TJ/MG: Plano de saúde terá de cobrir cirurgia para mudança de sexo

Mulher trans entrou na Justiça para garantir o procedimento.


O juiz convocado da 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), Narciso Alvarenga Monteiro de Castro, modificou decisão do juiz da 2ª Vara Cível de Poços de Caldas, no Sul de Minas, e determinou que, no prazo de 20 dias a contar da publicação da decisão (22/7), a Sul América Companhia de Seguros e Saúde providencie procedimentos para a mudança de sexo de B.H.F., sob pena de multa diária de R$ 500 (quinhentos reais), limitada a R$ 20 mil.

B.H.F. ajuizou pedido de tutela antecipada para que a cooperativa de saúde cobrisse os procedimentos da cirurgia de mudança de sexo. O juiz de 1ª Instância postergou a decisão até que a cooperativa se manifestasse nos autos, o que fez a requerente ajuizar um agravo de instrumento no Tribunal de Justiça, questionando tal decisão.

Relator do processo, o juiz convocado Narciso Alvarenga Monteiro de Castro ponderou que todos os procedimentos requeridos para a cirurgia, como amputação total, orquiectomia, reconstrução perineal com retalhos miocutâneos, neolagina (cólon delgado, tubo de pele) e enterectomia por videolaparoscopia, fazem parte do rol de cobertura do plano de saúde.

Além disso, o magistrado levou em consideração que a mulher comprovou, por meio de laudos médicos psiquiátricos, que apenas nasceu em um corpo de homem. Todavia, ela se vê completamente com uma mulher, tanto que já trocou o nome e passou a possuir muitas características femininas no corpo. Ela também concluiu que a presença de um órgão sexual masculino lhe causa enorme desgosto, a ponto de levá-la a uma profunda depressão.

Portanto, segundo o magistrado, a recusa do plano de saúde é ilegal. “Inobstante o procedimento cirúrgico para redesignação sexual não se trate de conditio sine qua non para que a agravante seja reconhecida como uma mulher trans (pois de acordo com seu gênero ela já o é), a adequação do sexo biológico (genitálias) ao seu gênero feminino lhe assegurará o respeito aos direitos fundamentais, à saúde e à dignidade da pessoa humana, permitindo, inclusive, que deixe sofrer por estranhar o próprio corpo”, afirma o relator.

TRT/MG: Empresa deverá indenizar ex-empregada por destruir caderno com anotações pessoais após a rescisão contratual

Uma empresa de comércio e serviços ligados à tecnologia foi condenada a indenizar ex-empregada por destruir o caderno que ela utilizava para fazer anotações pessoais e profissionais, após dispensá-la. A sentença é da juíza Christianne de Oliveira Lansky, titular da 4ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte. Para a magistrada, a conduta da empresa foi ofensiva aos direitos de personalidade da trabalhadora, nos termos do artigo 5º, incisos V e X, da Constituição da República de 1988, gerando danos morais. A indenização foi fixada em R$ 5 mil.

A trabalhadora afirmou que, após ser dispensada, a empregadora pegou seu caderno/agenda pessoal contendo várias anotações particulares e relativas à sua atividade profissional, informando-lhe que “pertencia à empresa”. Contou que solicitou aos superiores que verificassem as anotações e, caso encontrassem alguma informação exclusiva da empresa, que lhe fosse dada a oportunidade de retirar a folha e jogar fora. Acrescentou que, entretanto, para sua surpresa, a ex-empregadora simplesmente destruiu o caderno, fato que a trabalhadora não aceitou, já que o caderno era “objeto pessoal que possuía meses, anos de estudo”.

A empresa contestou as alegações da ex-empregada. Reconheceu que “havia sim um caderno/agenda com anotações feitas pela trabalhadora”, mas que continha “informações de procedimentos internos da empregadora. bem como senhas bancárias, entre outros, lançados em material cedido pela empresa para o desempenho das atribuições funcionais”. Afirmou ainda que, diante da solicitação da profissional, “tomou o cuidado de retirar as páginas referentes às informações de procedimentos internos”, tendo devolvido a ela a “agenda-caderno com outras informações gerais e não confidenciais”.

Mas testemunha que, inclusive, era responsável pelo setor e que, por isso, participou do processo de rescisão contratual da ex-empregada, confirmou a narrativa da trabalhadora. Relatou que a colega lhe emprestou um caderno com anotações pessoais sobre a rotina de trabalho, “no qual havia um passo a passo sobre como usar o sistema, sobre todo o processo”. Confirmou que o caderno pertencia à ex-empregada e não à empresa, e que, inclusive, havia anotações de cunho pessoal. Contou que deixou o caderno, junto com outros itens, dentro de uma sacola, no chão da sala onde trabalhavam, para devolver à colega no dia seguinte, tendo avisado o sócio da empresa. Relatou ainda que, após receber a sacola, a ex-empregada percebeu que várias folhas haviam sido tiradas e rasgadas e, inclusive, enviou para ela fotos das folhas rasgadas. Declarou que “não havia anotações de senhas ou informações de clientes da empresa no caderno; que havia anotações sobre os processos para a realização do trabalho em si”.

Conforme pontuado na sentença, a reparação por danos morais, no âmbito do contrato de trabalho, pressupõe um ato ilícito ou erro de conduta do empregador, além do prejuízo suportado pelo trabalhador e do nexo de causalidade entre a conduta injurídica e o dano, nos termos dos incisos V e X do artigo 5º da Constituição da República e dos artigos 186 e 927 do Código Civil. Na avaliação da magistrada, o depoimento da testemunha provou a prática de conduta irregular pelo empregador, de gravidade suficiente para gerar o direito à reparação por danos morais, por ter gerado ofensa aos direitos de personalidade da trabalhadora, não sendo o caso de simples irregularidade no desfecho final da ruptura contratual.

