CNJ: Exigência de validade para procuração em ato notarial é ilegal

Por unanimidade, o Plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou que titulares de cartórios de Minas Gerais se abstenham de exigir procuração atualizada e com prazo de validade para a prática de atos, sem que haja fundamentação para o pedido, sob pena de incorrer em ilegalidade. O entendimento se deu no julgamento de Procedimento de Controle Administrativo (PCA 0007885-89.2023.2.00.0000), durante a 8.ª Sessão Virtual.

A questão teve origem em reclamação contra exigência feita pelo Oficial do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Várzea da Palma, em Minas Gerais, e que condicionou o registro de ato notarial à apresentação de procuração expedida há, no máximo, 30 dias. A decisão considerou que tal prática carece de respaldo legal e impõe ônus aos usuários dos serviços notariais e de registro.

No voto, o relator do processo, conselheiro Marcello Terto, ressalta que o Código Civil não estipula prazo de validade para procurações, exceto nas hipóteses previstas em lei, como no caso de divórcio, ou quando determinado expressamente por quem outorga a procuração. Ao deliberar sobre a questão, Terto advertiu que ainda que provimento conjunto do Tribunal de Justiça de Minas Gerais e da Corregedoria-Geral de Justiça do Estado (artigo 183, § 7.º) preveja a possibilidade de verificar a atualidade dos poderes conferidos, a norma deve ser interpretada de forma compatível com o artigo 150 do Código Nacional de Normas do Foro Extrajudicial da Corregedoria Nacional de Justiça, que não autoriza exigências genéricas sem base legal.

Na fundamentação, o conselheiro enfatizou que as atividades notarial e registral devem respeitar os princípios da legalidade e da razoabilidade, evitando a imposição de exigências que não tenham justificativa plausível. “A exigência genérica de que toda procuração deva ter prazo máximo de expedição de 30 dias não encontra amparo na legislação vigente e caracteriza ato ilegal, salvo nas hipóteses excepcionalmente previstas em lei ou quando houver fundamentação idônea que a justifique”, destacou o voto. A decisão também será comunicada a todos os tribunais de justiça do país, com o objetivo de assegurar a conformidade dos serviços notariais e de registro com as diretrizes nacionais estabelecidas pelo CNJ.

Procedimento de Controle Administrativo – PCA 0007885-89.2023.2.00.0000

TJ/MA: Escola militar é obrigada a autorizar aluno a frequentar as aulas com roupas e cabelo conforme crença religiosa

Uma sentença proferida pelo Poder Judiciário de Santa Inês/MA, por meio da 1ª Vara, concedeu a um aluno o direito de frequentar a Escola Militar, sem precisar cortar o cabelo ou mudar sua vestimenta, que segue os preceitos da Igreja Adventista do Sétimo Dia. No caso, a juíza Ivna Cristina de Melo Freire confirmou uma liminar concedida anteriormente. O caso trata-se de ação movida pela mãe de um aluno, tendo como partes demandadas o secretário municipal de educação e o diretor da escola. A autora alegava que seu filho se submeteu a processo seletivo para ingresso de novos alunos no Colégio Militar Tiradentes XXV e foi aprovado.

Entretanto, após realizar sua matrícula, foi exigido pelo segundo requerido que ele cortasse o cabelo e fizesse uso de vestimenta, no caso, a farda, de mangas curtas na escola, conforme atos normativos internos. Argumentou que, assim como sua família, o aluno segue os preceitos da Igreja Adventista do Sétimo Dia da Reforma Completa, e que, conforme crença religiosa, faz uso, assim como todos os homens que seguem os referidos preceitos, de cabelo na altura da orelha e de vestimentas (camisas) de mangas longas.

