STJ definirá em repetitivo, critérios para busca domiciliar sem mandado nem consentimento do morador

A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) vai definir, sob o rito dos recursos repetitivos, os critérios para a configuração de justa causa apta a validar o ingresso de policiais em domicílio sem prévia autorização judicial e sem consentimento do morador.

O relator do recurso especial selecionado como representativo da controvérsia – REsp 1.990.972 – é o ministro Rogerio Schietti Cruz.

A questão submetida a julgamento foi cadastrada no sistema de recursos repetitivos do STJ como Tema 1.163, com a seguinte redação: “Saber se a simples fuga do réu para dentro da residência ao avistar os agentes estatais e/ou a mera existência de denúncia anônima acerca da possível prática de delito no interior do domicílio, desacompanhada de outros elementos preliminares indicativos de crime, constituem ou não, por si sós, fundadas razões (justa causa) a autorizar o ingresso dos policiais em seu domicílio, sem prévia autorização judicial e sem o consentimento válido do morador”.

Multiplicidade de processos justifica afetação
Segundo Schietti, a multiplicidade de casos semelhantes que chegam ao STJ justifica a necessidade de estabelecer um precedente qualificado sobre a presença ou não de justa causa (fundadas razões) para o ingresso dos agentes estatais no domicílio sem prévia ordem judicial e sem comprovação de consentimento válido do morador.

Leia também: Asilo inviolável, mas nem sempre: o STJ e o ingresso policial em domicílio
“Diante da multiplicidade de casos semelhantes que são amiúde retratados pela mesma discussão suscitada neste recurso especial, julgados frequentemente por ambas as turmas que compõem a Terceira Seção desta corte, e da relevância jurídica da matéria, apresento este recurso especial, para apreciação desta Terceira Seção, a fim de que o seu julgamento seja submetido ao rito dos recursos repetitivos”, afirmou o ministro.

O magistrado determinou que sejam oficiados os Tribunais Regionais Federais e os Tribunais de Justiça para que tomem ciência da afetação e destacou que não está sendo aplicado o disposto na parte final do parágrafo 1º do artigo 1.036 do Código de Processo Civil, que trata da suspensão do trâmite dos processos pendentes, “haja vista que a questão será julgada com brevidade”.

O relator também mandou oficiar a Defensoria Pública da União para figurar no processo na condição de amicus curiae.

Recursos repetitivos geram economia de tempo e segurança jurídica
O Código de Processo Civil regula, no artigo 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como saber a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 1990972

STJ: Acórdão que confirma sentença condenatória também interrompe prescrição

Sob o rito dos recursos especiais repetitivos (Tema 1.100), a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu a tese de que o acórdão que confirma a sentença condenatória – seja mantendo, reduzindo ou aumentando a pena anteriormente imposta – tem o efeito de interromper a prescrição.

O julgamento confirmou a interpretação que o STJ vinha dando ao inciso IV do artigo 117 do Código Penal, e agora o precedente qualificado deverá orientar os tribunais de todo o país na solução de casos idênticos.

Nos termos do artigo 117, inciso IV, do CP – com redação dada pela Lei 11.596/2007 –, o curso da prescrição é interrompido, entre outros fatos, pela publicação da sentença ou do acórdão condenatórios recorríveis. Um dos recursos julgados como repetitivos – o REsp 1.930.130 – questionava decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais que considerou que o acórdão confirmatório de decisão condenatória não interromperia a prescrição, mas apenas o acórdão que reforma decisão absolutória ou que agrava a situação do réu.

Evolução jurisprudencial do STJ e do STF
Os recursos repetitivos tiveram a relatoria do ministro João Otávio de Noronha. Em seu voto, ele explicou que, anteriormente, o STJ possuía o entendimento de que o acórdão confirmatório da condenação, de fato, não era novo marco interruptivo da prescrição. Segundo a posição anterior do tribunal, o efeito interruptivo acontecia apenas quando o acórdão condenava o réu absolvido em primeiro grau.

