TJ/MS: Lei que determina fornecimento de merenda nas férias escolares é inconstitucional

Os desembargadores do Órgão Especial, por unanimidade, julgaram procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade impetrada pelo Município de Campo Grande objetivando o reconhecimento da inconstitucionalidade da Lei Municipal n. 5.610/2015, que dispõe sobre o fornecimento obrigatório de merenda escolar durante as férias, na rede pública municipal de ensino.

O Executivo Municipal sustentou que a lei viola os artigos 1º, II; 2º; 14; 67, §1º, II, “d” e 160, I, II e III, todos da Constituição Estadual de MS, e aponta que o ato legislativo afronta os princípios da divisão, harmonia e independência dos poderes municipais, bem como o princípio da reserva de iniciativa.

A Câmara Municipal de Campo Grande se manifestou apontando que a matéria tratada na lei é de sua competência, referindo-se ao direito à educação e garantindo o atendimento ao educando. Defendeu também não estarem presentes os requisitos ensejadores da concessão da medida cautelar, postulando pelo respectivo indeferimento.

O Município requereu a concessão da medida cautelar para que seja determinada a imediata suspensão da eficácia da norma e o julgamento da ação, com a consequente declaração da inconstitucionalidade da referida lei. A Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pela procedência da ação, declarando a inconstitucionalidade da lei.

No entender dos julgadores, a lei municipal está efetivamente em desconformidade com o que dispõem os artigos da Carta Estadual que versam sobre o princípio da independência e harmonia dos poderes, princípio da reserva de iniciativa e a criação de despesa sem previsão orçamentária, sobretudo por impor ao ente federativo a obrigatoriedade do fornecimento de merenda escolar da rede pública municipal durante o período de férias escolares, invadindo seara exclusiva da administração pública, além de criar despesa sem criar simultaneamente a fonte respectiva de custeio.

Em seu voto, o relator do processo, Des. João Maria Lós, lembrou que a lei municipal atacada é oriunda de projeto de lei de iniciativa do Poder Legislativo Municipal e que, após aprovado, foi vetado pelo chefe do Executivo. Contudo, o veto foi rejeitado pela Câmara Municipal de Campo Grande e o projeto foi promulgado e convertido na Lei Municipal n. 5.610/2015.

O desembargador destacou que cabe privativamente ao Poder Executivo a função de administrar, envolvendo atos de planejamento, organização, direção e execução de políticas e de serviços públicos. Assim, para o relator, os atos de concretude cabem ao Poder Executivo enquanto ao Poder Legislativo estão deferidas as funções de editar atos normativos dotados de generalidade e abstração.

“Em que pese a nobre intenção do legislador local de disponibilizar alimentação a alunos carentes no período das férias escolares, verifica-se a relevância das fundamentações nas alegações da parte autora, porquanto não se pode descartar os comandos constitucionais atinentes à iniciativa do processo legislativo de acordo com o conteúdo do que nele se estabelece, sobretudo por implicar diretamente no planejamento orçamentário e na organização administrativa municipal, cuja atribuição é privativa do Poder Executivo. Ante o exposto, julgo procedente a presente ação, declarando a inconstitucionalidade da Lei Municipal n. 5.610/ 2015”, concluiu o Des. João Maria Lós.

STF: Associação de advogados questiona autorização para execução provisória de penas superiores a 15 anos

A alteração no CPP entrou em vigor no ano passado e, segundo a entidade, viola o princípio da presunção de inocência e a jurisprudência do Supremo.


A Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (Abracrim) ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra a alteração introduzida pelo Pacote Anticrime (Lei 13.964/2019) no Código de Processo Penal (CPP) que autorizou a execução provisória da pena de prisão superior a 15 anos de reclusão. A ADI 6735 foi distribuída, por prevenção, ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luiz Fux, relator de outra ação sobre a matéria.

