TRT/SP: Empresa é condenada por discriminação racial após trabalhadora ser alvo de insinuação ofensiva sobre cotas

Decisão proferida na 1ª Vara do Trabalho de Suzano-SP condenou empresa do ramo alimentício a pagar indenização por danos morais no valor de R$ 25 mil a atendente de loja vítima de racismo. De acordo com os autos, uma colega da trabalhadora alegava que a mulher teria sido admitida pela Seara Alimentos Ltda. em decorrência de cotas raciais, pois ela não teria capacidade nem competência para o cargo que ocupava. No processo, consta ainda que uma gerente perseguia a reclamante, atribuindo apenas a ela as tarefas mais pesadas, como receber e descarregar caminhões, além de organizar, sozinha, a câmara fria.

As testemunhas autorais e patronais relataram que era de amplo conhecimento na ré que a autora havia formalizado denúncia ao compliance da instituição por causa do tratamento discriminatório, porém a instituição permaneceu inerte.

Na sentença, a juíza Juliana Ranzani mencionou a previsão constitucional que proíbe quaisquer formas de discriminação. Citou também a Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância e a Convenção n° 111, da Organização Internacional do Trabalho, que visa combater a discriminação em matéria de emprego e profissão. Ao julgar, ela ressaltou que as obrigações antidiscriminatórias assumidas pelo Estado brasileiro no âmbito internacional alcançam também as relações jurídicas privadas.

A magistrada lembrou ainda que a sociedade brasileira, “profundamente marcada pelo racismo estrutural”, perpetua a discriminação por meio da naturalização de ações, falas e pensamentos que promovem a segregação ou o preconceito racial. E pontuou que condutas de desqualificação que tentam constranger ou rebaixar, como no caso da reclamante, “mulher negra retinta, não podem ser, de forma alguma, franqueadas pela empregadora, sendo inconcebíveis e intoleráveis no meio ambiente de trabalho”.

Na decisão, foi determinada expedição de ofício ao Ministério Público do Trabalho e ao Ministério Público Estadual para ciência dos fatos narrados e, se for o caso, adoção de providências devidas.

Pendente de análise de recurso.

TJ/RN: Empresa de viagens e companhia aérea são condenadas por danos morais e materiais após cancelamento de viagem

O 12º Juizado Especial Cível de Natal condenou uma empresa de viagens e uma companhia aérea ao pagamento de indenização por danos morais e materiais a um casal que teve uma viagem em família ao estado de Santa Catarina cancelada. A sentença é da juíza Sulamita Bezerra Pacheco.

De acordo com o processo, os clientes adquiriram, por meio da plataforma da empresa de viagens, passagens aéreas da companhia aérea envolvida. O trajeto, que incluía dois filhos e uma enteada, havia sido planejado para coincidir com o período de férias.

Contudo, os voos foram alterados sem aviso prévio em duas ocasiões, aumentando consideravelmente a duração da viagem e inviabilizando toda a logística previamente organizada, incluindo hospedagem e aluguel de carro.

Diante das mudanças impostas, o casal recusou a reprogramação e solicitou o cancelamento com reembolso integral. Apesar de a empresa prometer a devolução total, apenas R$ 1.235,95 foram restituídos, restando um saldo de R$ 5.013,59 indevidamente retido.

Ao analisar o caso, a juíza Sulamita Bezerra Pacheco considerou que houve falha clara na prestação do serviço. Na decisão, destacou que os consumidores têm direito ao reembolso integral quando o serviço contratado é modificado de forma significativa, conforme estabelece o Código de Defesa do Consumidor e a regulamentação da ANAC.

A magistrada também reconheceu que a frustração da viagem familiar, agravada pela ausência de solução adequada por parte das empresas, ultrapassa o mero aborrecimento, configurando dano moral indenizável.

“A frustração intensa, o desgaste emocional e a sensação de impotência diante das alterações impostas e da retenção do dinheiro são suficientes para caracterizar o dano moral”, afirmou a juíza na sentença.

Assim, as empresas foram condenadas ao pagamento de R$ 10.027,18 — o dobro do valor retido — e mais R$ 8 mil ao casal por danos morais.

TJ/RN: Banco é condenado por realização de cobranças indevidas em conta de cliente

A 2ª Câmara Cível do TJRN, em recente decisão, voltou a destacar que uma instituição financeira responde pelos danos causados aos consumidores, independente de culpa, uma vez que a atividade econômica por ela explorada está sujeita à teoria do risco do empreendimento e que, desta forma, responde objetivamente pelos danos causados ao consumidor em razão de cobrança indevida, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor.

