STJ afasta multa e honorários sobre crédito que recuperanda não podia quitar voluntariamente

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o crédito sujeito ao processo de recuperação judicial, decorrente de ação que demandava quantia ilíquida, não pode ser acrescido da multa e dos honorários advocatícios previstos para a hipótese de recusa ao cumprimento voluntário de sentença (artigo 523, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil de 2015).

O caso analisado diz respeito a ação declaratória de inexistência de débito com pedido de indenização, em fase de cumprimento de sentença, ajuizada por uma consumidora contra operadora de telefonia em recuperação judicial. A empresa foi condenada por ter incluído indevidamente o nome da consumidora em cadastro restritivo de crédito.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) reconheceu a sujeição do crédito da consumidora aos efeitos da recuperação, mas determinou que o valor fosse acrescido da multa e dos honorários previstos no artigo 523, parágrafo 1º, do CPC.

No recurso ao STJ, a operadora de telefonia alegou que a conclusão do TJRS viola o princípio da igualdade entre os credores.

Habilitação do crédito
Segundo a relatora, ministra Nancy Andrighi, “o fato gerador do crédito em discussão é anterior ao pedido de recuperação, de modo que não há dúvidas acerca de sua sujeição aos efeitos do processo de soerguimento”.

No entanto – observou a magistrada –, em se tratando de crédito decorrente de ação na qual se demanda quantia ilíquida, o artigo 6º, parágrafo 1º, da Lei 11.101/2005 determina que a ação de conhecimento prossiga no juízo original até a definição do valor do crédito, quando então deverá ser habilitado no quadro geral de credores, ficando impedido a partir daí o andamento da execução singular.

Além disso, a relatora destacou que, conforme o artigo 59, caput, da Lei 11.101/2005, o plano de recuperação implica novação dos créditos anteriores ao pedido, e o pagamento das dívidas da recuperanda deve respeitar as condições pactuadas, sempre com respeito à igualdade de tratamento entre os credores de cada classe.

Obrigação inexigível
Para Nancy Andrighi, diante de tais circunstâncias, a fase de cumprimento da sentença nem poderia ter sido iniciada, pois a liquidação do crédito só ocorreria depois de devidamente habilitado e de acordo com as disposições do plano de recuperação.

Assim – concluiu a ministra –, não se pode considerar que houve recusa voluntária ao pagamento, que seria a causa de aplicação da multa e dos honorários previstos no parágrafo 1º do artigo 523 do CPC, “uma vez que o adimplemento da quantia reconhecida em juízo, por decorrência direta da sistemática prevista na Lei 11.101/2005, não constituía obrigação passível de ser exigida da recuperanda”.

Ao dar provimento ao recurso especial, a relatora acrescentou que, estando em curso processo recuperacional, a livre disposição, pela devedora, de seu acervo patrimonial para pagamento de créditos individuais sujeitos ao plano de soerguimento violaria o princípio segundo o qual os credores devem ser tratados em condições de igualdade.

Veja o acórdão.
Processo n° 1.873.081 – RS (2020/0106169-7)

TJ/SP: Titularidade de recebíveis em vendas de comércio eletrônico é dos lojistas e não de subcredenciadora

Questão apreciada no âmbito da falência da Rakuten.


A 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão de primeira instância reconhecendo que a titularidade de recebíveis provenientes das vendas em plataforma digital da massa falida do Grupo Gencomm/Rakuten deve ser dos lojistas, e não da subcredenciadora.

De acordo com os autos, enquanto ainda operava no Brasil, a Gencomm/Rakuten usou como garantia de financiamento bancário créditos oriundos das vendas de mais de 800 lojistas que usavam sua plataforma digital para realizar transações – uma vez que lhe cabia a custódia dos valores para gestão de pagamento das transações. Após a decretação de falência da empresa, travou-se discussão sobre a titularidade dos recebíveis.