Com o tempo, apontou o ministro, o STJ, em consonância com o Supremo Tribunal Federal (STF), adotou o entendimento de que, após a publicação da sentença condenatória, o acórdão confirmatório da condenação é outro marco interruptivo da prescrição, ainda que ele apenas mantenha a decisão de primeiro grau.

Contudo, em respeito ao princípio da irretroatividade da lei penal, o relator ponderou que o entendimento atual do STJ só é aplicável aos crimes cometidos após as alterações trazidas pela Lei 11.596/2007, ou seja, se o delito for anterior à vigência da lei, aplica-se a jurisprudência anterior, segundo a qual a prescrição não é interrompida pelo acórdão que meramente confirma a sentença condenatória.

Relator analisou a questão a partir de diferentes métodos interpretativos
Para analisar a controvérsia e fixar a tese repetitiva, o ministro Noronha aplicou ao tema os métodos gramatical, interpretativo histórico, interpretativo sistemático e finalístico.

Sob a perspectiva interpretativa gramatical, o relator afirmou que, no texto do artigo 117, inciso IV, do CP (“pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis”), a referência a acórdão condenatório abarca também a decisão que confirma a condenação de primeiro grau.

“Ora, se fosse intenção do legislador que tal acórdão condenatório substituísse sentença absolutória, ele se teria utilizado de outros termos, por exemplo, ‘sentença condenatória ou acórdão condenatório após sentença absolutória'”, completou.

Segundo Noronha, se o dispositivo legal não distingue acórdão condenatório de acórdão confirmatório de sentença condenatória, é apropriado definir acórdão condenatório como a decisão que tem a capacidade de ser marco interruptivo do prazo prescricional.

“Portanto, na perspectiva do contexto gramatical, não são necessários contorcionismos interpretativos para se concluir que referida expressão indica um comando condenatório emanado do Poder Judiciário, não havendo, nessa modalidade interpretativa, nenhuma inidoneidade”, afirmou.

Projeto da Lei 11.596/2007 foi claro ao buscar estabelecer novo marco para a prescrição
Sob o método interpretativo histórico, Noronha apontou que a justificativa do projeto que levou à edição da Lei 11.596/2007 foi clara quanto ao propósito de criar um novo marco interruptivo da prescrição. A intenção, disse, foi eliminar o risco de prescrição intercorrente ou superveniente causado por recursos meramente protelatórios.

Segundo o prisma da interpretação sistemática, o relator enfatizou que, no ordenamento jurídico brasileiro, o acórdão tem o efeito de substituir a sentença, adquirindo carga condenatória mesmo quando confirma a sentença no mesmo sentido, de forma a legitimar o dispositivo legal que possibilita a interrupção do prazo prescricional.

Por fim, de acordo com o método finalístico, Noronha sublinhou que é necessário garantir ao Estado tempo razoável para o exercício do poder-dever de punir aqueles que descumprem a lei penal.

“Considerados todos os fatos, o que se infere é que, com a criação de novo marco interruptivo da prescrição, buscou-se equilibrar o interesse e as garantias individuais do acusado e assegurar o interesse da sociedade, evitando-se a impunidade e a falta de credibilidade dos serviços judiciais”, concluiu o ministro.

Veja o acórdão.
Processos: REsp 1930130 e REsp 1920091

TRT/MG: Companhia aérea Azul indenizará empregado obrigado a compensar pausas de idas ao banheiro

A Justiça do Trabalho determinou que uma companhia aérea pague uma indenização por danos morais de R$ 4 mil ao ex-empregado obrigado a compensar, após o horário de trabalho, o tempo das idas diárias ao banheiro. Testemunha, que exercia também na empresa a função de atendente de call center, contou que não era estipulado um número de pausas por dia para o banheiro, mas que era frequente compensar os períodos utilizados.

A empregadora alegou que jamais constrangeu o ex-empregado e que o depoimento da testemunha nada provou. Mas, ao decidir o caso, o juízo da 28ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte reconheceu a ilicitude praticada pela empregadora e determinou o pagamento de uma indenização de R$ 2 mil.

A empresa interpôs recurso, negando a versão do trabalhador. Na eventualidade, pediu pela redução do valor arbitrado, que considerou excessivo. Já o trabalhador recorreu pretendendo a majoração da indenização. Os recursos foram julgados pelos magistrados da Primeira Turma do TRT-MG, que deram razão ao ex-empregado.