A Lei 13.964/2019 alterou, no CPP, a previsão da alínea “e” do inciso I e dos parágrafos 3º, 4º, 5º e 6º do artigo 492, autorizando a execução provisória de pena de prisão superior a 15 anos. Segundo a Abracrim, a mudança viola a presunção de inocência, garantia constitucional que só autoriza o cumprimento da pena após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Além disso, segundo a associação, o dispositivo contraria a decisão do Supremo no julgamento conjunto das Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) 43, 44 e 54, em que foi reconhecido que a execução provisória da pena não é admitida, nos termos da Constituição.

Para a entidade, é necessário “evitar a insegurança jurídica com a vigência de dispositivo legal que afronta, diretamente, a ordem constitucional” e para que não se fique “à mercê de apreciação aleatória dos tribunais estaduais ou federais e mesmo dos juízos de primeiro grau”.

STJ: Multa por litigância de má-fé em embargos de terceiro é encargo da massa falida

Por unanimidade, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que os encargos da massa falida incluem as sanções por litigância de má-fé decorrentes de condenação em qualquer ação proposta pela massa ou contra ela, e não apenas no curso de processo falimentar. O colegiado entendeu também que os encargos da massa devem ser pagos com preferência sobre os demais créditos admitidos na falência, observadas as ressalvas previstas no artigo 124 do Decreto-Lei 7.661/1945 – legislação falimentar revogada sob a qual tramitou o processo julgado.

A Quarta Turma deu provimento ao recurso especial de uma construtora que, em embargos de terceiro, obteve a condenação da massa falida em multa por litigância de má-fé, fixada em cerca de R$ 211 mil. Na origem, a construtora ingressou com os embargos de terceiro porque um imóvel de sua propriedade foi arrecadado pelo síndico da massa.

Em primeira e segunda instâncias, foi indeferido o pedido da construtora para o pagamento imediato da multa, rejeitando-se a tese de que tal penalidade configuraria encargo da massa.

Segundo a decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), o enquadramento das penas processuais como custas judiciais e, consequentemente, como encargos da massa estaria limitado ao processo de falência e, na situação dos autos, a condenação por litigância de má-fé ocorreu no âmbito de embargos de terceiro – ou seja, uma ação diversa.

Previsão legal
Em seu voto, o relator do recurso especial, ministro Antonio Carlos Ferreira, afirmou que os embargos de terceiro possuem “estreita relação” com o processo de execução coletiva, devido à sua natureza de ação incidental. Ainda de acordo com o ministro, o artigo 124 do Decreto-Lei 7.661/1945 estabelece que os encargos da massa falida são constituídos por todas as custas judiciais relacionadas a qualquer processo do qual ela seja parte.

O magistrado mencionou precedente do STJ no sentido de que a lei falimentar “estabeleceu como encargos da massa falida as custas judiciais do processo da falência, dos seus incidentes e das ações em que a massa for vencida, as quais compreendem taxas judiciárias, emolumentos, verbas dos peritos, publicações, entre outras”.

Quanto à caracterização da pena aplicada à massa, o relator destacou que, conforme o artigo 35 do Código de Processo Civil de 1973, as sanções impostas por litigância de má-fé são consideradas custas judiciais. Assim, segundo Antonio Carlos Ferreira, a conjugação desse dispositivo com a norma inscrita no artigo 124 da revogada lei de falências permite compreender a indenização por litigância de má-fé como encargo da massa.

“Desse modo, o crédito da recorrente – proveniente da condenação da massa falida por litigância de má-fé, legalmente qualificada como custas – caracteriza-se como encargo da massa, pouco importando que a condenação tenha se dado no próprio processo falimentar ou em ação autônoma”, concluiu o relator.

A decisão da Quarta Turma reformou o acórdão do TJRS para determinar o pagamento do crédito da construtora sem a necessidade de habilitação no concurso de credores da falência, respeitadas as ressalvas legais do artigo 124 do Decreto-Lei 7.661/1945.

TJ/AC passa a adotar flexão de gênero para nomear profissão ou demais designações na comunicação social e institucional

Medida atende a Resolução 376/2021 do Conselho Nacional da Justiça e leva em consideração a importância de espaços democráticos e institucionais com tratamento igualitário entre homens e mulheres.


