TJ/RN: Atraso no pagamento de servidores gera condenação a gestor público

Os desembargadores da 3a Câmara Cível do TJRN mantiveram a sentença da Vara Única da Comarca de Lajes, que, nos autos de Ação Civil Pública, proposta pelo Ministério Público, impôs para Edivan Secundo Lopes, então prefeito de Lajes, a suspensão dos seus direitos políticos pelo prazo de três anos; a proibição de contratação com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios pelo prazo de três anos e multa civil equivalente a três vezes o valor da remuneração quando do exercício do cargo, a ser revertida em favor do Município de Lajes.

O julgamento se deu por meio da Apelação Cível n° 2018.003664-6, movida pelo então chefe do Executivo, o qual argumentou, dentre vários pontos, que o atraso dos proventos dos servidores foi resultado da redução do repasse do Fundo de Participação do Município que, desde 2004, saiu “de valores de ponto oito para ponto seis” e que só no final de 2007, com a realização de um novo censo, voltou a ser ponto oito.

O recurso ainda alegou que as demais contratações mencionadas pelo Ministério Público decorreram de necessidade temporária do serviço e o respectivo pagamento se deu com recursos diferentes dos destinados à folha de pessoal, circunstâncias estas que afastam o dolo necessário para caracterizar o ato de improbidade. Aduz, ainda, que foi realizado Termo de Ajustamento de Conduta, o qual foi devidamente cumprido e que não houve prejuízo ao erário.

A decisão na Câmara voltou a ressaltar o que foi destacado pelo juízo de primeiro grau, o qual apontou que o não pagamento regular da remuneração dos servidores públicos é conduta que viola os princípios regentes da administração pública, em especial os princípios da moralidade, legalidade e impessoalidade, superando, assim, uma mera desorganização da máquina administrativa.

O julgamento ainda ressaltou que a única justificativa apresentada pelo prefeito para esclarecer a sua impossibilidade de pagar foi exatamente a mesma enviada ao juízo de primeiro grau: a redução do repasse do Fundo de Participação do Município. Contudo, para a Câmara não há como acolher, já que não se verifica qualquer redução entre a data da elaboração e a promulgação da Lei Orçamentária Anual do Município apelante para o exercício de 2007 (LOA nº 443/2006) e os meses pagos com atraso.

“Considerando que, por óbvio, havia a previsão da dotação orçamentária específica para o pagamento dos servidores na supracitada norma, não se justifica o não pagamento, o que demonstra o elemento volitivo necessário para a configuração do ato ímprobo em exame, seja por má administração ou por uso indevido desta verba específica para outro fim”, define o relator do recurso, desembargador Vivaldo Pinheiro.

Apelação Cível n° 2018.003664-6
Ação Civil Pública, de nº 0000157-89.2011.8.20.0119

TJ/ES: Banco deve indenizar mulher negativada devido a um cartão de crédito que nunca utilizou

De acordo com o banco, a dívida era referente à anuidade do cartão, a qual ocorreria independentemente do seu desbloqueio.


Um banco foi condenado a pagar R$ 5 mil em indenização a uma cliente que teve seu nome incluído no cadastro de inadimplentes. Segundo a autora, ela nunca usou o cartão de crédito que foi motivo da sua negativação. A decisão é da 1ª Vara de Baixo Guandu.

De acordo com a requerente, ela havia solicitado um cartão de crédito de um site de compras, o qual é administrado pelo banco requerido. Após o seu recebimento, a autora sequer teria vindo a desbloqueá-lo e, muito menos, a realizar qualquer compra com ele. Contudo, ela relata que teria começado a receber mensagens de texto do requerido lhe cobrando valores de fatura. Além disso, ela recebeu uma notificação de que teria uma dívida e, ainda, de que seu nome seria inserido no rol de inadimplentes devido ao não pagamento dela.

Por tais razões, a autora pediu que o banco fosse condenado a excluir tal dívida, bem como a não inserir seu nome no cadastro de restrição ao crédito e, por fim, ao pagamento de indenização por danos morais.

Em contestação, o requerido afirmou que a dívida cobrada se refere ao valor da anuidade do cartão de crédito, cobrança que é pautada independentemente do desbloqueio do cartão. Além disso, o banco também defendeu que o cartão foi utilizado e, consequentemente, que as cobranças são pertinentes.