Pontuou que informou a referida crença religiosa e apresentou declaração da igreja que frequenta, mas, mesmo assim, foram-lhe exigidos o corte de cabelo e o uso de camisas de mangas curtas, sob pena de não poder frequentar as aulas. Argumentou que a exigência é ilegal e que fere suas liberdades de consciência e de crença e, diante da situação, entrou na Justiça, requerendo a garantia de seu livre acesso ao ambiente escolar, com seus padrões de vestimentas e cabelos, fazendo uso de farda de mangas compridas e cabelo na altura das orelhas. Notificado, o diretor da escola prestou informações e noticiou o cumprimento da liminar.

DIREITOS FUNDAMENTAIS

“A liberdade de consciência e de crença é direito fundamental previsto no art. 5º, VI, da Constituição Federal. Trata-se de liberdade inviolável, o que não significa que é absoluta, o que nenhum direito fundamental é (…) Do mesmo modo, a educação é direito social previsto no art. 6º da Constituição Federal (…) No âmbito escolar, existem limitações específicas aplicadas aos alunos, as quais variam conforme o ambiente escolar (se civil ou militar), as quais decorrem do poder regulamentar da Administração Pública, e que, se forem razoáveis, são legítimas, na medida em que visam manter a disciplina, o bom comportamento, dentre outros”, fundamentou a juíza.

E continuou: “Vale frisar que, embora o corte de cabelo e o uso de fardas diga respeito, também, ao direito de imagem dos alunos, tais direitos não são absolutos e podem ceder, no caso concreto, diante da razoabilidade da exigência (…) Desse modo, as exigências impostas pela direção da escola decorrem de atos normativos internos a serem seguidos por todos os alunos e são importantes para assegurar os valores e alcançar os objetivos traçados pela instituição (…) Todavia, tal fato não impede que, em casos concretos, tais exigências sejam excepcionadas, mormente quando sopesadas com direitos fundamentais dos alunos, como no caso em questão”.

A magistrada, após estudo detalhado do processo, entendeu que as exigências de corte de cabelo e de uso de fardas (camisas) com mangas curtas, apresentadas pelo diretor do Colégio Militar Tiradentes, violam, neste caso, o direito à educação e a liberdade de crença. “É que, se ele não cumprir a referida exigência, não poderá frequentar as aulas (estando violado seu direito à educação) e, se cumpri-la, cortando os cabelos e utilizando fardas de mangas curtas, será tolhido de sua crença religiosa (…) Consta no processo uma declaração de autoridade religiosa, indicando que o impetrante frequenta a Igreja Adventista do Sétimo Dia da Reforma Completa e que seu corte de cabelo e vestuário seguem a doutrina religiosa, sendo manifestações de sua crença”, observou, frisando que o aluno não está visando se eximir de obrigações legais de forma desmotivada, mas alegando motivos de crença religiosa.

Para a Justiça, trata-se de exceção pontual às exigências normativas do Colégio Militar Tiradentes XXV, visando unicamente resguardar os direitos de crença e educação do aluno. “Por outro lado, é certo que ele, assim como os outros alunos, estará sujeito a cumprir os demais atos normativos razoavelmente e legitimamente impostos pelo Colégio, não havendo prejuízos ao bom funcionamento do ambiente escolar (…) Ante o exposto, concedo em parte a segurança pleiteada, para determinar que, desde que o impetrante preencha os demais requisitos legais e infralegais (como a aprovação dentro das vagas e a apresentação de todos os documentos necessários à matrícula, dentre outros), os impetrados lhe assegurem livre acesso ao ambiente escolar, mantendo seu padrão de cabelo atual e as vestimentas inerentes à sua crença religiosa (calça longa e camisa de manga longa).

STF mantém vínculo de emprego entre motoboy e empresa de logística

1ª Turma rejeita recurso da companhia em ação contra decisão da Justiça do Trabalho; motociclista ganhava R$ 3 por entrega.


A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) manteve, por unanimidade, o reconhecimento do vínculo de emprego entre um motoboy e uma empresa de logística e entrega de mercadorias. O colegiado negou um recurso (agravo regimental) da companhia contra decisão individual do relator, ministro Cristiano Zanin.

