TRT/SP: Trabalhadora surda será indenizada por falta de intérprete de Libras

Sentença proferida na 3ª Vara do Trabalho de Santo André-SP condenou grupo econômico da área de aprendizagem do transporte a pagar indenização por danos morais de R$ 35 mil a auxiliar administrativa surda por não oferecer, de modo permanente, intérprete de Língua Brasileira de Sinais (Libras). Para o juiz Diego Petacci, as empresas deixaram de promover inclusão real da pessoa com deficiência (PCD), o que resultou em isolamento da trabalhadora.

No processo, a mulher relatou dificuldade na comunicação em reuniões e tarefas diárias. Afirmou que interagia com colegas por meio de leitura labial, tarefa que dependia da velocidade da fala do interlocutor. Sentindo-se excluída, pediu demissão. A defesa alegou que a auxiliar desempenhava normalmente suas funções (dar baixa em notas fiscais), que o cargo não envolvia atendimento ao público e que a comunicação também era feita via escrita. Ainda, disse que ofereceu curso de Libras aos empregados e que a profissional de interpretação era chamada para eventos específicos.

Ouvida em juízo, a intérprete afirmou ter sido contratada em três ou quatro oportunidades, fazendo a comunicação para a reclamante em alguns cursos e uma feira de empregabilidade, e ministrando oficina de Libras aos empregados das rés por três dias. Também afirmou que não era possível, nessas ocasiões, aprender com profundidade a comunicação por gestos.

Para fundamentar a decisão, o magistrado citou a Lei Brasileira de Inclusão (Lei nº 13.146/2015), que garante ambiente acessível e inclusivo às pessoas com deficiência, e o Decreto nº 6.949/09, que exige adaptações razoáveis para inclusão no mercado. Pontuou que, em casos como esse, é comum se argumentar sobre “custo excessivo” de medidas inclusivas, contudo, “se esse raciocínio sempre prosperar, não haverá inclusão alguma”. E lembrou que o Regional vem adotando adaptações para garantir condições dignas de trabalho (com leitores de tela, unidades judiciárias de acesso facilitado e disponibilização de servidor para leitura em voz alta de documentos).

Com isso, considerou que as reclamadas não diligenciaram de forma eficiente para garantir a plenitude de inclusão da reclamante no ambiente laboral, condenando-as de forma solidária pelo dano grave.

“Inserir a pessoa surda sem lhe garantir meios de se comunicar e se expressar pela sua língua nativa, Libras, é o mesmo que lhe negar sua própria identidade. (…) Reputo que a reclamante realmente foi segregada no ambiente de trabalho por não se promover inclusão real, mas mera inserção para cumprimento protocolar de quota de PCD”, avaliou.

Processo: 1002193-14.2024.5.02.0433

STF valida lei que libera pedágio para veículos de pessoas com deficiência nas rodovias

Para o Plenário, norma não invadiu competência do Executivo.


O Supremo Tribunal Federal (STF) manteve válida lei do Espírito Santo que isenta os veículos de pessoas com deficiência do pagamento de pedágio nas rodovias estaduais. A decisão foi tomada na sessão virtual encerrada em 28/3, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3816.

A ação foi proposta pelo governo do estado contra trechos da Lei estadual 7.436/2002. Entre outros pontos, o governo alegava que a norma cria atribuições para a administração pública, violando competência privativa do chefe do Executivo estadual.

Equilíbrio financeiro
O Plenário seguiu o voto do relator, ministro Nunes Marques, para afastar esse argumento. De acordo com o ministro, a norma não trata de matéria de competência privativa do chefe do Poder Executivo, como criação de cargos e aumento de remunerações. Também não ficou comprovado no processo que a isenção tenha gerado desequilíbrio econômico-financeiro no contrato de concessão de rodovias estaduais.

Direitos fundamentais
O colegiado também concluiu que a lei interveio na ordem econômica para dar maior efetividade aos direitos fundamentais das pessoas com deficiência, considerando, em especial, o direito de ir e vir, que, para esse grupo, é geralmente mitigado.