A única testemunha ouvida confirmou que, após o horário de trabalho, o período de pausa do banheiro deveria ser compensado. Pelo depoimento, não era estipulado o número de idas diárias, mas, muitas vezes, não podiam tirar a pausa do banheiro, pois prejudicava a avaliação.

Explicou ainda que o atendente era obrigado a cumprir metas. Segundo a testemunha, quando não atingia o estipulado, os “feedbacks” ficavam expostos, com a classificação das letras A, B ou C. “Na maioria das vezes, eram avaliados no C, com cobranças feitas aos gritos a toda a equipe”, disse.

Ofensa à dignidade do empregado
Para o desembargador relator, Emerson José Alves Lage, as provas apresentadas apontaram o exercício abusivo do poder diretivo patronal, por meio dos prepostos. “A testemunha demonstrou o efetivo controle das idas ao banheiro. Ela esclareceu que os empregados tinham dificuldade em utilizar as pausas, sob pena de prejudicar a avaliação, além de ter que compensar após o horário de trabalho”.

Na visão do magistrado, o comportamento da empresa implicou a degradação do ambiente de trabalho, caracterizando conduta ilícita passível de reparação. Segundo o desembargador, essa conduta injurídica vem sendo conceituada, no âmbito do contrato de trabalho, como a manipulação perversa e insidiosa que atenta sistematicamente contra a dignidade ou a integridade psíquica, ou física do trabalhador.

“O objetivo é a exposição dos empregados a situações incômodas e humilhantes caracterizadas pela repetição de um comportamento hostil de um superior hierárquico ou colega, ameaçando o emprego da vítima ou degradando o ambiente de trabalho”, destacou.

Para o julgador, o empregador tem o poder de comando, mas não pode exercê-lo, por si mesmo ou por seus prepostos (que pelos seus atos responde), com excesso. “O ato ilícito demonstrado neste caso deve sofrer justa reparação, segundo os termos dos artigos 927 e 932, inciso III, ambos do Código Civil”.

Na decisão, o relator ressaltou que as necessidades fisiológicas de qualquer pessoa não podem ficar à mercê das peculiaridades ou características da atividade econômica do empregador. “Reveste-se, tal visão, em manifesta inversão de valores. Prioriza-se esta, em detrimento dos atributos e necessidades íntimas do ser humano, ferindo, assim, toda a axiologia do estado social de direito, instituída, no Brasil, a partir da Constituição da República de 1988”.

Para o magistrado, o nexo de causalidade entre as condutas antijurídicas da empresa e o dano sofrido pelo empregado, decorrente do contrato de trabalho, manifesta-se sem qualquer dúvida. “Havendo ofensa à dignidade do empregado, mantendo esta ofensa relação direta com o contrato de trabalho, decorre daí a presença do dano moral, que, presente, deve ser recomposto”.

Os julgadores negaram provimento ao apelo da empresa e deram parcial provimento ao pedido do trabalhador para majorar o valor da indenização por danos morais para R$ 4 mil. Na decisão, foi considerada a condição econômica das partes, o grau de culpa da empresa, a extensão da lesão, o ato abusivo praticado e os demais elementos da responsabilidade civil. O processo aguarda decisão de admissibilidade do recurso de revista.

Processo PJe: 0010459-27.2020.5.03.0107 (ROT)

STJ decidirá em repetitivo se novo requisito para a liberdade condicional limita valoração do bom comportamento

A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu afetar dois recursos especiais – o REsp 1.970.217 e outro que tramita em segredo de Justiça –, ambos de relatoria do ministro Ribeiro Dantas, para julgamento sob o rito dos repetitivos.

A questão submetida a julgamento, cadastrada como Tema 1.161 na base de dados do STJ, está ementada da seguinte forma: “Definir se o requisito objetivo do livramento condicional consistente em não ter cometido falta grave nos últimos 12 meses (artigo 83, III, ‘b’, do Código Penal, inserido pela Lei Anticrime) limita temporalmente a valoração do requisito subjetivo (bom comportamento durante a execução da pena, alínea ‘a’ do referido inciso)”.

