TJ/SP: Incidência de contribuição previdenciária sobre gratificação de representação é indevida

Decisão do Colégio Recursal dos Juizados Especiais.


A 8ª Turma Recursal de Fazenda Pública do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão da Vara do Juizado Especial Cível e Criminal de Registro, proferida pelo juiz Alexandro Conceição dos Santos, que determinou o afastamento da incidência de contribuição previdenciária sobre gratificação de representação recebida por servidor público, bem como a restituição das diferenças devidas pela Fazenda Pública de São Paulo.

Em seu voto, o relator do acórdão, juiz Alexandre Batista Alves, ratificou entendimento de primeiro grau de que vantagens não incorporáveis devem ser excluídas da base de cálculo para a contribuição previdenciária. “Conforme o entendimento firmemente estabelecido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, a gratificação de representação é uma vantagem concedida em virtude da nomeação para uma função específica e deve ser paga enquanto o servidor continuar exercendo tal função, devendo ser automaticamente interrompida caso o servidor deixe de desempenhá-la. Trata-se, pois, de verba de natureza eventual, de modo que não pode servir de base de incidência da contribuição previdenciária”, escreveu o magistrado.

Também compuseram a turma de julgamento os juízes Ronnie Herbert Barros Soares e Antonio Carlos de Figueiredo Negreiros. A decisão foi unânime.

Recurso Inominado Cível nº 1000916-50.2024.8.26.0495

TJ/RN: Sentença determina fornecimento de medicação e indenização para cliente com câncer de pulmão

A Primeira Vara Cível da Comarca de Natal condenou um plano de saúde a fornecer tratamento de quimioterapia, com o uso de fármacos específicos, para uma idosa portadora de câncer de pulmão e determinou o pagamento de indenização de R$ 6 mil pelos danos morais causados à cliente.

Conforme consta no processo, a cliente foi diagnosticada com um tipo de câncer, chamado de adenocarcinoma de pulmão e apenas conseguiu iniciar seu tratamento de radioterapia após decretada uma sentença favorável em um processo judicial que tramitou na Oitava Vara Cível de Natal, em 2022.

Posteriormente, em 2023, foi confirmado o retorno da enfermidade, sendo prescrito dessa vez, pela médica que acompanha a paciente, o tratamento por meio de quimioterapia com o uso de dois medicamentos cujo fornecimento não foi autorizado pelo plano de saúde, alegando que eles não estavam previstos no rol taxativo da Agência Nacional de Saúde – ANS.

Ao analisar o processo, a magistrada Valéria Lacerda destacou inicialmente que a Lei nº 14.454/2022 alterou a redação da Lei dos Planos de Saúde, instituindo o regime do rol exemplificativo ao estabelecer que “em caso de tratamento ou procedimento prescrito por médico ou odontólogo assistente que não estejam previstos no rol referido” a cobertura deverá ser autorizada pela operadora de planos de assistência à saúde, “desde que exista comprovação da eficácia, à luz das ciências da saúde, baseada em evidências científicas e plano terapêutico”.

Em seguida, a juíza fez referências à jurisprudência do Tribunal de Justiça potiguar, que também está em conformidade com o Superior Tribunal de Justiça – STJ, ao estabelecer “a prevalência do direito à saúde, tendo em vista ser irrelevante a ausência de previsão do medicamento no rol da Agência Nacional de Saúde (ANS), pois a lista tem caráter exemplificativo nos termos da Lei 14454/2022”.

Dessa forma, a magistrada concluiu que o plano de saúde tem o dever “de custear todas as sessões necessárias ao tratamento da autora, sem questionar ou melhor, restringir seu direito”, devendo, portanto, evitar adentrar no “mérito de qual seria o melhor tratamento para a sua patologia”.

Em relação ao pagamento de danos morais foi explicado que a fixação da indenização, “tem um duplo caráter, de ressarcimento, ou seja, através dela a parte se conforta materialmente pelo ataque à sua honra subjetiva e objetiva, e pedagógico,” que significa que o ofensor “ficará inibido e desestimulado de praticar atos semelhantes em desfavor de tantos outros”.

