STJ: É possível cumular cumprimento provisório e definitivo de capítulos diversos da mesma sentença

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, decidiu que é possível a propositura concomitante de cumprimento provisório e cumprimento definitivo de capítulos diversos do mesmo pronunciamento judicial. O colegiado ainda concluiu que não é necessário desmembrar o processo e que a competência para processar ambas as execuções é do juízo que decidiu a causa em primeiro grau.

De acordo com os autos, após vencer uma demanda contra três empresas, a parte requereu o cumprimento definitivo da parcela incontroversa, contra a qual não houve recurso, e o cumprimento provisório da parcela controversa da sentença.

O pedido de cumprimento provisório foi recebido, mas as instâncias ordinárias negaram a possibilidade de execução simultânea da parcela incontroversa, sob o fundamento de que a coisa julgada é total, e não parcial.

Mérito da causa pode ser cindido e examinado em duas ou mais decisões
A relatora do recurso no STJ, ministra Nancy Andrighi, observou que o CPC de 2015 passou a admitir a formação da coisa julgada em capítulos, conforme se depreende dos dispositivos que tratam desse instituto (artigos 502 e 523), da possibilidade de decisão parcial de mérito (artigo 356), da execução definitiva da parcela incontroversa (artigo 523), da rescisão de capítulo da decisão (artigo 966, parágrafo 3º) e da devolutividade do capítulo impugnado na apelação (artigo 1.013, parágrafo 1º).

De acordo com a ministra, isso significa que o mérito da causa poderá ser cindido e examinado em duas ou mais decisões no curso do processo. “Na vigência do CPC/2015, parece não mais subsistir a vedação ao trânsito em julgado parcial ou progressivo das decisões. Assim, quando não impugnados capítulos da sentença autônomos e independentes, estes transitarão em julgado e sobre eles incidirá a proteção assegurada à coisa julgada”, declarou.

Sem impugnação, parcela transita em julgado e pode ser executada definitivamente
Nancy Andrighi também ressaltou que, subsistindo parcela controversa, sobre a qual pende recurso sem efeito suspensivo, é viável o cumprimento provisório da sentença, nos termos do artigo 520, com a garantia de caução prevista no inciso IV, do CPC.

Segundo a relatora, nada impede que, no mesmo pronunciamento judicial, exista parcela incontroversa, em relação à qual não tenha havido nenhum recurso. “Ante a ausência de impugnação, e consideradas as especificidades da situação em concreto, a referida parcela transitará em julgado e poderá ser executada de maneira definitiva, concomitantemente e sob mesmo procedimento”, afirmou.

A ministra ainda apontou que não há a necessidade de se realizar o desmembramento do processo, sendo competente para processar ambos os cumprimentos de sentença o órgão judicial que julgou a demanda em primeiro grau de jurisdição, nos termos do artigo 516, inciso II, do CPC – ainda que, por conveniência da organização judiciária local, tenham sido criados juízos especializados.

“Dessa maneira, é de ser determinado o retorno dos autos ao juízo de origem para que aprecie a existência de parcelas incontroversas, reconhecida a possibilidade de tramitação concomitante de cumprimentos provisório e definitivo de capítulos diversos da mesma sentença”, concluiu ao dar provimento ao recurso especial.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2026926

STJ: Colaboração do réu para apreensão da droga permite redução da pena

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que os requisitos do artigo 41 da Lei de Drogas – colaboração para identificar coautores e para recuperar o produto do crime – são alternativos, e não cumulativos. Assim, o acusado por tráfico que apenas auxilia as autoridades na apreensão da droga, sem apontar coautores do crime, faz jus à redução da pena prevista no dispositivo, que vai de um a dois terços.

“Isso não significa conceder ao acusado que identifica seus comparsas e ainda ajuda na recuperação do produto do crime o mesmo tratamento conferido àquele que só realiza uma dessas duas condutas, pois os distintos graus de colaboração devem ser sopesados para definir a fração de redução da pena”, destacou o relator do habeas corpus, ministro Rogerio Schietti Cruz.

No caso analisado pela turma, um homem foi flagrado com nove porções de maconha e, de acordo com o relato dos policiais, confessou ser traficante e indicou o local onde ocultava o restante da droga, o que levou à apreensão de mais 50 porções.