Prazo

O Plenário, contudo, julgou inválido o artigo 3º da norma, que estipulava prazo para que a lei fosse regulamentada pelo Poder Executivo. De acordo com a jurisprudência do Supremo, a regulamentação é uma das atividades típicas do Executivo, e não cabe ao Legislativo fixar prazos para que seja exercida, sob pena de violação ao princípio da separação dos Poderes.

STJ admite envio de ofício às corretoras para encontrar e penhorar criptomoedas do devedor

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que, no cumprimento de sentença, o juízo pode enviar ofício às corretoras de criptoativos com o objetivo de localizar e penhorar eventuais valores em nome da parte executada.

O recurso chegou ao STJ após o tribunal de origem negar provimento ao agravo de instrumento – interposto na fase de cumprimento de sentença – em que o exequente sustentava a possibilidade de expedição de ofícios para tentar encontrar criptomoedas que pudessem ser penhoradas.

O tribunal local considerou a inexistência de regulamentação sobre operações com criptoativos. Além disso, para a corte local, faltaria a garantia de capacidade de conversão desses ativos em moeda de curso forçado.

Ativo digital faz parte do patrimônio do devedor
O relator na Terceira Turma, ministro Humberto Martins, lembrou que, para a jurisprudência do STJ, da mesma forma como a execução deve ser processada da maneira menos gravosa para o executado, deve-se atender o interesse do credor que, por meio de penhora, busca a quitação da dívida não paga.

O ministro ressaltou que as criptomoedas são ativos financeiros passíveis de tributação, que devem ser declarados à Receita Federal. Conforme disse, apesar de não serem moedas de curso legal, elas têm valor econômico e são suscetíveis de restrição. “Os criptoativos podem ser usados como forma de pagamento e como reserva de valor”, completou.

O relator comentou que, conforme o artigo 789 do Código de Processo Civil, o devedor inadimplente responde com todos os seus bens pela obrigação não cumprida, ressalvadas as exceções legais. No entanto, em pesquisa no sistema Sisbajud, não foram localizados ativos financeiros em instituições bancárias autorizadas.

Para Humberto Martins, além da expedição de ofício às corretoras de criptomoedas, ainda é possível a adoção de medidas investigativas para acessar as carteiras digitais do devedor, com vistas a uma eventual penhora.

Criptomoedas representam desafios para o Judiciário
O relator lembrou que uma proposta legislativa em tramitação, o Projeto de Lei 1.600/2022, define o criptoativo como representação digital de valor, utilizado como ativo financeiro, meio de pagamento e instrumento de acesso a bens e serviços.

Em voto-vista, o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva informou que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) está desenvolvendo uma ferramenta, o Criptojud, para facilitar o rastreamento e o bloqueio de ativos digitais em corretoras de criptoativos.

Cueva salientou a necessidade da regulamentação desse setor, diante das dificuldades de ordem técnica relacionadas com a localização, o bloqueio, a custódia e a liquidação de criptoativos, o que traz desafios para o Poder Judiciário tanto na esfera cível quanto na penal.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2127038

TRT/MG: Recebimento do Bolsa Família não impede o reconhecimento da relação de emprego

O recebimento do Bolsa Família não impede o reconhecimento da relação de emprego, pois as normas do benefício permitem que o empregado celetista permaneça usufruindo dele, a depender da renda per capita da família. O entendimento foi manifestado pelo juiz Agnaldo Amado Filho, titular da 1ª Vara do Trabalho de Juiz de Fora/MG, ao reconhecer a relação de emprego de uma trabalhadora com um restaurante.

No caso, a mulher alegou que não teve o contrato de trabalho registrado na Carteira de Trabalho e que foi dispensada sem que fosse efetuado o acerto rescisório. Já o restaurante negou a existência de relação jurídica entre as partes, dizendo que a autora nunca lhe teria prestado qualquer tipo de serviço.

As provas foram favoráveis à trabalhadora. Testemunha declarou que “trabalhou na reclamada de janeiro a junho de 2022 e de julho de 2023 a janeiro de 2024, como cozinheira, tendo trabalhado com a reclamante, que atuava em serviços gerais”. Relatou ainda que a autora prestou serviços de forma contínua e pessoal, sendo ambas subordinadas à proprietária do estabelecimento. Acrescentou que havia salário, embora não soubesse informar o valor.