O colegiado decidiu não suspender o trâmite dos processos que discutem o mesmo assunto.

Caráter multitudinário da controvérsia
Ao propor a afetação do REsp 1.970.217, o relator destacou que, em consulta à jurisprudência do STJ, a Comissão Gestora de Precedentes e de Ações Coletivas (Cogepac) recuperou 42 acórdãos e 1.398 decisões monocráticas proferidas por ministros da Quinta Turma e da Sexta Turma com o mesmo tema, o que indica seu caráter multitudinário.

“De fato, a multiplicidade de recursos e a relevância da matéria recomendam a submissão do feito à apreciação da Terceira Seção”, afirmou o ministro.

O recurso foi interposto pelo Ministério Público contra decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que concedeu livramento condicional a réu acusado de tráfico de drogas, o qual havia cometido falta grave durante o cumprimento da pena.

Segundo a defesa, já haviam passado dois anos do cometimento da falta, e o réu não poderia ser perpetuamente penalizado pelo fato. O MP, no entanto, alegou que a decisão do tribunal estadual violou a lei, pois o benefício foi concedido sem o requisito subjetivo do bom comportamento, que deveria ser aferido durante toda a execução penal.

Recursos repetitivos geram economia de tempo e segurança jurídica
O Código de Processo Civil regula, no artigo 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como saber a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.

Veja o acordão.
Processo: REsp 1970217

TJ/MG: Hotel é condenado a pagar direitos autorais por oferecer canais por assinatura

A 14ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) manteve sentença da comarca de Ouro Branco que condenou um hotel da cidade a recolher o pagamento referente aos direitos autorais desde 2011, por oferecer em suas dependências canais de televisão. A decisão é definitiva.

O Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) ajuizou ação cobrando valores do hotel, que fornecia em suas 60 acomodações canais de televisão para os hóspedes sem recolher os direitos autorais. O estabelecimento, em sua defesa, alegou que não oferecia canais musicais, mas apenas canais fechados, o que o eximia da cobrança.

A juíza Luiza Starling de Carvalho, da Vara Única da comarca, citou decisão da 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que pacificou a questão, no julgamento do Recurso Repetitivo REsp n. 1.870.771/SP, de relatoria do ministro Antônio Carlos Ferreira, julgado em 24/3/2021 (Tema 1066).

“Assim, uma vez fixada a tese jurídica de que os hotéis são obrigados a pagar direitos autorais pelo fato de terem, em seus quartos, televisores, mesmo que a transmissão seja de TV por assinatura, impõe-se a imediata aplicação da tese ao presente feito, nos termos do Art. 985, inciso I, do CPC, com consequente julgamento de procedência dos pedidos iniciais”, ponderou.

Entretanto, a magistrada indeferiu a condenação da empresa ao pagamento de multa moratória de 10%, pois a penalidade estava embasada tão somente no Regulamento de Arrecadação do Ecad e o órgão não pode exigir isso sem que exista previsão em lei para a autuação.

O relator, desembargador Valdez Leite Machado, manteve o entendimento de 1ª Instância. Ele destacou que a tese de defesa já foi superada, inclusive pelo entendimento do STJ, portanto o hotel deve recolher os valores referentes aos direitos autorais.

As desembargadoras Evangelina Castilho Duarte e Cláudia Maia votaram de acordo com o relator.

Veja a decisão.
Processo nº 1.0000.21.207689-7/001

TRT/MG reverte justa causa aplicada à trabalhadora que foi responsabilizada por valores roubados do caixa

Uma empresa especializada na terceirização de processos de negócios foi condenada a pagar as verbas rescisórias a uma trabalhadora que foi dispensada por justa causa após assaltantes levarem cerca de R$ 8 mil do caixa por ela operado. A profissional trabalhava em um quiosque dentro de uma conhecida rede de loja de departamentos, prestando serviços voltados a uma instituição bancária. Ela foi acusada pela empregadora de não ter realizado a “sangria”, que consiste em transferir valores do caixa para o cofre, como deveria ter feito. Segundo a empresa, o fato de não ter realizado a “sangria” teria causado prejuízo, diante da alta quantia existente no caixa no momento do roubo.

