STF mantém necessidade de aprovação legislativa para alienação e concessão de terras públicas

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) manteve a necessidade de autorização da Assembleia Legislativa de Mato Grosso para a alienação e a concessão de terras públicas, salvo para fins de reforma agrária. A decisão, unânime, se deu na sessão virtual encerrada em 17/2, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6596.

O governador do estado, Mauro Mendes, alegava que o artigo 327 da Constituição estadual seria contrário ao artigo 188, parágrafo 1º, da Constituição Federal, que prevê a autorização do Congresso Nacional somente para terras públicas acima de 2,5 mil hectares. Argumentava, ainda, que a medida violaria o princípio da separação dos Poderes, pois a alienação ou a concessão são meros atos executivos no contexto de programas definidos com a participação do Legislativo.

Diferenças territoriais
Em seu voto pela improcedência do pedido, a relatora, ministra Rosa Weber, presidente do STF, destacou que devem ser consideradas as diferenças territoriais não somente entre os bens federais e estaduais, mas também entre os entes federativos. Segundo ela, a imposição do mesmo limite territorial mínimo previsto na Constituição da República aos demais entes federativos seria desproporcional, e a regra não é de reprodução obrigatória nas constituições estaduais.

Patrimônio público
Além disso, a ministra assinalou que a alienação de bens públicos, especialmente imóveis, não é atividade rotineira da administração pública. A seu ver, a condição imposta pela constituição estadual expressa uma tutela compartilhada do patrimônio público compatível com a separação de Poderes. “Ainda que caiba ao Executivo administrar os bens e, ao final, praticar o ato administrativo de alienação ou concessão, somente poderá fazê-lo com aquiescência popular, materializada na autorização legislativa”, concluiu.

Processo relacionado: ADI 6596

STJ remete para o STF interpelação contra governador de MG por comentários sobre atos de 8 de janeiro

Em razão do inquérito instaurado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para apurar responsabilidades pelos atos de vandalismo ocorridos em Brasília no dia 8 de janeiro, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Humberto Martins remeteu para aquela corte uma interpelação judicial apresentada contra o governador de Minas Gerais, Romeu Zema, por comentários relacionados às depredações no Palácio do Planalto, no Congresso Nacional e no próprio STF.

A interpelação – medida preparatória para futura ação penal – foi ajuizada para que Zema esclarecesse uma entrevista concedida à revista Veja, na qual o governador teria afirmado que autoridades trabalharam para que os ataques ocorressem, de forma que, colocando-se na posição de vítimas, pudessem obter supostos ganhos políticos perante a sociedade brasileira e a comunidade internacional.

Segundo os autores da interpelação, as afirmações do chefe do Executivo mineiro não teriam base em provas e, no mínimo, configurariam o crime de calúnia.

“Considerando que a presente interpelação judicial trata de medida preparatória a eventual ação penal e que a manifestação do interpelado diz respeito aos eventos investigados nos autos do Inquérito 4.921, instaurado pelo Supremo Tribunal Federal para apurar responsabilidades dos autores intelectuais dos atos de vandalismo ocorridos na capital da República em 8/1/2023, remetam-se os autos ao Pretório Excelso para que avalie a sua eventual competência para processar o presente feito”, determinou o ministro Humberto Martins.

Veja a decisão.
Processo: IJ 178

STF determina realização de audiências de custódia para todos os casos de prisão

Além da prisão em flagrante, o procedimento deve ser adotado nas demais modalidades de privação da liberdade.


O Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que todos os tribunais do país e todos os juízos a eles vinculados devem realizar, no prazo de 24 horas, audiência de custódia em todas as modalidades de prisão. A decisão unânime foi tomada na Reclamação (RCL) 29303, julgada procedente na sessão virtual encerrada em 3/3.