TJ/CE: Comerciante que teve carro apreendido será indenizada pelo Banco Toyota

O Judiciário cearense concedeu a uma comerciante que teve o carro apreendido pelo Banco Toyota do Brasil uma indenização por danos morais e materiais. O caso foi julgado pela 2ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) e teve como relator o desembargador Everardo Lucena Segundo.

Conforme os autos, a cliente firmou, em dezembro de 2018, um contrato de crédito bancário para financiar um veículo, tendo o automóvel como garantia. Até janeiro de 2020, cumpriu os pagamentos, porém, em razão da pandemia de covid-19, passou a enfrentar dificuldades financeiras que culminaram no atraso de parcelas. Em maio de 2021, a cliente foi surpreendida em seu local de trabalho por um oficial de justiça que apreendeu o automóvel.

A comerciante procurou a Justiça, que determinou a restituição do bem por não ter ocorrido uma intimação extrajudicial que oportunizasse o pagamento da dívida. Porém, o banco não cumpriu a decisão por ter vendido o veículo durante o processo. Por isso, ofereceu o valor do carro com o desconto referente ao compromisso contratual de financiamento veicular, o que foi aceito pela mulher.

No entanto, considerando que sofreu prejuízos além da esfera material em decorrência da cobrança judicial indevida, a comerciante buscou o Judiciário para pleitear uma reparação por danos morais e materiais. Na petição, argumentou que os prejuízos eram maiores do que somente o valor do veículo, já que custeou o transporte de outras formas durante os mais de 10 meses que esteve sem o automóvel.

O Banco Toyota contestou afirmando que a cliente concordou com o acordo firmado anteriormente e que deveria ter indicado suas insatisfações no momento de cumprimento da primeira sentença.

Em fevereiro de 2024, a 22ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza decidiu que, embora as partes fossem as mesmas, os processos não eram sobre assuntos iguais, já que, no primeiro, se discutia somente sobre a regularidade da apreensão. O Banco Toyota do Brasil foi condenado a pagar R$ 7 mil como reparação por danos morais e também a indenizá-la nos valores despendidos em locomoção desde a apreensão até a data do acordo.

A instituição financeira entrou com recurso de apelação no TJCE (nº 0268744-52.2022.8.06.0001) reforçando os argumentos já apresentados anteriormente e sustentando que as despesas de transporte não eram passíveis de ressarcimento, já que as dívidas da comerciante ensejaram o motivo da ação de busca e apreensão. A empresa ressaltou que o meio utilizado para obter a quitação do débito foi legal e não constituiu conduta ilícita.

Em 12 de junho de 2024, a 2ª Câmara de Direito Privado concordou que havia nítida diferença entre as causas, que foram comprovadas as despesas de deslocamento, e aumentou o valor a ser pago pelos danos morais para R$ 10 mil. “Há de se considerar que a conduta do banco que privou a comerciante de trafegar no automóvel extrapola o mero dissabor e mostra-se potencialmente lesiva à honra e à dignidade da pessoa humana, capaz de gerar os abalos psicológicos alegados”, justificou o relator.

Além desse, foram julgados outros 358 processos. O colegiado, que é presidido pelo relator, desembargador Everardo Lucena Segundo, é formado também pelos desembargadores Carlos Alberto Mendes Forte, Paulo Airton Albuquerque Filho, Maria de Fatima de Melo Loureiro, Jane Ruth Maia de Queiroga.

TJ/SP mantém a condenação de igreja por violação à imagem de fiel

Mulher será indenizada em R$ 20 mil.


A 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão da 10ª Vara Cível do Foro Regional de Santo Amaro, proferida pelo juiz Guilherme Duran Depieri, que condenou igreja a indenizar fiel por divulgação de sua imagem sem autorização. A autora receberá R$ 20 mil para reparação de danos morais.