“Registre-se que o ilícito civil independe da configuração do dolo específico, bastando a culpa do empregador em caso das relações de emprego, sendo que a empresa deve responder de forma objetiva pelos atos de seus prepostos e empregados no exercício do seu poder potestativo, nos termos do disposto no artigo 932, III, do Código Civil”, ressaltou a juíza. Não houve recurso. Já foi iniciada a fase de execução.

Processo PJe: 0010103-50.2020.5.03.0004 (ATOrd)

TRT/MG: Vale não precisa pagar indenização a tio da viúva de trabalhador vítima da tragédia de Brumadinho

Não se provou grau de afetividade diferenciado com o trabalhador falecido.


A Justiça do Trabalho de Minas Gerais absolveu a mineradora Vale de pagar indenização por danos morais ao tio da viúva de um trabalhador que morreu em decorrência do rompimento da barragem de rejeitos da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, em 25/1/2019.

A sentença é da juíza Vivianne Célia Ferreira Correa, titular da 5ª Vara do Trabalho de Betim. A magistrada registrou que não se desconsidera a desolação e a tristeza próprias à perda de parentes ou amigos, especialmente nos casos de tragédia, mas tais sentimentos não legitimam todos os atingidos à condição de vítimas de ofensa moral indenizável.

No caso, a prova produzida não provou o grau de afetividade diferenciado entre o tio da viúva e o falecido, não existindo, na conclusão da juíza, elementos suficientes para revelar proximidade diária, habitual, constante, íntima, a ponto de gerar, pelo grau de intensidade, sentimento de perda passível de compensação financeira.

O entendimento da juíza se baseou na jurisprudência majoritária, segundo a qual, em regra, têm legitimidade para pedir indenização por danos indiretos os entes integrantes do núcleo básico familiar. “Aos demais parentes, exige-se prova inequívoca de convivência diária e íntima, intensa a ponto de demonstrar que tais pessoas compartilhariam das dores daqueles que vivem o luto doméstico e duradouro”, destacou a magistrada, circunstâncias que, na sua visão, não se verificaram no caso.

Segundo ponderou a julgadora, o grau de parentesco civil é determinante para viabilizar a presunção de afetividade qualificada, para fim de dar suporte à indenização por morte. Explicou que, se a pessoa que pretende receber a indenização não integra o círculo de convivência do núcleo familiar básico do falecido, a afinidade entre ambos não é presumida.

Para a juíza, a prova oral não permitiu constatar a existência de grau de afetividade diferenciado com o falecido, para além do que normalmente é mantido entre os que se consideram e mantêm relação de cuidado mútuo. Ao prestar depoimento em juízo, o tio da viúva afirmou que se encontrava com o falecido três finais de semana no mês e duas vezes durante a semana. A única testemunha indicada, que foi ouvida como informante, declarou que via o senhor e o falecido juntos apenas aos sábados de manhã, quando jogavam bola. “Verifica-se, assim, tanto pela confissão do tio da viúva, quanto pelas declarações do informante, a ausência de convivência diária, habitual e íntima entre eles”, destacou a julgadora na sentença.

Também contribuiu desfavoravelmente à pretensão a ausência de relação de parentesco com a vítima, ainda que por afinidade, nos termos do artigo 1.595, parágrafo 1º, do Código Civil de 2002. A regra estabelece que: “Cada cônjuge ou companheiro é aliado aos parentes do outro pelo vínculo da afinidade. Parágrafo primeiro – O parentesco por afinidade limita-se aos ascendentes, aos descendentes e aos irmãos do cônjuge ou companheiro”.

Diante da inexistência de prova suficiente de danos passíveis de compensação financeira, foi julgado improcedente o pedido de indenização por danos morais. Não houve recurso. O processo já foi arquivado definitivamente.

Fotoarte: Leonardo Andrade

Processo PJe: 0010682-35.2021.5.03.0142 (ATOrd)

TRT/MG: Gari será indenizado após acidente com coleta de seringas descartadas de forma inadequada

Para a relatora, na coleta de lixo urbano, o risco de acidentes dessa natureza é acentuado e, no caso, atrai responsabilidade objetiva da empregadora.


Um coletor de lixo, em Ribeirão das Neves, ganhou na Justiça do Trabalho o direito de receber uma indenização por danos morais no valor de R$ 20 mil, após sofrer lesões durante o serviço de coleta de seringas descartadas inadequadamente. A decisão é dos desembargadores da Primeira Turma do TRT-MG.

O trabalhador informou judicialmente que foi admitido pela empregadora em 9/3/2016, na função de coletor de lixo. Contou que foi vítima de dois acidentes de trabalho, em 23/10/2017 e em 26/12/2017, com o seu afastamento das atividades por sete e cinco dias, respectivamente.

Explicou ainda que os acidentes ocorreram durante a execução dos serviços em vias públicas no município de Ribeirão das Neves, sofrendo lesões com as seringas descartadas. Afirmou também que conviveu com o receio de ter sido contaminado por vírus, como o HIV, o vírus da hepatite B e hepatite C, o que lhe causou traumas psicológicos que persistem até hoje.