Uniformidade
O Plenário confirmou liminar deferida pelo relator do processo, ministro Edson Fachin, em dezembro de 2020. Atendendo a pedido da Defensoria Pública da União (DPU), o ministro concluiu que são inadequados atos normativos de tribunais que restringem a realização da audiência de custódia apenas às prisões em flagrante. A seu ver, a matéria exige uniformidade, para evitar discrepâncias de tratamento em todo o território nacional, independentemente do estado da federação em que tenha ocorrido a prisão.

Ao votar no mérito da reclamação, Fachin explicou que a realização das audiências, no prazo de 24 horas, devem englobar, além da prisão em flagrante, as prisões preventivas, temporárias, preventivas para fins de extradição, decorrentes de descumprimento de medidas cautelares diversas, de violação de monitoramento eletrônico e definitivas para fins de execução da pena.

Tratamento legal
Outro ponto observado pelo relator foi que o Pacote Anticrime (Lei 13.964/2019) torna obrigatória a audiência de apresentação, estabelecendo o procedimento a ser adotado e as sanções decorrentes da não realização do ato processual. No mesmo sentido, as normas internacionais que asseguram a audiência, como a Convenção Americana sobre Direitos Humanos e o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, não fazem distinção a partir da modalidade prisional.

Direitos fundamentais
Segundo o ministro, a medida não é uma simples formalidade burocrática. “Trata-se de relevante ato processual instrumental à tutela de direitos fundamentais”, afirmou.

A audiência permite que o juiz avalie se os fundamentos que motivaram a prisão se mantêm e se houve eventual tratamento desumano ou degradante. Dessa forma, devem ser examinadas diversas condições da pessoa presa (gravidez, doenças graves, idade avançada, imprescindibilidade aos cuidados de terceiros, etc.) que podem interferir na manutenção da medida prisional.

Histórico
A RCL foi ajuizada pela Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro contra ato do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) que permitia a realização de audiências de custódia apenas nos casos de prisão em flagrante. Em dezembro de 2020, o relator deferiu liminar determinando que a Justiça estadual realizasse as audiências em todas as modalidades prisionais no prazo de 24h. Em seguida, estendeu esse entendimento aos Estados do Ceará e de Pernambuco. Por fim, ao acolher pedido da DPU, determinou o cumprimento da regra por todos os tribunais do país.

 

STJ: Falta de localização não impede penhora de veículo cuja existência tenha sido comprovada

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou cabível a penhora de veículo não localizado, desde que seja apresentada certidão capaz de comprovar a sua existência. Com esse entendimento, o colegiado deu provimento ao recurso especial interposto por uma sociedade de securitização de créditos que buscava a penhora de veículos em ação de execução de títulos extrajudiciais.

Na origem do caso, a exequente foi autorizada a consultar a existência de veículos no sistema Renavam, para possível restrição de transferência e efetivação de penhora, com a ressalva de que eles deveriam estar na posse dos executados. A decisão motivou a interposição de recurso ao Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), o qual foi negado sob o fundamento de que a localização física do bem seria indispensável para a formalização da penhora.

No recurso apresentado ao STJ, a empresa questionou a exigência de localização do bem e sustentou que o único requisito para a lavratura do termo de penhora de veículo seria a prova de sua existência.

CPC prevê penhora independentemente da localização do veículo
De acordo com a relatora, ministra Nancy Andrighi, o Código de Processo Civil (CPC) estabelece que a penhora se concretiza, em regra, por meio dos atos de individualização e apreensão do bem a ser depositado, mas o próprio dispositivo legal prevê exceções referentes aos veículos.

Citando o parágrafo 1º do artigo 845 do CPC, a magistrada observou que a penhora será realizada por termo nos autos, independentemente do local em que estiverem situados os bens, quando for apresentada a certidão da matrícula do imóvel ou a certidão que ateste a existência do veículo.

Ela recordou que a execução e os atos constritivos dela decorrentes se desenvolvem no interesse do exequente (artigo 797 do CPC) e que “se, porventura, o bem penhorado jamais vier a ser encontrado, poderá ser substituído (artigo 848) ou realizada uma segunda penhora (artigo 851)”.