Em análise do caso, a juíza alegou que a situação deveria ser analisada com base no Código de Defesa do Consumidor e, por tais motivos, defendeu que caberia ao réu comprovar que a autora havia desbloqueado o cartão e ainda o utilizado.

“Ocorre que o banco requerido não juntou nenhuma prova de que o cartão foi utilizado, tampouco de seu desbloqueio […]. O banco alega que a cobrança de anuidade é possível, independentemente do desbloqueio do cartão […]. Neste particular, entendo que não assiste razão ao réu, já que a jurisprudência vem entendendo que é abusiva a cobrança de anuidade de cartão que permaneceu bloqueado”, afirmou a magistrada.

Assim, a juíza entendeu que a situação danifica a reputação da autora, uma vez que causaria abalo a sua credibilidade e idoneidade. Por tais razões, a magistrada condenou o requerido a declarar a inexistência de débito e a pagar R$ 5 mil em indenização por danos morais.

Processo n° 0000609-36.2018.8.08.0007

TJ/MG: Clube deve indenizar vizinha por ofensa ao sossego

Vizinha do estabelecimento receberá R$ 6 mil por danos morais.


O Além Paraíba Tênis Clube foi condenado a indenizar uma vizinha do estabelecimento em R$ 6 mil, por danos morais. A decisão é da 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), que manteve sentença da Comarca de Além Paraíba.

A mulher narrou nos autos que, como vizinha de fundos do clube, vinha sofrendo com a poluição sonora em razão das frequentes festas, com emissão de som em volume insuportável.

Outro problema, de acordo com a mulher, era a presença de fumaça, possivelmente de churrasco, que causava mal a sua família, especialmente a seu filho. Alegou que não suportava mais ter de se valer da Polícia Militar para colocar fim ao problema.

Na Justiça, pediu para ser indenizada por danos morais. Pediu também a limitação das atividades realizadas nos fundos do estabelecimento e a proibição de realização de eventos ou de exploração nociva da propriedade naquele local.

Em sua defesa, o Além Paraíba alegou que os fatos narrados haviam ocorrido fora do horário normal de funcionamento do clube, no espaço onde ficam os quiosques. Disse que a área era alugada a terceiros ou emprestada aos associados, inexistindo ingerência de sua parte.

Entre outros pontos, o clube afirmou ainda que o som não havia sido medido por meio de equipamento registrado no Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) e que as narrativas contidas nos boletins de ocorrência eram unilaterais.

Sustentou também que a casa da mulher situava-se no primeiro pavimento, no mesmo nível do piso do clube, não se podendo dizer que a fumaça da churrasqueira entrasse no imóvel dela. E que os imóveis eram geminados, com paredes duplas os separando, sendo impossível a propagação de sons altos.

Em primeira instância, o clube foi condenado a pagar à vizinha R$ 6 mil por danos morais. Em relação aos pedidos de limitação de atividades nos fundos do clube, a ação foi julgada extinta.

Diante da sentença, o clube recorreu, reiterando suas alegações. E pediu ainda a redução do dano moral, se mantida a condenação.

Ofensa ao sossego

O relator, desembargador Domingos Coelho, observou que “os direitos de vizinhança constituem normas de conduta criadas com o intuito de preservar a paz social, procurando atingir situações como o mau uso da propriedade”.

Havendo ofensa ao sossego, “que pode ser traduzida por ruídos excessivos que tiram a tranquilidade de habitantes de prédios contíguos, devem ser impostas certas limitações para que o direito de um proprietário não se sobreponha ao de outro que com ele confronta”, ressaltou.

O desembargador observou haver inúmeros boletins de ocorrência lavrados a pedido da autora da ação, em função das perturbações que vinham clube.

As partes celebraram acordo, com a intermediação do Ministério Público, para que o clube se comprometesse a aumentar o muro divisório entre os imóveis e colocasse isolamento acústico, suspendendo a utilização da churrasqueira, afirmou o relator.

Entre outras provas, citou termo de declarações prestadas à Promotoria de Justiça da comarca, indicando que eram realizadas festas no clube quase todos os fins de semana, até a madrugada.

Para o desembargador, apesar de não ter sido realizada perícia técnica para a medição dos sons e ruídos, era incontroverso que o réu havia promovido sua atividade empresarial “ultrapassando os limites da boa convivência e perturbando a paz da coletividade durante o período noturno, destinado ao descanso”.