O Tribunal de Justiça do Acre (TJAC) passará a adotar a flexão de gênero para nomear profissão ou demais designações. A medida atende a Resolução 376/2021, do Conselho Nacional da Justiça (CNJ), que está em vigor desde o dia 2 de março. A resolução torna obrigatório o emprego da flexão de gênero para nomear profissão ou demais designações na comunicação social e institucional de todo o Poder Judiciário.

A desembargadora-presidente do TJAC Waldirene Cordeiro, encaminhou expediente à todas as unidades judiciárias e administrativas do Poder Judiciário do Acre para ciência e providências cabíveis para implementação da resolução que levam em consideração a importância de espaços democráticos e institucionais com tratamento igualitário entre homens e mulheres.

A regra engloba as carteiras de identidade funcionais, documentos oficiais, placas de identificação de setores, dentre outros. O segundo parágrafo do ato normativo define que a designação distintiva se aplica à identidade de gênero dos transgêneros, bem como à utilização de seus respectivos nomes sociais.

Com a medida, todas suas unidades e ramos do Poder Judiciário do Acre deverá adotar a designação distintiva para todas e todos integrantes, incluindo desembargadores e desembargadoras, juízes e juízas, servidores e servidoras, assessores e assessoras, terceirizados e terceirizadas, estagiários e estagiárias.

TJ/MS: Prestação de serviços de forma irregular isenta órgão público de pagamento

A prestação de serviços a ente público de forma irregular (sem licitação) exime o referido órgão do pagamento dos supostos serviços prestados. Este foi o entendimento de sentença proferida pela 3ª Vara de Fazenda Pública e de Registros Públicos de Campo Grande, que julgou improcedente ação movida por uma empresa contra fundação de saúde pública, na qual a autora se dizia credora da quantia de quase R$ 103 mil referentes ao fornecimento de kits para diálise a pacientes de um hospital público.

Para fundamentar a negativa do pedido, a sentença citou que a Constituição Federal e a legislação em vigor são expressas ao determinar a necessidade de realização prévia de licitação para que a administração pública contrate um particular para prestar serviços. E assim, ao agir de forma contrária, isso implicaria na ofensa dos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência e isonomia, de modo que acolher o pedido da autora seria incorrer em dano ao patrimônio público, isto porque não foi realizado procedimento licitatório regular.

Em sua petição inicial, a empresa autora alegou que é empresa renomada no ramo hospitalar, estando presente em mais de 120 países e que fabrica e comercializa máquinas de hemodiálise e demais equipamentos médicos para hemofilia e doença renal.

Afirma que, entre seus produtos, fornece à fundação de saúde pública ré um kit de diálise peritoneal (CAPD/DPA) instalado no abdômen dos pacientes, promovendo a limpeza contínua das toxinas do organismo.

Defende que, com base nas prescrições médicas que lhe são encaminhadas por meio eletrônico, fornece os kits de CAPD/DPA aos pacientes atendidos pela ré, inclusive entregando os kits diretamente aos pacientes em suas residências e realiza o faturamento em nome do hospital, formando-se uma relação de compra e venda, de modo que é credora do valor de R$ 102.948,33, pedindo assim que a ré seja condenada a lhe pagar o valor devido.

Em contestação, a fundação de saúde alegou que não reconhece o montante cobrado, pois a empresa autora não comprovou o amparo legal das despesas, bem como não provou que a entrega dos kits foi precedida de qualquer empenho como determina a lei, lembrando que em matéria de despesas públicas é necessário haver regular contratação e empenho prévio à posterior liquidação de despesas.

Argumentou também que a nota de empenho pressupõe vencidas todas as fases anteriores da execução das despesas. Além disso, ressaltou que nos autos não há provas relacionadas às prescrições médicas com as despesas constantes nas notas fiscais e que os documentos juntados não demonstram que são efetivamente de pacientes do hospital público. Desse modo, pediu que a ação fosse julgada improcedente.

