A Justiça de Mato Grosso garantiu o direito de uma paciente com câncer de mama ao tratamento oncológico imediato, após recusa indevida do plano de saúde, que condicionou o procedimento à análise de uma junta médica. A decisão, unânime, foi proferida pela Segunda Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT).
De acordo com o voto da relatora, desembargadora Maria Helena Gargaglione Póvoas, a operadora de saúde agiu de forma abusiva ao impor entraves administrativos em um caso de urgência médica, violando o direito fundamental à saúde e à dignidade da pessoa humana.
O processo teve origem após a beneficiária, diagnosticada com câncer de mama triplo negativo (cuja evolução é rápida e agressiva), ter o início do tratamento atrasado por exigência de junta médica. Conforme a Resolução Normativa nº 259/2011 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), o prazo para conclusão da junta é de até 21 dias, mas esse procedimento não se aplica em casos de urgência e emergência, como o que foi analisado.
Diante da demora indevida, o colegiado manteve a condenação da operadora e majorou o valor da indenização por danos morais de R$ 5 mil para R$ 10 mil, entendendo que a negativa agravou o sofrimento da paciente e colocou em risco sua recuperação.
Na decisão, a desembargadora destacou que a reparação deve cumprir não apenas o papel compensatório, mas também o caráter pedagógico, para coibir condutas semelhantes.
“É abusiva a recusa de cobertura de tratamento oncológico urgente sob a justificativa de submissão à junta médica. A recusa indevida caracteriza dano moral indenizável”, pontuou a relatora.
Processo nº 1004520-76.2023.8.11.0008
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO
Diário de Justiça Eletrônico Nacional – CNJ – MT
Data de Disponibilização: 20/10/2025
Data de Publicação: 20/10/2025
Página: 9137
Processo nº 1004520-76.2023.8.11.0008
Órgão Julgador: Segunda Câmara de Direito Privado
Classe: Apelação Cível (198)
Tipo de Comunicação: Intimação
Meio: Diário de Justiça Eletrônico Nacional
Partes:
Apelante: HAPVIDA ASSISTENCIA MEDICA LTDA.
Apelante: Daniela Salmazzo
Apelado: Daniela Salmazzo
Apelado: Hapvida Assistência Médica Ltda.
Advogados:
Diogo Fernando Pécora de Amorim – OAB/MT 17.695-O
André Menescal Guedes – OAB/MA 19.212
Nelson Wilians Fratoni Rodrigues – OAB/SP 66.8018
Relatora: Desª. Maria Helena Gargaglione Póvoas
Turma Julgadora: Desª. Maria Helena Gargaglione Póvoas, Desª. Marilsen Andrade Addario, Desª. Tatiane Colombo
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a Segunda Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a presidência da Desª. Maria Helena Gargaglione Póvoas, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão:
À unanimidade, recurso da autora provido e recurso da requerida desprovido, nos termos do voto da relatora.
E M E N T A
Direito do Consumidor e Processual Civil – Apelações Cíveis – Ação de Obrigação de Fazer c/c Indenização por Danos Morais – Plano de Saúde – Tratamento Oncológico – Recusa Indevida sob Alegação de Pendência de Junta Médica – Urgência Caracterizada – Demora Abusiva – Danos Morais Configurados – Majoração do Quantum – Recurso da Operadora Desprovido – Recurso da Autora Provido.
A Resolução Normativa ANS nº 259/2011 estabelece prazo máximo de 21 dias para conclusão de junta médica em procedimentos de alta complexidade, sendo inaplicável em hipóteses de urgência e emergência.
A autora, diagnosticada com câncer de mama triplo negativo – doença de evolução rápida e agressiva –, necessitava de tratamento imediato, configurando situação de urgência que não admite condicionamento à junta médica.
A recusa injustificada agravou o sofrimento da paciente, ensejando reparação moral.
O valor indenizatório deve refletir a gravidade do dano, o caráter pedagógico da condenação e a capacidade econômica das partes, justificando sua majoração para R$ 10.000,00.
Tese de Julgamento:
“É abusiva a recusa de cobertura de tratamento oncológico urgente sob a justificativa de submissão à junta médica.
A recusa indevida de tratamento em casos de urgência caracteriza dano moral indenizável, cujo valor deve observar a gravidade da conduta e os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.”
Dispositivos Relevantes Citados:
CF/1988, arts. 5º, XXXII, e 196;
CDC, arts. 12, 14 e 51;
CPC, art. 85, §11;
RN-ANS nº 259/2011, art. 3º.
Jurisprudência Citada:
STJ, AgInt no AREsp 1.612.974/SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, 3ª Turma, j. 14.09.2020;
STJ, AgInt no REsp 1.899.704/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 08.02.2021.
R E L A T Ó R I O
Trata-se de dois recursos de Apelação Cível interpostos por Hapvida Assistência Médica Ltda. e Daniela Salmazzo contra sentença que julgou procedente a ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais, condenando a ré a autorizar o tratamento indicado pela médica assistente da autora, bem como ao pagamento de R$ 5.000,00 a título de danos morais, acrescidos de juros de 1% ao mês e correção monetária, além de custas e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação.
A requerida/apelante sustenta que não houve recusa no atendimento, alegando que o procedimento de abertura de junta médica é lícito, pugnando pela exclusão dos danos morais, ou, subsidiariamente, pela redução do valor fixado.
A autora, por sua vez, requer a majoração da indenização.
Contrarrazões apresentadas. É o relatório.
Cuiabá/MT, data do sistema.
Desª. Maria Helena G. Póvoas, Relatora.
V O T O
Como relatado, trata-se de recursos interpostos contra sentença que julgou procedente a demanda para condenar a requerida à liberação do tratamento médico e ao pagamento de indenização por danos morais.
O apelo da requerida não comporta provimento. A tese de que a operadora aguardava a resolução da junta médica não prospera, pois o pedido estava pendente desde 22/11/2023, e o protocolo inicial é de 01/11/2023, configurando atraso injustificado.
A Resolução Normativa ANS nº 259/2011 (art. 3º) fixa o prazo de 21 dias para conclusão da junta médica em casos de alta complexidade, devendo a operadora cumprir a solicitação médica se o prazo expirar. Nos casos de urgência e emergência, a submissão à junta é inviável.
A autora foi diagnosticada com câncer de mama triplo negativo, doença de caráter extremamente agressivo, conforme laudo médico acostado aos autos. A demora imposta pela operadora agravou seu sofrimento e configurou falha grave na prestação do serviço, gerando dano moral indenizável.
Considerando a gravidade, o caráter pedagógico da condenação e a capacidade econômica das partes, majora-se o valor da indenização para R$ 10.000,00 (dez mil reais).
DISPOSITIVO
Nego provimento ao recurso da requerida e dou provimento ao recurso da autora, para majorar o valor da indenização para R$ 10.000,00 (dez mil reais), fixando os honorários sucumbenciais em 12% sobre o valor da condenação.
É como voto.
Cuiabá-MT, 15 de outubro de 2025.
Desª. Maria Helena Gargaglione Póvoas
Relatora
5 de dezembro
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