De acordo com os autos, a mulher aparece em vídeo divulgado nas redes sociais para apresentar a atividade do pastor da igreja. Na gravação, ele orava sobre a fiel quando ela teve um movimento brusco e se desequilibrou. A postagem obteve 453 mil visualizações e a autora alegou ter sofrido constrangimento em razão dos comentários pejorativos. No recurso de apelação, a igreja argumentou que a divulgação do vídeo se deu em nome de pessoa física, estranha à sua personalidade jurídica, não tendo controle sobre o comportamento de todos que frequentam o espaço.

O relator da apelação, desembargador Costa Netto, afirmou que, apesar de a postagem ter sido feita por pessoa física, trata-se de pastor da igreja, que utilizou a imagem da autora sem sua autorização expressa ou mesmo tácita, para divulgação das atividades do próprio templo. “Está claro que o pastor atuava em nome e em favor da pessoa jurídica apelante, e não meramente em seu nome. A separação entre personalidades não permite que, apenas por utilizar outro nome, a igreja realize a divulgação de suas atividades em redes sociais sem autorização dos fiéis retratados no culto”, escreveu o desembargador em seu voto.

Completaram o julgamento os desembargadores Rodolfo Pellizari e Débora Brandão. A votação foi unânime.

Apelação nº 1004138-84.2023.8.26.0002

TJ/SC: Habeas data não é instrumento cabível para obter informações sobre terceiros

Parte queria dados para usar em processo. Ação foi extinta por falta de interesse de agir.


Decisão da 5ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) reforçou o entendimento de que o habeas data é um instrumento que garante ao autor da ação informações sobre ele mesmo junto às autoridades públicas ou a correção de tais informações, mas não dados sobre terceiros.

No caso em pauta, o autor propôs habeas data em face do município de Imbituba, com pedido de informações de terceiros que julgava necessárias para a instrução de ação de nunciação de obra nova (ação para evitar que uma obra em construção cause danos a um imóvel vizinho ou viole as normas legais ou contratuais) e o ajuizamento de ação declaratória de nulidade. Em sentença inicial, o pedido foi indeferido por falta de interesse, com o processo extinto sem resolução do mérito.

O autor recorreu da sentença e sustentou que a peça não fazia qualquer referência ao interesse de agir em relação aos documentos sonegados pelo município, cujo conhecimento do conteúdo, em razão dos danos ambientais que provam, transcende ao interesse do impetrante.

A desembargadora que relatou o recurso, no entanto, lembra que o habeas data em questão buscou informações de caráter não individual, relacionadas à identificação de terceiras pessoas, a fim de instruir ação de nunciação de obra nova e viabilizar o ajuizamento de ação declaratória de nulidade.

Como a peça vai contra o que disciplina a Constituição quanto ao direito de acesso a informações e ao rito processual do habeas data, “é forçoso concluir pela ausência de interesse de agir da impetrante”. Para fundamentar a decisão, foram citados precedentes das Câmaras de Direito Público do TJ e do Supremo Tribunal Federal (STF).

Assim, o voto da desembargadora foi pelo desprovimento do recurso com a manutenção da sentença de origem, seguido de maneira unânime pelos demais membros da 5ª Câmara de Direito Público.

Apelação n. 5006311-80.2023.8.24.0030

TJ/SP: Empresa de publicidade será indenizada após quebra de contrato de exclusividade

Concessionária do metrô vendeu espaço a terceiro.


A 25ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão da 34ª Vara Cível Central, proferida pela juíza Gisele Valle Monteiro da Rocha, que condenou concessionária de linha do Metrô de São Paulo a indenizar empresa pelo rompimento de contrato de exclusividade na venda de espaço publicitário. A reparação por danos materiais foi fixada em R$ 1,15 milhão.

Consta nos autos que a empresa autora firmou contrato com a concessionária para explorar, com exclusividade, espaços publicitários em estações e trens do metrô. Posteriormente, a requerida comercializou com outra empresa dois terços do mesmo espaço. A concessionária alega que o contrato firmado com a autora não tem validade por ter sido assinado por ex-funcionário.

O relator do recurso, Rodolfo Cesar Milano, destacou em seu voto que os funcionários responsáveis pelas tratativas entre a ré e a autora detinham “notória autonomia para celebrar negócios em nome da empresa ré por longo período” e que, portanto, o contrato é válido.