O destaque se deu no julgamento de uma apelação, sob relatoria da desembargadora Lourdes de Azevêdo, que determinou a majoração do valor da indenização para R$ 2 mil.

Segundo o voto, é preciso destacar que a relação entre as partes é de consumo, aplicando-se as normas do CDC, quanto à chamada “responsabilidade objetiva” do fornecedor de serviços. “O ônus da prova sobre a regularidade das cobranças recai sobre a parte ré, nos termos do artigo 373, II, do Código de Processo Civil, não tendo a instituição demonstrado a contratação válida do serviço e a legitimidade das cobranças efetuadas”, reforça a relatora.

Conforme a decisão, o conjunto probatório produzido pela parte ré realmente não afastou as alegações autorais, devendo ser enfatizado que o ônus de provar a existência de relação contratual e do crédito dela gerado é imposto à parte ré, o que não se observou no caso.

“No que diz respeito à indenização por danos morais em razão da tarifação indevida, entendo que a conduta do banco demandado, como já dito, representa ofensa aos princípios da boa-fé objetiva, da transparência e da informação, de modo que o apelo da instituição financeira quanto ao afastamento dos danos morais não merece prosperar”, conclui a relatora.

TJ/MT reconhece abuso de app de serviço de transporte em exclusão de motorista e determina indenização

TJ reconhece abuso de app de serviço de transporte em exclusão de motorista e determina indenização.


A Terceira Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) deu parcial provimento a um recurso e condenou uma plataforma de mobilidade urbana a credenciar um motorista que havia tido seu acesso negado de forma indevida, além de fixar indenização por danos morais no valor de R$ 7 mil.

O caso envolveu a recusa da empresa em permitir o cadastro de um motorista sob a alegação de existência de um “apontamento criminal”. Entretanto, ficou comprovado no processo que o motorista celebrou e cumpriu integralmente um Acordo de Não Persecução Penal (ANPP), instituto que, de acordo com a legislação (Lei nº 9.099/1995, art. 76), não configura condenação criminal nem gera antecedentes.

De acordo com o voto do relator, desembargador Carlos Alberto Alves da Rocha, a conduta da plataforma violou princípios fundamentais das relações contratuais, como a boa-fé objetiva e a função social do contrato, previstos no Código Civil. O magistrado ressaltou que a restrição imposta foi desproporcional e sem respaldo legal, caracterizando abuso de direito.

“A restrição imposta pela plataforma, baseada em um conceito ampliado e arbitrário de ‘apontamento criminal’, violou direitos fundamentais do trabalhador e comprometeu seu direito ao trabalho”, afirmou o relator em seu voto.

O colegiado entendeu que a exclusão injustificada afetou diretamente a dignidade do trabalhador, ultrapassando o mero aborrecimento e configurando dano moral indenizável. Apesar disso, o pedido de indenização por lucros cessantes foi negado, pois não houve comprovação concreta dos valores que teriam sido efetivamente perdidos.

A tese firmada pela Terceira Câmara estabelece que “a negativa de credenciamento de motorista parceiro por apontamento criminal inexistente, sem condenação judicial, é abusiva e afronta a boa-fé objetiva e a função social do contrato”. A decisão também reforça que a exclusão injustificada de motoristas de plataformas digitais, quando compromete seu sustento, gera direito à indenização por dano moral.

Além da indenização, a decisão determinou o credenciamento do motorista na plataforma e a inversão do ônus da sucumbência, atribuindo à plataforma a maior parte das custas e dos honorários advocatícios.

Processo nº 1030200-27.2024.8.11.0041

TRT/RS: Copeiro vítima de homofobia recreativa deve receber indenização de R$ 30 mil por danos morais

Copeiro vítima de homofobia recreativa deve receber indenização de R$ 30 mil por danos morais.


Resumo:

  • Um copeiro sofreu ataques homofóbicos no ambiente de trabalho, sendo constantemente alvo de apelidos depreciativos por parte de colegas e superiores, tais como “bicha” e “gay da noite”.
  • A empregadora foi omissa diante das denúncias, não adotando medidas para coibir os abusos.
  • A juíza Rachel Albuquerque de Medeiros Mello enquadrou o caso como homofobia institucional e condenou o hospital empregador a pagar indenização por danos morais, fixada em R$ 30 mil.