O vínculo empregatício havia sido reconhecido pela Justiça do Trabalho no Rio de Janeiro. A empresa então acionou o STF com a Reclamação (RCL) 73042, argumentando que a decisão teria violado entendimentos anteriores da Corte sobre o tema. O pedido foi rejeitado pelo relator.

Conforme Zanin, o caso não tem relação com a decisão do Supremo que, na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 48, estabeleceu a competência da Justiça comum para demandas sobre serviços de transporte autônomo rodoviário de cargas . Esse era um dos argumentos da Tex Courier no processo. Para o relator, o motociclista não foi cadastrado como transportador autônomo. Além disso, o ministro destacou que deve ser levada em conta a vulnerabilidade do profissional, que recebia R$ 3 por entrega realizada.

No julgamento, o ministro Luiz Fux levantou a questão de um possível impacto no debate da decisão do ministro Gilmar Mendes no Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1532603. Em abril, ele determinou a paralisação de todos os processos na Justiça que tratem da licitude da contratação de trabalhador autônomo ou pessoa jurídica para a prestação de serviços, a chamada “pejotização”.

Para a Turma, porém, essa não é a discussão tratada no caso. Conforme o ministro Alexandre de Moraes, o debate na reclamação não envolve a validade de novas formas de emprego ou a terceirização. Para ele, havia uma relação de emprego, já que o motoboy tinha subordinação, cumpria horários e recebia horas extras, e a empresa é que atuava como terceirizada dos restaurantes.

Balanço

Ao final da sessão, o ministro Cristiano Zanin, presidente da Primeira Turma, fez um balanço estatístico do colegiado no primeiro semestre do ano. Foram realizadas 23 sessões virtuais e 15 presenciais no período.

A previsão é de que o semestre se encerre com 4.336 julgados. Desses, a maioria (1.419) é de Recursos Extraordinários e Agravos em Recurso Extraordinário. Reclamações (1.167), e Habeas Corpus ou Recursos Ordinários em Habeas Corpus (1.045) vêm na sequência. Foram julgados ainda 125 processos relacionados aos atos de 8 de janeiro de 2023. Os outros 580 casos são de outras classes processuais.

STJ: Plataformas de criptomoedas respondem objetivamente por fraudes em transações de clientes

As plataformas destinadas às transações de criptomoedas respondem de forma objetiva por fraudes na transferência desses ativos, caso a operação tenha seguido as medidas de segurança, como uso de login, senha e autenticação de dois fatores.

Com esse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento ao recurso de um usuário de plataforma de criptomoedas para reconhecer a responsabilidade da empresa pela falha no sistema de segurança.

Segundo o processo, o usuário estava transferindo 0,00140 bitcoins de sua conta na plataforma para outra corretora, quando uma falha no sistema teria resultado no desaparecimento de 3,8 bitcoins da conta, equivalentes, na época, a aproximadamente R$ 200 mil.

De acordo com o usuário, essa falha estaria relacionada ao mecanismo de dupla autenticação da plataforma, que exige login, senha e validação por email para a realização de transações. Ele relatou que, no seu caso, não foi gerado o email de autenticação relativo à transação fraudulenta. A empresa alegou que a fraude ocorreu por uma invasão hacker no computador do usuário, e não por falha da plataforma.

O juízo de primeiro grau condenou a empresa a devolver a quantia perdida e a pagar R$ 10 mil por danos morais, pois ela não comprovou a alegada invasão hacker, nem o envio do email ao usuário antes da transferência. Contudo, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) entendeu que o desaparecimento dos bitcoins decorreu de culpa exclusiva do usuário e de terceiros, e afastou o dever de indenizar.

Instituições financeiras respondem objetivamente por fraudes nas operações
A relatora no STJ, ministra Isabel Gallotti, lembrou que a jurisprudência do tribunal se consolidou no sentido de que “as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias” (Súmula 479).