Ainda que os eventos fossem realizados no local por terceiros, o desembargador ressaltou que, ao celebrar locação comercial de parte de sua propriedade para eventos, o clube era responsável pelas condutas ali praticadas.

O relator verificou ainda que as diligências de autoridades policiais, ao elaborar os boletins de ocorrência, haviam constatado a veracidade dos fatos, registrando que o som estava alto e que os organizadores das festas se prontificaram a baixar o volume.

“Dessa forma, verificando que os dissabores e a perturbação experimentados, em decorrência das atividades empresariais do apelante, extrapolam a condição de situação corriqueira e de mero dissabor, cabível a imposição da indenização”, ressaltou o relator.

Julgando adequado o valor fixado para o dano moral, o relator manteve a sentença, sendo seguido pelos desembargadores José Flávio de Almeida e Juliana Campos Horta.

Veja a decisão.
Processo nº 1.0015.13.000330-2/001

TJ/MG: Construtora terá que indenizar por defeitos em imóvel

Cliente pede compensação por falhas na construção de casa.


Uma família deverá receber indenização de R$ 20 mil por danos morais da construtora Azevedo e Carvalho Engenharia Ltda., contratada para executar os projetos e a obra de construção de uma casa em Itajubá. A decisão é da 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que manteve a sentença de primeira instância.

De acordo com o contratante do serviço, o projeto não observou a técnica adequada, o que resultou em vícios de construção que comprometem a segurança do imóvel, com risco de desabamento.

Para a empresa contratada, o projeto estrutural já considerava que o solo em que a casa seria construída era frágil, por estar localizado em área de antiga várzea aterrada.

Além disso, ao surgirem as primeiras trincas, foi realizado um procedimento de reforço estrutural, conhecido como “mega-estaca”, sendo o valor da obra dividido entre o cliente e a construtora. A empresa ainda alega que os problemas atuais do imóvel foram causados pela pressão exercida no terreno do vizinho dos fundos.

Decisão

A juíza Luciene Cagnin condenou a construtora a indenizar a família por danos materiais, restituindo-lhe o valor gasto com os reparos necessários para solucionar os problemas no imóvel. A empresa deve também indenizá-los em R$ 20 mil por danos morais.

A seguradora recorreu, alegando que o imóvel encontra-se alugado, logo a família não sofreu danos morais. Além disso, o laudo pericial comprovou que os problemas do imóvel não resultam de imprudência da empresa.

O relator, desembargador Marcos Henrique Caldeira Brant, manteve a decisão de primeira instância. Para ele, a obrigação de indenizar por danos morais é evidente, pois o imóvel apresenta vícios estruturais que não foram sanados pela construtora.

Foi comprovado que, desde 2006, o cliente estabeleceu tratativas com a construtora para a solução dos problemas, sem resultado, afirmou o magistrado.

Acompanharam o voto do relator os desembargadores Otávio de Abreu Portes e José Marcos Rodrigues Vieira.

Veja a decisão.
Processo nº 1.0324.10.007647-4/001

TJ/MG: Liminar manda motorista do Uber retirar vídeo de bate boca com passageira de redes sociais

Nas imagens, motorista de Uber e passageira discutem sobre viagem.


Decisão liminar proferida pelo desembargador Pedro Aleixo determina a retirada de um vídeo compartilhado por um motorista do Uber do Brasil em plataformas das redes sociais do Facebook e Google Brasil.

As imagens mostram uma discussão dele com uma passageira que vive em Belo Horizonte e se dirigia ao aeroporto Tom Jobim, no Rio de Janeiro. A discussão girava em torno do atraso no percurso da viagem.

O trajeto entre o local em que a mulher entrou no veículo e o aeroporto demoraria cerca de 15 minutos, mas no momento do conflito superava 40.

Antes de chegar ao aeroporto, na ponte de acesso ao local, a mulher solicitou ao motorista que conduzisse o veículo com mais velocidade. Em resposta, foi solicitado a ela que descesse do carro e percorresse o restante do caminho a nado.

A partir desse momento, houve um bate-boca, que culminou com a recusa do motorista em abrir o porta-malas do veículo para a retirada da bagagem, ao chegar ao aeroporto.

O motorista filmou todo o conflito e postou nas redes sociais.

Liminar

A mulher acionou a Justiça para retirar o vídeo da internet e solicitar danos morais, devido ao que entendeu ter sido uma ofensa à sua imagem.