Diante desse contexto, o julgador reconheceu a relação de emprego entre as partes. “Reputo demonstrada a presença cumulativa dos elementos caracterizadores do contrato de emprego previstos nos artigos 2º e 3º da CLT, quais sejam, prestação pessoal de serviço de natureza não eventual, mediante subordinação jurídica”, destacou na sentença.

O juiz também identificou o requisito da onerosidade, diante do depoimento da testemunha de que havia salário, embora ela não soubesse informar o valor. O princípio da onerosidade é um dos pilares fundamentais do Direito do Trabalho e está relacionado à natureza remunerada da relação de emprego. Ele estabelece que, para que exista um contrato de trabalho válido, deve haver uma contrapartida financeira ou material pelo serviço prestado pelo trabalhador ao empregador.

Em outras palavras, o trabalho realizado não é gratuito; é uma troca entre a força de trabalho e o pagamento, seja em forma de salário ou outras vantagens previstas no contrato. Esse princípio garante que o trabalhador receba uma compensação justa pelo serviço prestado, e também diferencia o contrato de trabalho de outros tipos de relações, como as de voluntariado, onde não há expectativa de remuneração. Além disso, reforça a ideia de que o trabalho tem valor econômico e deve ser devidamente recompensado. Segundo a decisão, não foi levantada tese nem houve prova de que o trabalho fosse voluntário.

Com relação ao fato de a trabalhadora ter recebido o benefício do Bolsa Família no período trabalhado, o magistrado explicou esse detalhe não é suficiente para afastar o vínculo de emprego. Isso porque as normas do benefício autorizam o empregado celetista a permanecer usufruindo dele, desde que a renda mensal per capita da família seja compatível com os critérios de elegibilidade do programa.

O restaurante foi condenado a anotar o contrato de trabalho na CTPS, fazendo constar o período de 1/3/2022 a 6/9/2023, função de serviços gerais e salário-mínimo. Foi determinado o pagamento de saldo de salário, aviso-prévio, 13º salário, férias + 1/3, FGTS com a multa de 40%, além de multa prevista no artigo 477 da CLT, horas extras e de intervalo, assim como feriados.

Por fim, o julgador determinou a expedição de ofício ao MTE (Ministério do Trabalho e Emprego), à CEF (Caixa Econômica Federal) e ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), para adoção das medidas que entenderem cabíveis.

Danos morais
A condenação envolveu ainda uma indenização por danos morais no valor de R$ 2 mil. “Isso porque restou apurada a irregularidade na anotação do contrato de emprego e a ausência de pagamento do acerto rescisório, o que certamente lhe gerou constrangimentos, já que foi impedida de honrar compromissos financeiros assumidos, para sua sobrevivência e de sua família”, registrou o magistrado.

Já ocorreu o cumprimento integral do acordo celebrado entre as partes, homologado pelo juiz de primeiro grau.

Processo PJe: 0010361-25.2024.5.03.0035

TJ/MT: Motel é condenado a pagar mais de R$ 30 mil ao ECAD por músicas tocadas em quartos

A Terceira Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso decidiu, por unanimidade, manter a condenação de um motel localizado em Cuiabá, ao pagamento de R$ 30.032,07 ao Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD) por execução pública de obras musicais sem autorização. Além disso, a decisão também autorizou a inclusão de parcelas anteriores à data da sentença, ampliando o valor da condenação.

O julgamento decorre de ação ajuizada pelo ECAD, que alegou que o estabelecimento promovia a transmissão de obras musicais e audiovisuais por meio de aparelhos de TV em seus quartos, sem a devida autorização. Segundo o órgão, tal prática configura execução pública de obras protegidas pela Lei de Direitos Autorais (Lei 9.610/98), ainda que a empresa tenha contratado serviços de TV por assinatura.

A relatora do processo, desembargadora Antônia Siqueira Gonçalves, destacou em seu voto que o Superior Tribunal de Justiça já pacificou entendimento sobre a legalidade da cobrança nesses casos. O STJ entende que a disponibilização de equipamentos de som ou imagem em quartos de hotéis e motéis caracteriza execução pública, mesmo que o sinal venha de canais por assinatura — não configurando, portanto, “bis in idem”, ou seja, cobrança em duplicidade.

