TJ/MT garante direito de posse a compradora enganada por vendedor que fingiu ser viúvo

A Quinta Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) decidiu, por unanimidade, manter a posse de um imóvel com a compradora que adquiriu o bem de boa-fé, mesmo sem a autorização da ex-companheira do vendedor. A decisão, proferida em 25 de março de 2025, reforça a importância da boa-fé nas relações contratuais e a segurança jurídica nas transações imobiliárias.

O imóvel, localizado em Rondonópolis (MT), foi adquirido pela compradora por meio de contrato de compra e venda e posteriormente financiado. No entanto, a transação foi questionada após a ex-companheira do vendedor ajuizar ação de reconhecimento e dissolução de união estável, alegando que a venda foi realizada sem sua autorização – o que tornaria o negócio nulo, segundo o artigo 1.647 do Código Civil.

No processo, a compradora apresentou uma série de documentos que demonstraram sua boa-fé: o contrato assinado com o vendedor, que se declarou viúvo, a procuração para tratar do financiamento habitacional, fatura de energia em seu nome e comprovantes de pagamento das parcelas.

“O vendedor declarou-se viúvo em todos os documentos apresentados à compradora, inclusive na matrícula do imóvel, não havendo qualquer elemento indicativo de má-fé da embargante”, destacou o relator do processo, desembargador Sebastião de Arruda Almeida.

A ex-companheira do vendedor, por sua vez, alegou que o imóvel teria sido adquirido durante a união estável e que a venda, sem sua ciência, violava o regime de bens e deveria ser anulada. Contudo, o colegiado entendeu que o pedido de anulação não poderia ter sido feito como pedido contraposto em contestação, mas sim por reconvenção ou ação própria, conforme o artigo 343 do Código de Processo Civil.

“A pretensão de anulação do contrato de compra e venda se mostra inadequada na via utilizada, devendo ser manejada por reconvenção ou ação própria”, afirma o acórdão.

Outro ponto decisivo foi a inexistência de qualquer registro formal da união estável à época da venda. A decisão cita a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que estabelece que, na ausência de publicidade do vínculo, a boa-fé do adquirente deve prevalecer.

“É válida a aquisição de imóvel realizada por terceiro de boa-fé que ignora a existência de união estável sem publicidade, ainda que ausente a outorga uxória, quando o alienante se declara viúvo e inexiste qualquer anotação ou registro que evidencie o vínculo”, diz a tese fixada no julgamento.

A sentença de origem, mantida integralmente, havia reconhecido a posse justa da compradora com base nos artigos 1.196, 1.200 e 1.201 do Código Civil, além da Súmula 84 do STJ, que admite a defesa da posse por meio de embargos de terceiro, mesmo sem o registro do contrato de compra e venda.

O colegiado também esclareceu que a sentença da ação de dissolução de união estável tratou apenas da partilha dos valores pagos no financiamento, sem mencionar ou invalidar o contrato de venda celebrado com a compradora.

“A sentença nos autos da ação de reconhecimento e dissolução da união estável limitou-se à partilha das parcelas pagas do financiamento, sem qualquer pronunciamento acerca da posse exercida por terceiro ou da validade do contrato de compra e venda”, conclui o acórdão.

Com a decisão, a compradora permanece na posse do imóvel, enquanto a ex-companheira do vendedor poderá buscar eventual reparação em ação própria contra o antigo companheiro, que omitiu o relacionamento na documentação oficial da transação.

TJ/RN: Operadora de saúde deve realizar internação de idosa de 78 anos com distúrbios da órbita

A Justiça determinou que uma operadora de saúde autorize, de forma imediata, a internação hospitalar de uma paciente de 78 anos, além da cobertura de exames, insumos e demais procedimentos necessários à sua recuperação. A decisão é da 10ª Vara Cível da Comarca de Natal.

De acordo com os autos do processo, a paciente foi encaminhada a um hospital da capital potiguar em 30 de abril após apresentar problemas de saúde, sendo diagnosticada com distúrbios na órbita e alterações hidroeletrolíticas, região em que se localiza os olhos e que é suscetível a diversos problemas.