Aplicando a redução de pena em razão da colaboração, o juízo de primeiro grau condenou o réu a três anos e dez meses de reclusão. Contudo, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) aumentou a pena para cinco anos, por considerar que a redução só seria possível se o acusado, além de indicar o local do produto do crime, tivesse identificado outros partícipes do esquema de tráfico.

Literalidade do texto não é suficiente para extrair o sentido da norma
O ministro Schietti comentou que, embora a redação do artigo 41 da Lei 11.343/2006 traga a conjunção “e” entre os dois requisitos da redução de pena (identificação de coautores e recuperação do produto do crime), sugerindo serem cumulativos, a interpretação gramatical de um dispositivo legal nem sempre é a mais adequada para extrair a norma jurídica pertinente.

“Situações nas quais a literalidade do texto não é suficiente para extrair o adequado sentido da norma nele contida podem ser constatadas com frequência na legislação, em que não raro o legislador se vale da conjunção ‘e’ quando deveria empregar a conjunção ‘ou’, e vice-versa”, explicou.

Schietti lembrou que o atual artigo 41 da Lei de Drogas tem origem no antigo artigo 32, parágrafo 2º, da Lei 10.409/2002, o qual trazia a conjunção “ou” entre os requisitos da colaboração premiada. Além disso, mesmo na colaboração disciplinada pela Lei de Organizações Criminosas, a qual trata de crimes em que há o concurso necessário de pessoas, o legislador não impôs obrigatoriamente a identificação dos demais partícipes, de modo que não seria razoável exigi-lo nos crimes da Lei de Drogas, em que o concurso de pessoas é eventual.

“Além de não se identificar nenhuma justificativa para que tal mudança gramatical decorresse de propósito deliberado do legislador, não se pode desconsiderar o advento da Lei 12.850/2013, que cuidou de regular diversos aspectos relativos ao instituto da colaboração premiada, oportunidade em que, ao estabelecer seus requisitos no artigo 4º, o fez de forma alternativa”, declarou.

Colaboração do acusado foi essencial para a comprovação do delito
O relator também observou que, segundo registrado no próprio acórdão do TJSP, não fosse a colaboração do acusado, apenas as nove porções de maconha que estavam em seu bolso teriam sido apreendidas e, nessas condições, seria bem provável o reconhecimento do porte de drogas para uso próprio, em vez do crime de tráfico.

Para o ministro, se a colaboração do acusado foi essencial para a comprovação do tráfico, está justificada a aplicação da causa de diminuição de pena, tal como decidido pelo juízo de primeiro grau.

Schietti ponderou ainda que, mesmo a confissão já tendo sido considerada para aplicar a atenuante da confissão espontânea em favor do réu, é possível adotar também a causa redutora de pena prevista no artigo 41 da Lei 11.343/2006.

“Isso porque a confissão, no caso, se limita à admissão da prática do tráfico de drogas, ao passo que a colaboração foi além e indicou aos policiais a localização do restante das drogas, que estavam escondidas e, segundo os próprios agentes afirmaram, não seriam por eles encontradas sem a ajuda do réu. Trata-se de institutos distintos e que devem ser aplicados conjuntamente, se ambos estiverem configurados” – concluiu o relator ao conceder a ordem de habeas corpus para restabelecer a sentença de primeiro grau.

Veja a decisão.
Processo: HC 663265

STJ garante salvo-conduto penal para cultivo de ‘cannabis’ com finalidade medicinal

Confirmando jurisprudência unificada das duas turmas de direito penal, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria de votos, concedeu, nesta quarta-feira (13), salvo-condutos para garantir que pacientes não sofram sanção criminal pelo cultivo doméstico de cannabis sativa destinado à extração do óleo com finalidade medicinal.

Entre outros fundamentos, o colegiado considerou que, além de o cultivo não ter a finalidade de produzir ou comercializar entorpecentes, os pacientes dos casos analisados pela seção estão amparados não só por prescrição médica, mas também por autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para importação do canabidiol, o que evidencia que a própria autarquia sanitária tem reconhecido a necessidade de uso do produto em contexto terapêutico.

A seção determinou a comunicação da decisão ao Ministério da Saúde e à Anvisa.

Leia também: STJ concedem salvo-condutos para o cultivo de cannabis com fins medicinais

Falta de regulamentação sobre plantio não pode prejudicar pacientes.