No acórdão, o relator do agravo, desembargador Azuma Nishi, explicou a controvérsia. “Pela leitura das disposições contratuais supracitadas, verifica-se que o único serviço prestado pelo Grupo Gencomm era o de hospedagem de e-commerce e gerenciamento de pagamento, recebendo, em contraprestação, um percentual sobre o faturamento. Desse modo, forçoso concluir que os valores pertencentes aos estabelecimentos comerciais, oriundos das vendas de seus produtos na plataforma e-commerce não eram objeto de depósito junto às instituições de pagamento, mas sim de custódia, tendo-se, com clareza, que não eram de titularidade da falida, mas dos usuários finais, que contrataram as empresas visando operar e expandir suas atividades econômicas, com a estrutura necessária para processar os pagamentos. É evidente que o foco da contratação pelo lojista foram os serviços de meio de pagamento, mas nunca a cessão dos créditos, ainda mais sem contrapartida financeira”, escreveu o magistrado.

Azuma Nishi destacou que as falidas, ao conferirem como garantia de financiamento bancário créditos que não lhe pertenciam, “certamente o fizeram contrariando princípios de boa-fé, levando-as a um superendividamento, pois o valor tomado é absolutamente incompatível com os montantes de receitas próprias decorrentes de tarifas de serviços por elas prestados, que representa apenas um pequeno percentual dos pagamentos recebidos”. Dessa forma, deverá ser restituído aos lojistas o montante excutido pela instituição financeira, descontados os valores devidos em função da prestação dos serviços pela Rakuten.
O julgamento, de votação unânime, teve a participação dos desembargadores Fortes Barbosa e J.B. Franco de Godoi.

Processo nº 2220888-74.2020.8.26.0000

Processo nº 2213101-91.2020.8.26.0000

Processo nº 2231235-69.2020.8.26.0000

TJ/DFT: Farmácia é condenada por colocar à venda produto indisponível em estoque

As Drogarias Pacheco e São Paulo terão que indenizar um casal de consumidores por vender produto que não estava disponível em estoque. A juíza do 4o. Juizado Especial Cível de Brasília entendeu que a conduta das farmácias foi abusiva.

Os autores contam que, em junho do ano passado, compraram em uma das lojas das rés um termômetro com pagamento no cartão de crédito. A entrega do produto estava programada para o dia seguinte ao da compra, o que não ocorreu. Os autores relatam que solicitaram a devolução do valor pago, mas o estorno ocorreu somente em setembro.

Em sua defesa, as farmácias explicaram que a compra só é efetivada após a confirmação do pagamento e que o pedido pode ter sido feito quando ainda havia o produto no estoque. As drogarias ressaltam que o valor foi devolvido aos consumidores logo após a constatação de que o termômetro não estava disponível no estoque.

Ao analisar o caso, a magistrada classificou a conduta das rés como abusiva, uma vez que disponibilizaram para venda produtos com estoque insuficiente. “Tenho por procedente o pedido de danos morais, ante a abusividade da conduta das requeridas, que gerou nos autores uma quebra de confiança e aborrecimentos que excedem a normalidade. Cumpre destacar, que em plena pandemia, o produto adquirido mostra-se indispensável para o controle da temperatura dos autores”, explicou.

Dessa forma, as rés foram condenadas a pagar a cada um dos autores a quantia de R$ 1.500,00 a título de danos morais. O pedido de repetição de indébito dos valores pagos pelo termômetro não entregue foi julgado improcedente, uma vez que houve a devolução do valor pago durante o processo.

Cabe recurso da sentença.

PJe: 0734969-82.2020.8.07.0016

TRF3: Instrutor de basquete não está sujeito ao Registro no Conselho Regional de Educação Física

Para TRF3, exigência é contra norma constitucional que prevê o livre o exercício de profissão.


A Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) manteve sentença que garantiu o exercício profissional de um instrutor de basquete sem necessidade de inscrição junto ao Conselho Regional de Educação Física da 4ª Região/São Paulo (CREF4/SP).

Para o colegiado, as atividades desenvolvidas pelo autor da ação não se enquadram como privativas do profissional de Educação Física, conforme a legislação. Além disso, segundo a decisão, obrigar o registro na autarquia federal vai contra norma constitucional de liberdade do exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão.

Em primeira instância, a Justiça Federal de São Paulo havia concedido mandado de segurança ao instrutor de basquete para assegurar o exercício da função sem estar vinculado e sujeito a autuações do CREF4/SP.