A partir do diagnóstico, foi recomendada a internação urgente em leito clínico pela equipe médica. No entanto, o pedido foi negado pela operadora. A empresa argumentou que o contrato ainda estaria em período de carência, porém, a paciente é beneficiária do plano de saúde desde o mês de fevereiro de 2025.

Em sua decisão, a magistrada destacou que, segundo o entendimento consolidado no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN), é abusiva a negativa de atendimento em situações de urgência sob a justificativa de carência contratual, quando já transcorrido o prazo mínimo de 24 horas desde a adesão ao plano.

A magistrada responsável pela análise do caso ressaltou que a negativa da operadora coloca em risco a saúde e a vida da paciente, valores resguardados pela Constituição Federal no artigo 196. “Logo, diante da urgência do caso, não há que se falar em carência para realização do procedimento, mormente quando a demora pode levar a um quadro generalizado, com comprometimento grave da saúde da paciente”, diz trecho da decisão.

Com isso, em razão do risco de agravamento do quadro clínico da paciente, a tutela de urgência foi deferida, determinando que a operadora de saúde adote as providências necessárias e imediatas para garantir e autorizar a internação da mulher. Além disso, foi fixada multa diária de mil reais, limitada a R$ 20.000, em caso de descumprimento.

TJ/MS: Empresa de ônibus é condenada a indenizar passageiros por atraso de mais de 12 horas

A Justiça de Mato Grosso do Sul condenou uma empresa de transporte interurbano ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10 mil para cada um dos quatro passageiros que enfrentaram mais de 12 horas de atraso e abandono durante uma viagem de ônibus. A decisão é da juíza Gabriela Müller Junqueira, da 7ª Vara Cível de Campo Grande.

Na ação, os passageiros alegaram falha grave na prestação do serviço contratado. Segundo os autores, a viagem teve início no Rio de Janeiro, com destino a Campo Grande, mas foi interrompida cerca de 1h30 após a partida, devido a uma pane mecânica no ônibus.

De acordo com o processo, os passageiros permaneceram por mais de 13 horas em um posto de gasolina desativado, em local considerado inseguro pela Polícia Militar, sem qualquer suporte da empresa. Somente no dia seguinte um novo veículo foi providenciado e, até então, os autores afirmam que não receberam qualquer assistência da empresa.

A empresa ré reconheceu o atraso de 12 horas e 30 minutos e a falha mecânica, mas argumentou que prestou a devida assistência, alegando ainda que atrasos são previsíveis em viagens rodoviárias e que o episódio não configuraria dano moral. Alegou também que os passageiros foram conduzidos a um restaurante próximo, onde teriam recebido conforto, alimentação e água.

No entanto, a juíza rejeitou a tese da defesa. “De modo algum atraso no serviço de transporte superior a 12 horas pode ser considerado normal, esperado ou irrelevante”, afirmou em sua sentença. A magistrada ressaltou que, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, a responsabilidade do transportador é objetiva, e que o atraso excessivo configura falha na prestação do serviço.

Testemunhas de ambas as partes confirmaram que os passageiros ficaram parados por horas em local inadequado e sem estrutura, sendo posteriormente retirados pela empresa que administra a rodovia — e não pela transportadora —, o que reforçou o entendimento da juíza sobre a ausência de assistência.

A indenização por danos materiais, no entanto, foi negada a um dos autores por falta de comprovação dos prejuízos alegados, como perda de meio dia de trabalho e despesas com alimentação.

TJ/DFT: Estado deve indenizar família por erro em parto que gerou sequela neurológica permanente

A 4ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) manteve a condenação do Distrito Federal ao pagamento de indenização por danos morais e materiais a uma família devido a falhas médicas durante um parto na rede pública de saúde, que resultaram em danos neurológicos permanentes à criança.

O caso envolveu alegações de imperícia no atendimento médico, o que incluiu demora na realização do parto, uso inadequado de medicamentos e falhas no diagnóstico da posição fetal. Os pais alegaram que o erro causou paralisia cerebral, epilepsia e perda definitiva da capacidade laboral da criança, que exige cuidados vitalícios. O Distrito Federal contestou, sob o argumento que seguiu os protocolos e que não havia nexo causal comprovado entre o atendimento e as sequelas.