“Referida situação não pode ser desconsiderada a fim de se declarar nulo negócio jurídico celebrado entre as partes, ao contrário, necessário invocar a teoria da aparência, para resguardar a parte autora, que de boa-fé agiu ao tomar uma situação como legítima diante da confiança existente entre as partes, o que faz surgir consequências jurídicas mesmo em situações inexistentes ou inválidas. Desse modo, de rigor a manutenção da condenação da parte ré ao pagamento da indenização em danos materiais requeridos na inicial, condizente com o ressarcimento pelo prejuízo experimentado diante da venda departe do espaço adquirido pela autora e não utilizado, que foi vendido a sua concorrente”.

Completaram a turma julgadora os desembargadores Almeida Sampaio e Marcondes D’Angelo. A decisão foi unânime.

Apelação nº 1087824-73.2020.8.26.0100

TJ/SP: Município de São Paulo indenizará gestante diagnosticada com sífilis por equívoco

Reparação fixada em R$ 10 mil.


A 11ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo condenou o Município de São Paulo a indenizar gestante diagnosticada equivocadamente com sífilis. A mulher realizava acompanhamento pré-natal quando recebeu, por engano, os resultados de outra paciente, que havia testado positivo. Por conta do erro, ela e o marido foram obrigados a passar por tratamento médico. A indenização por danos morais foi fixada em R$ 10 mil.

Em seu voto, o relator do recurso, desembargador Oscild de Lima Júnior, apontou a ação negligente do profissional de saúde que, no dever do ofício, deveria agir cuidadosamente nas verificações dos exames. “Não foi um erro tolo e sem importância. O fato de a apelante receber de forma abrupta a notícia de que era portadora de sífilis e que, portanto, ela, gestante, e o marido deveriam ser submetidos a tratamento evidencia o dano moral. Trata-se de notícia que pode acarretar, como de fato acarretou, inúmeros constrangimentos, desavenças familiares, desconfianças acerca da fidelidade dos cônjuges, notadamente quando ocorre em meio a descoberta da gestação”.

Os desembargadores Afonso Faro Jr. e Aroldo Viotti completaram a turma de julgamento. A votação foi unânime.

Apelação nº 1020348-07.2023.8.26.0005

TJDFT mantém indenização por falha em serviço de pet shop

A 7ª Turma Cível decidiu pela manutenção da decisão que condenou a empresa Agropecuária Pura Roca LTDA a pagar indenização a consumidores em um recurso interposto por proprietários de um cão da raça Shih-tzu contra um pet shop.

Conforme o processo, os autores alegaram que, após confiarem o animal aos cuidados do estabelecimento para serviços de banho e tosa, o cachorro foi devolvido com uma fratura no maxilar, razão pela qual o animal necessitou de cirurgia e tratamento medicamentoso, o que resultou em gastos que somaram a quantia de R$ 4.495,22. Além disso, os donos do cachorro pleitearam compensação por danos morais devido ao sofrimento causado pela situação.

A defesa do pet shop argumentou que o animal estava bravo, o que impossibilitou a prestação dos serviços. Além disso, afirmou que o cão foi devolvido em boas condições. A empresa ainda mencionou ter alertado um dos autores sobre os riscos ao cortar os pelos do animal com tesoura.

No entanto, a prova juntada aos autos, incluindo vídeos de câmeras de segurança, demonstrou que a lesão ocorreu nas dependências do estabelecimento. Os registros indicam que o cão sofreu a fratura durante o atendimento, possivelmente ao cair do balcão ou ao colidir com uma porta de vidro.

O julgamento foi fundamentado pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), que estabelece a responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços pelos danos causados aos consumidores. Conforme o artigo 14 do CDC, o pet shop deve ser responsabilizado pelos danos materiais comprovados e pelos danos morais, reconhecidos in re ipsa.