Disse que recebeu orientações, na unidade de saúde, para realizar exames mensalmente, por um período de seis meses consecutivos, para averiguar as possíveis infecções. Afirmou que a empregadora não prestou assistência. Informou, por último, que, em janeiro de 2018, comunicou à empresa sobre a necessidade de realização de cirurgia para retirada de pedra nos rins, sendo dispensado antes do procedimento cirúrgico e de forma discriminatória.

Por isso, pediu indenização por danos morais. Ele alegou que não teve assistência na recuperação após os dois acidentes de trabalho e argumentou que a dispensa sofrida foi discriminatória. Já a empregadora confirmou a ocorrência dos acidentes, sustentando que não concorreu com culpa para os sinistros. Informou que sempre forneceu os EPI’s e que o acidente aconteceu em razão de um caso fortuito. Negou ainda que tenha havido discriminação na dispensa.

Ao decidir em primeiro grau, o juízo da Vara do Trabalho de Ribeirão das Neves negou os pedidos do ex-empregado. Mas ele recorreu da decisão, ratificando o pedido de indenização por danos morais. A juíza convocada Ângela Castilho Rogêdo Ribeiro, como relatora, entendeu que não se evidenciou qualquer conduta ilícita da empregadora relativa à dispensa do empregado, não restando provada a suposta conduta discriminatória.

“As lesões sofridas com material perfurocortante, felizmente, não resultaram no adoecimento do coletor, situação que poderia atrair a conduta discriminatória alegada. Sobre a necessidade de realização de procedimento cirúrgico, com o diagnóstico de pedra nos rins, também não se trata de doença que suscita estigma ou preconceito, o que não afasta eventual ato ilícito da empregadora, pela dispensa de empregado que poderia não contar com capacidade laborativa plena, o que, todavia, extrapola o limite do pedido inicial”, pontuou a julgadora.

A juíza ressaltou que o trabalhador não apresentou no processo atestado ou relatório médico que comprovasse incapacidade laborativa no momento da dispensa. Assim, à míngua de prova de danos suscetíveis de gerar ofensa à esfera moral do ex-empregado, a magistrada reconheceu que, no caso da dispensa, não há que se falar em obrigação de indenizar.

No entanto, a juíza reconheceu incontroversos os acidentes de trabalho sofridos nos dias 22/12/2017 e 21/10/2017. O relatório médico descreve que o trabalhador se acidentou com material perfurocortante, quando coletava lixo doméstico, sendo iniciada a medicação e testes rápidos. “O empregado se afastou de suas atividades laborais por cinco dias e sofreu novo acidente em outubro de 2017; ele usou medicação, porém não retornou para avaliação”, constou do documento.

Segundo a julgadora, nos termos do artigo 7º, inciso XXII, da Constituição, constitui direito dos trabalhadores a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança. “Assim sendo, o poder diretivo conferido ao empregador, a par de lhe assegurar a prerrogativa de organizar a forma de execução dos serviços, também lhe impõe o dever de zelar pela ordem dentro do ambiente de trabalho e, inclusive, cuidar da integridade física de todos os seus empregados”, ressaltou.

Para a julgadora, o acidente e o nexo de causalidade são incontroversos. Segundo ela, o trabalhador, no desempenho de suas funções, sofreu típico acidente de trabalho. “A atividade desenvolvida pela empresa era de risco para aquele tipo de acidente, o que permite a aplicação da responsabilidade objetiva. Responsabilidade que independe de culpa, pois aquele que, por meio de sua atividade, cria um risco de dano, é obrigado a repará-lo, independentemente de prova de culpa ou dolo”.

A magistrada entendeu que não há que se cogitar em culpa exclusiva da vítima ou culpa de terceiro para afastar a responsabilização da recorrida. “Isso porque não há, nos autos do processo, prova concreta e insofismável de que o sinistro aconteceu em decorrência de imperícia ou imprudência do trabalhador, ou qualquer fato que possa atribuir ao obreiro a culpa que se lhe pretende emprestar”, frisou.

Registrou ainda que a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho é no sentido de se atribuir a responsabilidade objetiva do empregador nas atividades de gari. “Em especial as atribuições relacionadas à coleta de lixo urbano em vias públicas, tendo em vista o risco acentuado de acidentes dessa natureza”, completou.

Assim, identificada a presença do dano e da responsabilidade objetiva da empresa, a juíza concluiu que é inarredável o dever de indenizar. “Não podemos olvidar a angústia sofrida pelo trabalhador em razão do risco de contaminação com uma série de patologias, como o HIV, hepatite B, hepatite C”.

Quanto ao arbitramento da indenização, a magistrada ressaltou que esse deve ser equitativo e compensar a vítima pelo sofrimento que lhe foi causado, “não admitindo que seja fixada em valor tão elevado que importe enriquecimento sem causa, ou tão ínfimo que não seja capaz de diminuir a dor do empregado”. A julgadora concluiu, conferindo parcial provimento ao apelo do trabalhador para condenar a empresa ao pagamento de indenização por danos morais de R$ 20 mil.

Houve recurso de revista, mas ele não prosseguiu, tendo em vista que não foi comprovado o pagamento das custas. O ex-empregado já recebeu os seus créditos trabalhistas. O processo foi arquivado definitivamente.

Processo PJe: 0010548-63.2018.5.03.0093 (ROT)

STJ mantém medida cautelar contra advogada acusada de concorrer para a prática de falso testemunho

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, manteve a medida cautelar que proibiu uma advogada, acusada de concorrer para a prática de falso testemunho, de manter contato com vítimas e testemunhas de um processo criminal. De acordo com a acusação, ela teria induzido testemunhas a mentir e tentado que outra mudasse seu depoimento.

