência dos autos (art. 621, inciso II do CPP), a defesa tentou demonstrar a existência de uma sentença, supostamente relativa aos mesmos fatos julgados no Brasil, que teria sido prolatada pelo Tribunal Regional de Zurique, na Suíça. E suscitou dúvida sobre a legalidade/constitucionalidade das interceptações telefônicas feitas no caso.

“Relativamente ao primeiro ponto — a existência de coisa julgada em razão da decisão da justiça suíça —, verifica-se que a respectiva sentença penal estrangeira transitou em julgado e se tornou executória em 12/11/2007, ou seja, mais de dois anos antes da sentença objeto do pedido revisional, proferida em 20/01/2010, sem que, contudo, a requerente tenha suscitado eventual litispendência ou coisa julgada nos autos da Ação Penal 0006055-65.2006.4.01.3500/GO, cuja condenação agora busca rescindir”, apontou o relator.

O magistrado também salientou que as cópias da sentença prolatada na Suíça e a respectiva tradução apresentada à Justiça brasileira apresentavam omissões e supressões em vários pontos, impossibilitando aferir se havia, de fato, coisa julgada. “A simples indicação de dispositivos da lei penal suíça e a transcrição das penas impostas à requerente não se mostram suficientes à comprovação de que ambas as ações continham as mesmas partes, causa de pedir e pedido, nos termos do art. 337, § 2º, do Código de Processo Civil”, esclareceu.

Para o relator, seria preciso ainda um quadro comparativo dos fatos do processo penal do Brasil e na Suíça com as duas acusações oficializadas a fim de que a principal tese da revisão pudesse ser examinada com completude. Isso porque não havia elementos seguros acerca da identidade da causa de pedir.

Quanto às interceptações telefônicas, o magistrado firmou ainda que a questão já havia sido “rechaçada na sentença” e que a defesa não apresentou qualquer novo fundamento para revisar o entendimento da Justiça Federal.

Voto-vista – A desembargadora federal Maria do Carmo Cardoso, que pediu vista para melhor analisar a matéria, terminou por também acompanhar o voto do relator. Em primeiro lugar, ela constatou que o Superior Tribunal de Justiça decidiu pela improcedência do pedido de homologação da sentença estrangeira apresentada pela defesa e que, nesse sentido, à Justiça Federal cabe executar a homologação após ter sido originalmente feito no STJ.

A magistrada pontou ainda que embora existam situações em que a sentença estrangeira produz efeitos no Brasil sem a necessidade e homologação do STJ (como para evitar o bis in idem), não foi o caso demonstrado pela defesa, já que a requerente não comprovou a similitude fática e temporal com os crimes pelos quais foi condenada no Brasil.

Processo: 1041052-27.2019.4.01.0000

STJ determina que juízo da execução em SP analise pedido de Anna Carolina Jatobá para progressão ao regime aberto

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou, por unanimidade, que o juízo da execução em São Paulo aprecie o pedido de progressão ao regime aberto apresentado pela defesa de Anna Carolina Jatobá, independentemente da realização de Teste de Rorschach.

Anna Carolina foi condenada, junto com Alexandre Nardoni, pelo assassinato de Isabella Nardoni, em março de 2009.

De acordo com a Quinta Turma, o juízo da execução penal havia exigido a submissão da recorrente a um teste psicológico (Teste de Rorschach) como condição para análise da progressão de regime sem, entretanto, apresentar fundamentação adequada para a medida.

A exigência imposta pelo juízo de primeiro grau levou a defesa a impetrar habeas corpus junto ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), ao qual argumentou que Anna Carolina já havia sido submetida a exame criminológico, com resultado favorável, de forma que a manutenção do regime mais gravoso representaria constrangimento ilegal.

Juízo de execução não demonstrou pertinência de exame psicológico
O relator do caso, ministro Messod Azulay Neto, destacou ser possível que o magistrado de primeiro grau ou o tribunal local determinem a realização de prova técnica para a formação de seu convencimento, desde que essa decisão seja adequadamente motivada, conforme preveem a Súmula 439 do STJ e a Súmula Vinculante 26 do STF.