A Desembargadora, ao ponderar sobre danos morais, destacou que “a falha na prestação do serviço, que ocasionou a fratura do maxilar do cão, é capaz de causar abalo pois os autores foram surpreendidos com o estado de saúde de seu animal de estimação, que havia sido deixado com saúde no pet shop para a realização do serviço de banho e tosa, e ao final se deparou com a lesão que necessitou de socorro em atendimento veterinário. Isso ultrapassa o mero aborrecimento comum e permite a indenização razoável por danos morais”.

A indenização por danos morais foi mantida e foi fixado o valor em R$ 4.000,00, em partes iguais para cada um dos autores. O valor foi considerado adequado ao propósito de desestimular práticas negligentes semelhantes.

A decisão foi unânime.

Processo nª 0713849-45.2022.8.07.0005/DF

TJ/DFT: Construtoras são condenadas a indenizar consumidor por abandono de obra

A Gerber Construtora e Incorporadora; a Terus Projetos, Construções e Reformas e a Credibilidade Construções e Incorporações imobiliárias e seus respectivos sócios foram condenadas a indenizar consumidor por abandono de obra. A decisão é da 6ª Vara Cível de Brasília.

De acordo com o processo, em novembro de 2018, o autor contratou os serviços da primeira ré, para construção de uma residência no Jardim Botânico para a sua moradia e de sua família. O valor do contrato foi no total de R$ 351.169,52, com cronograma de execução que previa a entrega da obra no final do mês de maio de 2019. Porém, as rés teriam abandonado a obra antes do término, de modo que o autor teve que desembolsar o valor de R$ 129.625,00 para a conclusão do serviço.

Na defesa, as empresas rés argumentam que o cumprimento do contrato não ocorreu em razão da inadimplência da parte autora. Sustentam que não houve abandono da obra e que, na verdade, ela foi concluída integralmente. Alegam que a contratação de nova empresa ocorreu por liberalidade do consumidor e não por necessidade.

Ao julgar o caso, a Juíza cita laudo pericial que evidencia que a obra realizada pela construtora não estava só incompleta como malfeita em vários pontos. Segundo o documento, foram encontrados 19 pontos na construção classificados como de grau de risco crítico. A magistrada ainda cita que a própria empresa reconheceu que não realizou a impermeabilização da obra e destaca que vários dos problemas apontados pelo laudo pericial são decorrentes da ausência desse serviço.

Assim, para a Justiça do DF “calcada em todas essas evidências, concluo que a obra da casa do autor realizada pela GERBER foi entregue incompleta e com defeitos importantes, especialmente de estrutura”, finalizou.

Dessa forma, as rés deverão desembolsar a quantia de R$ 129.625,00, por danos materiais, referente à restituição pelo valor gasto pelo autor para a finalização da obra. Além disso, a empresas foram condenadas a indenizá-lo no valor de R$ 20.000,00, a título de danos morais.

Cabe recurso da decisão.

Processo nº 0737036-31.2021.8.07.0001

STJ: Princípio da precaução: a obrigação de proteger o meio ambiente mesmo quando o dano é incerto

Reconhecido por seu protagonismo em matéria ambiental, o Brasil regula a proteção ao meio ambiente não só na Constituição – a exemplo do artigo 225 –, mas também em leis federais, estaduais e municipais. Há, além disso, todo um sistema de normas e princípios construído em convenções internacionais às quais o país aderiu nas últimas décadas.

Um desses princípios é o da precaução, consagrado na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio 92), segundo o qual a falta de certeza científica absoluta não justifica deixar de tomar as providências necessárias para prevenir danos possivelmente graves e irreversíveis.

Em outras palavras: ainda que o dano ambiental seja incerto, ele deve ser levado em consideração quando determinada ação puder causá-lo.

Muito além de um simples balizador de condutas, o princípio da precaução gera diversos efeitos concretos, a exemplo da inversão do ônus da prova em ações que discutem potencial dano ambiental, transferindo ao possível poluidor a obrigação de provar que sua conduta não traz riscos ao mesmo ambiente. Esse é um dos vários entendimentos do Superior Tribunal de Justiça (STJ) a respeito do princípio da precaução.