Entre as instituições financeiras definidas no artigo 17 da Lei 4.595/1964 – acrescentou a ministra –, estão as pessoas jurídicas públicas e privadas que tenham como atividade principal ou acessória a custódia de valores de propriedade de terceiros. Dessa forma, a relatora observou que a empresa de criptomoedas em questão é instituição financeira, constando, inclusive, da lista de instituições autorizadas, reguladas e supervisionadas pelo Banco Central.

“Em se tratando, portanto, de instituição financeira, em caso de fraude no âmbito de suas operações, a sua responsabilidade é objetiva, só podendo ser afastada se demonstrada causa excludente da referida responsabilidade, como culpa exclusiva da vítima ou de terceiros, nos termos do artigo 14, parágrafo 3º, I, do Código de Defesa do Consumidor (CDC)”, apontou.

Isabel Gallotti verificou que, no caso, não foram produzidas provas de que o usuário tivesse liberado informações pessoais para terceiros de maneira indevida ou de que houvesse confirmado a operação contestada por email – provas essas que poderiam afastar a responsabilidade da empresa pela transação fraudulenta.

Ataque hacker não exclui responsabilidade da instituição
Além disso, a ministra destacou que a empresa deveria demonstrar que o usuário atuou de maneira indevida em toda a cadeia de atos necessários para a conclusão da operação, ou seja, que ele fez login e inseriu senha e código PIN para transferir 3,8 bitcoins e, também, que confirmou essa específica operação por meio de link enviado por email.

Na hipótese, a relatora ressaltou que a empresa não apresentou o email de confirmação da transação de 3,8 bitcoins, sendo que tal prova era indispensável para afastar a sua responsabilidade pelo desaparecimento das criptomoedas.

Por fim, a ministra comentou que um ataque hacker no caso não excluiria a responsabilidade da empresa, que responderia pela falta de segurança adequada para combater esses crimes.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2104122

TJ/MT valida posse de imóvel registrada em cartório e rejeita contrato sem firma reconhecida

A Segunda Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) negou provimento a recurso de apelação interposto por uma mulher que tentava anular a posse de um imóvel localizado em Primavera do Leste. A decisão confirmou a validade da arrematação feita em leilão extrajudicial e rejeitou a alegação da apelante de que seria a legítima possuidora do imóvel com base em contrato não registrado e sem firma reconhecida.

Conforme a ação, o caso envolvia a disputa pela posse de um imóvel de 75m², com casa de alvenaria, localizado no bairro Parque Eldorado. A apelante alegava ter comprado o imóvel em 2004 por meio de contrato particular e apresentou testemunhas para comprovar sua posse. Contudo, o bem foi posteriormente dado como garantia fiduciária a um banco por outra pessoa, que perdeu o imóvel em razão de inadimplência.

Após a consolidação da propriedade pelo banco e regular publicação dos editais, o imóvel foi arrematado em leilão extrajudicial por um homem, que posteriormente obteve a posse por meio de ação judicial. Toda a operação seguiu os trâmites previstos na Lei nº 9.514/97.

A relatora do caso, desembargadora Marilsen Andrade Addario, destacou que, embora contratos particulares de compra e venda tenham validade as partes, não produzem efeitos perante terceiros se não forem registrados em cartório e não tiverem firma reconhecida. No caso, o contrato apresentado pela apelante não preenchia esses requisitos mínimos de segurança jurídica.

“O reconhecimento de firma confere maior segurança ao contrato, pois garante que foi assinado pelas pessoas indicadas e na data constante no documento”, afirmou a relatora.

O TJMT reforçou que, quando duas pessoas adquirem o mesmo imóvel, prevalece o direito daquele que primeiro registra a escritura no cartório – mesmo que ambos atuem de boa-fé. No caso concreto, quem arrematou cumpriu todos os procedimentos legais, obteve a escritura pública e registrou a posse regularmente.