No recurso ao TRF3, a autarquia defendeu que a prática da atividade oferece riscos e o treinamento somente poderia ser ministrado por profissionais registrados no conselho. O órgão de classe argumentou ainda que o basquete é reconhecido como esporte pelo Comitê Olímpico Brasileiro e pelo Ministério dos Esportes.

Ao analisar o caso, o desembargador federal relator Antônio Cedenho ressaltou que a inscrição é um ato ilegal e está em desacordo com a jurisprudência do TRF3 e do Superior Tribunal de Justiça (STJ). “É vedado aos Conselhos Federais ou Regionais de Educação Física ampliar, por meio de ato infralegal, o rol de atividades sujeitas à sua fiscalização”, destacou.

Assim, o colegiado, por unanimidade, negou provimento à apelação e manteve a inexigibilidade de inscrição do profissional junto à autarquia federal.

Processo n° 5007543-79.2020.4.03.6100

TJ/MA: Uber pode negar cadastro de motorista sem precisar justificar

A empresa Uber do Brasil Tecnologia Ltda não é obrigada a justificar as negativas de cadastro de motoristas em sua plataforma. Este foi o entendimento de sentença proferida na 1ª Vara Cível de São Luís. A sentença é resultado de ação movida por um homem, inconformado por ter o cadastro junto à Uber negado. Na ação, de obrigação de fazer e de danos morais, ele alegou que postulou junto à requerida a inscrição como motorista de aplicativo, tendo sido surpreendido pela recusa da ré à sua solicitação, sem qualquer justificativa.

Na ação judicial, o autor pediu pela concessão de liminar em caráter de urgência determinando que a requerida efetuasse seu cadastro como motorista em sua plataforma e, por fim, a confirmação da liminar de urgência e a condenação da requerida ao pagamento de indenização por danos morais. De pronto, a Justiça indeferiu o pedido de liminar. Quando citada, a empresa ré argumentou que recusou a solicitação formulada em virtude de ter verificado a existência de ação penal em seu desfavor do requerente.

Afirmou, ainda, que mesmo que não houvesse tal justificativa, não poderia ser obrigada a contratar com alguém que não deseja, em razão do princípio da autonomia da vontade, razão pela qual não há que se falar em indenização por dano moral. “No mérito, versa a presente demanda acerca da possibilidade de a requerida recusar solicitações de cadastro como motorista em sua plataforma. (…) No caso em tela, alega o requerente que a recusa da requerida em efetuar seu cadastro como motorista na plataforma foi injustificada, razão pela qual pleiteou sua inclusão na referida plataforma e a indenização pelos danos morais alegadamente sofridos”, analisa a sentença.

LIBERDADE DE CONTRATAR

A Justiça entendeu que a requerida, por se tratar de empresa privada, não pode ser obrigada a contratar quem quer que seja e muito menos possui o dever legal de justificar suas negativas de contratação de prestação de serviços àqueles que solicitam, em virtude de sua autonomia privada e liberdade de contratar, assegurados constitucionalmente e infraconstitucionalmente. “Desta forma, não deve prosperar a alegação de recusa injustificada da solicitação da parte autora, tendo em vista que a requerida sequer é obrigada a justificar as negativas de cadastro de motoristas em sua plataforma, conforme acima delineado”, ressalta, citando decisões semelhantes de outros tribunais.

A sentença explica que a recusa do cadastro foi informada ao autor por meio de e-mail, desprovido de qualquer conteúdo que abalasse a honra do requerente, conforme consta no processo, não tendo sido verificada a ocorrência de nenhuma situação vexatória, que ofendesse a honra, imagem, ou outro direito da personalidade do requerente. “Assim, não tendo sido verificada a prática de ato ilícito por parte da requerida, não há que se falar em condenação dessa a obrigação de fazer ou a arcar com indenização por danos morais”, finalizou, decidindo por não acolher os pedidos do autor.

STJ: Beneficiário de endosso-caução não perde direito ao crédito por quitação ao endossante sem resgate do título

Nas operações de endosso-caução – nas quais a parte endossante transmite um título ao endossatário como forma de garantia da dívida, mas sem a transferência da titularidade da cártula –, o endossatário de boa-fé não tem seu direito de crédito abalado no caso de eventual quitação realizada ao endossante (credor originário), sem resgate do título.