No voto acompanhado pela maioria, o desembargador convocado Jesuíno Rissato destacou que, em mudança jurisprudencial ocorrida em 2022, a Quinta Turma, alinhando-se a precedentes da Sexta Turma, passou a entender que a ausência de regulamentação estatal sobre o plantio de cannabis não pode prejudicar o direito à saúde dos pacientes, os quais têm de lidar com muita burocracia e com altos custos caso queiram importar o óleo medicinal.

Ainda segundo a Quinta Turma, a Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas) não proíbe o uso justificado e a produção autorizada do óleo medicinal, mediante procedimento predeterminado sujeito à fiscalização. Em relação às sementes necessárias para o plantio, os ministros consideraram na época que tanto o Supremo Tribunal Federal (STF) quanto o STJ se posicionaram no sentido de que elas não possuem o princípio ativo da cannabis sativa, de modo que o salvo-conduto para o plantio deveria proteger também a eventual importação de sementes.

Segundo Jesuíno Rissato, considerando que, nos casos analisados, o uso do óleo extraído a partir das plantas será destinado a fins exclusivamente terapêuticos, com base em receita médica e autorização de importação da Anvisa, deve ser impedida a repressão criminal sobre a conduta dos pacientes.

Em um dos casos julgados pela Terceira Seção, o salvo-conduto diz respeito ao cultivo de 15 mudas de cannabis sativa, exclusivamente enquanto durar o tratamento do quadro de ansiedade generalizada do paciente.

Processo: HC 802866; HC 783717; RHC 165266

STJ admite penhora de imóvel financiado com alienação fiduciária na execução de cotas condominiais

Na execução de cotas de condomínio de um prédio de apartamentos (ou de qualquer outro condomínio edilício), é possível a penhora do imóvel que originou a dívida, mesmo que ele esteja financiado com alienação fiduciária, em razão da natureza propter rem do débito condominial, prevista no artigo 1.345 do Código Civil.

Com esse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria de votos, deu provimento a um recurso especial para permitir a penhora, mas considerou necessário que o condomínio exequente promova a citação do banco (credor fiduciário), além do devedor fiduciante. O acórdão foi publicado nesta terça-feira (12).

Se quiser pagar a dívida para evitar o leilão, já que é a proprietária do imóvel, a instituição financeira poderá depois ajuizar ação de regresso contra o condômino executado. A decisão da Quarta Turma representa uma mudança em relação à jurisprudência adotada até aqui pelo STJ.

Leia também: Imóvel alienado não pode ser penhorado em execução de débito condominial do devedor fiduciante
De acordo com o ministro Raul Araújo, cujo voto prevaleceu no julgamento, o entendimento de que a penhora só poderia atingir os direitos relativos à posição do devedor fiduciante no contrato de alienação fiduciária, sem alcançar o próprio imóvel, é válido para qualquer outro credor do condômino, mas não para o condomínio na execução de cotas condominiais. Neste caso, em razão da natureza propter rem da dívida, é necessária a citação do banco.

Credor fiduciário não pode ter mais direitos do que o proprietário pleno
Para o ministro, as normas que regulam a alienação fiduciária não se sobrepõem aos direitos de terceiros que não fazem parte do contrato de financiamento – como, no caso, o condomínio credor da dívida condominial, a qual conserva sua natureza jurídica propter rem.

“A natureza propter rem se vincula diretamente ao direito de propriedade sobre a coisa. Por isso, se sobreleva ao direito de qualquer proprietário, inclusive do credor fiduciário, pois este, proprietário sujeito a uma condição resolutiva, não pode ser detentor de maiores direitos que o proprietário pleno”, afirmou o ministro.

Segundo ele, seria uma situação confortável para o devedor das cotas condominiais se o imóvel não pudesse ser penhorado devido à alienação fiduciária, e também para a instituição financeira, caso o devedor fiduciante estivesse em dia com a quitação do financiamento mesmo devendo as taxas do condomínio.

“Cabe a todo credor fiduciário, para seu melhor resguardo, estabelecer, no respectivo contrato, não só a obrigação de o devedor fiduciante pagar a própria prestação inerente ao financiamento, como também de apresentar mensalmente a comprovação da quitação da dívida relativa ao condomínio”, destacou.

Prejuízo teria de ser suportado pelos demais condôminos
O caso analisado pelos ministros é de um condomínio edilício: um prédio de apartamentos com unidades privativas e áreas comuns. O condomínio ajuizou a cobrança das cotas em atraso de uma das unidades, mas não teve sucesso em primeira e segunda instâncias.