A Corte também considerou que os depoimentos apresentados pela apelante não eram suficientes para comprovar a existência do negócio jurídico de forma inequívoca. Além disso, a própria vendedora original do contrato informal já havia tentado anular o leilão por via judicial anteriormente, sem sucesso.

O acórdão invoca entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), segundo o qual a boa-fé de um comprador não pode anular o registro de outro também de boa-fé, desde que este tenha sido mais diligente ao registrar o negócio.

Processo nº: 1007601-48.2020.8.11.0037

TRT/SP: Descumprir normas trabalhistas atenta contra direitos coletivos e não individuais

A 9ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região negou provimento ao recurso de um trabalhador que pleiteava indenização por dano moral, alegando o descumprimento de normas regulamentares (NRs), a ausência de fornecimento de Equipamentos de Proteção Individual (EPI), de exames médicos periódicos e da entrega do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) durante o vínculo empregatício com o Município de Araraquara.

O Juízo da 3ª Vara do Trabalho de Araraquara julgou improcedente o pedido do trabalhador, sob o fundamento de que o descumprimento de norma trabalhista de saúde e segurança extrapola a esfera individual, uma vez que atenta contra direitos de natureza coletiva, de maneira que “não sendo uma coletividade, mas apenas um de seus membros, o autor não é, portanto, titular do direito material postulado”.

Ao apreciar o recurso, a 9ª Câmara manteve a sentença, destacando que o descumprimento de obrigações trabalhistas ligadas à saúde e segurança do trabalhador, por si só, não tem “o condão de acarretar ofensa à honra objetiva do trabalhador, sendo necessário verificar a existência de algum constrangimento ou dano sofrido, o que não foi comprovado”.

Segundo a relatora do acórdão, juíza convocada Juliana Benatti, “o mero desatendimento à legislação trabalhista por parte do empregador, isoladamente, não autoriza a presunção da ocorrência de dano moral”. Para ela, “o descumprimento das obrigações contratuais e da legislação trabalhista, ainda que relativas à saúde do trabalhador, insere-se no âmbito dos danos materiais como, por exemplo, o pagamento do adicional de insalubridade pela ausência de fornecimento do EPI”.

Processo 0011563-28.2023.5.15.0006

STJ: Repetitivo fixa teses sobre exceção à impenhorabilidade do bem de família

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.261), fixou duas teses sobre o bem de família. Na primeira, ficou definido que a exceção à impenhorabilidade do bem de família, nos casos de execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar, prevista no artigo 3º, inciso V, da Lei 8.009/1990, restringe-se às hipóteses em que a dívida foi constituída em benefício da entidade familiar.

A segunda tese estabelece que, em relação ao ônus da prova: a) se o bem foi dado em garantia real por um dos sócios de pessoa jurídica, é, em regra, impenhorável, cabendo ao credor o ônus de comprovar que o débito da sociedade se reverteu em benefício da família; e b) caso os únicos sócios da pessoa jurídica sejam os titulares do imóvel hipotecado, a regra é a penhorabilidade do bem de família, competindo aos proprietários demonstrar que o débito da sociedade não se reverteu em benefício da entidade familiar.

Com a definição das teses, podem voltar a tramitar todos os processos sobre o mesmo assunto que estavam suspensos à espera do precedente, incluindo os recursos especiais e agravos em recurso especial.

Proteção ao bem de família não é absoluta
O ministro Antonio Carlos Ferreira, relator dos recursos representativos da controvérsia, lembrou que o Estado instituiu a proteção ao bem de família para concretizar o direito fundamental à moradia, impedindo que o imóvel urbano ou rural destinado à residência familiar seja penhorado juntamente com os demais bens do devedor.

“O bem funcionalmente destinado à moradia da família está protegido da retirada do patrimônio do devedor, de forma a eliminar ou vulnerar aquele direito fundamental”, afirmou o relator.