A ação foi distribuída para a 29ª Vara Cível da Comarca de Belo Horizonte.

Liminarmente o pedido para retirar as imagens das redes sociais foi indeferido.

Em grau de recurso, essa decisão foi alterada. O desembargador Pedro Aleixo entendeu que, enquanto não há decisão definitiva, a circulação do conteúdo pode acarretar sérios prejuízos à mulher, com danos de difícil reparação.

TJ/SC: TAM deverá indenizar família por frustrações em viagem de volta dos EUA

Uma companhia aérea deverá indenizar uma família de Florianópolis em R$ 12 mil, a título de danos morais, por uma série de constrangimentos e frustrações sofridos em viagem de volta dos Estados Unidos, realizada no final do ano passado.

O casal deveria fazer o trajeto de Miami até Florianópolis, com conexão em Guarulhos-SP, acompanhado do filho de apenas três anos. Quando chegaram ao aeroporto paulista, no entanto, descobriram que o terminal da Capital estava fechado devido a uma pane sistêmica, por isso seriam realocados em um voo alternativo no dia seguinte. Foi quando o drama familiar começou.

Em ação ajuizada na 2ª Vara Cível da Capital, o casal narra que o transporte, a hospedagem e a alimentação foram precários. Outro problema envolveu a realocação da criança, que teve de ficar em poltrona separada dos pais no voo fornecido. De acordo com os autos, as condições do ônibus disponível para o traslado até o hotel eram péssimas, com a necessidade de desembarcar no meio do caminho, debaixo de chuva, porque o veículo não conseguiu subir a via de acesso.

Como o serviço de hospedagem não tinha estrutura para receber todos os passageiros, o acesso aos quartos só ocorreu após a meia-noite, ainda assim em acomodações separadas. O banho quente também foi prejudicado pelo uso excessivo das caldeiras. Já a alimentação, segundo os autores, se resumia a bananas. O casal, então, requereu indenização por danos morais devido ao abalo emocional suportado pela falha na prestação de serviço.

Em contestação, a companhia aérea afirmou que o voo contratado foi cancelado por motivos técnicos/operacionais, ocorrendo excludente de responsabilidade por motivo de força maior. Sustentou que não houve falha na prestação dos serviços, bem como prestou toda a assistência necessária aos passageiros.

Ao julgar o caso, o juiz Giuliano Ziembowicz anotou que cumpria à empresa comprovar a prestação da assistência material necessária e adequada aos autores, o que não ocorreu. O resultado, analisou o magistrado, extrapolou os meros aborrecimentos, especialmente porque o casal viajava com o filho de três anos.

“A situação vivenciada pelos autores, que foram submetidos a transporte, hospedagem e alimentação precários durante o período em que precisaram aguardar o voo em que seriam realocados […], além do fato da poltrona do menor estar separada das poltronas dos pais na ocasião do voo de retorno a Florianópolis, configura, sem sombra de dúvida, flagrante constrangimento, desconforto, frustração e desgaste”, anotou Ziembowicz.

A indenização imposta, destacou o juiz, deverá colaborar para que a companhia reveja seus procedimentos, devendo ser diligente na assistência prestada aos passageiros. A sentença ainda impõe reembolso aos autores no valor de R$ 54,59, correspondente ao gasto com transporte por aplicativo do hotel em Guarulhos para o aeroporto – as duas vans enviadas pela companhia não supriram a demanda. Cabe recurso ao Tribunal de Justiça.

Processo n. 0300849-37.2019.8.24.0082

STF julga constitucional revisão de anistia concedida a cabos da Aeronáutica

Na conclusão do julgamento de recurso extraordinário, o Plenário fixou a tese de repercussão geral de que a administração pública pode rever os atos de concessão de anistia, assegurando aos anistiados o direito de defesa.


Por seis votos a cinco, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou constitucional a possibilidade de revogação das anistias concedidas a cabos da aeronáutica atingidos por portaria do ministro da Aeronáutica que, em 1964, estabeleceu prazo máximo de permanência em serviço para cabos não concursados. De acordo com a decisão, porém, é garantido ao anistiado a defesa administrativa e a não devolução das verbas recebidas de boa-fé.

A questão foi analisada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 817338, com repercussão geral reconhecida, concluído nesta quarta-feira (16) com o voto de desempate do ministro Luiz Fux, que acompanhou o entendimento do relator do RE, ministro Dias Toffoli. De acordo com Fux, o decurso do prazo decadencial de cinco anos não é obstáculo para que a administração pública reveja atos que preservem situações inconstitucionais.