O colegiado considerou válido o laudo pericial que apontou falhas no serviço, como a indução do parto fora dos protocolos e a tentativa inadequada de uso de fórceps. Segundo o relator, “a imperícia do corpo médico, ao não diagnosticar corretamente a posição fetal e utilizar o fórceps de forma inadequada, levou à interrupção da progressão do parto e à anoxia intraparto do menor, evidenciando a conduta do agente público, o dano e a relação causal entre ambos”. A decisão judicial confirmou a responsabilidade objetiva do Estado, conforme o artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, que estabelece o dever de indenizar quando há falha na prestação de serviço público.

Com base nesse entendimento, o Tribunal manteve o pagamento de pensão vitalícia equivalente a dois salários mínimos mensais, considerando a necessidade de cuidados contínuos com medicamentos, profissionais de saúde e adaptações na rotina da família. Também foram mantidas as indenizações por danos morais, fixadas em R$ 100 mil para a criança, R$ 75 mil para a mãe e R$ 50 mil para o pai.

A decisão foi unânime.

Processo: 0705533-04.2022.8.07.0018

TJ/RN: Companhia aérea deve indenizar palestrante que perdeu compromissos após remarcação de voo de conexão

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN) condenou uma empresa aérea a indenizar uma palestrante em R$ 4 mil reais, por danos morais, após remarcar seu voo de conexão. A decisão é da juíza Josane Peixoto Noronha, do Juizado Especial Cível e Criminal da Comarca de Macaíba.

A mulher afirmou que comprou passagens com uma agência de viagens para viajar de Natal a Navegantes, em Santa Catarina, no dia 20 de abril de 2024, com uma conexão no Rio de Janeiro, para dar palestras em diversos eventos religiosos no estado de destino entre os dias 20 e 30 de abril.

Entretanto, a passageira foi surpreendida com o cancelamento do voo de conexão, sob a alegação de “impossibilidade operacional”. A companhia aérea, então, ofereceu reacomodação em outro voo com saída no dia 21 de abril, o que impossibilitou o cumprimento de um de seus compromissos.

Em sua defesa, a empresa aérea alegou que “a responsabilidade por qualquer remarcação ou reembolso deveria ser atribuída à agência de viagem que intermediou a venda das passagens”. Ainda foi argumentado que o cancelamento do voo se deu por “questões de reestruturação da malha aérea”.

Transporte aéreo e relação de consumo
Ao analisar o processo, apesar dos contratos de transporte aéreo serem regulamentados pelo Código Brasileiro de Aeronáutica, a magistrada Joseane Peixoto pontuou a relação de consumo característica da relação contratual no caso, já que “de um lado, a empresa aérea pode ser identificada como fornecedora de serviço e, do outro, o passageiro é enquadrado como consumidor”.

A juíza também citou jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que determinou a subordinação da prestação de serviços das companhias aéreas ao “Código Consumerista”. Portanto, levando em consideração as provas anexadas nos autos, além de precedentes do próprio Judiciário Potiguar, a magistrada que analisou o caso atendeu o pedido de condenação da companhia aérea por danos morais.

“Diante da situação analisada estou convencida de haver nos autos consequências suplementares ao descumprimento contratual as quais demonstram ser causadoras de prejuízos de ordem moral, pelo fato do cancelamento do voo e ter a parte autora embarcado apenas no dia 21/04/2024, em razão da má prestação de serviço da parte ré, dando a pretensão autoral vasto amparo jurisprudencial conforme precedentes do E. TJRN e de suas Turmas Recursais”, concluiu.

TRT/PA-AP: Trabalhadora PCD deve ser indenizada após dispensa discriminatória

Motorista de veículos pesados em uma mineradora no sul do Pará, a trabalhadora não recebeu condições de trabalho adequadas.


A 1ª Vara do Trabalho de Parauapebas (PA), da Justiça do Trabalho da 8ª Região, condenou uma mineradora que atua no sul do Pará por dispensa discriminatória, incluindo indenização por danos morais, e ainda, pagamento de adicional de insalubridade após visita técnica ao local. A trabalhadora é pessoa com deficiência (PcD), com surdez unilateral, e, à época da abertura do processo, era contratada como operadora de máquinas de construção civil e mineração.