O motel, réu na ação, foi declarado revel — ou seja, não apresentou defesa no prazo legal — e argumentou apenas em grau de apelação que a cobrança seria indevida por já pagar pelos direitos autorais via a operadora de TV. Alegou também a ausência de prova concreta de utilização habitual das músicas nos quartos. Os argumentos, contudo, não foram aceitos pela Corte, que ressaltou a presunção legal dos fatos alegados pelo ECAD diante da revelia e a ausência de provas em sentido contrário.

Por outro lado, o recurso interposto pelo próprio ECAD foi acolhido, permitindo a inclusão das parcelas vincendas até a sentença, com base no artigo 323 do Código de Processo Civil. A relatora explicou que se trata de obrigação de trato sucessivo e que a manutenção da conduta infracional pelo motel legitima a ampliação da condenação.

A sentença de Primeiro Grau, proferida pela juíza Ana Paula da Veiga Carlota Miranda, da 3ª Vara Cível de Cuiabá, já havia reconhecido a procedência do pedido do ECAD, mas não incluía as parcelas futuras. Com a nova decisão, o montante da condenação poderá ser ampliado.

Processo: 1028483-14.2023.8.11.0041

STJ: Melhor interesse da criança justifica sua permanência com família substituta em vez da biológica

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, manter a guarda de uma criança com a família substituta, negando o pedido da tia biológica. O colegiado considerou que a infante, acolhida logo após o nascimento, não tinha vínculos afetivos com a tia e já havia mais de um ano que estava sob os cuidados dos pretensos adotantes.

A ministra Nancy Andrighi, relatora, enfatizou que, embora o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) priorize a família extensa, essa diretriz não pode ser aplicada automaticamente quando o melhor interesse da criança recomenda a sua permanência na família substituta.

Aos dois meses de vida, devido ao risco representado pela convivência com a mãe biológica, usuária de drogas, a criança foi encaminhada a um abrigo. Três meses depois, o Ministério Público ajuizou ação para destituição do poder familiar, levando a Justiça a suspender os direitos da mãe e encaminhar a infante para adoção. A criança foi acolhida por uma família substituta, mas a tia materna requereu a guarda – o que foi concedido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).

Contra essa decisão, o guardião provisório entrou simultaneamente com recurso especial e habeas corpus no STJ para manter a criança sob seus cuidados.

ECA exige tanto o vínculo de parentesco quanto o de afetividade
Ao analisar o habeas corpus, a ministra Nancy Andrighi ressaltou que o princípio da prioridade da família natural não pode ser aplicado de forma automática, pois o ECA exige tanto o vínculo de parentesco quanto o de afetividade. Segundo ela, o uso do conectivo ‘e’ no artigo 28, parágrafo 3º, do ECA deixa claro que não basta a proximidade de grau de parentesco, mas é indispensável um laço afetivo concreto.

“A mudança de paradigma proporcionada pela doutrina do melhor interesse leva ao entendimento de que a prioridade do instituto da adoção não é a realização pessoal dos adotantes, mas, sim, a possibilidade de proporcionar a crianças e adolescentes o pertencimento a uma célula familiar que lhes propicie desenvolvimento saudável e efetiva felicidade”, declarou.

A ministra comentou ainda que, em muitos casos, a criança encontra melhores condições para um desenvolvimento saudável ao ser inserida em família substituta por meio da adoção, em vez de permanecer no abrigo à espera de parentes aptos a acolhê-la. Para ela, a insistência na busca por familiares biológicos sem vínculos afetivos pode até retardar a colocação definitiva da criança em um lar adotivo, reduzindo suas chances de adoção, especialmente porque a maioria dos adotantes prioriza crianças mais novas.

Criança está segura e amparada na família substituta
A ministra apontou que não ficou demonstrado no processo que o melhor interesse da criança seria garantido com a concessão da guarda à tia materna, pois elas nunca conviveram. Por outro lado, a relatora constatou que o laudo psicossocial demonstra que a criança está segura e amparada na família substituta, recebendo todos os cuidados necessários para seu desenvolvimento saudável.