Por outro lado, o ministro ressaltou que essa proteção não é absoluta, devendo ser relativizada conforme os outros interesses envolvidos. Segundo explicou, o STJ entende que a exceção à impenhorabilidade prevista no artigo 3º, inciso V, ocorrerá quando o devedor tiver oferecido o imóvel como garantia hipotecária de uma dívida contraída em benefício da própria entidade familiar.

Não é admissível comportamento contraditório do devedor
De acordo com o relator, o devedor que tenta excluir o bem da responsabilidade patrimonial, após dá-lo como garantia, apresenta um comportamento contraditório com a conduta anteriormente praticada (venire contra factum proprium), sendo essa uma postura de exercício inadmissível de um direito e contrária à boa-fé.

O ministro destacou que, embora a garantia do bem de família tenha impactos sobre todo o grupo familiar, a confiança legítima justifica a garantia da obrigação, já que o imóvel foi oferecido pelo próprio membro da família.

“Admitir que a defesa seja oposta em toda e qualquer situação, implicaria o esvaziamento da própria garantia que constituiu o fundamento que conferia segurança jurídica e suporte econômico à contratação posterior”, concluiu.

Veja o acórdão.
Processos: REsp 2093929 e REsp 2105326

TRF3: Instrutor de futevôlei não precisa de registro em Conselho de Educação Física

Para TRF3, atividade não é privativa de profissional inscrito no órgão.


A Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) confirmou sentença que garantiu a um instrutor de futevôlei o direito de exercer a atividade profissional sem a necessidade de efetuar registro no Conselho Regional de Educação Física da 4ª Região (CREF4/SP).

Os desembargadores entenderam que a Lei 9.696/1998 não estabelece a atividade de instrutor de futevôlei como privativa de profissionais de educação física.

“Pontue-se que a Constituição Federal estabelece, como regra geral, a liberdade do exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, a não ser que sejam estabelecidos requisitos especiais por meio de lei”, destacou a desembargadora federal relatora Leila Paiva.

Em primeira instância, a Justiça Federal em São Paulo/SP havia desobrigado o instrutor do registro. O CREF4/SP recorreu ao TRF3, argumentando falta de respaldo legal para não exigir inscrição e formação acadêmica específica.

Ao analisar o caso, a relatora destacou jurisprudência consolidada sobre o tema no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no TRF3. Ela esclareceu que os conselhos de classe não podem adicionar atividades à sua fiscalização, além das previstas legalmente.

“A Lei 14.597/2023 (Lei Geral de Esporte) não proibiu a prática de atividade de treinador de futevôlei àqueles que não detêm formação superior em educação física”, salientou.

A magistrada acrescentou que o STJ, no Tema 1.149, decidiu que técnicos e treinadores de tênis não são obrigados a se inscrever nos Conselhos de Educação Física.

“Deve ser aplicado, analogicamente, ao caso em apreço, o mesmo raciocínio”, acrescentou.

Assim, a Quarta Turma negou provimento ao recurso e determinou que o CREF4/SP se abstenha de exigir o registro para o exercício da atividade de instrutor de futevôlei.

Apelação/Remessa Necessária 5022254-50.2024.4.03.6100

TJ/SP: Casamento em regime de separação de bens não exclui cônjuge da herança

Ausência de descendentes e ascendentes.


A 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão da Vara da Família e das Sucessões de Indaiatuba que negou pedido de abertura de inventário de irmãos e sobrinhos de homem que faleceu sem ter pais, avôs e filhos vivos nem deixar testamento ou documento de transferência de bens. A sentença reconheceu que a cônjuge sobrevivente, casada com o falecido sob o regime de separação obrigatória de bens, é a única herdeira, afastando a legitimidade dos colaterais.

Em seu voto, relator do recurso, desembargador Carlos Castilho Aguiar França, apontou que, não havendo descendentes nem ascendentes do autor, a sucessão legítima defere-se por inteiro ao cônjuge sobrevivente, uma vez que o Código Civil não faz nenhuma distinção em relação ao regime de bens do casamento em casos de falecimento.