Um copeiro que prestava serviços em um hospital de Porto Alegre e era alvo de ataques homofóbicos por parte de colegas de trabalho deve receber uma reparação pelos danos morais sofridos. A indenização foi fixada em R$ 30 mil pela juíza Rachel Albuquerque de Medeiros Mello, da 16ª Vara do Trabalho da Capital.

O empregado alegou que era tratado constantemente pela expressão “bicha”, utilizada pelas colegas e superiores em tom de “brincadeira”. As ofensas eram proferidas em público e em alto tom de voz. Ele refere ter reportado os episódios ao setor de Recursos Humanos da empresa que o contratou em mais de uma oportunidade, sem que qualquer medida tivesse sido adotada para coibir tais condutas. Nessa linha, o trabalhador argumentou ter sofrido homofobia recreativa.

A testemunha trazida pelo empregado relatou ter presenciado as piadas e expressões depreciativas dirigidas a ele. Ela afirmou que, nas trocas de plantão, as técnicas de enfermagem se referiam ao copeiro como “bicha” e “gay da noite”, e não pelo seu nome. Os apelidos ofensivos eram utilizados quando o copeiro não estava presente.

Diante dos relatos apresentados, a magistrada concluiu que o trabalhador sofreu tratamento discriminatório em razão de sua identidade afetiva e sexual, configurando assédio moral e discriminação no ambiente de trabalho. Para Rachel, a sistematicidade da conduta discriminatória ficou comprovada pela atribuição de apelidos para o trabalhador, evidenciando que as ofensas não se limitavam a comentários isolados.

A magistrada destacou a menção feita pelo empregado à “homofobia recreativa”. Segundo ela, trata-se de uma estratégia utilizada para normalizar comportamentos discriminatórios, ferindo a dignidade da pessoa e criando um ambiente de trabalho tóxico. Nesse contexto, segundo Rachel, a vítima se sente impotente, desvalorizada e marginalizada.

A sentença também apontou a ausência de ações concretas da empregadora para garantir um ambiente de trabalho respeitoso e livre de discriminação. Para a magistrada, a empresa falhou quanto à obrigação de proteger a integridade emocional e psicológica dos seus empregados.

A sentença destacou o julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF), na Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) nº 26 e no Mandado de Injunção (MI) nº 4.733, que conferiu à prática de homofobia e transfobia o mesmo enquadramento jurídico do crime de racismo, até que sobrevenha legislação específica. “Essa decisão reafirma que a discriminação motivada por identidade afetiva e sexual constitui grave ofensa à dignidade da pessoa humana, e deve ser combatida com a mesma severidade atribuída ao racismo, dada sua natureza estrutural e difusa”, afirmou Rachel.

Nesse cenário, a magistrada ressaltou os Princípios de Yogyakarta, que delineiam a aplicação dos direitos humanos no contexto da identidade afetiva e sexual e identidade de gênero. Tais princípios reafirmam que todas as pessoas, independentemente de sua identidade afetiva e sexual, têm direito ao pleno exercício dos direitos fundamentais em condições de igualdade e dignidade, inclusive no ambiente laboral. “Eles impõem aos Estados — e, por extensão, a todos os entes obrigados à proteção de direitos — o dever de adotar medidas eficazes para prevenir e punir práticas discriminatórias e violências motivadas por identidade afetiva e sexual ou de gênero”, explicou a magistrada.

Aplicando também ao caso o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a juíza enfatizou que a conduta deve ser analisada com atenção à dimensão estrutural da discriminação, que não se limita ao gênero no sentido binário, mas se estende às expressões da sexualidade e identidade de gênero. Segundo a magistrada, o Protocolo explicita que a heteronormatividade — ou seja, a imposição da heterossexualidade como norma social — constitui uma das principais fontes de opressão contra pessoas LGBTQIAPN+.

Segundo Rachel, a negligência da empregadora configura o que o Protocolo denomina homofobia institucional, ou seja, uma estrutura de tolerância e inação que legitima e perpetua a violência simbólica e subjetiva contra trabalhadores LGBTQIAPN+. “O caso evidencia que o empregado, por ser homoafetivo, foi submetido a uma forma de discriminação sistemática e institucional, reforçada pela omissão da empresa em adotar qualquer medida concreta de prevenção, correção ou apuração das condutas relatadas. A negligência da reclamada demonstra uma falha grave no cumprimento do dever de proteção do empregador, resultando em verdadeira homofobia institucional”, concluiu a magistrada.