No entanto, o ministro ressaltou que, no caso, meses depois da determinação de realização de exame criminológico – que foi feito –, o juízo da execução penal exigiu a submissão da recorrente ao Teste de Rorschach para análise da progressão ao regime aberto, sem apresentar fundamentação idônea e pautada em elementos concretos e pertinentes.

“A sequência de decisões, ora exigindo um exame, ora outro, em um intervalo de meses sem a apreciação do pedido de progressão de regime, revela a afronta aos princípios da proporcionalidade, da boa-fé processual e da cooperação”, afirmou Messod Azulay Neto.

Juízo de primeiro grau e do TJSP contrariaram jurisprudência do STJ
O relator acrescentou que não é a primeira vez que a recorrente se submete à apreciação de requisito subjetivo para a progressão de regime e, evidentemente, já passou por avaliações antes de progredir ao regime semiaberto. Dessa forma, Messod Azulay Neto classificou a decisão do juízo de execução como carente de elementos consistentes que, de fato, demonstrassem a necessidade, naquele momento, do exame complementar.

Em seu voto, o relator enumerou julgados do STJ que apontam a necessidade de fundamentação amparada em informações concretas e extraídas do curso da execução penal, para que se possa determinar exame a respeito do preenchimento do requisito subjetivo para a progressão de regime.

“Desta forma, a decisão do juízo de primeiro grau e o acórdão do tribunal de origem estão em contrariedade ao entendimento e à jurisprudência do STJ, razão pela qual se constata a flagrante ilegalidade no caso, que deve ser sanada”, concluiu o ministro.

Processo: RHC 181452

TJ/SC: Médica que desviou remédios e exames do SUS para familiares agora trabalhará de graça

Uma médica atuante em unidades de saúde de Chapecó, no Oeste, foi condenada a três anos, 10 meses e 20 dias de reclusão pelo crime de peculato – quando o funcionário público se aproveita do cargo para tirar vantagens. Por preencher os requisitos, a profissional teve direito à substituição da pena privativa de liberdade por prestação de serviço comunitário, por tempo igual ao da pena imposta, e pagamento de prestação pecuniária no valor de 20 salários mínimos. A decisão é da 1ª Vara Criminal da comarca de Chapecó.

Segundo apurado nos autos, pedidos de exames e desvios de medicamentos em favor de familiares ocorreram entre agosto de 2015 e janeiro de 2016, por 122 vezes. De acordo com a denúncia, a servidora pediu a uma enfermeira de um dos Centros de Saúde da Família (CSF), onde atendia, que cadastrasse o companheiro, a sogra, os pais e ela própria, embora nenhum deles residisse na comunidade abrangida pelo CSF.

A partir da elaboração de falsos prontuários, a médica prescreveu quantidade excessiva de medicamentos e solicitações de exames, o que foi custeado com dinheiro público e também prejudicou o estoque para os demais usuários do sistema nas áreas onde foram registradas as retiradas.

Inclusive, segundo testemunhas, houve a retirada, durante três dias e em nome do pai, de medicamentos suficientes para tratamento de seis meses. No entanto, ele residia em Minas Gerais. A sogra, outra beneficiada pela ação, tinha residência no Rio Grande do Sul. A partir daí teve início auditoria que apurou o cadastro de familiares da acusada no mesmo posto de saúde em que exercia regularmente suas funções – unidade não condizente com os domicílios dos beneficiados.

A portaria GM/MS n. 2.488/2011, da Política Nacional de Atenção Básica, determina que cabe aos Centros de Saúde da Família atender as famílias que residam em sua área de abrangência, fato que se atesta através de comprovante de residência e visita domiciliar feita pelas agentes de saúde.

“É por demais óbvio que na realidade de nosso país os recursos públicos são insuficientes para garantir o acesso efetivamente universal. […] Não é admissível que a acusada desconhecesse e ignorasse tal cenário, nem mesmo eticamente aceitável, considerando a sua remuneração, que desfalcasse os setores mais carentes da população em razão do desvio dos medicamentos em proveito próprio e de seus familiares”, considerou o magistrado em sua decisão. O valor referente aos medicamentos retirados ilicitamente foi ressarcido aos cofres públicos ao longo do processo.