Ao negar o pedido de penhora do apartamento, a Justiça estadual citou decisões do STJ no sentido de que, como o bem em questão não integra o patrimônio do devedor fiduciante, que apenas detém a sua posse direta, não pode ser objeto de constrição em execuções movidas por terceiros contra ele, ainda que a dívida tenha natureza propter rem.

“Não faz sentido esse absurdo. Qualquer proprietário comum de um imóvel existente num condomínio edilício se submete à obrigação de pagar as despesas. Se essas despesas não forem pagas pelo devedor fiduciante nem pelo credor fiduciário, elas serão suportadas pelos outros condôminos, o que, sabemos, não é justo, não é correto”, declarou o ministro Raul Araújo ao votar pela possibilidade da penhora.

Ele disse que a interpretação que vem sendo dada a situações semelhantes é “equivocada e sem apoio em boa lógica jurídica”, pois estende proteções de legislação especial a terceiros não contratantes, além de conferir ao banco uma condição mais privilegiada que o direito de propriedade pleno de qualquer condômino sujeito a penhora por falta de pagamento das cotas do condomínio.

Raul Araújo concluiu que a melhor solução é integrar todas as partes na execução, para que se possa encontrar uma solução adequada. “Não se pode simplesmente colocar sobre os ombros dos demais condôminos – que é o que irá acontecer – o dever de arcarem com a dívida que é, afinal de contas, obrigação tocante ao imediato interesse de qualquer proprietário de unidade em condomínio vertical”, afirmou.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2059278

TST: Empregada que recebia salário mensal inferior ao mínimo tem direito a diferenças

Para a 3ª Turma, ainda que a jornada seja reduzida, deve ser observado o valor do salário mínimo.


A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Digisec Certificação Digital, microempresa de Goiânia (GO), a pagar diferenças salariais a uma auxiliar administrativa que recebia menos que o salário mínimo. Segundo o colegiado, a remuneração pode até variar de acordo com a quantidade de horas trabalhadas ou de unidades produzidas, mas não pode ser inferior ao valor do salário mínimo mensal.

Contrato por hora
Na reclamação trabalhista, a trabalhadora disse que fora contratada em 2017 mediante remuneração por hora para atender advogados de Anápolis que contratavam a certificação digital fornecida pela empresa, com jornada semanal de 44h. Isso resultaria numa remuneração de R$ 1.174, mas ela só recebia entre R$ 300 e R$ 500 mensais.

A empresa, em sua defesa, alegou que ela tinha vínculo de emprego com a Caixa de Assistência dos Advogados de Goiás e ficava à sua disposição apenas uma hora por dia, quando atuava como agente de registro.

Diferenças salariais
O Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (GO) manteve a sentença que indeferiu o pedido de diferenças salariais. Para o TRT, o valor do salário mínimo não deveria ser tomado em caráter absoluto e inflexível, uma vez que a trabalhadora ficava à disposição do empregador apenas algumas horas por dia.

Salário mínimo mensal
O ministro Mauricio Godinho Delgado, relator do recurso de revista da empregada, explicou que, em regra, não se pode contratar alguém para receber salário inferior ao mínimo legal, sobretudo no caso, em que não foi demonstrada nenhuma cláusula contratual ou prévia negociação coletiva a respeito das condições de trabalho.

Garantia constitucional
Em seu voto, o ministro destacou que a divisão do salário em frações diárias e horárias não compromete a garantia constitucional de recebimento de um valor mínimo mensal baseado no salário mínimo. Essa divisão, segundo ele, é apenas um parâmetro para cálculo e não afeta a remuneração mínima garantida pela Constituição Federal (artigo 7, incisos IV e VII). Isso significa que os trabalhadores têm direito a receber um salário mínimo por mês, independentemente da possibilidade de sua divisão em frações menores.

Ônus da prova
Além desse fundamento, o ministro Godinho Delgado também observou que a empresa não conseguiu provar que havia previsão contratual de jornada reduzida ou mesmo a quantidade de horas efetivamente trabalhadas pela empregada, uma vez que não apresentou cartões de ponto.

A decisão foi unânime.

Veja o acórdão.
Processo: RR-11104-74.2018.5.18.0052

TST: Fabricante de cervejas Ambev é condenada por assédio moral estrutural

A prática envolvia racismo, xingamentos e humilhações.