“Não é do melhor interesse da criança nova alteração do lar de convivência, pois, em tão tenra idade, já foi afastada do convívio com a mãe biológica, passou por medida de desacolhimento e encontra-se acolhida na família substituta há mais de um ano e quatro meses”, declarou Nancy Andrighi ao determinar que a criança permaneça sob a guarda da família substituta.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

TRT/SP: Avó e neta são multadas por má-fé por simularem processo para transferir imóvel

Em julgamento unânime, a 12ª Turma do TRT da 2ª Região manteve multa por litigância de má-fé a avó e neta que simularam lide trabalhista a fim de obterem a adjudicação de imóvel. As mulheres foram condenadas solidariamente a pagar mais de R$ 37 mil, o que equivale a 5% do valor da causa, a ser revertido ao Fundo de Amparo ao Trabalhador.

Entre outras alegações, a neta afirmou ter prestado, por 20 anos, serviço de administração de bens da avó, com recebimento de R$ 7 mil mensais, sem o devido registro. Pleiteou o reconhecimento de vínculo empregatício e pagamentos de horas extras, 13º salário, aviso-prévio e outras verbas do período. Antes da audiência, as partes juntaram acordo em que a avó reconhecia os fatos alegados e valores pleiteados na inicial, e oferecia, para adjudicação, um apartamento do qual detém 50% da propriedade.

A juíza-relatora do acórdão, Soraya Lambert, lembrou que parentesco não veda o reconhecimento de vínculo de emprego, porém ficou comprovado que as partes se valeram do processo trabalhista para prejudicar os demais herdeiros da reclamada.

A falta de pretensão resistida, segundo a magistrada, ficou evidente na colheita de prova oral em que a neta afirmou que “continua trabalhando normalmente” sem a intenção de rescindir a relação jurídica entre as partes; a idosa, por sua vez, disse que não contratou a parente “porque ela não pediu” e “agora” irá regularizar a contratação.

“A reclamada sequer apresentou defesa, ainda que os documentos acostados com a petição inicial não indiquem quaisquer elementos de configuração de vínculo empregatício (…) Aliás, curiosamente, como bem fundamentado pelo MM. Juízo a quo, os pedidos formulados se ajustam exatamente ao valor da parte do imóvel oferecida para adjudicação judicial (…)”, afirmou a relatora.

Na decisão, a julgadora pontuou que o processo do trabalho “tem vocação ética e impõe deveres correlatos às partes” e que a “prática maliciosa e equivocada” de se valer do processo de forma simulada é incompatível com a dignidade da Justiça, na forma do artigo 793-C da Consolidação das Leis do Trabalho.

Sobre o benefício da justiça gratuita, o instituto foi concedido à neta, mas permaneceu negado à avó, que não provou a impossibilidade de arcar com as custas e despesas processuais.

Cabe recurso.

TJ/SC: Flagrante de aves silvestres em gaiolas permite que polícia entre em casa sem mandado

Provas visíveis afastam princípio da inviolabilidade de domicílio, decide TJ/SC.


A 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) condenou um morador de Joinville à pena de seis meses e sete dias de detenção, a ser cumprida em regime inicialmente aberto, por crime ambiental. Para o órgão julgador, o ingresso dos agentes policiais na residência do réu sem seu consentimento foi justificado pelo flagrante de aves silvestres em gaiolas penduradas nas paredes externas e também de aparato ilegal de caça.

A ação policial aconteceu no bairro Petrópolis, na manhã de 8 de fevereiro de 2021. Após denúncias de prática de caça ilegal, policiais militares dirigiram-se à residência do denunciado. Constataram que ele mantinha em cativeiro 15 aves de espécies pertencentes à fauna silvestre brasileira, sem licença ou autorização da autoridade ambiental. Também foram encontrados 13 animais abatidos (tatus-galinha) em um freezer. Foram apreendidas ainda 19 armadilhas destinadas à captura dos tatus.

A sentença do juízo da 1ª Vara Criminal da comarca de Joinville absolveu o réu. Para o magistrado sentenciante, houve ilegalidade na abordagem dos policiais, com invasão de domicílio sem fundada razão e consequente invalidade das provas obtidas na diligência. O Ministério Público recorreu da sentença. Alegou que não houve violação de domicílio, pois os policiais só entraram no imóvel após receberem denúncias anônimas de caça ilegal.