A julgadora afirmou que a análise do conjunto probatório seguiu as orientações delineadas pelo Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero. O documento preconiza que, em casos de assédio, deve-se reconhecer a dificuldade de obtenção de provas diretas, sendo necessário valorizar os depoimentos coerentes das vítimas e das testemunhas que corroboram a existência do ambiente hostil.

Com relação ao papel do Poder Judiciário no tema da violência de gênero no ambiente de trabalho, a julgadora defendeu que o juiz deve exercer um papel pedagógico e reparador. Nessa linha, à luz do Protocolo, o primeiro passo do julgador consiste em “contar até seis” — metodologia que busca identificar, desde o início do processo, até seis camadas de vulnerabilidade que podem atravessar a parte envolvida: identidade de gênero, raça ou etnia, orientação sexual, classe social, condição de pessoa com deficiência e idade.

“No presente caso, são evidentes os marcadores interseccionais: o empregado é homoafetivo (identidade afetiva e sexual), subordinado em ambiente hospitalar (classe social), e houve omissão da empregadora em coibir os abusos (condição de invisibilização estrutural). A presença desses fatores demanda do julgador uma escuta atenta, empática e descolonizada, que compreenda a vivência do autor em sua complexidade”, argumentou a magistrada.

Nesse cenário, a juíza considerou que as violações cometidas contra o empregado são de natureza grave, fixando a indenização em R$ 30 mil. De acordo com a julgadora, “o dever de reparação moral transcende o caráter compensatório, assumindo uma dimensão política e simbólica de afirmação de direitos”. Segundo Rachel, a responsabilização da empresa e o consequente deferimento da reparação por danos morais constituem medida de Justiça, coerente com os fundamentos constitucionais da República, com os tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Brasil e com o compromisso da Justiça do Trabalho com a promoção de uma sociedade livre de opressões, violências e silenciamentos.

Cabe recurso da decisão ao Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região.

TJ/RN: Companhia aérea deve indenizar passageiros que perderam voo

Uma companhia aérea foi condenada a pagar indenização por danos morais, para as duas passageiras, após um atraso em voo e reacomodação inadequada. A decisão é da juíza Josane Peixoto Noronha, do Juizado Especial Cível e Criminal da Comarca de Macaíba/RN.

De acordo com os autos do processo, os passageiros adquiriram passagens aéreas para um trajeto entre Natal, Recife e São Luís, com previsão de retorno em 25 de setembro de 2024. No voo de retorno, no entanto, houve atraso no trecho São Luís-Recife, o que resultou na perda da conexão para o voo Recife-Natal.

O problema teve início quando a aeronave pousou em Recife por volta das 16h40, mas permaneceu estacionada com as portas fechadas por cerca de 40 minutos, o que atrasou o desembarque dos passageiros. Quando chegaram ao portão para o voo de conexão, o embarque já havia sido encerrado. Após uma longa espera, a empresa ofereceu a alternativa de transporte rodoviário, o que foi recusado pelos autores, que pediram reacomodação em outro voo, mas sem sucesso.

A magistrada considerou falha na prestação do serviço da empresa, havendo um descumprimento contratual que causou prejuízos aos consumidores. A juíza destacou que a empresa não forneceu alternativas de reacomodação adequadas, como exigido pelo artigo 21 da Resolução nº 400 da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), que obriga as empresas a oferecerem outras opções de transporte ou reembolso.

Além disso, a juíza refutou a alegação de que o atraso na conexão foi causado pelo curto intervalo entre os voos, apontando que havia mais de 30 minutos entre a chegada do voo de São Luís e a saída do voo de Recife para Natal. Essa falha, juntamente à reacomodação inadequada dos passageiros em transporte terrestre, levou à condenação da empresa.

A sentença também levou em consideração a hipossuficiência dos autores, que são consumidores em uma relação de consumo com uma grande companhia aérea, o que justifica a reparação pelos danos causados. O valor da indenização foi fixado em R$ 6 mil para cada autor, com acréscimo de juros e correção monetária, a partir da data do incidente.