A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Ambev S.A., maior fabricante de cervejas do mundo, a pagar indenização de R$ 50 mil a um vendedor de Vitória (ES) submetido a assédio moral durante sete anos. Sob a alegação de cobrança de metas, ele era chamado por supervisores, gerentes e até colegas por nomes pejorativos e alvo de constantes xingamentos, inclusive de conteúdo racial.

Respeito mútuo
Na ação, o vendedor contou que trabalhou para a Ambev de 2011 a 2017, na região da Grande Vitória. Nesse período, disse que fora exposto a situações que feriram direitos básicos como respeito mútuo, dignidade humana e ambiente sadio de trabalho. As condutas eram praticadas usualmente por seus supervisores, gerentes de vendas e outros vendedores.

Xingamentos
Segundo seu relato, o cumprimento de metas envolvia muita pressão psicológica, estresse físico e mental e ameaças de demissão. Eram cobranças públicas, com tratamento desrespeitoso e xingamentos para quem não atingisse as metas. “Morto”,desmotivado“, “desmaiado“, “âncora”, “negão” e “cara de monstro” eram algumas das expressões que ele ouvia, e o próprio gerente de vendas inventava apelidos desrespeitosos.

“Brincadeiras masculinas”
O juízo de primeiro grau reconheceu o assédio moral e condenou a empresa a pagar indenização de R$ 50 mil. Contudo, o Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região (ES) retirou a condenação.

Considerando o depoimento do trabalhador, o TRT concluiu que todos os vendedores tinham apelidos, com expressões “perfeitamente inseridas em um ambiente de brincadeiras tipicamente masculinas”, inclusive as palavras de baixo calão.

Política sistemática
Para o relator do recurso de revista do vendedor, ministro Alberto Balazeiro, não é aceitável que agressões corriqueiras decorram de brincadeiras masculinas. Para ele, a situação retratada pelo TRT mostra uma conduta reiterada e omissiva da empresa, sob o argumento injustificável do humor, que reproduz comportamentos abusivos que degradam profundamente o ambiente de trabalho. Trata-se, a seu ver, de uma política sistemática da empresa, que visa engajar os trabalhadores no cumprimento de metas, “a despeito de seu sofrimento psíquico-social”.

Estereótipo de masculinidade
O ministro se surpreendeu que, mesmo diante desse quadro, o TRT tenha concluído se tratar de “brincadeiras recíprocas” e “tipicamente masculinas”. Ele assinalou que, conforme a Resolução CNJ 492 (Protocolo para julgamento com perspectiva de gênero), o que é considerado “humor” é reflexo de uma construção social que revela a concepção ou a preconcepção de determinado grupo sobre a realidade vivenciada por outros. “Os ideais estereotipados em torno do que seria tipificado como ‘masculino’ no âmbito das organizações tem efeitos deletérios para os sujeitos que não se enquadram em um padrão pré-concebido de masculinidade”, afirmou.

Assédio organizacional
O caso, segundo o relator, retrata efetivo assédio organizacional interpessoal, em que as metas não eram cobradas por meio de motivação positiva, mas de uma cultura generalizada de xingamentos, gritaria e palavras de baixo calão.

Conduta reiterada
Balazeiro lembrou, ainda, que o assédio moral na Ambev tem motivado inúmeras condenações no TST e, apesar disso, a empresa continua desrespeitando a obrigação de manter um meio ambiente de trabalho saudável. A gravidade dessa conduta reiterada, a seu ver, demanda posicionamento enérgico do TST, a fim de evitar a sua perpetuação.

Ofensa racial
Ao restabelecer a condenação, os ministros da Terceira Turma ressaltaram a necessidade de acabar com a naturalização da discriminação e da prática injustificável de brincadeiras abusivas. Para o colegiado, a ofensa de cunho racial é uma das mais graves. “Não se pode considerar aceitável essa conduta num país que se pretende civilizado”, resumiu o ministro José Roberto Pimenta.

Processo: RR-1406-93.2019.5.17.0001

TRF1 garante a candidato que prossiga no concurso público após entrega de exame médico tardio

Um candidato ao cargo de Sargento Músico que foi eliminado do concurso público organizado pelo Exército Brasileiro (EB) por não ter entregado, na fase de Inspeção de Saúde, um dos 16 exames médicos (toxicológicos) exigidos no edital, garantiu o direito de retornar ao certame. A decisão é da 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) que reformou a sentença do Juízo da 5ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal (SJDF).