No entendimento da ministra, caso a lavratura do termo de penhora de veículo fosse condicionada à localização do bem – que, concretamente, se dá em momento posterior –, não seria possível garantir o direito de preferência do exequente, que se inicia somente após o ato de constrição.

Medida prestigia princípios da efetividade e da razoável duração do processo
Para Nancy Andrighi, um possível hiato entre a lavratura do termo nos autos, a apreensão e a posterior entrega do veículo ao depositário, sem a formalização da penhora, daria margem para ações como a ocultação ou a alienação do bem por parte de um devedor malicioso.

“Assim, quando o exequente se manifesta pela penhora de determinado veículo, cuja prova de existência foi trazida aos autos, há de se viabilizar a penhora independentemente da sua prévia localização”, destacou a relatora. A medida, segundo ela, é uma forma de privilegiar os princípios da efetividade e da razoável duração do processo, assim como os postulados da razoabilidade e da proporcionalidade.

“Em síntese, quando requerida a penhora de veículo automotor por interesse do exequente, dispensa-se a efetiva localização do bem para a lavratura do termo de penhora nos autos, bastando, para tanto, que seja apresentada certidão que ateste a sua existência”, concluiu a ministra ao dar provimento ao recurso especial.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2016739

STJ vê falhas em reconhecimento, mas nega absolvição de réu que foi perseguido na tentativa de fuga

Apesar de identificar falhas no procedimento de reconhecimento pessoal de um homem condenado por roubo, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Rogerio Schietti Cruz negou o pedido de absolvição feito pela defesa, pois, segundo o processo, ele foi monitorado pelas vítimas e pela polícia ininterruptamente entre o crime e a captura.

Para o magistrado, embora o reconhecimento seja nulo por ter sido realizado informalmente pelas vítimas dentro da viatura policial e sem observar os procedimentos do artigo 226 do Código de Processo Penal (CPP), o monitoramento visual contínuo do suspeito, durante a perseguição, constitui elemento probatório válido para, ao lado de outras provas, afastar a hipótese de inocência.

De acordo com o depoimento das vítimas e dos policiais, três indivíduos – entre eles uma adolescente – entraram em um ônibus e iniciaram o assalto. Após roubarem os pertences dos passageiros, os assaltantes deixaram o veículo. Nesse momento, um passageiro, suspeitando que a arma usada no roubo fosse de brinquedo, desceu do coletivo e perseguiu os criminosos.

Policiais que faziam ronda no local perceberam a movimentação e acompanharam o passageiro na perseguição. Um dos assaltantes teria jogado sua camiseta fora para tentar despistar os perseguidores, mas acabou sendo capturado em conjunto com a adolescente, enquanto o terceiro conseguia fugir.

O reconhecimento dos suspeitos capturados foi feito pelas vítimas no interior da viatura que conduziu todos até a delegacia. Para o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, esse procedimento de reconhecimento não teria violado o artigo 226 do CPP e, além disso, haveria nos autos outros elementos para justificar a condenação do réu a mais de seis anos de reclusão.

Exibição informal de suspeitos viola CPP e perde força probatória
O ministro Schietti lembrou que, ao julgar o HC 598.886, em 2020, a Sexta Turma passou a considerar que os procedimentos previstos pelo artigo 226 do CPP para o reconhecimento de pessoas não constituem mera recomendação, mas verdadeira norma de observância obrigatória pela autoridade policial, cujo descumprimento pode, inclusive, gerar a nulidade do ato.

No ano passado, a Sexta Turma avançou na análise da matéria e fixou o entendimento de que, mesmo se realizado em conformidade com a norma do CPP, o reconhecimento pessoal, embora seja válido, não tem força probatória absoluta; se, porém, for realizado fora dos preceitos legais, deve ser considerado inválido e não pode ser usado nem mesmo de maneira suplementar (HC 712.781).

Leia também: Reconhecimento de pessoas: um campo fértil para o erro judicial
Com base na jurisprudência, para o relator, não seria possível admitir o reconhecimento realizado pelas vítimas no interior da viatura policial e sem a observância mínima dos procedimentos legais, como a colocação do suspeito ao lado de pessoas com características físicas semelhantes.