A decisão negou provimento ao recurso em habeas corpus em favor da advogada, cujos clientes são suspeitos de promover migração ilegal de pessoas e de provocar a morte de um homem que se afogou durante a travessia do rio na fronteira entre o México e os Estados Unidos. Segundo a Polícia Federal, os investigados obrigaram o homem a entrar na água mesmo sabendo que ele era epilético e não sabia nadar.

O juízo aplicou à advogada algumas medidas cautelares, como monitoração eletrônica e suspensão do exercício profissional. Ao julgar o habeas corpus impetrado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) revogou as medidas, exceto a proibição de contato com vítimas e testemunhas dos fatos investigados.

Ao STJ, a defesa da advogada reiterou o pedido de trancamento da investigação, sustentando não haver indícios de autoria e materialidade. Também alegou que o crime de falso testemunho não admite a tentativa e que os parentes da vítima não devem prestar compromisso de dizer a verdade – o que indicaria a inexistência do delito.

Suposta instrução de testemunha para mentir justifica a proibição de contato
O relator do recurso, ministro Rogerio Schietti Cruz, afirmou que os relatórios da polícia e as decisões das instâncias ordinárias apontam fortes indícios da prática de atos ilícitos e da autoria, motivo pelo qual não é cabível o trancamento da persecução penal, medida excepcional só admissível diante da absoluta falta de justa causa ou da atipicidade da conduta.

O magistrado destacou que o falso testemunho (artigo 342, parágrafo 1º, do Código Penal) é crime formal, cuja consumação ocorre com a afirmação falsa, e independe do compromisso, do grau de influência no convencimento do julgador e do recebimento de vantagem ilícita.

Os indícios, reunidos no processo, de que a advogada concorreu para testemunhos falsos são suficientes para a imposição da medida cautelar de afastamento entre ela, as vítimas e as testemunhas, em razão do risco de interferência na apuração dos fatos e na produção de provas, concluiu Rogerio Schietti ao negar provimento ao recurso.

Veja o acórdão.
Pocesso: RHC 150509

TRF1 mantém suspensão de atos normativos que previam a obrigatoriedade de relatório eletrônico por instrutores de trânsito aos candidatos a obtenção de documento de habilitação

A 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) negou provimento à remessa oficial após reexaminar decisão que suspendeu os efeitos da Portaria n. 238/2014 do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) e das Portarias n. 754/2017, 397/2018 e 1475/20 do Departamento de Trânsito de Minas Gerais (Detran/MG), permitindo aos autores, instrutores de um centro de formação, continuar a exercer as atividades sem o uso do “monitoramento eletrônico” (relatório eletrônico com filmagem das aulas de direção) para os candidatos à obtenção do documento de habilitação.

O Denatran havia editado a Portaria n. 238/2014 regulamentando o sistema eletrônico de anotação, transmissão e recepção dos relatórios de avaliação elaborados pelos instrutores, no que tange às aulas de prática de direção veicular para aprendizagem e habilitação de condutores de veículos automotores. Já o Detran/MG teria expedido normativo estabelecendo procedimentos para a operacionalização e o credenciamento de pessoas jurídicas para atuarem no referido sistema de monitoramento, bem como concedendo aos Centros de Formação de Condutores um prazo para contratação de uma das empresas credenciadas com esse objetivo.

Para os autores da ação anulatória levada à Justiça Federal, as Portarias impugnadas extrapolariam o poder regulamentar, criando exigência que o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) não prevê, podendo ocasionar um “aumento no custo da obtenção de CNH, inviabilizando o exercício das atividades prestadas pelas demandantes”, acrescentando ainda que “a medida implica em fiscalização dos exames práticos de direção, o que deve ser custeado pelo poder público”.

A Remessa Oficial, instituto do Código de Processo Civil (art. 496), também conhecido como reexame necessário ou duplo grau obrigatório, exige que o juiz encaminhe o processo ao tribunal de segunda instância, havendo ou não apelação das partes, sempre que a sentença for contrária a algum ente público.

O relator, desembargador federal Daniel Paes Ribeiro, ressaltou que o TRF1, em diversas oportunidades, tem manifestado o entendimento de que “não há na legislação de regência previsão no que diz respeito à obrigatoriedade da implementação de sistema de monitoramento eletrônico, sendo, portanto, inadmissível que instrumento infralegal venha instituir a obrigação sem a correspondente previsão legal”. Também por esse motivo, entendeu não ser necessário nenhum reparo na sentença submetida ao duplo grau de jurisdição obrigatório.

A decisão foi unânime.

Resolução CONTRAN n. 493/2014, dentre outras disposições, previu:

(…)

1.4.5 Ao final de cada aula ou conjunto de aulas de prática de direção veicular, incumbirá ao instrutor de trânsito elaborar relatório detalhando o comportamento do candidato, o conhecimento das normas de conduta e circulação estabelecidas pelo Código de Trânsito Brasileiro e as faltas cometidas durante o processo de aprendizagem;

Portaria nº 238/2014 Denatran:

Art. 3º O instrutor de prática de direção veicular deverá elaborar, durante cada aula ou conjunto de aulas de prática de direção veicular, relatório eletrônico de avaliação do candidato, o qual servirá para fins de acompanhamento e evolução do processo de aprendizagem.

Processo 1037112-66.2020.4.01.3800.