Com esse voto, prevaleceu o entendimento de que, mesmo após decorrido o prazo legal de cinco anos (decadência), é possível que a administração pública faça a revisão de atos administrativos caso seja constatada flagrante inconstitucionalidade. Segundo a maioria, a portaria do Ministério da Aeronáutica, por si só, não constitui ato de exceção, e é necessária a comprovação caso a caso da existência de motivação político-ideológica para a exclusão das Forças Armadas, único fator que possibilita a concessão de anistia. Os ministros entenderam, ainda, que notas técnicas emitidas pela AGU em 2003 e 2006 teriam interrompido o prazo decadencial. Seguiram essa corrente também os ministros Alexandre de Moraes, Roberto Barroso, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes.

Para a corrente minoritária, a revisão não seria possível em razão da incidência do prazo decadencial. Segundo a divergência, pareceres administrativos internos e genéricos, como as notas técnicas da AGU, têm caráter opinativo e não interrompem o prazo decadencial para anulação de ato administrativo, especialmente se não forem editados por autoridade competente para a revisão ou revogação do ato e sem a possibilidade de defesa da parte interessada. Essa corrente foi integrada pelos ministros Edson Fachin, que abriu a divergência, Celso de Mello, Marco Aurélio, Cármen Lúcia e Rosa Weber.

Revisão de anistia

A Portaria 1104/1964 do Ministério da Aeronáutica mudou a regra em vigor antes do início do regime militar para determinar a dispensa dos cabos contratados (não concursados) por mais de oito anos. Em novembro de 2002, a Comissão de Anistia entendeu que a medida configurava ato de exceção de natureza exclusivamente política, o que autorizava o reconhecimento da condição de anistiado dos atingidos com base no dispositivo constitucional que concedeu anistia a perseguidos políticos. Em fevereiro de 2011, o ministro da Justiça e o advogado-geral da União instituíram um grupo de trabalho para revisar as anistias concedidas com fundamento unicamente na Portaria 1.104/1964, o que resultou na anulação de diversos atos.

No caso dos autos, um cabo que obteve anistia em 2003 teve o ato revisto e anulado em 2011, com o fundamento de que não teria sido comprovada a motivação política e que a portaria de 1964 se limitara a disciplinar o tempo máximo de serviço dos militares por ela atingidos.
Em julgamento de mandado de segurança contra a revogação, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que, ultrapassado o prazo de cinco anos, fica consumada a decadência administrativa.

No recurso ao STF, a União alegava ofensa ao artigo 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), pois a dispensa, que atingiu a outros 2,5 mil cabos, não teria motivação exclusivamente política, como exigido textualmente nesse dispositivo para justificar a anistia.

Repercussão geral

A tese de repercussão geral fixada foi a seguinte: No exercício de seu poder de autotutela, poderá a administração pública rever os atos de concessão de anistia a cabos da Aeronáutica com fundamento na Portaria 1.104/1964 quando se comprovar a ausência de ato com motivação exclusivamente política, assegurando-se ao anistiado, em procedimento administrativo, o devido processo legal e a não devolução das verbas recebidas.

Processo relacionado: RE 817338

STJ: Falsa médica acusada de homicídio após aplicar silicone em cliente vai continuar em prisão preventiva

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a prisão preventiva de uma mulher que, mesmo sem habilitação profissional em medicina, teria realizado aplicações de silicone industrial em várias pessoas no Rio de Janeiro. Após um desses procedimentos com finalidade estética, a cliente morreu.

A mulher foi denunciada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro pelos crimes de homicídio e exercício ilegal da medicina. Segundo o MP, após complicações geradas pela colocação de silicone nas nádegas da cliente, a suposta profissional de saúde ainda lhe teria prescrito medicamentos, mas a vítima acabou morrendo.

A prisão preventiva foi decretada em julho de 2018. Na decisão, o magistrado apontou que a aplicação do silicone foi feita na residência da vítima, local que não reunia as condições mínimas necessárias para uma intervenção médica.

Medidas mais bran​​das
No pedido de habeas corpus, a defesa da ré argumentou que a prisão foi decretada sem que fossem indicados os motivos concretos para a adoção da medida extrema. Ainda segundo a defesa, seria possível a aplicação de medidas cautelares mais brandas que a prisão, tendo em vista que a ré não teria interesse em fugir ou se eximir do processo penal.