“Exibições informais de suspeitos, sem que se cumpra aquele mínimo roteiro normativo disposto no artigo 226 do CPP, facilitam sobremaneira os falsos positivos e, por isso, perdem qualquer serventia probatória”, destacou.

Relatos de testemunhas confirmam que suspeito nunca deixou de ser monitorado
Embora tenha considerado falho o reconhecimento pessoal, Rogerio Schietti apontou que a reconstrução dos fatos não deixa dúvidas de que, entre o início da fuga – quando o acusado desceu do ônibus na companhia dos comparsas – e o instante em que foi capturado, ele nunca saiu da vista de seus perseguidores.

Segundo o ministro, a perseguição realizada pelo passageiro chamou rapidamente a atenção dos transeuntes e dos policiais, o que permitiu a configuração do chamado flagrante impróprio.

“Muito embora nada tenha sido encontrado com o réu, todos os pertences roubados estavam em poder da adolescente que circulava pela mesma localidade e que, no momento da captura, conversava com o ora paciente como se já se conhecessem antes. O controle visual do paciente durante toda a extensão temporal de sua tentativa de evadir-se respalda com suficiência a sua condenação”, concluiu o ministro ao negar o habeas corpus.

Processo Nº HC 727005

TRF1: Veículo utilizado em transporte irregular de carvão oriundo de desmatamento não autorizado deve ficar sob a guarda do Ibama

A 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) decidiu reformar a sentença e acatar o recurso do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para que um veículo utilizado no transporte irregular de carvão proveniente de desmatamento não autorizado permaneça sob a guarda do órgão ambiental.

A hipótese em questão ocorreu na cidade de Cândido Sales/BA. Conforme os autos, a decisão de primeira instância havia garantido ao proprietário da carreta a entrega do bem, na condição de fiel depositário (pessoa nomeada pelo juiz para ser o responsável por cuidar e preservar bens ou coisas penhoradas ou arrecadadas pela Justiça), até o julgamento final do processo administrativo referente ao caso.

Em seu recurso ao TRF1, o Ibama alegou que ficou comprovada a prática da infração ambiental consistente no transporte de 74,3m³ de carvão vegetal sem licença válida. Alegou, ainda, que o proprietário da carreta é reincidente no cometimento de infração ambiental e, portanto, a fim de evitar novas infrações, haveria grande risco de incidência, sobretudo pelo infrator ter sido nomeado como fiel depositário do veículo.

Jurisprudência – Ao analisar o caso, o relator, juiz federal convocado Emmanuel Mascena de Medeiros, observou o artigo 105 do Decreto n. 6.514/2008, que regula a guarda dos bens apreendidos por entidades responsáveis pelas fiscalizações e possibilita a nomeação de fiel depositário desde que a posse dos bens não traga risco de utilização em novas infrações (art. 106, II).

Segundo o magistrado, “o art. 105 do Decreto n. 6.514/2008 estabelece como regra a guarda dos bens apreendidos pelo órgão ou entidade responsável pela fiscalização, sendo possibilitada apenas excepcionalmente a nomeação de fiel depositário e, de forma ainda mais excepcional, a nomeação do próprio autuado para esse múnus, desde que a posse dos bens não traga risco de utilização em novas infrações (art. 106, II)”.

O relator ainda citou jurisprudência do próprio TRF1 segundo a qual “constatada a infração administrativo ambiental que se concretizou com a utilização de veículo, afigura-se escorreita a apreensão empreendida pela fiscalização ambiental (ex vi dos arts. 25, caput, e 72, IV c/c o art. 70, caput, todos da Lei n. 9.605/1998, regulamentados pelos arts. 3º, IV, e 35, IV, do Decreto n. 6.514/2008), tendo-se em vista os princípios da precaução e da prevenção, do poluidor-pagador, da responsabilidade social e do desenvolvimento sustentável. (AC 00006190320124013602, rel. desembargador federal Souza Prudente, Quinta Turma, e-DJF1 29/06/2017)”.