A juíza substituta Pricila Apicelo, em julgamento, tratou sobre a questão de dispensa discriminatória da trabalhadora utilizando o Protocolo para Atuação e Julgamento com Perspectiva Antidiscriminatória, Interseccional e Inclusiva da Justiça do Trabalho. Ficou constatado que a empresa sabia da deficiência da trabalhadora ao contratá-la, mas se recusou a fazer adaptações no seu ambiente de trabalho por considerar que ela não foi candidata a uma vaga específica para PcD.

A trabalhadora contou que chegou a pedir a troca de maquinário utilizado, pois, durante os testes para sua contratação o modelo era não prejudicial para sua audição, mas o que passou a usar quando de fato começou o trabalho na mina não era adequado. A comunicação por sinais sonoros para orientação dela como motorista em seu percurso na mina também era inadequado e não houve troca ou ajuste.

Diante da situação, a profissional solicitou transferência para outra vaga na empresa, mas foi informado que não havia vaga em outros setores e ela foi demitida. Após a motorista entrar com o processo na Justiça do Trabalho da 8ª Região, a empresa – antes mesmo da primeira audiência – realizou a recontratação da trabalhadora e a recolocou em um cargo na área administrativa e não mais na área de mina. No processo, de fato, a juíza solicitou que as duas medidas fossem tomadas, e confirmou com a trabalhadora que a empresa já tinha tomado a iniciativa, se antecipando à decisão judicial.

Além disso, a trabalhadora pleiteou o pagamento de adicional de insalubridade pelo tempo que atuou como motorista de veículos pesados na mina e foi de fato constatada a existência de insalubridade em grau médio (20%), devido à exposição ao agente “ruído contínuo e intermitente”, acima do limite de tolerância, sem a devida proteção.

Em sua decisão, a juíza substituta Pricila Apicelo destacou as interseccionalidades do caso, verificando múltiplas vulnerabilidades no caso da trabalhadora. “A autora relatou, no exame ocupacional de 28.03.24, que mora com sua filha de 15 anos. Em sua ficha funcional, consta seu estado civil como separada judicialmente. Ou seja: a autora é mulher, mãe de uma adolescente, PCD e separada. Tal fato enseja aplicação do Protocolo para Atuação e Julgamento com Perspectiva Antidiscriminatória, Interseccional e Inclusiva da Justiça do Trabalho, juntamente com todos os diplomas nacionais e internacionais aplicáveis ao caso”.

O art. 2º da Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência estabelece que a discriminação ocorre não apenas pelo dolo, mas, também, pelo resultado de atos que acarretem objetiva inviabilização do acesso a direitos pelas pessoas com deficiência. Nesse sentido, o art. 1º e 2º da Lei Brasileira de Inclusão desfocam a deficiência da pessoa, para as barreiras sociais que PCD enfrentam cotidianamente, para o exercício de direitos em iguais condições com os demais membros da sociedade.

“No caso, a ré deixa claro seu entendimento de que não precisa readaptar sua outrora empregada, pois ‘já possuía outros empregados PCD, já havia preenchido sua cota’. Mais: informa acreditar que não tinha necessidade de adaptar as condições de trabalho da autora, pois ela se candidatou a uma vaga de ampla concorrência. Tais crenças causam profundo espanto, pois a garantia de adaptação razoável é do ser humano PCD e não daquele que consegue êxito em ocupar ‘vagas destinadas a PCD’”, destacou a magistrada diante das afirmações dadas pela empresa de mineração.

A magistrada reforçou que a postura tomada pela empresa violou a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho. E destacou a importância do Judiciário nestes casos: “Quando um contrato de experiência é findo em razão de uma falta de adaptação razoável às condições de trabalho de um PCD, cabe ao Poder Judiciário intervir para evitar o abuso de Direito e garantir a função social da propriedade. Aliás, esse é o próprio sentido do Direito do Trabalho: evitar abusos da classe patronal sobre os trabalhadores, garantindo um patamar mínimo civilizatório das condições de trabalho”.

TJ/RN condena Município a indenizar família por morte de recém-nascido

A 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN) decidiu que uma família deverá ser indenizada em R$ 140 mil pela morte do filho recém-nascido, ocorrida após o parto realizado no Município de Nova Cruz, no agreste potiguar. A decisão reformou a sentença da primeira instância, reconhecendo falha no atendimento médico.