TRF1: Configura-se delegação da competência federal quando a distância entre os municípios for superior a 70 km

A 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) decidiu que é competente o Juízo de Direito da Comarca de Arcos/MG para julgar uma ação proposta por uma mulher para pedir o pagamento de benefício previdenciário.

No caso, o Juízo Estadual declinou da competência a ação sob a alegação de que a Lei 13.876/2019 (sobre a organização da Justiça Federal), que modificou a Lei 5.010/1966 estabeleceu a competência absoluta da Justiça Federal para julgar causas previdenciárias quando a Comarca de domicílio do segurado estiver localizada a menos de 70 km da sede de Vara Federal.

A autora da ação recorreu contra a decisão do Juízo que declinou sua competência para que a ação continuasse tramitando na Comarca de Arcos.

Ao analisar o pedido, o relator, desembargador federal Gustavo Soares Amorim, afirmou que “configura-se a hipótese de delegação da competência federal quando é superior a 70 km a distância entre os centros urbanos dos municípios de localização dos juízos estadual e federal, conforme estabelecido no art. 15, inciso III, da Lei 5.010/1966 (com redação conferida pelo art. 3º da Lei 13.876/2019), Portaria TRF1-Presi 9507568/2019 e Portaria Presi 411/2021”.

Segundo o magistrado, o TRF1, “tornou pública a lista das comarcas estaduais com competência federal delegada para processamento e julgamento das causas em que forem partes instituição de previdência social e segurado relativamente a benefícios de natureza pecuniária, na qual é possível verificar que a Comarca de Arcos/MG está abrangida pelo Município de Divinópolis (distante mais de 70 km), sendo competente para processamento e julgamento da causa, em decorrência, o Juízo da Comarca de Arcos/MG”.

Além disso, o relator informou em seu voto que o Conselho da Justiça Federal (CJF) editou a Resolução 603/2019 a qual estabeleceu em seu artigo primeiro que para definição das comarcas dotadas de competência delegada federal deverá ser considerada a distância entre o centro urbano do município sede da Comarca estadual e o centro urbano do município sede da Vara Federal mais próxima, “em nada interferindo o domicílio do autor”.

A 1ª Turma do TRF1, por unanimidade, deu provimento ao agravo de instrumento, nos termos do voto do relator.

Processo 1027859-08.2020.4.01.0000

TJ/MG: Consumidora deverá ser indenizada por acidente com esteira

Cliente sofreu corte no rosto ao tentar montar equipamento.


A 13ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) modificou decisão da comarca de Juiz de Fora e condenou a Universal Fitness da Amazônia Ltda. a indenizar uma consumidora em R$ 389,61, por danos materiais, e em R$ 30 mil, por danos morais, devido a um acidente ocorrido quando a mulher tentava montar, por conta própria, uma esteira elétrica que havia adquirido da empresa.

A cliente alegou que, quando começou a articular as peças, o pé de inclinação atingiu o rosto dela e causou-lhe um profundo corte, sendo necessário buscar atendimento médico. O ferimento também deixou uma cicatriz permanente.

Ela acrescentou que, ao comprar o produto, a vendedora não lhe apresentou as informações básicas e necessárias à segurança do usuário, tendo afirmado que o produto não requeria um montador. Segundo a autora da ação, o manual recebido não sinalizou de forma alguma haver perigo na montagem do produto, situação que terminou por acarretar o acidente.

Em contrapartida, a empresa se defendeu sob o argumento de que não tem qualquer responsabilidade pelo ocorrido, pois o manual de instruções é claro e o fator que determinou o episódio em que a consumidora se feriu foi a imprudência dela.

A alegação da empresa foi acolhida pela 5ª Vara Cível da comarca de Juiz de Fora, que considerou que o manual de instruções esclarece que o produto deve permanecer na posição horizontal e o lacre somente dever ser removido após o término da montagem. Segundo a sentença, o incidente se deu por culpa da própria autora, que deixou de observar as recomendações.

A consumidora recorreu e o relator, desembargador Luiz Carlos Gomes da Mata, modificou o entendimento de 1ª Instância. Segundo o magistrado, faz-se necessário, no manual, estarem presentes todas as informações sobre o produto, inclusive aquelas informando eventuais riscos na montagem.

“Analisando o manual que acompanhou o produto adquirido, não vejo qualquer informação acerca do risco de perigo na montagem, em especial sobre a peça que veio a atingir a autora, não havendo dúvida de que o manual e o fabricante infringiram os ordenamentos normativos, pois não apontam ostensivamente o perigo de nocividade e periculosidade do equipamento na sua montagem”, afirmou.

Para o relator, ficou evidenciado que o equipamento oferece grave perigo físico, pois a usuária poderia ter sido atingida diretamente nos olhos, com potencial risco de perda da visão. “Havendo perigo de montagem, o ideal era que a parte apelada informasse o consumidor sobre a possibilidade de contratação de um montador profissional, ante a existência de risco de acidente na montagem”, diz.

O juiz convocado Roberto Apolinário de Castro e os desembargadores Ferrara Marcolino e Rogério Medeiros votaram de acordo com o relator. Já o desembargador José de Carvalho Barbosa ficou vencido em relação ao valor da indenização por danos morais, porque entendeu que a quantia de R$ 20 mil seria mais razoável.

Veja o acórdão.
Apelação Cível 1.0000.22.032227-5/001

TRT/MG: Hospital é condenado a pagar R$ 150 mil por danos morais de em razão da morte de ex-empregada por covid-19

Hoje, 27 de julho, é o Dia Nacional da Prevenção de Acidentes de Trabalho, um marco histórico na luta dos trabalhadores por melhorias nas condições de segurança e saúde do trabalho. A data de hoje se tornou oficial em 1972 e, há 50 anos, marca o início da implementação do Serviço Obrigatório de Segurança e Medicina do Trabalho em empresas com mais de 100 empregados. Na época, o Brasil registrava quase dois milhões de acidentes de trabalho por ano.