Inversão do ônus da prova se aplica às ações de degradação ambiental

Foi com base no princípio da precaução que, em 2010, a Corte Especial do STJ julgou o REsp 883.656 e adotou um entendimento sobre inversão do ônus da prova que viria a servir de precedente para a edição da Súmula 618.

O colegiado assentou que, diante do dever genérico e abstrato de conservação do meio ambiente, o princípio da precaução estabelece um regime ético-jurídico no qual o exercício de atividade potencialmente poluidora – sobretudo quando perigosa – conduz à inversão das regras de gestão da licitude e causalidade da conduta, com a imposição ao empreendedor do encargo de demonstrar que sua ação é inofensiva.

O ministro Herman Benjamin, relator, destacou que, no contexto do direito ambiental, o princípio da precaução transforma a máxima in dubio pro reo em in dubio pro natura, trazendo consigo uma forte presunção a favor da proteção da saúde humana e do meio ambiente.

“A responsabilidade de demonstrar a segurança passa para as mãos daqueles que conduzem atividades potencialmente perigosas, o que representa um novo paradigma: antes, o poluidor se beneficiava da dúvida científica; agora, a dúvida funcionará em benefício do meio ambiente.”
REsp 883.656 Ministro Herman Benjamin”

 

A própria natureza indisponível do bem jurídico protegido (o meio ambiente), de projeção intergeracional, certamente favorece uma atuação mais incisiva e proativa do juiz, que seja para salvaguardar os interesses dos incontáveis sujeitos-ausentes, por vezes toda a humanidade e as gerações futuras. Ademais, o cunho processual do artigo 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor liberta essa regra da vinculação exclusiva ou do confinamento à relação jurídica de consumo. Por derradeiro, a incidência do princípio da precaução, ele próprio transmissor por excelência de inversão probatória, base do princípio in dubio pro natura, induz igual resultado na dinâmica da prova”, disse.

Na falta de certeza científica, prevalece a defesa do meio ambiente

Em 2012, ao discutir um caso que envolvia a queima de canaviais, a Segunda Turma reafirmou o princípio da precaução: a ausência de certezas científicas não pode ser argumento utilizado para postergar a adoção de medidas eficazes para a proteção do meio ambiente.

O colegiado deu provimento ao recurso especial interposto pelo Ministério Público (REsp 1.285.463) em processo no qual o órgão pedia a anulação de todas as autorizações para a queima de canaviais na comarca de Jaú (SP) e a proibição de que outras fossem concedidas.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) havia entendido que, como não existiam dados capazes de provar cientificamente que a fuligem da cana-de-açúcar causa câncer – como sustentavam os críticos das queimadas –, o Judiciário não poderia paralisar a atividade canavieira do estado, a qual proporcionava pelo menos 15 milhões de empregos diretos e indiretos.

O relator do recurso especial no STJ, ministro Humberto Martins, amparado no princípio da precaução, afirmou que, “na dúvida, prevalece a defesa do meio ambiente”. Em seu voto, ele argumentou ainda que a possibilidade legal de autorização para o uso do fogo no processo produtivo agrícola não abrange as atividades exercidas de forma empresarial, que “dispõem de condições financeiras para implantar outros métodos menos ofensivos ao meio ambiente”.

Na análise de medidas urgentes, periculum in mora favorece o meio ambiente

No julgamento do AgInt na TP 2.476, a Primeira Turma entendeu que, no exame de medidas de urgência em matéria ambiental, à luz dos princípios da precaução e da prevenção, o periculum in mora milita em favor da proteção do meio ambiente, não sendo possível a adoção de outra solução senão o imediato resguardo da pessoa humana e do meio ambiente, principalmente em situações críticas.

O Ministério Público ajuizou ação civil pública contra uma empresa que estaria causando danos ambientais ao utilizar um imóvel como depósito de resíduos siderúrgicos da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). O MP alegou que as montanhas de lixo estariam contaminando a água no subsolo e causando poluição atmosférica pela dispersão de partículas com o vento.

O Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) manteve a decisão de primeiro grau que limitou a quantidade e a altura das pilhas de escória recebidas mensalmente no depósito, por entender que ficou comprovado que esse material colocava em risco as populações vizinhas, o lençol freático da região e o rio Paraíba do Sul. Contra essa decisão, a empresa interpôs recurso especial com pedido de efeito suspensivo, o qual foi concedido pela vice-presidência do TRF2. No entanto, após solicitação de tutela provisória pelo MP, o STJ revogou o efeito suspensivo – decisão da qual a empresa recorreu.

A ministra Regina Helena Costa, relatora do recurso, ponderou que o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, presente no caput do artigo 225 da Constituição Federal, é interesse difuso, de titularidade transindividual, e os princípios da precaução e da prevenção impõem a priorização de medidas que previnam danos à vulnerável biota planetária, bem como a garantia contra perigos latentes, ainda não identificados pela ciência.

“Não se pode adotar outra solução, senão o imediato resguardo da pessoa humana e do meio ambiente, principalmente em quadros fáticos críticos como o presente, no qual, segundo apontou o tribunal de origem, já há constatação de prejuízos à saúde e à segurança da população.”
TP 2.476 – Ministra Regina Helena Costa

A magistrada ressaltou que, em conformidade com o princípio da precaução, é necessária a inversão do ônus da prova em ações civis ambientais, atribuindo ao empreendedor a responsabilidade de provar que o meio ambiente permanece intacto mesmo com o desenvolvimento de suas atividades.

“Não se extrai dos autos nenhuma comprovação, pelo agravante, de que sua atividade não causaria a degradação apontada na ação civil pública, constatando-se, na verdade, a iminente ameaça de severos danos ambientais, bem como à saúde pública de um sem-número de pessoas, mormente pelo risco concreto de contaminação do rio Paraíba do Sul”, concluiu a ministra ao negar provimento ao recurso.

Pode haver indenização por dano ambiental mesmo sem prova do prejuízo

Sob a relatoria do ministro Franscisco Falcão, analisando um caso de despejo irregular de esgoto, a Segunda Turma concluiu que a ausência de prova técnica para a comprovação do efetivo dano ambiental não inviabiliza o reconhecimento do dever de reparação ambiental.

A posição do colegiado se deu no julgamento do REsp 2.065.347, em que o Ministério Público pedia a condenação de um clube e uma pessoa física por lançamento irregular de esgoto no estuário do rio Capibaribe, em Recife. Após o juízo de primeiro grau condenar os réus ao pagamento de indenização por danos ambientais e danos morais coletivos, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) reformou a sentença, por entender que não havia prova técnica dos danos.

O relator no STJ destacou que, diante de dano ambiental notório, é desnecessária, como regra, a realização de perícia, pois seria diligência inútil e meramente protelatória (artigo 370, parágrafo único, do Código de Processo Civil). Nesses casos, segundo o ministro, basta a prova da conduta imputada ao agente.

Falcão também apontou que a responsabilidade civil por danos ambientais, na situação dos autos, fundamentava-se na teoria do risco administrativo e decorria do princípio do poluidor-pagador, que imputa ao poluidor – aquele que internaliza os lucros – a responsabilização pelo impacto causado no meio ambiente.

“Diante dos princípios da precaução e da prevenção, e dado o alto grau de risco que a atividade de despejo de dejetos, por meio do lançamento irregular de esgoto – sem qualquer tratamento e em área próxima à localização de arrecifes –, representa para o meio ambiente, a ausência de prova técnica pela parte autora não inviabiliza o reconhecimento do dever de reparação ambiental”, concluiu o ministro ao restabelecer a sentença.

Juiz deve inverter ônus da prova se ficar evidenciada presunção do dano

Sob relatoria do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, a Terceira Turma definiu, no AREsp 1.311.669, que, quando ficar evidenciada a presunção do dano, o magistrado deve inverter o ônus da prova e determinar que a parte ré demonstre a não existência ou a irrelevância dos prejuízos alegados na ação, bastando aos autores, por sua vez, provar a potencialidade lesiva da atividade.