Também de acordo com a defesa, embora a ré seja mãe de um menor de dois anos, o magistrado de primeiro grau indeferiu o pedido de prisão domiciliar, descumprindo orientação do Supremo Tribunal Federal (STF) no HC 143.641.

Violê​​ncia
Em análise do pedido de soltura, o ministro Sebastião Reis Júnior, acompanhando manifestação do Ministério Público Federal (MPF), entendeu que o decreto prisional apresentou indícios suficientes de autoria e de materialidade dos crimes imputados à ré. O relator também destacou indícios de que, caso seja colocada em liberdade, ela poderá causar danos à ordem pública, especialmente em virtude de seu comportamento, do grau de periculosidade e da reiteração criminosa.

No tocante ao pedido de fixação da prisão domiciliar em razão da maternidade, Sebastião Reis Júnior destacou manifestação do MPF no sentido de que a decisão do STF excetua do benefício os casos de crimes praticados mediante violência ou grave ameaça, contra os descendentes e as situações excepcionalíssimas, que devem ser devidamente fundamentadas.

Para o Ministério Público, a mulher não cumpre os requisitos, especialmente considerando a gravidade de sua conduta e o entendimento de que a suposta prática de homicídio pode caracterizar a hipótese de violência mencionada no artigo 318-A do Código de Processo Penal, o que afastaria sua aplicação.

“Considerando-se a circunstância de se tratar de crime cometido de forma reiterada pela paciente, que tinha a agenda cheia, tendo como resultado a morte de uma mulher, caso em que a paciente não buscou o necessário socorro médico mesmo quando o procedimento feito apresentou complicações, mostra-se inviável a revogação da medida constritiva ou mesmo a concessão da prisão domiciliar com amparo no artigo 318, V, do Código de Processo Penal”, concluiu o ministro ao negar o pedido de habeas corpus.

Veja o acórdão.
Processo: HC 507579

STJ: Consumidor que encontrou carteira de cigarros dentro de garrafa de Cerveja Heineken receberá R$ 10 mil de danos morais

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) condenou uma fabricante de cerveja a pagar R$ 10 mil de danos morais a consumidor que encontrou uma carteira de cigarros dentro de uma garrafa de cerveja.

A decisão do colegiado seguiu a corrente interpretativa do STJ segundo a qual a compra de produto alimentício contendo corpo estranho na embalagem – mesmo sem haver ingestão do conteúdo – dá direito a indenização por dano moral. Para a outra corrente, o dano moral só se configura quando há consumo efetivo do produto, ainda que parcial.

“Apesar da divergência jurisprudencial no âmbito desta corte e com todo o respeito à posição contrária, parece ser o entendimento mais justo e adequado à legislação consumerista aquele que dispensa a ingestão, mesmo que parcial, do corpo estranho indevidamente presente nos alimentos”, afirmou a ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso do consumidor.

Acompanhando a relatora de forma unânime, a Terceira Turma entendeu que o consumidor foi exposto a grave risco e por isso reformou acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) para condenar a fabricante de cerveja ao pagamento de R$ 10 mil por danos morais.

“A simples comercialização de produto contendo corpo estranho possui as mesmas consequências negativas à saúde e à integridade física do consumidor que sua ingestão propriamente dita”, disse Nancy Andrighi.

Defeito de seguran​ça
Segundo o processo, o consumidor promoveu uma festa e, quando ia tomar a bebida, foi alertado por um convidado sobre o conteúdo estranho no interior da garrafa. Ele não chegou a abrir a embalagem.

Em primeira instância, o pedido de indenização foi negado, devido à não ingestão da bebida. O TJRS manteve a sentença, argumentando que os acidentes de consumo decorrentes de alimentos impróprios somente se materializam quando é colocada em risco a integridade física do consumidor com a ingestão do alimento impróprio.

Segundo a ministra Nancy Andrighi, “um produto ou serviço apresenta defeito de segurança quando, além de não corresponder à expectativa do consumidor, a utilização ou fruição for capaz de criar riscos à sua incolumidade ou à de terceiros”.

Para a ministra, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) protege o consumidor contra produtos que coloquem em risco sua segurança. Por isso, segundo a relatora, a simples comercialização de produto contendo corpo estranho possui as mesmas consequências negativas à saúde e à integridade física do consumidor que sua ingestão.