O entendimento foi fixado pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) e, por unanimidade, julgar improcedente a pretensão da parte executada, que – nos embargos à execução – alegou ter pago diretamente ao endossante o valor executado pelo endossatário, mas sem que houvesse o resgate da duplicata que embasou a execução.

Em primeira instância, o juízo acolheu os embargos e reconheceu a ilegitimidade ativa da parte exequente. Já o TJPR, apesar de entender que o exequente teria legitimidade para propor a ação, concluiu que, como houve pagamento direto ao endossante, o título extrajudicial perdeu o requisito da exigibilidade.

Ampla circulação
Segundo o ministro Luis Felipe Salomão, relator do recurso da parte endossatária, o artigo 19 da Lei Uniforme de Genebra estabelece que, quando o endosso contém qualquer menção que implique uma caução, o portador pode exercer todos os direitos emergentes do título.

O mesmo dispositivo prevê que os coobrigados não podem invocar contra o portador as exceções fundadas nas relações pessoais com o endossante, a menos que o portador, ao receber a letra cambiária, tenha praticado ato consciente em detrimento do devedor.

Com base na doutrina, o relator também destacou que o interesse social busca proporcionar ampla circulação dos títulos de crédito, permitindo aos terceiros de boa-fé a plena garantia e a segurança na sua aquisição, “constituindo a inoponibilidade das exceções fundadas em direito pessoal do devedor a mais importante afirmação do direito moderno em favor da segurança da circulação e da negociabilidade dos títulos de crédito”.

Nesse sentido, explicou, o título de crédito nasce para circular, não para ficar restrito à relação entre o devedor principal e o credor originário.

Abstração
Em seu voto, Salomão apontou que o artigo 15 , I, da Lei das Duplicatas estabelece que a cobrança judicial de duplicata será efetuada conforme processo aplicável aos títulos executivos extrajudiciais, não havendo necessidade de qualquer outro documento além do título.

Por outro lado, o ministro também ressaltou que, apesar de a duplicata possuir natureza causal – ou seja, depende da prestação de um serviço para ser constituída –, essa característica não lhe retira o caráter de abstração: uma vez em circulação o título, contra ele não podem ser opostas exceções.

“Perquirir acerca do negócio subjacente para admitir oposição de exceções pessoais em face do endossatário terceiro de boa-fé de duplicata aceita representaria patente e significativa mudança na jurisprudência desde sempre pacífica acerca do tema, ferindo de morte a circulabilidade dos títulos de crédito, o princípio da abstração e o relevantíssimo instituto cambiário do aceite”, considerou o magistrado.

Aceite
Além disso, Luis Felipe Salomão enfatizou que o caso não discute o instituto de direito civil da cessão do crédito, mas as obrigações cambiárias autônomas do endosso e, de forma específica, o aceite dado no título.

Uma vez aceito o título – afirmou o relator –, o sacado vincula-se a ele como devedor principal, e a falta de entrega da mercadoria ou da prestação do serviço, ou mesmo a quitação referente à relação fundamental ao credor originário, só são oponíveis ao sacador, como exceção pessoal, mas não ao endossatário de boa-fé.

Ao dar provimento ao recurso, o ministro considerou “temerário” para a circulação dos títulos de crédito que se admita a quitação de crédito cambial sem a exigência do regaste da cártula, especialmente se essa situação gerar prejuízo a terceiro de boa-fé. ​

TJ/RS: LGPD – Empresa é responsabilizada por falha em contrato de gestão informatizada de dados públicos

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) atendeu parcialmente a apelo do Município de Alvorada e condenou empresa à indenização por descumprimento contratual relativo à gestão informatizada de dados públicos. A decisão é do Desembargador Newton Fabricio, que reconhece falhas na migração e desenvolvimento de sistemas de software, além da indisponibilidade de dados da Administração Pública.

O valor a ser pago pela empresa Startnet Consultoria Hardware & Software Ltda. a título de indenização é de R$ 282.100,00.