Na origem do caso, dois pescadores ajuizaram ação de indenização contra a concessionária responsável pela construção de uma hidrelétrica, sustentando que a obra causou a diminuição da quantidade de peixes na região e prejudicou a atividade pesqueira. Por entender que o nexo causal e os prejuízos não foram demonstrados, as instâncias ordinárias afastaram o dever de indenizar.

No STJ, o ministro Cueva observou que a construção da hidrelétrica e a redução da quantidade de peixes são fatos incontestáveis, devendo a questão ser dirimida, portanto, pela interpretação das leis aplicáveis e à luz dos princípios norteadores do direito ambiental.

Segundo o ministro, a Lei 6.938/1981 adotou a sistemática da responsabilidade objetiva, que foi integralmente recepcionada pela ordem jurídica atual, tornando-se irrelevante a discussão da conduta do agente (culpa ou dolo) para atribuição do dever de reparação do dano. Além disso, segundo o magistrado, o artigo 4º, inciso VII, da mesma lei prevê expressamente o dever de recuperar ou indenizar os danos causados, independentemente da existência de culpa.

“Basta que haja um nexo de causalidade provável entre a atividade exercida e a degradação, devendo ser transferido para a concessionária todo o encargo de provar que sua conduta não ensejou riscos para o meio ambiente, bem como a responsabilidade de indenizar os danos causados.” AREsp 1.311.669 – Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva

“Não obstante a responsabilidade ser objetiva, o dano ser evidente e a necessidade de comprovação do nexo de causalidade ser a regra, não se pode deixar de ter em conta os princípios que regem o direito ambiental (precaução, prevenção e reparação)”, afirmou o relator, acrescentando que, na falta de provas cientificamente relevantes sobre o nexo causal entre certa atividade e o dano ao meio ambiente, este deve ter o benefício da dúvida.

Seguindo o voto do ministro, o colegiado determinou o retorno dos autos à origem para que houvesse novo julgamento, após a inversão do ônus da prova.

Atuação do administrador deve ser regida, cada vez mais, pela precaução

Ao negar provimento ao AgInt no AREsp 2.067.641, a Segunda Turma, com base no princípio da precaução, manteve a decisão que havia determinado a uma empresa ferroviária, após vários acidentes, a adoção do regime de “duplacondução” nos trens que transportassem cargas perigosas.

No caso, a empresa interpôs recurso especial argumentando que, ao exigir a implementação da “duplacondução” nos trens, em vez da monocondução, a administração pública teria alterado unilateralmente o contrato administrativo durante sua vigência, o que teria causado a quebra do equilíbrio econômico-financeiro do contrato e violado a segurança dos negócios jurídicos.

Em seu voto, o ministro Herman Benjamin, relator, observou que, no sistema jurídico brasileiro, a administração pública é titular de ampla atribuição cautelar, incumbindo aos seus agentes o dever de adotar, em relação a pessoas físicas ou jurídicas, medidas concretas que impeçam ou reduzam acidentes e outros eventos danosos à integridade físico-psíquica e a bens materiais e imateriais de terceiros, assim como ao meio ambiente e ao patrimônio público em geral.

Nesse sentido, o relator ponderou que a atuação do administrador contemporâneo se rege pelo princípio da prevenção e, cada vez mais, pelo princípio da precaução, até porque seria um absurdo defender que o Estado “corra atrás do prejuízo”, sobretudo se confrontado com ameaça ou ofensa de efeitos coletivos, algo que descaracterizaria a missão estatal e as expectativas sociais às quais deve estrita obediência.

“Entre a segurança jurídica dos contratos e a segurança das pessoas e do meio ambiente, só daria preferência àquela em prejuízo desta um legislador (ou juiz) insensível ao princípio da supremacia do interesse público, alienado da centralidade da comunidade da vida como valor de regência primordial no consenso normativo das sociedades democráticas do mundo todo”, declarou.

Processos: REsp 883656; REsp 1285463; TP 2476; REsp 2065347; AREsp 1311669 e AREsp 2067641


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