Segundo os autos, a mulher relatou que estava grávida de sete meses quando entrou em trabalho de parto e deu à luz em sua própria residência, sendo posteriormente levada por familiares ao Hospital Monsenhor Pedro Moura, no Município de Nova Cruz.

No hospital, o médico plantonista indicou a necessidade de transferência para a Maternidade Januário Cicco, localizada em Natal, solicitando ambulância com a UTI móvel do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU). Entretanto, o veículo não chegou a tempo e o recém-nascido veio a óbito.

A mulher, então, alegou que houve omissão específica do ente municipal e que a falha na garantia do transporte e atendimento médico adequado foram determinantes para o falecimento do bebê. Em primeira instância, o pedido formulado foi julgado improcedente e, por isso, a família entrou com recurso de apelação cível.

O Município, por sua vez, alegou que prestou o atendimento necessário ao recém-nascido, encaminhando-o a uma incubadora neonatal. Destacou, ainda, que a jurisprudência dominante exige a comprovação de culpa quando se trata de omissão do Poder Público em situações de atendimento de saúde e que não houve comprovação de que a transferência para outro hospital teria evitado o óbito.

Na análise do caso, o desembargador Vivaldo Pinheiro salientou a teoria da responsabilidade objetiva do ente público, presente no artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal. Assim, o ente público seria responsável pelos danos que causar no exercício comissivo ou omissivo de suas atividades, havendo ou não culpa de seus agentes, bastando demonstrar o dano e o seu nexo com aquela atividade.

Na situação, diferentemente do entendimento adotado na sentença, o magistrado de segunda instância observou omissão na conduta do ente municipal, que deixou de providenciar a transferência do neonato para Maternidade Januário Cicco, onde teria aumentado as chances de vida do recém-nascido.

“Desse modo, a ausência de ambulância no local, por si só, caracteriza clara omissão do ente público e o nexo de causalidade resta identificado no fato de que a falta de transferência culminou com o agravamento do quadro de saúde do paciente e seu falecimento, atraindo, portanto, a responsabilização do Município”, destacou.

Além disso, foi evidenciado o dever de indenizar a família, sendo “inegável o sofrimento emocional e psicológico decorrente da perda de um filho”. Assim, a sentença foi reformada, condenando o Município de Nova Cruz a pagar indenização por danos morais no valor de R$ 70 mil para cada autor, além de inverter o ônus da sucumbência, que serão suportados integralmente pelo ente municipal, fixados em 10% do valor da causa.

STJ: Compra tributada de insumos para produtos imunes também dá direito a créditos de IPI

​Sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.247), a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que “o creditamento de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), estabelecido no artigo 11 da Lei 9.779/1999, decorrente da aquisição tributada de matéria-prima, produto intermediário e material de embalagem utilizados na industrialização, abrange a saída de produtos isentos, sujeitos à alíquota zero e imunes”.

No julgamento, o colegiado discutiu a abrangência do benefício fiscal instituído pelo artigo 11 da Lei 9.779/1999, a fim de definir, especificamente, se há direito ao creditamento de IPI na aquisição de insumos e matérias-primas tributados (entrada onerada), inclusive quando aplicados na industrialização de produto imune; ou se tal benefício ocorre apenas quando utilizados tais insumos e matérias primas na industrialização de produtos isentos ou sujeitos à alíquota zero.

Com a definição da tese, podem voltar a tramitar todos os processos sobre o mesmo assunto que estavam suspensos à espera do precedente.

Benefício para produtos imunes não é interpretação extensiva de norma
Segundo o relator do repetitivo, ministro Marco Aurélio Bellizze, o dispositivo legal em debate traz os requisitos para as hipóteses de manutenção do crédito de IPI, bem como deixa claro – sobretudo ao utilizar a expressão “inclusive” – que o benefício não se restringe às saídas de produto isento ou sujeito à alíquota zero, mas, sim, que ele está assegurado também nesses casos, sem excluir outras situações de saída desonerada.

“O reconhecimento do direito ao creditamento não decorre de suposta extensão do benefício contido no artigo 11 da Lei 9.779/1999 para hipótese ali não prevista, mas, ao contrário, da compreensão fundamentada de que tal situação (produto imune) está contida na norma em exame, sobretudo ao utilizar o termo ‘inclusive'”, apontou o magistrado.