Para o desembargador que relatou o apelo, a entrada forçada em domicílio sem justificativa prévia é a princípio arbitrária, conforme entendimento do próprio Supremo Tribunal Federal (STF). No caso em discussão, porém, havia fundada suspeita da ocorrência de crime com seriedade capaz de excetuar a inviolabilidade do domicílio – e isso foi suficientemente demonstrado nos autos.

De acordo com o relatório, não se constata incongruência ou imprecisão significativa capaz de colocar em xeque o relato dos agentes públicos ou da abordagem policial como um todo. “É oportuno não olvidar que é por intermédio dos policiais que a sociedade vigia e busca quem delínque, motivo de gozarem de certa parcela de fé pública no exercício de suas funções e de dever ser tomadas como verdadeiras suas afirmações quando nada nos autos consistentemente as contradite”, destaca o relator.

Da mesma forma, o voto reforça que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem reiterados julgados no sentido de que os depoimentos dos policiais responsáveis pelo flagrante constituem meio idôneo de prova para motivar a condenação, sobretudo quando colhidos no âmbito do devido processo legal, sob o crivo do contraditório, e em conformidade com os demais elementos probatórios.

O voto do relator pela condenação do réu foi acompanhado pelos demais desembargadores da 2ª Câmara Criminal do TJ.

Apelação criminal n. 5042553-48.2022.8.24.0038

TJ/MA: Acesso indevido a mensagens de WhatsApp e envio a terceiros gera indenização

Duas colaboradoras de uma universidade em São Luís foram condenadas a pagar indenização por danos morais por terem acessado indevidamente o aplicativo de mensagens WhatsApp de uma colega de trabalho, fazendo prints das mensagens e enviado a terceiros. Na decisão, o juiz titular da 3ª Vara Cível da Capital, Márcio Castro Brandão, considerou que isso causou prejuízos à imagem, honra e credibilidade da requerente, bem como a perda de seu cargo na instituição de ensino.

Conforme a autora da ação, uma amiga de trabalho teve o aplicativo de mensagens WhatsApp acessado indevidamente pelas requeridas, por meio de um computador da universidade em que trabalhavam. A requerente informou que foram realizadas capturas de tela (prints) das conversas privadas, tanto entre a autora e sua amiga, quanto em grupos do Whatsapp dos quais participavam, sendo as mensagens expostas a terceiros.

Na contestação, as requeridas sustentaram não ter havido violação de sigilo porque o computador utilizado era de uso compartilhado e que as mensagens estavam visíveis na tela. Que não praticaram qualquer ato ilícito e que a situação descrita não configura dano moral, mas mero aborrecimento, além de alegarem suposta ilicitude das provas juntadas aos autos.

Em réplica, a parte autora reafirmou a ocorrência de violência contra sua intimidade e privacidade e destacou que as provas juntadas foram obtidas licitamente.

De acordo com a decisão judicial, pelo depoimento de uma testemunha é possível inferir-se que a situação se tornou de conhecimento por todo o corpo de funcionários da universidade, inclusive chegando à direção superior do estabelecimento de ensino. A testemunha não pôde afirmar, com certeza, quem exatamente lhe enviou os prints, dada a repercussão que o assunto teve entre diversas pessoas.

Conforme o magistrado, a proteção às comunicações é assegurada pela Constituição Federal (art. 5º, inciso XII). “Desdobra-se da liberdade de expressão, e, ao fim, resguarda o direito à intimidade e à privacidade, que possuem, igualmente, status constitucional. Dessa forma, as conversas e ligações realizadas em sede do aplicativo WhatsApp são resguardadas pelo sigilo das comunicações”, destacou o juiz, acrescentando: “indubitável o fato de que terceiros somente podem ter acesso às conversas de WhatsApp mediante o consentimento dos participantes ou autorização judicial”.