Conforme analisou o juiz Ricardo Galbiati, a empresa autora firmou contrato com a ré em 31 de julho de 2009, com vigência de um ano, o qual foi prorrogado por meio de três termos aditivos, sendo que o último termo aditivo estipulou a prorrogação do contrato até 30 de julho de 2013.

Observou também que no dia 12 de julho de 2013 a ré encaminhou à autora ofício solicitando manifestação por escrito quanto ao interesse da empresa na prorrogação do contrato por mais três meses e por igual valor, sendo que a ré respondeu no dia 1º de agosto de 2013, que não seria possível a prorrogação do contrato, por ausência de amparo legal, tendo em vista que, para continuar fornecendo os kits seria necessário regularizar a situação com o órgão, por meio de nova licitação ou uma dispensa de licitação para compra emergencial.

Todavia, em réplica, a autora afirmou que o contrato foi prorrogado de forma verbal a partir de julho de 2013. No entanto, continuou o juiz, “de acordo com os ofícios encaminhados, a autora tinha conhecimento da irregularidade nas prorrogações sucessivas, manifestando seu entendimento de que não seria possível uma nova prorrogação por falta de previsão na Lei de Licitações”.

Sobre a referida lei, o juiz cita que esta veda a formalização de contrato por prazo indeterminado, bem como sua prorrogação somente pode ocorrer em situações excepcionais e de forma justificada. “No caso em tela, verifica-se que a autora tem conhecimento do prazo final do contrato administrativo e da necessidade que a Administração Pública tem de realizar nova licitação. A manutenção de um contrato expirado viola os princípios da Administração Pública e da Licitação”, destacou o magistrado.

“Ainda que se prove a realização do serviço, participou de uma contratação ilegal da qual não pode sequer alegar desconhecimento, uma vez tem conhecimento que o contrato não poderia mais ser renovado, sob pena de violação da Lei de Licitações e, portanto, não pode pretender receber pela prestação irregular de serviços”, finaliza o magistrado.

Nota de Pesar pelo falecimento do Advogado Dr. Aires Gonçalves

É com grande pesar que recebemos a triste notícia do falecimento de nosso querido amigo Dr. Aires Gonçalves, natural de Bela Vista/MS, exemplar Advogado tributarista, mestre e Professor Universitário, membro da Comissão de Direito Processual da OAB e do Conselho Científico da Academia Brasileira de Direito Tributário, foi procurador do Estado de MS, e nas horas vagas era músico, compositor e interprete da música Sul-mato-grossense.  O vazio deixado pela sua partida será sempre lembrado pelas inestimáveis lições de humildade, alegria em tudo que fazia e grande profissionalismo com que nos brindava a cada contato.

Pedimos a Deus que o ampare e conforte o coração dos familiares neste triste momento de dor e aflição e que sua lembrança esteja sempre viva em nossas mentes.

Equipe Sedep

TRF4: Pessoas com HIV têm direito à isenção de imposto de renda mesmo que não apresentem sintomas

Pessoas com o vírus HIV fazem jus à isenção do imposto de renda mesmo que não apresentem sintomas da síndrome da imunodeficiência adquirida. Esse foi o entendimento firmado pela Turma Regional de Uniformização (TRU) dos Juizados Especiais Federais (JEFs) da 4ª Região durante sessão telepresencial de julgamento realizada na última semana (19/3).

O pedido de uniformização de jurisprudência foi suscitado por um homem de 63 anos com HIV, morador de Capão de Canoa (RS), que buscava a declaração da inexigibilidade do imposto de renda da pessoa física (IRPF) sobre a sua aposentadoria.

A questão chegou à TRU após ele recorrer da decisão da 5ª Turma Recursal do Rio Grande do Sul, apontando divergência de entendimento em relação à um acordão da 1ª Turma Recursal do Paraná ao julgar caso semelhante.