O aproveitamento do crédito de IPI, explicou o relator, exige a verificação de dois requisitos. O primeiro diz respeito à realização de operação de aquisição de matéria-prima, produto intermediário ou material de embalagem, sujeita à tributação do imposto. O segundo é a submissão do bem adquirido ao processo de industrialização, conforme disposto no Regulamento do IPI (Decreto 7.212/2010).

“Verificadas, assim, a aquisição de insumos tributados e a sua utilização no processo de industrialização, o industrial faz jus ao creditamento de IPI, afigurando-se desimportante, a esse fim, o regime de tributação do imposto na saída do estabelecimento industrial, já que é assegurado tal direito inclusive nas saídas isentas e nas sujeitas à alíquota zero”, afirmou Bellizze.

Disciplina de tributação na saída do estabelecimento industrial é irrelevante
O ministro também citou os critérios definidos na Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (Tipi) para viabilizar o direito ao crédito de IPI, especialmente no que diz respeito aos produtos sob a rubrica NT (não tributado).

Nessa categoria, prosseguiu, estão produtos excluídos do campo de incidência do IPI, já que não são resultantes de nenhum processo de industrialização; e outros que, apesar de derivados do processo de industrialização, por determinação constitucional, são imunes ao tributo.

Dessa forma, o relator observou que, se o produto – resultado do processo de industrialização de insumos tributados na entrada – é imune, o industrial tem direito ao creditamento. Porém, se o produto não deriva do processo de industrialização de insumos tributados, sua saída, ainda que desonerada, não faz jus ao creditamento de IPI.

Nas palavras do ministro, o direito ao creditamento “não se aperfeiçoa porque não houve submissão ao processo de industrialização, e não simplesmente porque o produto encontra-se sob a rubrica NT na Tipi”, detalhou.

“Para efeito de creditamento, a disciplina de tributação na saída do estabelecimento industrial é absolutamente irrelevante, com idêntico resultado para produto isento, sujeito à alíquota zero ou imune (independentemente da distinção da natureza jurídica de cada qual), exigindo-se, unicamente, que o insumo adquirido (e tributado) seja submetido ao processo de industrialização”, concluiu Marco Aurélio Bellizze.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 1976618

TRF1 suspende exigência de “circuito fechado” no transporte por fretamento

O desembargador federal Newton Ramos, da 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), deferiu pedido formulado pela Associação Brasileira dos Fretadores Colaborativos (Abrafrec) para suspender os efeitos do art. 3º, inciso XIV, da Resolução ANTT nº 4.777/2015. O dispositivo impugnado estabelece o conceito de “circuito fechado” como a viagem de ida e volta realizada por um mesmo grupo de passageiros, no mesmo veículo, com retorno ao ponto de origem — exigência que impunha restrições à atuação das empresas de transporte coletivo por fretamento.

Ao analisar o recurso, o magistrado entendeu ser cabível o exercício do juízo de retratação para reformar decisão anterior e conceder a tutela de urgência pleiteada. Destacou que a exigência normativa não encontra respaldo na Lei nº 10.233/2001 — diploma legal que disciplina a organização do setor de transportes terrestres e a atuação da ANTT.

“A referida lei, embora disponha sobre as modalidades de autorização para o serviço de fretamento, não contempla o conceito de ‘circuito fechado’ nem autoriza, de forma expressa ou implícita, a imposição de tal condicionante à operação das empresas autorizadas. Trata-se de restrição que ultrapassa o poder regulamentar da Agência e que, portanto, carece de validade à luz do ordenamento jurídico vigente”, afirmou o desembargador federal.

Ressaltou também que, conforme dispõe a Constituição Federal, cabe à lei — e não a regulamentos infralegais — disciplinar a ordenação dos transportes terrestres, com observância dos princípios da livre iniciativa, da concorrência e da racionalidade regulatória.

Citou ainda parecer técnico da Secretaria de Advocacia da Concorrência e Competitividade (SEAE), vinculada ao Ministério da Economia, que concluiu que a exigência de “circuito fechado” no transporte por fretamento gera ineficiências econômicas, eleva custos operacionais, encarece os serviços para o consumidor e restringe a entrada de novos agentes e a inovação no setor.