Para o magistrado, portanto, “merece ser reformada a sentença que garantiu ao proprietário a entrega do bem na condição de fiel depositário, visto que tal determinação vai de encontro às disposições da Lei n. 9.605/98 e do Decreto n. 6.514/2008, que legitimam a apreensão cautelar do veículo”.

A decisão do Colegiado acompanhando o voto do relator foi unânime.

Processo: 0053411-19.2012.4.01.3800

TRF1: Cabe ao devedor demonstrar erros de cálculo relativos ao suposto excesso na cobrança de dívida em contrato de crédito consignado

Inconformada com a sentença que a condenou a pagar a quantia de R$ 205.758,55, além de correção monetária e juros, uma mulher que realizou contrato de crédito consignado na Caixa Econômica Federal recorreu ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1). Ela argumentou que houve excesso de cobrança, juros excessivos e cláusulas abusivas, principalmente em relação ao seguro prestamista (que realiza o pagamento do empréstimo junto à Caixa em caso de morte ou invalidez total por acidente), o que, no seu entender, teria sido imposto, configurando venda casada.

A apelante sustentou, também, que o processo tinha conexão com uma ação revisional (que busca a revisão das cláusulas contratuais), ajuizada anteriormente na 1ª Vara Federal da Seção Judiciária de Mato Grosso (SJMT), mas que o juiz não levou esse fato em consideração ao julgar a ação. Por isso, requereu a anulação da sentença e a suspensão do processo até o julgamento da ação revisional.

Na relatoria do processo, o desembargador federal Carlos Augusto Pires Brandão, membro da 5ª Turma, primeiramente explicou que a ação revisional em que se discutia regularidade das cláusulas e excesso de cobrança já foi resolvida e o pedido foi julgado improcedente, motivo pelo qual não se justifica mais a conexão.

Contestação genérica – Prosseguindo na análise, o magistrado constatou que a recorrente “não apresentou a contra conta, devidamente discriminada, que levasse ao convencimento de que, na elaboração do crédito, não fora obedecido o que pactuado”, o que demandaria a realização da perícia contábil.

Ressaltou o desembargador que a Caixa apresentou extratos, planilhas de evolução da dívida e memória de cálculo do valor. Argumentou que a metodologia para calcular a dívida consta do contrato, sendo este realizado livremente entre as partes capazes, conforme o princípio da autonomia das vontades e da regra de que o que foi contratado deve ser cumprido (pacta sunt servanda).

Dessa forma, caberia à apelante o ônus de comprovar que foi coagida ou chantageada a contratar o seguro. Assim, diante da impugnação genérica manifestada pela apelante, em relação ao excesso de cobrança e não tendo demonstrado que a concessão do empréstimo foi condicionada à compra do seguro, não há como acolher a alegação de abusividade de sua cobrança, não devendo a sentença recorrida ser reformada.

A decisão do Colegiado foi unânime.

Processo:1002225-79.2017.4.01.3600

TRF6 acolhe recurso de candidato contra nota em exame da OAB

Em sessão realizada no dia 28 de fevereiro, a 3a Turma do TRF6 acolheu o recurso de um candidato que, ao prestar o exame nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) em 2021, obteve uma nota inferior ao mínimo nas provas finais. Recorrendo a um “distinguishing” (técnica em que um precedente vinculante deixa de ser aplicado excepcionalmente num caso concreto), o relator divergiu da decisão recorrida por não vislumbrar uma real interferência judicial na avaliação subjetiva da banca examinadora do certame. O acórdão unânime chama a atenção, porque o Poder Judiciário não costuma acolher recursos da mesma natureza em situações semelhantes.