Enquanto a decisão judicial do colegiado gaúcho considerou que somente possuem direito à isenção tributária as pessoas que manifestem sintomas da Aids ou de outra doença causada em razão do vírus, a Turma paranaense adotou o posicionamento de que a isenção também deve ser garantida aos assintomáticos.

Desnecessidade de sintomas para a concessão da isenção

De acordo com o relator do caso na TRU, juiz federal Antônio Fernando Schenkel do Amaral e Silva, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) não exige a comprovação da contemporaneidade da doença para fins da isenção do imposto de renda prevista no artigo 6º, inciso XIV, da Lei n° 7.713/88.

“Independentemente dos sintomas, há a prescrição para uso da medicação específica, comumente chamada de coquetel. Tal prescrição é utilizada justamente para tentar impedir o desenvolvimento da doença, situação que, com a evolução dos tratamentos e dos fármacos utilizados, tem-se mostrado cada vez mais comum”, frisou o magistrado em seu voto.

Segundo o juiz, a isenção de imposto sobre a aposentadoria ou pensão tem por finalidade permitir que pessoas com doença grave tenham melhores condições de vida e de controle da enfermidade. Ainda conforme o relator, em determinados casos, a manutenção do benefício se justifica mesmo após o controle da doença, com o objetivo de garantir o melhor acompanhamento possível para a pessoa doente.

“Isso porque, apesar de determinados tratamentos ensejarem a falsa compreensão de que o agravo foi efetivamente afastado, exige-se permanente e disciplinado controle, com o objetivo de evitar a recidiva”, acrescentou o magistrado.

TRT/GO aplica “distinguishing” e absolve restaurante de indenização substitutiva a gestante que se negou a retornar ao trabalho

A recusa injustificada da empregada gestante à proposta de retorno ao trabalho, feita pelo empregador de maneira espontânea, tão logo tomou conhecimento da gravidez, implica renúncia a essa garantia, por demonstrar claramente a falta de interesse da empregada na manutenção do posto de trabalho, evidenciando a prática de abuso do direito. Esse foi o entendimento da 1ª Turma do TRT de Goiás ao aplicar o distinguishing (técnica da distinção) para afastar a aplicação da Súmula 38 do TRT de Goiás, que garantiria indenização substitutiva.

Conforme os autos, a mulher trabalhava como saladeira em um restaurante de Goiânia e havia sido dispensada sem justa causa em agosto de 2019, tendo recebido as verbas rescisórias devidas. Quase quatro meses depois ela procurou o restaurante para informar a gestação, que já contava cerca de sete meses. Na ocasião, conforme os autos, a empresa teria oferecido o emprego de volta à mulher, mas ela se recusou sob a justificativa de que passou a residir em Goianira e teria dificuldades para se deslocar até Goiânia.

Após o nascimento do bebê, a mulher ajuizou uma ação trabalhista pedindo a indenização substitutiva em razão da estabilidade provisória da empregada gestante. No primeiro grau, o Juízo da 14ª Vara do Trabalho de Goiânia havia entendido que a recusa da autora a retornar ao emprego, ainda que injustificada, não implica renúncia à garantia de emprego, tendo condenado o restaurante ao pagamento da indenização do período estabilitário, conforme o entendimento da Súmula 38 do Regional. Inconformado, o restaurante recorreu ao Tribunal.

Voto do relator

O caso foi analisado pelo desembargador Gentil Pio, relator. Ele observou que na manifestação inicial no processo a autora já havia demonstrado seu desinteresse em retornar ao emprego. “É certo que o fato de ela residir em Goianira exigiria maior esforço para deslocar-se ao local de trabalho, mormente pelo seu estado gravídico. Todavia, trata-se de cidade da região metropolitana, que conta com serviço regular de transporte que sequer se caracteriza como intermunicipal”, considerou o magistrado ao destacar que diariamente inúmeros moradores dos municípios vizinhos trabalham em Goiânia sem qualquer impedimento.