Atualmente, de acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), a cada 15 segundos, morre uma pessoa por acidente de trabalho no mundo. Isso significa que mais de 6,3 mil mortes por acidente de trabalho são registradas por dia no planeta, o que corresponde a 2,3 milhões de óbitos por ano. No Brasil, em 2021, foram comunicados 571,8 mil acidentes e 2.487 óbitos associados ao trabalho. O número representa um aumento de 30% em relação ao ano anterior, segundo o Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho/Smartlab. Para reverter esse quadro, é importante que empregadores e trabalhadores estejam comprometidos com a promoção de um ambiente de trabalho seguro e saudável. Garantir a segurança e a saúde no trabalho é um dever de todos.

Além de englobar a prevenção do acidente de trabalho, esta data também abrange a prevenção em relação às doenças ocupacionais. De acordo com magistrados que atuam na Justiça do Trabalho mineira, a Covid-19 pode ser considerada uma doença ocupacional, caso ela seja adquirida em razão do exercício do trabalho, principalmente se for demonstrado que o empregador não tomou as medidas preventivas adequadas.

O TRT-MG traz hoje uma matéria especial que aborda aspectos da doença ocupacional no contexto da pandemia. Na sentença, a juíza reconheceu a Covid-19 como a doença ocupacional que provocou a morte da auxiliar de enfermagem. Apesar de ter comorbidades, ela não foi afastada do serviço pela empregadora. Acompanhe!

Uma instituição de saúde foi condenada a pagar indenização por danos morais de R$ 150 mil à filha de uma auxiliar de enfermagem pela morte da mãe por Covid-19. A decisão é da juíza Alessandra Junqueira Franco, titular da Vara do Trabalho de Alfenas-MG.

A auxiliar de enfermagem trabalhava desde 1988 no hospital de propriedade da empregadora e faleceu em 2020, após o agravamento da Covid-19. Segundo apurou a magistrada, embora a trabalhadora pertencesse ao grupo de risco, a empresa não providenciou afastamento da profissional em momento crítico da pandemia (2020).

Na análise da juíza, houve possibilidade concreta de que a doença que vitimou a empregadora tenha sido adquirida no ambiente de trabalho, justamente pela exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho desenvolvido, nos termos previstos no artigo 20, item II, parágrafo primeiro, alínea “d”, da Lei 8.213/1991, aplicado ao caso, por analogia. Também foi considerado que a contaminação resultou das condições especiais em que o trabalho era executado e com ele se relacionava diretamente, de forma a configurar doença do trabalho, nos termos do artigo 20, item II, parágrafo segundo, da Lei 8.213/1991.

Houve o reconhecimento da responsabilidade da empregadora pelos prejuízos morais causados à filha da profissional, com a condenação da empresa à indenização pretendida.

“Não há como negar que o dano à filha da empregada falecida é evidente, à medida que o adoecimento da empregada, por Covid, acabou por conduzi-la à morte. As consequências danosas sob a ótica do relacionamento pessoal, familiar e social são óbvias, notadamente nos casos de contaminação pela Covid-19, atingindo diretamente o íntimo da filha e afrontando o patrimônio imaterial, cuja dor somente a pessoa envolvida sabe quantificar”, destacou a juíza na sentença.

A decisão se baseou no inciso X do artigo 5º da Constituição Federal de 1988 e nos artigos 186 e 927 do Código civil, que protegem a integridade moral da pessoa e asseguram a reparação no caso de violação dos direitos de personalidade.

O valor da indenização foi fixado levando em conta a vida profissional e econômica da auxiliar de enfermagem, em contrapartida às condições financeiras da empregadora, assim como a extensão do abalo psíquico sofrido pela vítima. Constou da decisão que o valor da indenização deve ter como norte a reparação do sofrimento e, ainda, o objetivo de coibir a reiteração da prática pela empregadora, atuando, nesse último caso, como medida corretiva.

Para a magistrada, a conformidade e adaptação de valores com o previsto no artigo 223-G, parágrafo primeiro, inciso III, da CLT, o qual dispõe sobre a tarifação dos danos morais, não deve ser admitida, no caso, porque afronta o dispositivo constitucional, de forma que a única interpretação possível é a de que a regra celetista estabeleceu apenas parâmetros de arbitramento, sem qualquer vinculação.

Entenda o caso
A autora pretendeu o reconhecimento do nexo de causalidade entre a doença que causou a morte da mãe (Covid-19) e o trabalho exercido. Afirmou que a empregadora teve responsabilidade no ocorrido, porque não afastou a trabalhadora do serviço, embora ela pertencesse ao grupo de risco. A empresa, por sua vez, negou que a auxiliar de enfermagem tenha adquirido Covid-19 no ambiente de trabalho, alegando que o contágio poderia ter ocorrido em qualquer outro local.

Covid-19 X Doença ocupacional
Sobre a possibilidade da Covid-19 ser considerada doença ocupacional, a magistrada ressaltou que a legislação não menciona hipótese específica da pandemia. Contudo, entendeu que deve ser aplicado ao caso, por analogia, o artigo 20, item II, parágrafo primeiro, alínea “d”, da Lei 8.213/1991, que considera doença do trabalho a “doença endêmica adquirida por segurado habitante da região em que ela se desenvolva”, desde que “resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho”.