O caso foi decidido em grau de recurso pelos julgadores da Sétima Turma do TRT de Minas, que, baseados no voto do juiz convocado Marcelo Segato Morais, entenderam que a penalidade foi exagerada e afastaram a justa causa.

Sentença oriunda da Vara do Trabalho de Bom Despacho havia declarado a rescisão indireta, mas foi reformada para considerar a dispensa como sendo sem justa causa. Foi mantida determinação de pagamento de indenização por danos morais, mas fixada em R$ 6 mil, valor inferior ao determinado na decisão de primeiro grau.

O horário do assalto chamou a atenção do juiz relator. De acordo com o boletim de ocorrência, o roubo com uso de arma de fogo aconteceu às 10h06min, seis minutos após o início da escala de trabalho. Embora a prova tenha indicado que era atribuição da trabalhadora providenciar a “sangria” a cada mil reais recebidos, na visão do relator, não se provou que isso não tenha sido observado.

Formulário do procedimento relativo ao dia anterior ao roubo demonstrou que a empregada realizou várias sangrias até as 17h19min, no valor total de R$ 34.453,75, encerrando o expediente com o caixa zerado. Não houve indicação no processo de que a quantia encontrada na unidade arrecadadora no momento do assalto se referisse a valor remanescente do dia anterior.

Pelas provas, o julgador concluiu que a trabalhadora recebeu valores elevados nas primeiras operações do dia, não tendo a oportunidade de realizar a sangria antes da ação criminosa. Ao afastar a responsabilidade da empregada, ele ponderou que “o fato de o assaltante encontrar quantia expressiva na unidade arrecadadora não advém de culpa da trabalhadora, mas do próprio modelo de exploração econômica em que há operações de alta quantia, sem que a dinâmica laboral oportunize a realização de sangria impeditiva do acúmulo de valores superiores a R$ 1 mil em todo o período da jornada de trabalho”.

Para o relator, a situação examinada não pode ser enquadrada como “mau procedimento” da profissional por descumprimento de normas internas de segurança, na forma sustentada pela empregadora, uma vez que a trabalhadora sequer teve a oportunidade para realizar a sangria antes da prática do roubo e “não mantém controle sobre o avanço da criminalidade”. Na avaliação do julgador, ao imputar a prática de falta grave à trabalhadora e ainda exigir o reembolso da quantia subtraída pelos criminosos, a empresa pretendeu repassar os riscos da atividade econômica à empregada, o que viola o princípio da alteridade (artigo 2º da CLT).

Danos morais
Além das verbas rescisórias devidas pela dispensa sem justa causa, a empresa deverá pagar indenização por danos morais de R$ 6 mil. Para tanto, levou-se em consideração a declaração da representante da empregadora de que “o item mais importante de segurança é o da sangria, justamente para evitar que fique muito dinheiro no caixa e que no local do quiosque há câmera, mas não tem vigilante”. A câmera, segundo apontado, seria a da loja onde funcionava o quiosque. Foi levado em conta também o número frequente de assaltos aos quiosques, conforme revelado pela a prova oral.

Na decisão, foi pontuado que “a precaução para minimizar danos concentrada apenas na realização de sangria, a fim de que os valores subtraídos não alcançassem quantias exorbitantes, demonstra nítida ausência de preocupação em relação à integridade física e psicológica dos empregados, haja vista que o procedimento apenas reduz o prejuízo das empregadoras, mas não inibe a ação criminosa enfrentada pelos operadores do caixa, constantemente abalados e traumatizados por assaltos à mão armada”. O relator destacou que “as empresas não providenciaram detectores de metais, vigias, blindagens dos quiosques, entre outras medidas de proteção não apenas ao patrimônio, mas também à integridade física e à tranquilidade psíquica de seus colaboradores”.

Para o juiz, houve violação ao disposto no artigo 157, inciso I, da CLT, referente a normas de segurança e medicina do trabalho. A instituição financeira foi condenada de forma subsidiária. Ao final, foi celebrado um acordo entre as partes. O processo já foi arquivado definitivamente.