TJ/MT barra manobra do INSS e protege trabalhadora contra término indevido de benefício

O Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) não pode encerrar automaticamente o pagamento de auxílio-doença acidentário por meio da chamada “alta programada”, conforme decisão da Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT). A decisão reforça que a cessação do benefício só pode ocorrer após a realização de nova perícia médica administrativa.

De acordo com o voto da relatora, desembargadora Helena Maria Bezerra Ramos, “não há que se cogitar a fixação da DCB (Data de Cessação do Benefício) com base em mero decurso temporal, sem reavaliação do quadro clínico do segurado”, conforme exigido pelo art. 60, § 8º, da Lei 8.213/1991.

A magistrada destacou ainda que “o cancelamento automático do benefício previdenciário por meio da alta programada, sem prévio procedimento administrativo, fere o direito subjetivo do segurado de ver sua capacidade laborativa aferida por meio idôneo, que é a perícia médica”, citando entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça.

Na análise do caso, o Tribunal reconheceu que o laudo médico juntado aos autos atestou incapacidade total ou temporária por 60 dias, mas concluiu que “o quadro clínico da parte não permite um prognóstico seguro quanto à plena recuperação da capacidade laboral”.

Outro ponto sensível abordado foi a reabilitação profissional. A Câmara entendeu que essa etapa “não é requisito obrigatório para a manutenção do auxílio-doença, cabendo ao INSS avaliar a sua pertinência no caso concreto”, afastando a exigência automática da reabilitação como condição para manutenção ou cessação do benefício.

O acórdão ainda ressaltou que, embora o INSS possa realizar revisões periódicas dos benefícios, “não se admite que qualquer auxílio seja cancelado sem que proceda à prévia perícia administrativa”.

Diante disso, o colegiado determinou que o pagamento do benefício somente poderá ser encerrado “após a realização de nova perícia administrativa, momento no qual será aferida a (in)capacidade do segurado”, afastando assim a alta programada imposta pela autarquia.

Processo nº 1010969-44.2018.8.11.0002

STJ permite retificar o registro civil para fazer constar o gênero neutro

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, que é possível retificar o registro civil para fazer constar o gênero neutro. Para o colegiado, apesar de não existir legislação específica sobre o tema, não há razão jurídica para a distinção entre pessoas transgênero binárias – que já possuem o direito à alteração do registro civil, de masculino para feminino ou vice-versa – das não binárias, devendo prevalecer no registro a identidade autopercebida pelo indivíduo.

Ainda segundo o colegiado, o direito à autodeterminação de gênero e à identidade sexual está intimamente relacionado ao livre desenvolvimento da personalidade e ao direito do ser humano de fazer as escolhas que dão sentido à sua vida. Por outro lado, os ministros esclareceram que a decisão não elimina o registro de gênero da certidão de nascimento, mas apenas assegura à pessoa o reconhecimento formal de sua identidade.

“Todos que têm gênero não binário e querem decidir sobre sua identidade de gênero devem receber respeito e dignidade, para que não sejam estigmatizados e fiquem à margem da lei”, declarou a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, acrescentando que tais pessoas têm o direito de se autodeterminar.

Instâncias ordinárias negaram a retificação do registro civil
No caso analisado, a pessoa que ajuizou a ação de retificação de registro civil diz ter enfrentado dificuldades emocionais e psicológicas, tendo feito cirurgias e tratamento hormonal para mudar de sexo. Apesar de já ter alterado o nome e o gênero no registro, percebeu que, na verdade, não se identificava como homem nem como mulher – ou seja, era não binária.

Antes de recorrer ao STJ, ela teve o pedido negado pelas instâncias ordinárias. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) afirmou, entre outras questões, que o ordenamento jurídico prevê apenas a existência dos gêneros feminino e masculino, e que a eventual adoção do gênero neutro exigiria antes um amplo debate e o estabelecimento de uma regulamentação a respeito.

Jurisprudência já admite que pessoas trans mudem prenome e gênero
Nancy Andrighi ressaltou que toda pessoa tem assegurada a autonomia para a determinação de uma personalidade livre, sem interferência do Estado ou de particulares. Dessa forma, prosseguiu, a autodeterminação de gênero e a identidade sexual – direitos amparados por cláusula geral de proteção à personalidade prevista no artigo 12 do Código Civil – estão diretamente ligadas às escolhas pessoais que dão sentido à vida.