No recurso, o Município destacou uma série de problemas ocorridos durante a vigência do contrato com a Startnet, de 2009 a 2015, e pleiteou, além do ressarcimento, que a empresa disponibilizasse os dados da Administração Municipal contidos em sistema (COBOL) para o Município ou empresa que viesse a ser contratada e para que fosse a ré impedida de suspender a prestação dos serviços.

O contrato firmado previa a aquisição de licença de uso de uma solução (serviços e sistemas) informatizado de gestão pública, obrigatoriamente em plataforma Windows ou sistema operacional similar, com a entrega do código fonte e dicionário de dados ao Município, implantação, conversão e migração de dados existentes, suporte técnico ao usuário com assessoria permanente, com alterações legais, corretivas e evolutivas com contrato de desenvolvimento, customização de sistemas e suporte técnico.

Decisão

No acórdão, o julgador comentou que diversos Termos Aditivos a esse contrato original foram celebrados nos anos seguintes para viabilizar a realização de serviços relacionados aos sistemas municipais.

“Muito embora no aspecto formal a relação perpetrada pelas partes leve a crer que a contratação foi bem sucedida, haja vista os inúmeros instrumentos para a perpetuação da relação celebrados desde o contrato originário”, observou o Desembargador Fabricio, “a verdade é que, materialmente, foi justamente a insatisfatoriedade dos serviços prestados e a dependência de sistemas mal estruturados e ineficientes que ocasionaram a prorrogação infindável das avenças”.

Entre os problemas ele cita erros identificados no sistema COBOL pelo setor de dívida ativa relacionados à inconsistência dos cálculos realizados entre valores pagos pelos contribuintes em parcelamentos realizados junto ao setor de dívida ativa, e falhas sistêmicas relacionadas aos setores de pessoal e folha de pagamento.

O Desembargador relator ainda sopesou, de um lado, a alegação de manifesta afronta, para além das regras específicas que regem a relação contratual especificadas no contrato originário, aos preceitos que hoje vigoram no prisma nacional – e internacional – quanto às inovações necessárias ao aprimoramento dos serviços públicos na era digital; e, de outro, o argumento da empresa de que as intercorrências observadas se deram pela ausência de pessoal qualificado no âmbito público municipal para manuseio dos sistemas. No entanto, concluiu:

“Apesar da vasta documentação trazida pela contratada, as correções e suporte técnico em tempo proporcional à urgência com que as demandas necessitavam ser sanadas não comprovam o cumprimento do que foi pactuado com a qualidade mínima esperada, ainda mais se considerada a complexidade inerente aos serviços informáticos na atualidade.”

Descumprimento

Em outro ponto da decisão, o Desembargador Newton Fabricio tratou da importância da interoperabilidade na gestão de dados públicos, o que deveria ter sido providenciado pela empresa ré. “Em suma, está-se inviabilizando não apenas o normal desenvolvimento das atividades no âmbito municipal, mas também prejudicando a coletividade, na medida em que, cada vez mais, em uma sociedade movida a dados, exige-se uma interlocução constante com os canais digitais”.

E completou: “No caso, o contexto situa-se e diz para com não somente a necessidade de modernização de fluxos processuais que viabilizem mais agilidade, menos dispêndio financeiro e melhor alocação de capital humano, mas também com os desafios da interoperabilidade, condição essencial a provisionar, no plano micro, a autodeterminação informacional plena e, no plano macro da esfera pública, a autonomia dos entes na consecução do interesse público e de sua função institucional.”

O integrante da 1ª Câmara Cível abordou o tema à luz da Lei nº 14.129/2021, que estabelece princípios, regras e instrumentos para o funcionamento de um governo também digital pautado pela eficiência, publicidade e moralidade.

“Eficiência contém ligação direta com a ideia de digitalização, de desburocratização, de modernização e acessibilidade. Por sua vez, a publicidade dos atos é hoje ligada à ideia de interoperabilidade, muito difundida no setor bancário, mas que, com a internalização e disseminação dos princípios reitores da novel Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) irradia-se de forma plurissetorial. Por fim, a moralidade, na medida em que, por meio da conferência de modo simples e transparente dos atos públicos, viabiliza-se a sua mensuração segundo padrões éticos, de boa-fé, decoro, lealdade e honestidade na prática diária da boa administração”, completou.