O magistrado salientou as diferenças entre dois institutos jurídicos distintos: o regime de bens no casamento e o direito sucessório. “O regime de bens, seja ele qual for, regula as relações patrimoniais entre os cônjuges durante a vigência do matrimônio, disciplinando a propriedade, administração e disponibilidade dos bens, bem como a responsabilidade por dívidas”, salientou. “Por outro lado, o direito sucessório regula a transmissão de bens, direitos e obrigações em razão da morte. A vocação hereditária, estabelecida no artigo 1.829 do Código Civil, determina a ordem de chamamento dos herdeiros para suceder o falecido. O artigo 1.829, III, do Código Civil é expresso ao estabelecer que, na ausência de descendentes e ascendentes, o cônjuge sobrevivente herda a totalidade do patrimônio do falecido, sem qualquer condicionante relacionada ao regime de bens adotado”, reforçou.

Participaram do julgamento, de votação unânime, os magistrados Mauricio Velho e Vitor Frederico Kümpel.

Apelação nº 1010433-44.2024.8.26.0248

TJ/MA: Distribuidora de energia deve retirar poste de terreno alheio

Emprresa não prestou o serviço público de forma regular e adequada.


Decisão do Juizado Especial Cível e Criminal de Santa Inês/MA. condenou uma distribuidora de energia a retirar, em 30 dias, um poste instalado dentro de uma propriedade privada, e a pagar R$ 5 mil por danos morais solicitados na ação.

A decisão, do juiz Samir Araújo Mohana Pinheiro, titular do Juizado, deu razão ao pedido da mulher, que ajuizou a ação, alegando que no seu imóvel foi instalado um poste de energia elétrica, que impediu o uso, construção e reforma de sua casa.

Segundo a ação, a mulher comprovou que há mais de três anos tenta junto à distribuidora fazer a retirada de um poste de sua propriedade; que fez a solicitação em 04/05/2022 e entrou em contato com a empresa por diversas vezes, sem resposta até a presente data.

RESPONSABILIDADE DA CONSESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA

A distribuidora sustentou que o poste foi colocado naquele local há muitos anos, e que, ao adquirir o terreno, a mulher sabia da servidão de passagem da rede elétrica. Alegou também que o serviço de retirada do poste solicitado “é de grande complexidade”.

Na decisão, o juiz considerou que – em geral -, quem deve custear a remoção de poste de energia elétrica de seu interesse é a própria pessoa consumidora, a não ser que seja demonstrada a irregularidade na sua instalação, transferindo essa responsabilidade para a concessionária de energia elétrica.

Nesse caso, conforme demonstram fotografias juntadas ao processo, dentro do terreno de propriedade da mulher está instalado um poste, de responsabilidade da distribuidora de energia elétrica , que lhe impede o uso pleno do imóvel e a construção de um muro.

INSTALAÇÃO IRREGULAR

As fotografias demonstram, ainda, que o poste não foi instalado regularmente, pois se mantém dentro dos limites da propriedade. Além disso, está com sua estrutura danificada, com ferros expostos, gerando risco à vida e à segurança de todas as pessoas que passam pela rua.

O juiz concluiu que, estando o poste de energia elétrica impedindo o pleno uso da propriedade, em especial o direito de construção do muro, a distribuidora não prestou de o serviço público a que estava obrigada, de forma regular e adequada, sendo, portanto, responsável pelo custeio decorrente da remoção, conforme o Código de Defesa do Consumidor.

A decisão também ressaltou que o caso não trata de pretensão de ordem estética ou para mero deleite da autora, mas sim para pleno exercício do seu direito constitucional de propriedade. “Acresça-se que, ainda que a instalação do poste tenha ocorrido há muito tempo, certo é que ele foi assentado de forma inadequada, pois posicionado dentro do lote da autora e não na divisa do imóvel, em desconformidade com aquilo que determina a lei”, declarou o juiz na sentença.


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