Em seu recurso, o autor alegou que não conseguiu entregar o referido exame na data prevista em razão do atraso na entrega do resultado pelo laboratório onde ele realizou a coleta do material.

Ao analisar o caso, a relatora, desembargadora federal Ana Carolina Roman, destacou que “não se afigura legítima a exclusão do candidato em razão do atraso pelo laboratório na confecção do exame toxicológico, haja vista que tal circunstância é alheia à vontade do recorrente e que os demais exames foram entregues em conformidade com o edital do certame, revelando-se ilegítima a recusa de entrega posterior por afrontar aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade”.

Diante disso, o Colegiado, por unanimidade, deu provimento à apelação do candidato para que ele prossiga regularmente nas demais fases do concurso.

Processo: 1009382-82.2021.4.01.3400

TRF1: Servidora demitida do INSS por participação de 1% em sociedade privada consegue ser reintegrada no cargo

O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) recorreu ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) contra a decisão anulatória do ato administrativo que demitiu uma servidora, bem como impôs ao instituto a obrigação de reintegrá-la ao seu quadro de pessoal e de cumprir com todas as demais obrigações resultantes da reintegração, como o reconhecimento de todas as vantagens pecuniárias que lhe seriam devidas.

De acordo com os autos, a servidora do INSS foi demitida em decorrência de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) que não teria observado a gravidade da infração nem os antecedentes funcionais para aplicação da penalidade. O juiz de primeiro grau concluiu, portanto, pela desproporção entre a conduta e a sanção.

O relator, desembargador federal Urbano Leal Berquó Neto, informou que a servidora sofreu penalidade por ter participado de administração de sociedade, violando a proibição contida na legislação. Contudo, afirmou que a vedação legal precisa ser interpretada sistematicamente. “Com efeito, não basta apenas o fato de a servidora figurar no contrato social da pessoa jurídica como sócia administradora para que se materialize a hipótese de demissão por infração ao artigo 117, X, da Lei 8.112/90”, declarou.

Conflito de interesses – O magistrado explicou ser necessário levantar provas de que o servidor público exerceu efetivamente atividades de gestão da pessoa jurídica de direito privado concomitantemente com as atividades do cargo, tendo negligenciado deveres específicos de sua atividade no setor público, bem como deixado de prestar observância aos deveres funcionais e ter obtido benefícios, de qualquer forma, por meio da empresa por ele administrada. Assim, a mera aplicação da literalidade da norma proibitiva é insuficiente para dar ensejo à penalidade máxima administrativa, argumentou.

No caso, o simples fato de ter o nome como sócio-administrador de sociedade privada não caracteriza motivação suficiente para justificar a demissão, sendo necessário constatar conflito de interesse público e privado e vantagem ou tratamento diferenciado em decorrência de ser servidor público. Contudo, isso não impossibilita a reprimenda, desde que com punições proporcionais à infração, concluiu o desembargador.

Na opinião do magistrado, a decisão deve ser mantida, pois considerou corretamente que o caso não ensejaria a demissão, tendo em vista que a efetiva participação da autora como gestora de sociedade privada não foi comprovada, bem como por ser simbólica a participação no quadro societário, de apenas 1%, não caracterizando conduta incompatível com o serviço público ou com as funções de seu cargo.

Assim, a 9ª Turma do TRF1 não acatou o recurso, negando o pedido do INSS nos termos do voto do relator.

Processo: 0017505-86.2007.4.01.3300

TRF1: Inexiste exigência legal que condicione recebimento de auxílio-transporte à apresentação de bilhetes utilizados por servidor

A União recorreu ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) da sentença que determinou a manutenção do benefício de auxílio-transporte pago a servidor público militar independentemente de apresentação dos comprovantes de despesa.

De acordo com a apelante, normas internas determinam a comprovação das despesas quando o deslocamento for intermunicipal visando impedir que o referido auxílio seja recebido como parcela de remuneração maior do que os gastos efetivamente utilizados para deslocamento rodoviário, gerando, por via transversa, um aumento salarial.