Segundo a relatora, a evolução da jurisprudência e as alterações legislativas permitiram até aqui que pessoas transgênero pedissem extrajudicialmente a mudança de prenome e gênero, de acordo com sua autoidentificação. No entanto, ela explicou que essas alterações levaram em conta a lógica binária de gênero masculino/feminino, a qual representa a normatividade padrão esperada pela sociedade.

Leia também: Decisões do STJ foram marco inicial de novas regras sobre alteração no registro civil de transgêneros

“Seria incongruente admitir-se posicionamento diverso para a hipótese de transgeneridade binária e não binária, uma vez que em ambas as experiências há dissonância com o gênero que foi atribuído ao nascimento, devendo prevalecer a identidade autopercebida, como reflexo da autonomia privada e expressão máxima da dignidade humana”, refletiu a ministra.

Falta de regra específica não pode deixar o tema sem solução
Com base nos artigos 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro e 140 do Código de Processo Civil, Nancy Andrighi lembrou que a lacuna sobre o tema na legislação não pode deixá-lo sem solução nem ser confundida com ausência do próprio direito.

A relatora comentou que já existem experiências estrangeiras na área do direito que reconhecem a existência de um terceiro gênero, não binário. Como exemplos, citou a Alemanha, a Austrália, a França, a Holanda e a Índia.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

TST: Empresa de telefonia é condenada por transfobia contra empregada transexual

Entre as condutas consideradas discriminatórias está a não aceitação do nome social da empregada.


Resumo:

  • Uma operadora de telemarketing transexual pediu indenização por danos morais, porque não era reconhecida pelo nome social.
  • A empresa alegou que a certidão de nascimento com o nome social foi expedida após a demissão.
  • O colegiado concluiu que houve violação dos direitos da empregada.

A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Datamétrica Teleatendimento, de Salvador (BA), a indenizar em R$10 mil uma empregada transexual por conduta discriminatória. Situações como não ser reconhecida pelo nome social e restrição ao uso do banheiro feminino levaram o colegiado à conclusão de transfobia pela empresa.

Ela disse que procurou a direção da empresa para relatar a situação
A empregada disse, na ação trabalhista, que foi admitida em maio de 2021 como operadora de telemarketing e que nunca teve seu nome social respeitado pela empresa, mesmo todos sabendo que ela era uma mulher transexual. Sofrendo com os preconceitos, ela disse que chegou a procurar a direção para relatar as condutas discriminatórias, sendo até bem recebida, mas, poucos dias depois, foi demitida.

Em agosto de 2023, a primeira instância condenou a Datamétrica a indenizar a trabalhadora em R$ 10 mil por conduta de transfobia no ambiente de trabalho e dispensa discriminatória. Em sequência, a sentença foi confirmada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (BA).

Diante da decisão, a empresa tentou a análise do caso pelo TST.

Para a empresa, a operadora não comprovou as alegações de transfobia
No recurso, a Datamétrica declarou que sempre procedeu de maneira correta ao propiciar um ambiente de trabalho saudável e inclusivo para todos. Acrescentou que, apesar de a empregada ter apresentado, na contratação, documentos pessoais com nome de batismo e ter sua certidão de nascimento expedida após o fim do contrato, sempre esteve aberta a lhe dar o tratamento requerido, ou seja, o nome social.

A empregadora alegou questões de segurança em relação ao uso do nome social
Ainda no recurso, a Datamétrica observou que a empregada prestava serviços em uma instituição bancária, com rígidas regras de segurança e informação. Por isso, o nome social apenas poderia ser incluído em tais documentos caso ela realizasse a mudança do seu nome em registro. A empregadora lembrou que o nome social da empregada fazia parte dos canais internos da empresa e no crachá utilizado por ela.

Quanto ao uso do banheiro, a Datamétrica informou que estes eram utilizados conforme a identidade de gênero, sem qualquer restrição. A empresa também rechaçou a alegação de demissão discriminatória, lembrou que nada foi provado e que a Datamétrica sempre prezou pela diversidade.

Para a 2ª Turma, houve violação grave dos direitos da empregada
Ao analisar o caso, a 2ª Turma do TST considerou correta a condenação da empresa ao pagamento de indenização por danos morais. Segunda a relatora do processo, ministra Maria Helena Mallmann, os fatos narrados evidenciaram violação grave aos direitos da empregada, gerando angústia e constrangimento incompatíveis com o dever de respeito à dignidade humana.