No agravo de instrumento (recurso usado para evitar danos graves e irreversíveis a uma das partes), o candidato pedia o reconhecimento da nota relativa ao item 9 da peça prático-profissional do XXXIII Exame Unificado da OAB na área de Direito do Trabalho. Segundo ele, sua resposta atendia ao solicitado pela banca examinadora. Com isso, o candidato faria jus a um acréscimo de 0,40 em sua pontuação até então oficial, elevando-a para 6,5, o que asseguraria a sua aprovação.

Em resposta, a seccional da OAB em Minas Gerais alegou, em caráter preliminar, a impossibilidade do recurso por este não atacar os fundamentos da decisão recorrida. Aliado a isso, a entidade se disse parte ilegítima para a causa, argumentando que a responsabilidade pela preparação e realização do exame nacional seria do CFOAB (Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil). Diante disso, o próprio Conselho teve como indevido o foro da ação, uma vez que este deveria ser o de seu domicílio.

Durante o julgamento, o relator destacou que o recurso era aparentemente descabido, porque significaria indevida interferência no mérito do ato administrativo em questão. Nesse sentido, ele recordou a advertência do STJ (Superior Tribunal de Justiça) e do STF (Supremo Tribunal Federal), que afirma que instâncias judiciais não se sobrepõem à conclusão de banca examinadora de concurso, sob pena de substituí-la numa reapreciação de critérios avaliativos.

Entretanto, o magistrado relator percebeu também que o pleito não buscava a mera revisão da nota atribuída ao candidato pela banca examinadora. Em verdade, o candidato buscava o reconhecimento do equívoco praticado pelos examinadores, por não considerarem igualmente correta a sua resposta na peça prático-profissional. Isso se deve ao fato de a resposta dada pelo candidato não ter correspondido ao que a banca examinadora considerava “correto” segundo seu roteiro de correção e padrão de resposta.

O relator, no entanto, fez uma ressalva, percebendo não se tratar de um pedido de mera revisão da nota atribuída. De outro modo, buscava-se o reconhecimento do equívoco dos examinadores, quando consideraram incorreta, de acordo com o roteiro de correção e o padrão de resposta da banca, a resposta do candidato na peça prático-profissional.

“Ora, se é fato que o agravante [o candidato], ao mencionar o artigo 483 da CLT equivocou-se na alínea a ser indicada (indicou a alínea ‘a’ enquanto o esperado seria as alíneas ‘d’ ou ‘e’), também é correto que [o candidato] trouxe à banca (…) a solução esperada, qual seja, rescisão indireta do contrato de trabalho, e, desta forma, faz jus ao acréscimo (até então negado pelas agravadas) de 0,40”, explicou o relator no acórdão.

Desse modo, o “distinguishing” aplicado pela 3ª Turma serviu para reparar a ilegalidade presente na forçosa vinculação da resposta do candidato pleiteante ao roteiro de correção e padrão de resposta da banca examinadora.

Veja o acórdão.
Processo nº 1017340-03.2022.4.01.0000

TRF4: Universidade Federal deve readmitir aluna de Doutorado que foi desligada sem processo administrativo prévio

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) manteve liminar que determinou à Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) a readmissão de uma aluna de 41 anos, moradora de Porto Alegre, no curso de Pós-Graduação de Doutorado em Geociências, com a ativação da matrícula dela. A decisão foi proferida por unanimidade pela 3ª Turma em 28/2. O colegiado entendeu que o desligamento foi realizado pela UFRGS sem a instauração de um processo administrativo prévio que assegurasse o contraditório e a ampla defesa à estudante.

A ação foi ajuizada em julho de 2022. A mulher requisitou que a Justiça anulasse o ato administrativo que a desligou e determinasse o seu reingresso no Doutorado. A autora narrou que havia sido informada pela Universidade do seu desligamento “sem que lhe fossem fornecidos maiores esclarecimentos”. A mulher afirmou que o jubilamento não foi precedido de processo administrativo.

Já a UFRGS alegou que “o desligamento da autora deveu-se pela não apresentação da tese de Doutorado no prazo assinalado, mesmo tendo sido concedida prorrogação excepcional do prazo”.