 

TRT/RS: mantém despedida por justa causa de empregado que assaltou mercado onde trabalhava

A 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) manteve a despedida por justa causa de um encarregado de sessão que participou de um assalto ao supermercado onde trabalhava. Por unanimidade, os desembargadores mantiveram, no mérito, a sentença da juíza Amanda Stefania Fisch, da Vara do Trabalho de Osório.

Após dois anos de vínculo de emprego, o trabalhador foi preso preventivamente por participar do crime. Depois da soltura, a despedida aconteceu com base no ato de improbidade e incontinência de conduta ou mau procedimento, conforme alíneas “a” e “b” do artigo 482 da CLT, respectivamente. Posteriormente denunciado pelo Ministério Público Estadual, o processo transitou em julgado, com condenação superior a 10 anos de prisão.

Na ação trabalhista, ele tentou reverter a despedida por justa causa, sob alegação de que não teria participado do assalto. A partir da análise do processo, a juíza Amanda considerou incontroverso o envolvimento do autor no assalto cometido à sede da ré. “A prova documental constante dos autos, aliada à consulta processual acerca do andamento da ação penal em comento, dão conta do ato lesivo praticado pelo autor em pormenores”, afirmou a magistrada.

O trabalhador recorreu ao Tribunal para reverter a decisão de 1º grau, mas a despedida por justa causa foi mantida. Os magistrados determinaram apenas o pagamento de férias e 13º salário proporcionais, além da multa do artigo 477,§ 8º da CLT.

A decisão ressaltou que é necessária a ocorrência dos seguintes requisitos para a configuração da justa causa: ato culposo ou doloso do empregado; gravidade do ato; tipificação legal (em regra, art. 482 da CLT); nexo de causalidade entre a falta e a penalidade aplicada; proporcionalidade da punição; imediatidade da punição; e inexistência de perdão tácito, dupla punição e discriminação. No caso, o relator do acórdão, desembargador Gilberto Souza dos Santos, esclareceu que não houve afronta ao requisito da gradação das penas, em face da gravidade da falta cometida pelo empregado.

Para o desembargador, diante da prova contundente sobre ato que enquadre o empregado nas hipóteses previstas no artigo 482 da CLT, impõe-se o reconhecimento da validade da despedida por justa causa. “A ruptura do contrato de trabalho por justa causa configura medida extrema adotada pelo empregador em relação à conduta faltosa do trabalhador. Reitero, que diversamente do alegado nas razões recursais, as condutas criminosas do reclamante estão satisfatoriamente demonstradas na ação penal ajuizada pelo Ministério Público, a qual foi julgada procedente”, destacou o magistrado.

Participaram do julgamento os desembargadores Clóvis Fernando Schuch Santos e Ricardo Carvalho Fraga. Não houve recurso da decisão.

TRF1: União deve pagar R$ 250 mil a familiares por detento que se suicidou nas dependências da Polícia Federal

A 5ª Turma do Tribunal Regional Federal (TRF1) manteve a sentença que acatou o pedido da família da mãe e do filho de um detento que cometeu suicídio no interior da Superintendência da Polícia Federal da cidade de Passo Fundo/RS. A União foi condenada ao pagamento da quantia de R$ 250.000,00 para cada um dos familiares do presidiário.

União e autores apelaram da sentença. Os autores informam que, além do incidente de insanidade mental instaurado pela Defensoria Pública, houve cinco pedidos de transferência do interno à clínica psiquiátrica, formalmente requeridos e todos negados, caracterizando assim responsabilidade objetiva do Estado, reivindicando, portanto, aumento da quantia a ser reparada. Já a União alegou que a culpa foi exclusiva da vítima.

Ao analisar o processo, o relator, desembargador federal Carlos Augusto Pires Brandão, afirmou que a responsabilidade objetiva do Estado consiste em princípio constitucional que estabelece que o Poder Público deve responder pelos danos provocados a terceiros, independentemente de culpa.