Cabe recurso da decisão. A íntegra pode ser acessada no site do TJRS.

Processo n° 5001533-16.2015.8.21.0003

TJ/PB entende que não houve fraude em contrato de empréstimo consignado

A Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Paraíba manteve a sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Mista da Comarca de Mamanguape que, nos autos da ação declaratória de inexistência de débito, ajuizada por uma cliente em face do Banco Bradesco S/A, julgou improcedente os pedidos constantes na inicial, que buscavam a nulidade de um dos contratos de empréstimo, bem como a condenação do banco para pagar indenização pelos danos morais e materiais supostamente causados. A parte autora alegou que os descontos efetivados na sua conta são decorrentes de um contrato de empréstimo consignado não celebrado entre as partes.

O relator do processo nº 0840080-34.2016.8.15.2001, desembargador Luiz Silvio Ramalho Júnior, destacou, em seu voto, que os contratos em discussão mostram-se perfeitamente válidos e regulares não havendo qualquer aparência de fraude. “Em verdade, o recorrente foi beneficiário da quantia contratada, e o ajuizamento da presente ação, questionando o descontos indevidos, somente ocorreu 1 ano após o início da cobrança. Tal fato se mostra, portanto, desfavorável à apelante”, frisou.

O desembargador-relator acrescentou que não havendo nos autos qualquer indício de irregularidade na conduta do banco, não há que se falar em ato ilícito, mostrando-se, por consequência inviável o acolhimento dos pleitos indenizatórios. “Por fim, para que ensejasse direito à indenização por dano moral, seria necessária a prova inequívoca de que o Banco praticou comportamento ilícito, e a ocorrência de dano, o que no caso ora examinado não se vislumbra”, pontuou.

Da decisão cabe recurso.

STJ: Proteção do credor e de terceiros justifica registro de protesto contra alienação de bem de família

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que é possível a averbação de protesto contra a alienação de imóvel classificado como bem de família – não para impedir a venda do imóvel impenhorável, mas para informar terceiros de boa-fé sobre a pretensão do credor, especialmente na hipótese de futuro afastamento da proteção contra a penhora.

Com a decisão, o colegiado manteve acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que, no âmbito de execução em que não foram localizados bens penhoráveis, deferiu a averbação do protesto, em caráter informativo, na matrícula de imóvel protegido pela Lei 8.009/1990.

De acordo com o credor, o protesto seria necessário para resguardar os seus direitos futuros, bem como para alertar compradores em potencial do imóvel familiar. Sustentou que, em caso de morte da devedora, ele poderá ser habilitado no espólio, possibilitando impedir a alienação de bens antes do pagamento do débito.

A devedora, em recurso especial contra a decisão do TJSP, alegou que não existe direito do credor ao protesto, pois ele não poderia executar o imóvel, tendo em vista a impenhorabilidade assegurada pelo artigo 10 da Lei 8.009/1990.

Prevenção de litígios
O relator do recurso, ministro Antonio Carlos Ferreira, lembrou que a Segunda Seção, no julgamento do EREsp 185.645, considerou que a averbação cartorária de protesto contra alienação de bem está dentro do poder geral de cautela do juiz (artigo 798 do Código de Processo Civil de 1973) e é justificável pela necessidade de dar conhecimento do protesto a terceiros, prevenindo litígios e prejuízos para eventuais compradores.

Segundo o magistrado, a inserção dessa informação no registro público do imóvel também é uma forma de prevenir possível alienação fraudulenta. “A medida não impede a disposição do bem, mas obsta que terceiro adquirente possa alegar boa-fé, no caso de futura demanda judicial envolvendo o imóvel”, explicou.

Também com base em precedentes do STJ, o ministro destacou que o protesto contra a alienação pressupõe dois requisitos: que a pretensão do interessado no protesto seja legítima e que o protesto não impeça a realização de negócio lícito.

Situação fática
Em seu voto, Antonio Carlos Ferreira ressaltou que a impenhorabilidade do bem de família nada mais é do que uma garantia jurídica que incide sobre uma situação fática: a moradia familiar. No entanto, os fatos podem ser modificados por várias razões, como o recebimento de herança, a compra de um segundo imóvel ou a mudança de residência da família.