Conforme constou da sentença, o artigo 29 da Medida Provisória 927 estabelecia que: “Os casos de contaminação pelo coronavírus (Covid-19) não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal”. Entretanto, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da medida cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 6.342, suspendeu a eficácia do dispositivo.

Como pontuou a julgadora, é fato que a pandemia desencadeada pela Covid-19 não possui limitações territoriais e envolve agente patogênico de fácil transmissão, com milhares de vidas ameaçadas, tanto em razão da gravidade como da propagação do vírus. “Trata-se de um quadro alarmante mundial, e não há, como regra, uma relação direta com as condições do meio laboral, sendo vários os locais de possível contágio”, destacou. Nesse contexto, na avaliação da magistrada, apesar do posicionamento adotado pelo STF de suspender a eficácia do artigo 29 da MP 927, não há como simplesmente presumir que o empregado tenha adquirido Covid no ambiente de trabalho.

De acordo com a juíza, não se pode esquecer de que, por outro lado, a responsabilidade de indenizar surge da configuração de alguns pressupostos, entre eles: o nexo de causalidade entre a conduta do ofensor e o dano, os prejuízos suportados pela vítima, a culpa quanto ao dano causado, nos termos do artigo 186, do Código Civil, e artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição Federal. Segundo ponderou a magistrada, em casos como esse, que envolvem o adoecimento por Covid-19, tendo em vista as particularidades apontadas, não há como se estabelecer o nexo de causalidade, com base nos mesmos critérios adotados para as demais doenças originárias do trabalho.

Possibilidade concreta de que a contaminação tenha ocorrido no ambiente de trabalho
Não houve dúvidas de que a profissional adquiriu Covid-19 durante a vigência do contrato de trabalho e de que a doença foi a causa da morte, como, inclusive, registrado no atestado de óbito. Nesse quadro, para averiguação do nexo de causalidade entre a doença e o trabalho, assim como da responsabilidade do empregador, a juíza considerou as seguintes questões: 1) Se houve prova de que a contaminação foi “resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho”, para efeito de aplicação, por analogia, do artigo 20, inciso II, parágrafo primeiro, alínea “d”, da Lei 8.213/1991. 2) Se a empresa cumpriu procedimentos de prevenção e precaução em relação aos riscos de contaminação pelo coronavírus no ambiente de trabalho. 3) E, por fim, se a contaminação resultou das condições especiais em que o trabalho é executado e com ele se relaciona diretamente, de forma a configurar doença do trabalho, nos termos do artigo 20, inciso II, parágrafo segundo, da Lei 8.213/1991.

Nesse ponto, a julgadora chamou a atenção para o fato de que a profissional desempenhou a função de auxiliar de enfermagem, em hospital de grande movimentação de pacientes, o que, inclusive, foi reconhecido pelo representante da empregadora em depoimento. Na visão da juíza, ainda que o hospital não fizesse atendimento direto de pacientes com Covid-19, os quais eram encaminhados para a Santa Casa local, não há como afastar a presunção de que inúmeros pacientes contaminados passaram por aquela localidade. Sobretudo em 2020, ano do falecimento da trabalhadora, quando teve início a pandemia no Brasil, a doença ainda era desconhecida e o país vivia um momento de caos. Conforme salientou a juíza, é fácil presumir o temor entre os trabalhadores do hospital, na época, no que diz respeito ao contágio, fato inclusive relatado por testemunha.

Além disso, em depoimento, o representante da empregadora confessou que, naquela ocasião, 40 trabalhadores do hospital testaram positivo para Covid-19 e apenas a auxiliar de enfermagem veio a falecer. A prova oral ainda demonstrou que, embora a trabalhadora não realizasse triagem dos pacientes e não atuasse no pronto-socorro, ela estava inserida em ambiente hospitalar, em contato direto com os colegas de trabalho e com os pacientes atendidos naquela unidade.

Tendo em vista as circunstâncias apuradas, a magistrada entendeu haver possibilidade concreta de que a doença que vitimou a ex-empregada tenha sido adquirida no ambiente de trabalho, justamente pelo contato direto determinado pela natureza do trabalho que ela desenvolvia. Concluiu ser cabível a aplicação, no caso, por analogia, do artigo 20, parágrafo primeiro, alínea “d”, da Lei 8.213/1991.

Ônus da prova e culpa da empregadora
No entender da juíza, tendo em vista as circunstâncias especiais do caso, cabia à empregadora comprovar que a auxiliar de enfermagem adquiriu Covid-19 em outra localidade, de forma a transferir à empregada a responsabilidade pelo evento danoso que tirou sua vida. Entretanto, isso não se verificou.

Apesar de uma testemunha ter mencionado a existência de um segundo ofício exercido pela trabalhadora, como cuidadora de um paciente particular, na visão da magistrada, o fato não foi esclarecido a ponto de gerar a possibilidade de que o contágio tenha ocorrido em razão dessa circunstância. A testemunha relatou que a falecida cuidava de um paciente particular, entretanto, não foi estabelecida a frequência dessa prestação de serviços e, na conclusão da juíza, não se comprovou qualquer situação que pudesse legitimar o contágio por essa via, como o fato desse paciente ou algum de seus familiares terem sido contaminados na época.