Em decisão liminar, o juízo da 3ª Vara Federal de Porto Alegre determinou à instituição de ensino que “readmita a autora no curso de Pós-Graduação de Doutorado em Geociências, com a ativação da matrícula”. A UFRGS recorreu ao tribunal, mas a 3ª Turma da corte manteve a decisão de primeira instância.

A relatora, desembargadora Vânia Hack de Almeida, reconheceu que “de fato, a não apresentação da tese no prazo assinalado é causa de desligamento do curso de pós-graduação”. No entanto, ela ressaltou que “tratando-se de medida de caráter nitidamente sancionatório, por óbvio que a exclusão do curso somente poderia ter ocorrido após a instauração de procedimento administrativo capaz de assegurar a plenitude do contraditório e da ampla defesa”.

Para a desembargadora, “a situação fática descrita na ação evidencia que a autora foi desligada do curso de Pós-Graduação de Doutorado sem qualquer processo administrativo previamente instaurado. A jurisprudência do TRF4 e do STJ orienta-se no sentido de que o desligamento de aluno da Universidade exige a prévia instauração de processo administrativo em que lhe seja assegurado o contraditório”.

A ação segue tramitando em primeira instância e ainda terá o mérito julgado pela Justiça Federal gaúcha.

TRF4: Associação de apoio a pessoas com Síndrome de Down pode ser equiparada a ente público

A Justiça Federal concedeu à Associação Amor pra Down, de Balneário Camboriú (SC), liminar que impede usa inscrição como inadimplente no Cadin, em função de alegada execução parcial de um projeto de R$ 217 mil em recursos federais, até a manifestação definitiva do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre o caso. O juiz Charles Jacob Giacomini, da 3ª Vara Federal de Itajaí, entendeu que a associação, em razão de sua finalidade, tem prerrogativas semelhantes às próprias dos entes públicos.

“Embora não se trate de ente público, a impetrante é associação civil sem fins lucrativos, fundada em 21 de março de 2000, e que visa defender os direitos e os interesses das pessoas com Síndrome de Down”, observou o juiz. “O objeto social e o tempo de existência da impetrante, bem como os projetos sociais por ela realizados, demonstram tratar-se de associação que visa o bem comum e a inserção de pessoas com deficiência no meio social (…), objeto relevante e honroso”, afirmou Giacomini.

O juiz citou um precedente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), que considerou “indevida a inscrição do município antes do julgamento definitivo pelo Tribunal de Contas da União com base somente nos indícios que fundamentaram a instauração de tomada de contas especial, agir que se afigura ilegal por representar ofensa ao devido processo legal”. Segundo Giacomini, é “viável a utilização analógica para a impetrante do entendimento direcionado aos entes públicos”.

A associação alegou que firmou convênio com o Ministério da Saúde para execução do projeto “Capacita Down”, com valor originário de R$ 217,7 mil, entre maio de 2015 e maio de 2017. Em 2019, a prestação de contas final foi “aprovada com ressalvas”, pois apenas 60% do projeto teria sido executado. Em setembro último, a associação foi instada a devolver R$ 223,7 mil. A instituição argumenta que o valor é desproporcional e que deveria ficar restrita a no máximo R$ 87 mil.

“O perigo na demora, por sua vez, encontra-se igualmente atendido, tendo em vista os efeitos da suposta inadimplência e inscrição junto ao sistema [Cadin]”, considerou o juiz. “Isto porque, acaso verificada a restrição, a associação ficará impossibilitada firmar acordos de cooperação, convênios e operações de crédito com a União – há risco, inclusive, de suspensão no repasse de valores provenientes da celebração de outros de convênios, fato que evidencia a necessidade de deferimento da liminar, ante a relevância social das verbas relacionadas”.

O mandado de segurança foi impetrado contra o Departamento de Cooperação Técnica e Desenvolvimento em Saúde. A decisão foi proferida ontem (6/3) e cabe recurso ao TRF4.

Processo nº 5012487-03.2022.4.04.7208


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