O desembargador também entendeu não ser crível que a autora tenha tomado conhecimento de sua gravidez somente no sétimo mês, “o que leva ao entendimento de que ela poderia ter informado anteriormente ao empregador a sua condição para ser reintegrada quando ainda não apresentasse os incômodos do final da gestação”.

Distinguishing

Gentil Pio concluiu que a intenção da reclamante, na verdade, foi de obter, exclusivamente, a indenização pecuniária, sem a devida contraprestação do trabalho. Ele destacou, no entanto, que a indenização não é o objetivo primeiro da garantia constitucional de estabilidade à gestante (artigo 10, II, b, do ADCT da Constituição Federal). “É certo que a proteção à maternidade tem por objetivo principal a proteção do nascituro. Entretanto, não é lícito nem razoável atribuir à empregadora essa responsabilidade quando a empregada grávida dispensada se distancia das regras básicas da boa-fé, agindo com evidente abuso do direito, em prejuízo intencional à reclamada”, ponderou.

Assim, o relator aplicou ao caso a técnica do distinguishing para afastar a aplicação do entendimento consubstanciado na Súmula 38 do TRT de Goiás. Os demais julgadores da 1ª Turma acompanharam o entendimento do relator para reformar a decisão e absolver o restaurante da condenação ao pagamento de indenização decorrente da garantia de emprego.

Conceito de Distinguishing conforme professor Fredie Didier Jr.:

Fala-se em distinguishing (ou distinguish) quando houver distinção entre o caso concreto (em julgamento) e o paradigma, seja porque não há coincidência entre os fatos fundamentais discutidos e aqueles que serviram de base à ratio decidendi (tese jurídica) constante no precedente, seja porque, a despeito de existir uma aproximação entre eles, algumas peculiaridades no caso em julgamento afasta a aplicação do precedente. (Fonte: Curso de Direito Processual Civil. Vol. 2. 8ª ed. Salvador: Jus Podivm, 2013)

Processo n° 0010179-27.2020.5.18.0014

TJ/DFT: Candidato que responde a inquérito ou ação penal não pode ser excluído de concurso

A 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, por unanimidade, acolheu o recurso apresentado por candidato e anulou o ato administrativo do Distrito Federal, que o excluiu do concurso para o cargo de policial militar, na fase de sindicância de vida pregressa e investigação social. Dessa forma, o ente governamental deve mantê-lo no concurso e consequentemente, nomeá-lo, caso não haja outro motivo para sua exclusão.

Segundo o candidato, o DF o excluiu indevidamente do certame, em razão de processo criminal ao qual responde e foi absolvido, mas que ainda não transitou em julgado, ou seja, cabe recurso da decisão. Assim, ajuizou ação para anular o ato, mas em 1a instância seu pedido foi negado. Irresignado, recorreu da sentença, mas também não obteve êxito. Contra o acordão do órgão colegiado, apresentou recurso de embargos de declaração, requerendo a modificação da decisão.

Os magistrados explicaram que, após o julgamento anterior (na esfera recursal), sobreveio posicionamento do Supremo Tribunal Federal no sentido de não ser possível restringir a participação de candidato em concurso público pelo simples fato de responder a inquérito policial ou ação penal. Assim, modificaram o julgado e declararam a nulidade da exclusão pelo motivo apresentado e determinaram que o DF mantenha o candidato no concurso em questão.

PJe2: 0722145-28.2019.8.07.0016

 

STF: Transexuais e travestis com identificação com gênero feminino poderão optar por cumprir pena em presídio feminino ou masculino

Ministro do STF se baseou em documentos do governo federal elaborados por meio de interlocução com associações representativas de grupos LGBTI.


O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou nesta sexta-feira (19) que presas transexuais e travestis com identidade de gênero feminino possam optar por cumprir penas em estabelecimento prisional feminino ou masculino. Nesse último caso, elas devem ser mantidas em área reservada, como garantia de segurança.

Barroso ajustou os termos de medida cautelar deferida em junho de 2019, na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 527.