Segundo o magistrado, diversos documentos internacionais destacam a necessidade de tratar todos os detentos com respeito e dignidade, independentemente das circunstâncias da prisão.

Respeito e dignidade aos detentos – O desembargador federal sustentou que a indenização por danos morais tem como função principal compensar uma pessoa pelos prejuízos que ela sofreu em decorrência de ofensa a sua honra, imagem, dignidade, integridade física ou psicológica, dentre outros aspectos relacionados a sua vida privada. Alguns dos seus principais objetivos da indenização são: reparar o sofrimento causado, incentivar a prevenção de futuros danos, restabelecer a dignidade e a imagem da vítima e aliviar o impacto financeiro.

No caso dos autos, afirmou o magistrado que, como restou demonstrado, a União deixou de observar diversos documentos internacionais que destacam a necessidade de tratamento dos detentos com respeito e dignidade, independentemente do motivo da prisão, como as Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento dos Reclusos, conhecidas com as Regras de Mandela. Deve, portanto, o ente público responder civilmente, em linhas gerais, moral e materialmente.

O Colegiado decidiu, por unanimidade, negar provimento às apelações nos termos do voto do relator, mantendo a sentença que condenou a União a pagar a quantia de R$ 250.000,00 à mãe e ao filho do detento que cometeu suicídio na Superintendência da Polícia Federal.

Processo: 1010624-81.2018.4.01.3400

TJ/RO: Estado é obrigado a contratar psicólogos para unidades socioeducativas

Decisão colegiada da 2ª Câmara Especial do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, por unanimidade de votos dos seus julgadores, manteve na íntegra a sentença do Juízo da 1ª Vara Infracional e de Execução de Medidas Socioeducativas da Comarca de Porto Velho, que determina ao Estado de Rondônia contratar servidores, em número adequado, para o exercício no cargo de psicólogo junto ao Sistema Socioeducativo de Porto Velho, capital de Rondônia.

A sentença do juízo da causa determina que o “Estado de Rondônia informe, no prazo de 30 dias, a quantidade de vagas disponíveis e necessárias para o cargo de psicólogo nas Unidades Socioeducativas de Meio Fechado (Internação e Semiliberdade), na Comarca de Porto Velho-RO; convoque para nomeação, em até 60 dias, candidatos aprovados em concurso público para preenchimento das vagas, conforme o Edital n. 319/GDRH/SEARH/RO, de 15 de dezembro de 2014, e os mantenha trabalhando nas unidades de meio fechado, em Porto Velho, ou seja: Unidade de Internação, Unidade Provisória, Unidade Feminina e Unidade de Semiliberdade e diretamente no atendimento a adolescentes, vedada a atuação em área meramente administrativa ou cedidos a outros órgãos”.

Segundo o voto do relator, desembargador Miguel Monico, ao contrário do argumento de que o Poder Judiciário não pode intervir no Poder Executivo, em situações excepcionais, como no caso, o Poder Judiciário pode determinar à Administração Pública a adotar medidas que garantam os direitos constitucionais reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação do princípio da separação de poderes. Pois provas, juntadas ao processo, mostram a deficiência de psicólogos nas entidades que executam medidas socioeducativas de adolescentes em Porto Velho.

O voto explica que “o Estado tem o dever constitucional de fornecer o mínimo existencial à recuperação dos adolescentes internados, com profissionais necessários e em quantidade suficiente, em harmonia com o princípio da dignidade da pessoa humana, assegurando-lhes os direitos previstos na Constituição e ECA, com absoluta prioridade”. Dessa forma, o voto ressalta que é proibido o Poder Público, “como forma de se eximir em executar política específica voltada ao adolescente, alegar falta de disponibilidade financeira, invocando, para tanto, a lei de responsabilidade fiscal e o princípio da reserva do possível”.

Participaram do julgamento da Apelação Cível (7013140-97.2017.8.22.0001), movida pela Defensoria Pública e Ministério Público, os desembargadores Hiram Marques, Miguel Monico e Roosevelt Queiroz. A sessão de julgamento foi realizada no dia 23 de maio de 2023.


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