Processo PJe: 0010899-34.2019.5.03.0050 (ROT)

STJ vê incidência inadequada de qualificadora e redimensiona pena de réus da Chacina de Unaí

Por considerar inadequada a incidência da qualificadora de homicídio mediante pagamento ou promessa de recompensa (artigo 121, parágrafo 2º, inciso I, do Código Penal), a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu nesta terça-feira (6) redimensionar as penas de três réus condenados pela chamada Chacina de Unaí. No episódio, ocorrido em 2004, três auditores fiscais e um motorista do Ministério do Trabalho foram assassinados enquanto exerciam a fiscalização do trabalho rural no município de Unaí (MG).

Com a retirada da qualificadora, o colegiado fixou a pena do proprietário rural Norberto Mânica – acusado de ser o mandante do crime – em 56 anos e três meses de reclusão. Já para os réus José Alberto de Castro e Hugo Alves Pimenta – denunciados por contratarem os pistoleiros que executaram os disparos contra os servidores –, o colegiado fixou a pena em 41 anos e três meses e em 27 anos de reclusão, respectivamente.

De acordo com o Ministério Público Federal, os três auditores fiscais e o motorista do carro estavam próximos a uma fazenda quando foram vítimas de tiros disparados por assassinos profissionais. Os auditores morreram na hora, enquanto o motorista faleceu horas depois do crime.

Após a condenação do tribunal do júri, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) fixou a pena de reclusão de Norberto Mânica em 65 anos e sete meses; a de José Alberto de Castro em 58 anos e dez meses; e a de Hugo Alves Pimenta – corréu beneficiado por ter sido colaborador – em 31 anos e seis meses. No acórdão, o TRF1 manteve a qualificação do crime pelo pagamento de recompensa.

Qualificadora de paga não se aplica a mandantes do crime
Relator dos recursos especiais, o ministro Ribeiro Dantas explicou que, segundo a jurisprudência mais recente do STJ, a qualificadora de paga se aplica apenas aos executores diretos do homicídio, porque são eles que recebem, efetivamente, o pagamento ou a promessa de recompensa para executar o crime.

“Como consequência, o mandante do delito não incorre na referida qualificadora, já que sua contribuição para o cometimento do homicídio em concurso de pessoas, na forma de autoria mediata, é a própria contratação e pagamento do assassinato”, completou o ministro.

Apesar dessa posição, Ribeiro Dantas reconheceu a existência de julgados do STJ em sentido contrário, porém o magistrado se baseou em entendimento da doutrina no sentido de que a qualificadora é voltada para aquele que obtém a recompensa pela execução do crime, ou seja, não poderia ser aplicada àquele que a oferece, pois sua motivação é diferente da prevista na qualificadora.

A qualificadora do artigo 121, parágrafo 2º, inciso I, do CP, segundo o ministro, “diz respeito à motivação do agente, tendo a lei utilizado, ali, a técnica da interpretação analógica. Vale dizer: o homicídio é qualificado sempre que seu motivo for torpe, o que acontece exemplificativamente nas situações em que o crime é praticado mediante paga ou promessa de recompensa, ou por motivos assemelhados a estes”.

Qualificadora não poderia ser apresentada aos jurados, mas não há motivo para anulação
O relator lembrou que os executores diretos da chacina foram julgados em autos apartados, de modo que, no recurso analisado, está presente apenas o núcleo apontado pelo Ministério Público como mandante do crime. Por essa razão, para o ministro, a qualificadora de paga não poderia nem ter sido colocada como quesito para os jurados no julgamento desses réus.

Entretanto, Ribeiro Dantas considerou não ser necessária a anulação do júri como um todo, sendo suficiente a retirada da qualificadora ilicitamente considerada na dosimetria da pena.

“Sem a qualificadora da paga, a única circunstância que permanecerá a qualificar o homicídio será a do inciso V do artigo 121, parágrafo 2º, do CP, o que impõe seu decote na segunda fase da aplicação da pena. Para além desse impacto no cálculo do apenamento, nenhuma outra consequência advirá da exclusão da qualificadora da paga”, apontou.