Já o servidor sustentou que utiliza mais de um tipo de meio de transporte para realizar o deslocamento diário entre sua residência e seu local de trabalho de modo que parte do trecho ocorre em veículo particular, com rateio de combustível com outras pessoas, e o restante do percurso com transporte alternativo tipo van que não lhe fornece o comprovante de pagamento.

O relator, desembargador federal Rui Gonçalves, argumentou que o auxílio-transporte é benefício que possui nítida natureza indenizatória, objetivando custear as despesas realizadas pelo servidor público com os deslocamentos efetuados de sua residência até o local de trabalho e vice-versa por meio de transporte coletivo municipal, intermunicipal e interestadual e, inclusive, pela utilização de veículo próprio, evitando, assim, que o salário do servidor seja corroído pelas despesas de transporte ao trabalho.

Para tal, a Medida Provisória n° 2.165-36/01, ao tratar do referido auxílio, autoriza sua concessão mediante declaração firmada por militar, servidor ou empregado na qual ateste a realização das despesas com transporte coletivo municipal, intermunicipal ou interestadual nos deslocamentos de suas residências para os locais de trabalho e vice-versa, complementou o magistrado.

Jurisprudência – O desembargador explicou que embora a MP não expresse a possibilidade de pagamento da parcela em debate nas hipóteses de utilização de veículo próprio para o deslocamento, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), tendo apreciado o tema em diversas oportunidades, consolidou sua jurisprudência no sentido de que também nessas hipóteses o servidor faria jus a sua percepção.

Desse modo, a Administração Pública não pode interferir na liberalidade concedida aos seus servidores quanto à forma de deslocamento entre o local de residência e o posto de trabalho sob pena de desvirtuar a natureza indenizatória conferida ao auxílio-transporte, não existindo impedimento para recebimento do benefício na hipótese de o servidor utilizar veículo próprio para fins de transporte diário para ir e voltar do trabalho.

Por fim, a regra estabeleceu que a simples declaração firmada pelo servidor representa elemento suficiente para comprovação, não havendo exigência legal que condicione o recebimento do benefício à apresentação de bilhetes de passagem. O magistrado reforçou, ainda, que está previsto, na regra, que em caso de declaração falsa visando à percepção indevida de valores o servidor fica sujeito à apuração de eventuais responsabilidades administrativa, civil e penal.

Assim, concluiu o relator pela manutenção da sentença, dispensando a obrigatoriedade de o servidor apresentar os comprovantes de passagens de transporte coletivo para fins de recebimento do auxílio-transporte.

A 2ª Turma do TRF1 decidiu, por unanimidade, acompanhar o entendimento nos termos do voto do relator.

Processo: 0008899-98.2009.4.01.3300

TRF4: Justiça nega pedido de benefício assistencial, após laudo apontar aptidão para realização de trabalho

A justiça negou o pedido de Benefício de Prestação Continuada (BPC) a uma mulher moradora de Paranavaí (PR). A decisão do juiz federal Adriano José Pinheiro, da 1ª Vara Federal de Paranavaí, levou em conta que a autora não preencheu os requisitos necessários para a concessão do benefício, sendo que o laudo realizado a pedido da justiça mostra que ela é apta ao trabalho. O pedido já tinha sido negado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

A autora da ação tem 61 anos e alega não possuir condições de trabalhar devido às suas restrições, de forma que não possui capacidade laborativa. Apresentou atestados médicos, reforçando que sente dores e tem restrições, já não conseguindo nem mesmo executar os serviços domésticos.

Segundo o laudo judicial, a patologia da autora no estágio em que se encontra não gera limitações ou incapacidade. “Assim, conforme o laudo, a parte autora não possui impedimento de longo prazo e nem restrições significativas, que durem por pelo menos 2 anos e possam caracterizar deficiência”, ressaltou o magistrado.

“Acrescento, ainda, que a existência de doença, por si só, não implica a existência de incapacidade, sendo este o entendimento uniformizado pela Turma Nacional de Unificação (TNU), ‘a incapacidade não se presume pelo só fato da pessoa ser portadora de determinada doença’. É preciso que haja prova da existência de incapacidade. Assim, a parte autora não preenche o requisito deficiência”.

Adriano José Pinheiro ressaltou ainda em sua sentença que o julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando não reconhece a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual. A autora da ação alegou em sua inicial viver em vulnerabilidade social, viver com o marido desempregado e um neto. Como ainda não completou 65 anos de idade, não pode obter o benefício pelo quesito etário.


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