Ainda, segundo o juiz, o dano restou patentemente comprovado, tendo em vista que a exoneração da autora da ação, do cargo que ocupava na universidade, deu-se “em decorrência dos fatos, além das demais consequências do ocorrido, com exposição de sua intimidade, julgamentos no âmbito profissional, não se podendo tampouco a condição de gestante em que se encontrava à época dos fatos”. Segundo o magistrado, foram preenchidos os requisitos legais que impõem às rés o dever de indenizar pelos danos causados.

As duas colaboradoras foram condenadas ao pagamento de 10 mil reais (R$ 5 mil cada uma), a título de reparação por danos morais, acrescidos de correção monetária pela variação do IPCA a partir da data da sentença, e de juros de mora de 1% ao mês, a partir do evento danoso. Elas também terão que pagar as custas processuais e os honorários dos advogados da parte autora.

STJ: Valor nominal de promissória registrado na partilha não basta para definir alcance das obrigações sucessórias

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o valor de face de uma nota promissória, registrado em escritura pública de inventário e partilha, não deve ser utilizado para calcular o patrimônio transferido por herança e, consequentemente, estabelecer o alcance das obrigações sucessórias.

Uma sociedade de advogados buscava o pagamento de honorários sucumbenciais relativos à sua atuação em processo no qual os pais de um homem falecido se habilitaram como seus sucessores. O juízo deferiu a penhora nas contas dos pais, sob o fundamento de que eles teriam herdado patrimônio suficiente para arcar com a dívida.

Ocorre que, de acordo com a escritura pública de inventário e partilha, o patrimônio herdado pelos genitores foi uma nota promissória, nunca resgatada, emitida em favor do falecido por uma empresa atualmente em processo de falência.

Ao reformar a decisão de primeiro grau, o tribunal estadual entendeu que o valor nominal da nota promissória não integrava o patrimônio dos herdeiros, pois era apenas uma expectativa de crédito com mínima probabilidade de recebimento.

Risco de inadimplência diminui o valor da nota promissória
No STJ, a sociedade advocatícia sustentou que eventual inadimplemento do crédito herdado, mesmo que decorrente da falência do devedor, não modifica a responsabilidade dos herdeiros pela dívida, que deve observar o valor do título.

O relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, lembrou o entendimento consolidado na corte segundo o qual, encerrada a partilha, os herdeiros respondem proporcionalmente à parte da herança que lhes coube, até o limite desse acréscimo patrimonial.

Além disso, o ministro destacou que o real valor econômico de uma nota promissória é estabelecido durante a sua circulação no mercado, e frequentemente fica abaixo do valor que lhe foi atribuído no início. “Por se tratar a relação de crédito de manifesta relação de risco, a probabilidade real da mora ou da inadimplência é sopesada para fins de se arbitrar a taxa de desconto efetivamente aplicada nesses negócios com títulos de crédito”, enfatizou.

Avaliação econômica mostrará real valor de mercado
Por esse motivo, o ministro ressaltou que não pode ser concedido caráter absoluto ao valor indicado na escritura de inventário e partilha (o qual correspondia ao valor nominal do título herdado), sob pena de imputação de responsabilidade que extrapola as forças da herança.

O relator salientou que a dificuldade em quantificar a nota promissória não resulta em sua inexistência, já que “mesmo os créditos de difícil recuperação, especialmente em cenário de elevado nível de inadimplência, são objeto de comercialização em mercado específico”.

Para Villas Bôas Cueva, apesar da falência da empresa emissora do título, ele está sujeito à avaliação econômica, impondo-se aos herdeiros a responsabilidade sucessória no limite da herança, dentro do seu valor de mercado real.

Pagamento deve ocorrer antes da penhora
No caso dos autos, o relator observou que não houve circulação do título de crédito, e que a substituição da parte beneficiária se deu por motivo de sucessão. Além disso, a satisfação do crédito somente será viável com a habilitação dos herdeiros no processo falimentar, quando serão verificadas as condições específicas do crédito – inclusive a sua classificação.

O ministro afirmou que o valor expresso na nota promissória não é suficiente para representar as forças da herança, o que só será conhecido com o efetivo pagamento do crédito, ainda que parcial, pela empresa que emitiu o título. Segundo concluiu, essa liquidação deve ocorrer antes da penhora de valores nas contas dos herdeiros, sob pena de serem responsabilizados além do limite herdado.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2168268


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