“Dessa forma, reconheço a existência dos pressupostos legais para o deferimento da tutela cautelar, nos termos do art. 300 do CPC, e, em juízo de retratação, reformo a decisão anteriormente proferida”, concluiu o desembargador federal Newton Ramos.

Processo: 1030928-09.2024.4.01.0000

TJ/RJ afasta diretoria da CBF e determina a convocação de nova eleição na entidade

O desembargador Gabriel Zéfiro, da 21ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, determinou, nesta quinta-feira (15/5), o afastamento do atual presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Ednaldo Rodrigues, assim como dos demais membros da diretoria da entidade. Na decisão, o magistrado determinou, ainda, a realização, “o mais rápido possível”, de nova eleição para os cargos diretivos da CBF, indicando para comandar o processo eleitoral, o vice-presidente mais antigo da instituição, Fernando José Sarney.

“Determino: 1- o afastamento da atual diretoria da CBF; 2- que o Vice-Presidente da CBF, Fernando José Sarney, realize a eleição para os cargos diretivos da CBF, na qualidade de interventor, o mais rápido possível, obedecendo-se os prazos estatutários, ficando a seu cargo, até a posse da diretoria eleita, os poderes inerentes à administração da instituição, dispostos no art.7º do Estatuto da Entidade”.

O afastamento de toda a diretoria foi determinado após o desembargador declarar nulo o acordo firmado em fevereiro desse ano, entre a CBF, a Federação Mineira de Futebol e dirigentes esportivos, reconhecendo a legalidade da Assembleia Geral Extraordinária da CBF, realizada em 7 de março de 2022, e da Assembleia Geral Eleitoral, ocorrida em 23 de março de 2022, que definiram as regras eleitorais da entidade.

O desembargador Zéfiro considerou haver “indícios robustos” de que o ex-presidente da CBF Antônio Carlos Nunes de Lima, mais conhecido como Coronel Nunes, não tinha condições de saúde para assinar o acordo.

“A robustez dos indícios trazidos aos autos leva à inarredável conclusão acerca de um fato, até mesmo óbvio: há muito o Coronel Nunes não tem condições de expressar de forma consciente sua vontade. Seus atos são guiados. Não emanam da sua vontade livre e consciente. De tal forma, em obediência ao que me foi determinado pelo E. STF, DECLARO NULO O ACORDO FIRMADO ENTRE AS PARTES, HOMOLOGADO OUTRORA PELA CORTE SUPERIOR, em razão da incapacidade mental e de possível falsificação da assinatura de um dos signatários, ANTÔNIO CARLOS NUNES DE LIMA, conhecido por CORONEL NUNES.”

Entre os indícios que chamou de “fáticos”, para constatar as precárias condições de saúde do Coronel Nunes, o magistrado citou o diagnóstico de neoplasia cerebral maligna (tumor no cérebro) e cardiopatia grave, a qual acometem o coronel Nunes desde 2018; laudo médico de 19 de junho de 2023, firmado pelo chefe do departamento médico da CBF, Dr. Jorge Pagura, que atesta “déficit cognitivo” do signatário já em 2023; procuração pública datada de 20 de junho de 2023, um dia depois do referido laudo, na qual o coronel Nunes confere amplos poderes para terceiro gerenciar todas as suas finanças junto ao banco e; parecer grafotécnico de 2025, cuja conclusão aponta que a assinatura firmada no referido acordo diverge do punho periciado.

STF determinou ao TJRJ análise das denúncias

A partir de um laudo grafotécnico apresentado pela perita Jacqueline Tirotti, no último dia 4 de maio, o vice-presidente da CBF, Fernando José Sarney requereu a anulação do acordo que referendou a eleição do atual presidente Ednaldo Rodrigues.
No dia 7 de maio, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes decidiu não afastar Ednaldo da presidência da entidade, mas determinou que o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro analisasse as denúncias apresentadas.
Assim, o desembargador Gabriel Zéfiro convocou o coronel Nunes para prestar esclarecimentos em audiência no dia 12 de maio. Contudo, os advogados do coronel informaram que, por problemas de saúde, ele não poderia comparecer à audiência.

Processo nº 0186960-66.2017.8.19.0001


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