“Assim, ao perder a qualidade de bem de família, a venda posterior do imóvel com registro de protesto contra alienação de bens pode, numa análise casuística, configurar fraude à execução”, enfatizou o relator.

Ao manter o acórdão do TJSP, o ministro ponderou que, embora o protesto possa ter reflexos negativos para a devedora, a publicidade da pretensão futura de penhora do bem é essencial para a proteção de terceiros de boa-fé e a preservação do direito do credor.

STJ: Regência supletiva da Lei das SAs não impede retirada imotivada de membro de sociedade limitada

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o sócio pode se retirar imotivadamente de uma sociedade limitada – ainda que ela seja regida de forma supletiva pelas normas relativas à sociedade anônima –, nos termos do artigo 1.029 do Código Civil. Para o colegiado, a ausência de previsão da retirada imotivada na chamada Lei das Sociedades Anônimas – ou Lei das SAs (Lei 6.404/1976) – não implica sua proibição, uma vez que o Código Civil deve ser aplicado nas hipóteses de omissão daquele diploma legal.

O colegiado deu provimento ao recurso de um sócio que, na origem, ajuizou ação para anular a convocação de reunião em que seria discutida a sua expulsão. Segundo ele, não haveria interesse jurídico em tal deliberação, pois já havia exercido seu direito de retirada imotivada, tendo notificado extrajudicialmente os demais sócios.

O pedido foi julgado procedente em primeiro grau, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo concluiu que, embora a convocação fosse nula, por não indicar claramente a acusação contra o sócio, ele não poderia ter saído imotivadamente, uma vez que tal direito é inaplicável às sociedades limitadas que, expressamente, em seu contrato social, optaram por ser regidas de forma supletiva pela legislação das sociedades anônimas.

Simples notificação
O relator do recurso no STJ, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, explicou que a hipótese da retirada voluntária imotivada está prevista no artigo 1.029 do Código Civil, segundo o qual o sócio pode se retirar da sociedade de prazo indeterminado mediante simples notificação aos demais sócios.

“Esse dispositivo, conquanto inserido no capítulo relativo às sociedades simples, é perfeitamente aplicável às sociedades de natureza limitada, conforme a jurisprudência deste Superior Tribunal, de modo que o sócio, também nesse tipo societário, tem o direito de se retirar de forma imotivada, sem que seja necessária, para tanto, a ação de dissolução parcial”, afirmou.

O magistrado verificou que a sociedade limitada em questão apresenta a peculiaridade de ser regida supletivamente pelas normas aplicáveis às sociedades anônimas, como expressamente previsto no contrato social.

Sanseverino ressaltou que o artigo 1.053 do Código Civil, ao mesmo tempo em que estabelece que a sociedade limitada deve se reger subsidiariamente pelas normas da sociedade simples, autoriza de forma expressa, em seu parágrafo único, que o contrato social preveja a regência supletiva pelas normas da sociedade anônima.

Direito fundamental
Segundo o ministro, na hipótese de eventual omissão no capítulo do Código Civil que trata das sociedades limitadas, a complementação deve se dar, a depender do contrato social, ou pelas normas das sociedades simples ou pela lei especial reguladora das sociedades anônimas.

Para Sanseverino, a aplicação supletiva da Lei 6.404/1976 não tem o efeito de afastar o direito de retirada imotivada nas sociedades limitadas de prazo indeterminado, uma vez que a própria Constituição Federal expressamente garante, em seu artigo 5º, XX, tanto o direito fundamental de associação quanto o de não associação.

Além disso, o relator lembrou que a aplicação supletiva da lei das sociedades anônimas, autorizada pelo parágrafo único do artigo 1.053 do Código Civil, apenas deve ocorrer naquilo que for compatível com o regramento das sociedades limitadas.

“Nesse sentido, a simples ausência de previsão de retirada voluntária imotivada na Lei 6.404/1976 não pode ser automaticamente interpretada como proibição de sua ocorrência nas sociedades limitadas regidas supletivamente por essa norma”, afirmou Sanseverino.

Veja o acórdão.​
Processo n° 1.839.078 – SP (2017/0251800-6)


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