Na cautelar deferida anteriormente, o ministro havia determinado que presas transexuais femininas fossem transferidas para presídios femininos. Quanto às presas travestis, ele registrou, à época, que a falta de informações, naquele momento, não permitia definir com segurança, à luz da Constituição Federal, qual seria o tratamento adequado a ser conferido ao grupo.

Notável evolução

Ao ajustar os termos de sua decisão, o ministro registrou que dois documentos juntados posteriormente aos autos pelo governo federal acrescentam importantes informações à instrução do processo e sinalizam uma “notável evolução” do entendimento do Poder Executivo quanto ao tratamento a ser conferido a transexuais e travestis identificados com o gênero feminino no âmbito do sistema carcerário.

São eles o relatório “LGBT nas prisões do Brasil: diagnóstico dos procedimentos institucionais e experiências de encarceramento”, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MDH), e a Nota Técnica 7/2020, do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP).

O relatório apresenta uma ampla pesquisa de campo com a população LGBT encarcerada e chega à conclusão de que a decisão mais adequada do ponto de vista da dignidade de tais grupos, extremamente vulneráveis e estigmatizados, não implicaria apenas olhar para questões de identidade de gênero, tais como direito ao nome, à alteração de registro e ao uso de banheiro, mas também para as relações de afeto e múltiplas estratégias de sobrevivência que eles desenvolvem na prisão.

Nesse sentido, aponta que o ideal é que a transferência ocorra mediante consulta individual da travesti ou da pessoa trans. Na mesma linha, a nota técnica também defende que a transferência seja feita após a manifestação de vontade da pessoa presa. Ambos os documentos defendem que a detenção em estabelecimento prisional masculino deve ocorrer em ala especial, que assegure a integridade do indivíduo.

Diálogo institucional

Segundo Barroso, essa evolução de tratamento dado à matéria no âmbito do Poder Executivo decorre do diálogo institucional ensejado pela judicialização da matéria, que permitiu uma “saudável interlocução” com associações representativas de interesses desses grupos vulneráveis, o Executivo e o Judiciário.

Ele acrescentou não haver “dúvida” de que a solução sinalizada por ambos os documentos se harmoniza com o quadro normativo internacional e nacional de proteção das pessoas LGBTI, no sentido de ser dever dos Estados zelar pela não discriminação em razão da identidade de gênero e orientação sexual, bem como de adotar todas as providências necessárias para assegurar a integridade física e psíquica desses grupos quando encarcerados.

No Brasil, disse ele, o direito das transexuais femininas e travestis ao cumprimento de pena em condições compatíveis com a sua identidade de gênero decorre, em especial, dos princípios constitucionais do direito à dignidade humana, à autonomia, à liberdade, à igualdade, à saúde, e da vedação à tortura e ao tratamento degradante e desumano.

Decorre também da jurisprudência consolidada no STF no sentido de reconhecer o direito desses grupos a viver de acordo com a sua identidade de gênero e a obter tratamento social compatível com ela.

O ministro ressaltou ainda que, dentre os Princípios de Yogyakarta, documento aprovado em 2007 pela comunidade internacional com o objetivo de produzir standards específicos para o tratamento da população LGBTI, o de número 9 recomenda que, caso encarceradas, essas pessoas possam participar das decisões relacionadas ao local de detenção adequado à sua orientação sexual e identidade de gênero.

Preceitos fundamentais

A ADPF 527 foi ajuizada pela Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT) e questiona decisões judiciais contraditórias na aplicação da Resolução Conjunta da Presidência da República e do Conselho de Combate à Discriminação 1/2014, que estabeleceu parâmetros de acolhimento do público LGBT submetido à privação de liberdade nos estabelecimentos prisionais brasileiros.

A entidade argumenta que alguns juízos de execução penal estariam interpretando a norma de forma a frustrar a efetivação dos direitos desses grupos a tratamento adequado no âmbito do sistema carcerário, resultando em violação aos preceitos fundamentais da dignidade humana, da proibição de tratamento degradante ou desumano e do direito à saúde.

Veja a decisão.
Processo relacionado: ADPF 527


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