Relatórios emitidos pela companhia telefônica e apresentados ao processo não evidenciaram, para a juíza, que a técnica de enfermagem esteve transitando por vários locais, em Alfenas, durante o período analisado. Ao contrário, segundo a magistrada, os dados contidos na documentação denotaram uma estabilidade em sua locomoção, na época, com grande predominância em locais determinados, em torre próxima à sua residência. Contribuiu para o entendimento adotado a comprovação de que a auxiliar de enfermagem residia apenas com a filha.

Segundo observou a julgadora, fichas de entregas de equipamentos de proteção individual – EPI´s – e prova oral revelaram que o hospital, de fato, cumpriu a obrigação de entregar os equipamentos de segurança para o enfrentamento da pandemia na ocasião. Mas, na conclusão da juíza, a empresa não foi diligente ao deixar de providenciar o afastamento da empregada das atividades, tendo em vista o evidente quadro de comorbidades. “No particular, ainda que a filha tenha afirmado que a mãe chegou a pedir o afastamento do trabalho (o que não ficou provado, aliás), há de ser ressaltado que esta não era a responsabilidade da empregada, mas, sim, do empregador, que deveria ter conhecimento do estado de saúde de seus trabalhadores e zelar pela proteção deles, principalmente em razão da evidente situação de risco vivenciada no ano de 2020, e, mais ainda, por se tratar de um hospital, local onde a probabilidade de contágio era alta”, destacou na sentença.

Empregada inserida no grupo de risco e não afastada no trabalho
As provas demonstraram que a profissional sofria de obesidade e de diabetes. Ocorrências registradas ainda revelaram quadros de hipotireoidismo, anemia e hipertensão. Os problemas de saúde da auxiliar de enfermagem foram comprovados por relatórios médicos, por relatório da vigilância epidemiológica e pelo atestado de óbito, o qual registrou a morte por insuficiência respiratória aguda, Covid-19, com o quadro de obesidade mórbida (grau III) e diabetes mellitus (tipo II). A prova oral, por sua vez, confirmou que a fragilidade da saúde da empregada era de conhecimento do hospital.

Para a juíza, ficou evidente que a auxiliar de enfermagem era do grupo de risco. Apesar disso, ao contrário de outros empregados do hospital, ela não foi afastada do serviço, fato comprovado por documento apresentado pela própria empregadora e confirmado por testemunha.

Responsabilidade da empregadora
Ao concluir pela responsabilidade da empregadora pela indenização pretendida na ação, a juíza considerou o frágil quadro de saúde da trabalhadora, o enquadramento no grupo de risco e o desempenho de atividades que, por sua própria natureza, a expunham ao contágio, em ambiente hospitalar, somados à falta de precaução mínima da empregadora, que não providenciou o afastamento do trabalho em momento crítico da pandemia, no ano de 2020.

“Não há como olvidar que a culpa da empresa ocorre, no caso, pelo fato de que ao empregador compete zelar pela integridade física de seus empregados, de maneira a não gerar reflexos danosos a sua saúde (artigo 157 da CLT)”, destacou a magistrada. Na avaliação da juíza, houve violação à integridade moral da trabalhadora, a qual encontra proteção constitucional, nos moldes do artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal, e nos termos preconizados pelos artigos 186 e 927 do Código Civil, sendo devida a reparação pelos danos morais sofridos.

Conforme constou da sentença, danos morais são “lesões sofridas pelo sujeito físico ou pessoa natural de direito em seu patrimônio ideal, entendendo-se por patrimônio ideal, em contraposição ao patrimônio material, o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico, tendo como elemento característico a dor, tomado o termo em seu sentido amplo, abrangendo tanto os sofrimentos meramente físicos quanto os morais, propriamente”. A empregadora apresentou recurso, que se encontra em trâmite no TRT-MG.

Processo PJe: 0010272-90.2021.5.03.0169 (ROT)

TJ/MG autoriza homem a trocar prenome do pai e adotar sobrenome do avô

Mudança na legislação permite que maior de 18 altere o prenome, uma vez, sem apresentar justificativa.


A 21ª Câmara Cível Especializada do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) modificou decisão da juíza da Comarca de Araguari e autorizou o recorrente M.R.A.M. a alterar o prenome que constava em seu registro civil, o mesmo do pai, e a adotar o sobrenome do avô materno. Um dos motivos alegados por M. foi a falta de vínculo afetivo com o pai.

Segundo M., o prenome com o qual foi registrado é o mesmo do pai biológico que o abandonou e, por isso, causava-lhe desgosto. Além disso, ele argumentou que o avô materno sempre foi presente e se transformou em uma pessoa muito importante para sua formação. A juíza de 1ª Instância autorizou a inclusão do sobrenome do avô, mas negou o direito de modificar o prenome.

M. recorreu ao tribunal e o relator, desembargador José Eustáquio Lucas Pereira, fundamentou o provimento ao recurso de apelação na Lei 14.382, de 27 de junho de 2022, que modificou a Lei de registros Públicos (LRP).

A nova lei autoriza a modificação do prenome de forma imotivada e, até mesmo, de forma extrajudicial.

“Ainda que não se verifique a existência de razão justificável para alterar o nome, a alteração dos dispositivos da lei supracitados oportunizou a mudança do nome imotivadamente, sendo possível, inclusive, a realização do ato extrajudicialmente”, afirmou o desembargador José Eustáquio Lucas Pereira, no acórdão. Portanto, como M. não se sente bem com o prenome que remete ao pai biológico, tem o direito de alterá-lo.

Os desembargadores Alexandre Victor de Moraes e Marcelo Rodrigues votaram de acordo com o relator.

Veja o acórdão.
Processo nº 1.0000.22.099429-7/001


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