Segundo a decisão, empresas públicas e privadas devem reconhecer o nome social
De acordo com a ministra, assim como órgãos públicos, empresas privadas devem respeitar o nome social dos funcionários e dos clientes. “O nome social é a forma pela qual a pessoa trans se identifica e quer ser reconhecida socialmente nas diferentes instituições”, observou Mallmann.

A ministra observou que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADO 26 e do MI 4.733, reconheceu a transfobia como espécie de racismo, vedando práticas discriminatórias contra pessoas transgênero. “A recusa em utilizar o nome social configura afronta à dignidade humana e gera danos morais”, frisou a relatora.

A ministra defendeu o uso do banheiro de acordo com a identidade de gênero
Por fim, quanto à restrição ao uso do banheiro feminino, a ministra ressaltou que o direito ao uso do banheiro condizente com a identidade de gênero resulta da proteção à igualdade e à dignidade, sendo a restrição a esse direito uma forma de discriminação direta. “Promover a diversidade de gênero é um passo essencial para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva”, concluiu a relatora.

Cabe recurso da decisão.

Veja o acórdão.
Processo: 0000416-46.2022.5.05.0029

TST: Aceitação de uso de EPI quebrado não afasta indenização a trabalhador que cortou o pé com facão

É de responsabilidade da empresa o fornecimento,a manutenção e a reposição de equipamentos de proteção, além da fiscalização do uso adequado e eficiente dos EPI’s, o que não ficou comprovado neste processo.


Resumo

  • A Quinta Turma condenou a Usina Bazan S.A. a pagar pensão mensal vitalícia e R$ 35 mil de indenização por danos morais a um cortador de cana que se feriu no pé com um facão.
  • Um EPI danificado contribuiu para que o trabalhador perdesse 5% da flexão do pé esquerdo.
  • A decisão se baseou na responsabilidade da empresa em fornecer, manter e fiscalizar o uso adequado de equipamentos de proteção individual (EPIs), o que não foi comprovado no caso.

A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Usina Bazan S.A., de Pontal (SP), a pagar pensão mensal vitalícia e indenização por danos morais de R$ 35 mil a um cortador de cana-de-açúcar. O motivo é que um EPI estragado contribuiu para que ele se machucasse com facão e, assim, perdesse 5% da flexão do pé esquerdo. De acordo com os ministros, é de responsabilidade da empresa o fornecimento, a manutenção e a reposição de equipamentos de proteção, além da fiscalização do uso adequado e eficiente dos EPI’s, o que não ficou comprovado neste processo.

EPI quebrado
O posicionamento do TST supera a decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região sobre o caso. O TRT tinha afastado as indenizações que tinham sido deferidas pelo juízo de primeiro grau, pois entendeu que o acidente foi de culpa exclusiva do empregado. Segundo o Regional, o infortúnio ocorreu em razão de um ato inseguro praticado pelo próprio cortador, que, considerado um trabalhador experiente, não poderia atuar com EPI estragado (pederneira), como confessado em depoimento.

Acidente de trabalho
Houve recurso de revista ao TST, e o relator na Quinta Turma, ministro Douglas Alencar Rodrigues, votou no sentido de restabelecer a sentença que condenou a empresa ao pagamento de indenizações por danos morais e materiais. O ministro explicou que, na relação de emprego, o trabalhador tem direito à “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança” (artigo 7º, inciso XXII, da Constituição Federal). Além disso, é obrigação do empregador cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho (artigo 157, inciso I, da CLT), de modo a garantir um ambiente de trabalho hígido, saudável e seguro.

Responsabilidade da empresa
Nesse cenário, é de responsabilidade da empresa, não apenas o fornecimento, a manutenção e a reposição dos equipamentos de proteção, nos termos do item 6.6.1 da NR-6 do Ministério do Trabalho, mas, também, a fiscalização do uso adequado e eficiente dos EPI’s, “o que não restou comprovado no caso dos autos”, disse o ministro.

Com esse contexto, o ministro Douglas Alencar Rodrigues afirmou que o Tribunal Regional, ao atribuir a culpa exclusiva do acidente ao cortador, em razão do uso de equipamento de proteção danificado, violou o disposto no artigo 157, inciso I, da CLT.

Por unanimidade, a Quinta Turma acompanhou o voto do relator.

Veja o acórdão.
Processo: RR-10440-07.2015.5.15.0125


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