Segundo o relator, situação distinta ocorreria se o vício tivesse ocorrido nos quesitos de autoria, de materialidade ou da absolvição, porque, nessas hipóteses, estaria prejudicada a compreensão da própria vontade popular quanto à condenação dos réus.

“Nesta ação penal, contrariamente, inexiste dúvida quanto à autoria e à materialidade do delito, estando clara, também, a opção dos jurados pela condenação. Como se não bastasse, permanece hígida uma das qualificadoras reconhecidas pelo júri (a do artigo 121, parágrafo 2º, inciso V, do CP), de maneira que tampouco se questiona o enquadramento das condutas dos recorrentes como homicídios qualificados”, concluiu o ministro.

Processo: REsp 1973397

TRF1: Norma que considera atividade profissional com moto perigosa é anulada por vício em tramitação

A 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) manteve a anulação de uma portaria do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) que compreende como perigosa a atividade profissional realizada com motocicleta ou motoneta em vias públicas. Com isso, o TRF1 atendeu ao recurso da União contra a sentença que deu ganho de causa ao Sindicato do Comércio Varejista de Gêneros Alimentícios de Belo Horizonte.

Na 1ª instância, o pedido foi acolhido sob o fundamento de que teriam sido constatadas irregularidades quanto à tramitação e à aprovação da portaria.

Ao analisar o recurso que chegou ao TRF1, a relatora, desembargadora federal Daniele Maranhão, observou que, de fato, a aprovação da norma não teria seguido o rito que regulamenta o processo de elaboração de normas relacionadas a saúde, segurança e condições gerais de trabalho.

Segundo a magistrada, “é ilegal a Portaria 1.565/14 na medida que seu processo estaria eivado de irregularidades, descumprindo-se o procedimento ditado na Portaria 1.127/03, que estabelece procedimentos para a elaboração de normas regulamentadoras relacionadas a saúde e segurança e condições gerais de trabalho”.

Sistema tripartite – A desembargadora ressaltou que, de acordo com os autos, não foi observado o sistema tripartite, composto de representantes dos empregados, dos empregadores e do Poder Público, bem como não foram respeitados os prazos quando foram negados os pedidos de prorrogação realizados por diversos componentes do setor empresarial.

Portanto, apesar de os atos normativos terem presunção de veracidade e legitimidade, “são passíveis de prova de que o ato administrativo foi produzido com violação às normas que lhe são aplicáveis, como ocorreu no caso dos autos, em que o procedimento, o prazo e a configuração do sistema tripartite foram descumpridos, tornando inválida a portaria discutida nestes autos”.

A decisão da 5ª Turma foi unânime.

Processo: 0049124-08.2015.4.01.38000

TRT/MG: Trabalhador apelidado de “mineiro peçonhento” na Bahia receberá indenização por danos morais

A Justiça do Trabalho determinou o pagamento de indenização, no valor de R$ 5 mil, ao trabalhador que recebia frequentemente um tratamento hostil e desrespeitoso do superior hierárquico. Entre as ofensas narradas, ele foi chamado de “mineiro, animal peçonhento”, durante reunião de trabalho, causando constrangimento. A decisão é dos desembargadores da Nona Turma do TRT-MG, que, por maioria de votos, mantiveram a sentença proferida pelo juízo da 4ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte.

Segundo o trabalhador, os problemas começaram a partir de julho de 2018, quando foi transferido para a obra do Complexo de Campo Largo, em Ourolândia, na Bahia, sob a supervisão de um engenheiro, que era o superior hierárquico. O trabalhador contou que o tratamento grotesco se intensificou a partir de outubro de 2019. Em julho do ano seguinte, ele foi dispensado.

“Os percalços eram enormes e diários. Falta de bom ambiente de trabalho, humilhações, escárnios, provocações, comentários ofensivos e desairosos dirigidos por aquele senhor”, disse o profissional, postulando a condenação da empresa ao pagamento de indenização por danos morais. Em sua defesa, a empregadora negou todas as acusações. Alegou que o ex-empregado era tratado com respeito e urbanidade por colegas e superiores hierárquicos, não havendo o assédio moral alegado.