“Ainda que, na espécie, a potencialidade lesiva do dano não se equipare à hipótese de ingestão do produto contaminado (diferença que necessariamente repercutirá no valor da indenização), é certo que, conquanto reduzida, aquela também se faz presente na hipótese em julgamento”, declarou. De acordo com a ministra, o dano indenizável, no caso julgado, decorre do risco a que o consumidor foi exposto.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 1801593

STJ: Destituição do poder familiar pode ser pedida por quem não é parente do menor

Regulada pelo artigo 155 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a legitimidade para o pedido de destituição do poder familiar não está limitada ao Ministério Público e ao interessado que tenha laços familiares com o menor, podendo ser estendida, de acordo com as circunstâncias do caso, a pessoas não abarcadas pelo conceito limitado de vínculo familiar ou de parentesco, considerando sobretudo os princípios da proteção integral e do melhor interesse do menor.

O entendimento foi firmado pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que julgou extinta ação de destituição do poder familiar e de adoção em razão de ilegitimidade ativa. Para o TJMG, por não possuir vínculo de parentesco com a criança, a autora estaria desautorizada a propor a demanda.

“O foco central da medida de perda ou suspensão do poder familiar é, na sua essência, salvaguardar o bem-estar da criança ou do adolescente, motivo pelo qual a legitimidade para o pedido está atrelada à situação específica factual, notadamente diante dos complexos e muitas vezes intrincados arranjos familiares que se delineiam no universo jurídico de amparo aos interesses e direitos de menores”, apontou o relator do recurso, ministro Marco Buzzi.

Guarda d​​​e fato
De acordo com a ação, a autora tinha a guarda de fato da criança desde os nove meses de vida, quando a mãe biológica, sem condições financeiras de manter a filha, deixou-a sob os seus cuidados. Segundo a autora, o pai biológico é desconhecido, e a genitora abandonou outros três filhos – os quais, à época da propositura da ação, estavam recolhidos em abrigo.

O juiz de primeiro grau, acolhendo as conclusões do estudo social e o parecer do Ministério Público, destituiu a mãe biológica do poder familiar e deferiu a adoção à autora.

Em segunda instância, ao julgar extinta a ação sem resolução de mérito, o TJMG entendeu que a ação de destituição do poder familiar poderia ser ajuizada apenas pelo Ministério Público ou por quem tivesse legítimo interesse, nos termos do artigo 155 do ECA.

Conceito indetermina​​do
No STJ, o ministro Marco Buzzi destacou inicialmente que a suspensão ou destituição do poder familiar está muito mais relacionada a uma providência em prol da defesa do melhor interesse de crianças e adolescentes do que a um propósito de punição aos pais, motivo pelo qual o artigo 155 do ECA estabeleceu que o procedimento terá início por provocação do MP ou de quem tenha legítimo interesse.

Segundo o ministro, a legislação não define quem, em tese, possui o legítimo interesse para pleitear a medida, tampouco fixou definições taxativas para a legitimação ativa, tratando-se de conceito jurídico indeterminado.

“Não há omissão alguma na regra, sendo que a aparente imprecisão da norma jurídica, longe de ser considerada esquecimento ou displicência, constitui uma consciente opção legislativa derivada do sistema normativo protetivo estatuído pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, que tem como baliza central, reitere-se, assim, os princípios do melhor interesse da criança e da sua proteção integral”, disse o relator.

Prudên​​cia
O ministro ressaltou que o legítimo interesse para o pedido de perda ou suspensão do poder familiar deve ser analisado com prudência, a partir do caso concreto, sendo descabido considerar de forma automática que a adotante, por não possuir vínculo familiar com o menor, não possa ser parte legítima para propor a ação.

No caso dos autos, Marco Buzzi destacou que, de acordo com as instâncias ordinárias, a criança está sob a guarda informal da adotante desde 2006, não havendo notícia de mudanças significativas em relação à estabilidade do lar e do vínculo afetivo formado entre a autora e a adotanda.

Apesar disso, como o TJMG extinguiu o processo apenas com amparo na ausência de parentesco entre a autora e a criança, o relator entendeu ser necessário o retorno dos autos à instância ordinária para que, reconhecido o legítimo interesse da adotante, o recurso de apelação da mãe biológica seja analisado em seus demais termos.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.


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