Mas testemunhas ouvidas confirmaram a versão do trabalhador. Segundo o depoente, o engenheiro se referiu ao profissional como “mineiro, animal peçonhento” durante uma reunião de apresentação do Complexo de Campo Largo. Disse ainda que presenciou esse mesmo tratamento em outras reuniões.

A testemunha explicou que esses encontros eram on-line, com cerca de 20 pessoas. O depoente disse acreditar que todos da reunião ouviram a referência feita pelo supervisor. Outra testemunha confirmou as ofensas. Informou que viu também o ex-empregado sendo chamado de “mineiro peçonhento” na reunião. Disse ainda que, após o encontro de trabalho, chegou a telefonar para o colega com o intuito de apoiá-lo.

Para o juiz convocado relator, Jessé Cláudio Franco de Alencar, ficou demonstrado que o trabalhador sofreu realmente tratamento vexatório e humilhante, em algumas ocasiões, inclusive na frente de vários colegas de trabalho.

O julgador salientou que o fato de o ex-empregado não ter realizado denúncia em canais da empregadora não significa anuência tácita. “Os fatos ocorreram de 2019 em diante, no último cargo dele na empresa, conforme se infere dos depoimentos das testemunhas, sendo dispensado em julho de 2020”, frisou.

Para o juiz convocado, uma vez demonstrado no processo o ato abusivo praticado pela empresa que gere constrangimento e humilhação, é devido o pagamento de indenização por danos morais. “Ao fixar o quantum indenizatório, o julgador deve observar a finalidade da compensação por dano moral, que tem como escopo não apenas a punição do empregador em razão do dano causado, com objetivo pedagógico, para tentar coibi-lo da prática de atos ilícitos que atentem contra os direitos da personalidade, mas também a reparação pecuniária pelo dano causado ao empregado”, concluiu o julgador, mantendo o valor de R$ 5 mil fixado na origem. Atualmente, o processo aguarda decisão de admissibilidade do recurso de revista.

Processo nº 0010780-20.2020.5.03.0024 — Acórdão em 28/7/2022

TRF1: Prazo superior a 30 dias para julgamento de auto de infração ambiental não anula processo administrativo

O desrespeito ao prazo de 30 dias para julgar auto de infração lavrado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) não acarreta a nulidade do processo administrativo e da respectiva multa. Essa foi a decisão da 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) ao reformar a sentença da 26ª Vara Federal de Minas Gerais (SJMG) envolvendo um homem que mantinha em cativeiro um pássaro da fauna silvestre brasileira sem licença.

No TRF1, o Ibama argumentou que a autuação tem respaldo no Decreto nº 26.514/2008, que dispõe sobre infrações e sanções administrativas ao meio ambiente e estabelece o processo administrativo federal para apuração desses delitos. Alegou que o art. 71, II, da Lei nº 9.605/1998, que prevê o prazo de trinta dias para o julgamento do auto de infração, não prevê nulidade do processo administrativo em caso de descumprimento do prazo, sobretudo por não ter havido prejuízo ao autuado.

Ameaça de extinção – A juíza federal convocada pelo TRF1 Rosimayre Gonçalves de Carvalho, relatora, verificou que o autor foi autuado por manter em cativeiro um pássaro da fauna silvestre brasileira sem licença do órgão ambiental, ave de espécie que se encontra ameaçada de extinção nos termos da Lei 9.605/1998 e do Decreto 6.514/2008, com multa no valor de R$ 5.000,00.

Segundo a magistrada, “a inobservância do prazo não implica nulidade do auto de infração, caracterizando, quando muito, irregularidade passível de apuração nas instâncias administrativas superiores. Inclusive, em se tratando de multa, não se impõe qualquer ônus ao autuado que sequer tem o nome inscrito ou o lançamento de eventual débito em cadastros fiscais ou de devedores”, conforme a legislação e a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do TRF1.

O voto no sentido de dar provimento ao apelo do Ibama foi acompanhado, por unanimidade, pelo Colegiado.

Processo: 0068169-66.2013.4.01.3800


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