Lei da Anistia não interfere no trabalho da Comissão da Verdade, afirma Pinheiro

O coordenador da CNV (Comissão Nacional da Verdade), Paulo Sérgio Pinheiro, afirmou que a Lei da Anistia, de 1979, não ajuda nem atrapalha os trabalhos de investigação dos fatos ocorridos no período da ditadura. A declaração foi feita, nesta segunda-feira (1/4), em cerimônia do lançamento do acervo digital do Deops (Departamento Estadual de Ordem Política e Social) de São Paulo, no Aquivo Público de São Paulo, zona norte da capital.

A afirmação veio após uma intervenção do Levante Popular da Juventude e do Comitê pela Memória, Verdade e Justiça de São Paulo, que colocavam uma série de reivindicações para os trabalhos da comissão. A mais aclamada foi a revisão da Lei da Anistia, de 1979, que garante anistia política aos militantes de esquerda e também aos agentes da repressão do Estado. “Somos uma comissão do Estado, e não o Estado em si”, disse ele ao comentar as competências.

“Essa sentença não é da Comissão da Verdade, está no nosso trabalho indicar os autores dos crimes, e é claro que os queremos desmascarados.” O coordenador do grupo também afirmou que nenhuma comissão que se propõe a apurar violações de direitos humanos em regimes de exceção tem a competência para julgar. “Nenhuma comissão é tribunal, nenhuma comissão é Ministério Público.”

O governador Geraldo Alckmin (PSDB), também presente ao evento, ao ser questionado por jornalistas sobre a validade da Lei da Anistia, não respondeu se era favorável ou não a uma possível revisão, mas falou sobre a comissão da Secretaria da Justiça e Defesa da Cidadania, que indeniza familiares das vítimas da repressão “analisando caso a caso”. “Este é um compromisso de São Paulo. A política de direitos humanos é política de Estado, não é de governos nem de partidos”, disse.

A Comissão Estadual de Ex-Presos Políticos foi formada em decorrência da Lei Estadual 10.726/2001, a partir do reconhecimento de que o Estado agiu de modo criminoso contra os cidadãos durante a ditadura (1964-1985). Os relatores da comissão deliberam sobre a concessão de indenizações, divididas em dois valores: R$ 22 mil, em caso de prisão e/ou tortura; e R$ 39 mil, em caso de sequelas permanentes ou morte.

Sobre a declaração do governador, o presidente do Conselho Estadual de Defesa da Pessoa Humana (Condepe) e assessor da Comissão Estadual da Verdade Rubens Paiva, Ivan Seixas, afirmou que o governador não respondeu à pergunta feita pelos jornalistas. “O que ele fala é outra coisa. Ele foi perguntado sobre a Lei de Anistia, para processar os torturadores, e ele respondeu sobre reparação.”

“A Lei de Anistia foi fruto de uma imposição da ditadura. Não houve acordo, passou um projeto que não era o da oposição, também não era o da ditadura, mas não foi o mais adequado”, disse Seixas.

Paulo Sérgio Pinheiro destacou o papel decisório que o relatório final dos trabalhos do grupo, que deve ser finalizado em maio de 2014, terá para que novas interpretações do passado, inclusive das leis instituídas na ditadura, surjam no debate político-social do país.

Outras reivindicações dos manifestantes, como a prorrogação dos trabalhos da comissão e a divulgação de relatórios parciais, que garantiriam maior transparência às informações apuradas, foram rebatidas por Pinheiro. “Eu era a favor de só um ano de trabalhos, mas a maioria quis dois. Essa decisão não cabe a nós da comissão, mas sim à presidente da República.”

Sobre a transparência das informações, ele afirmou que as audiências públicas realizadas pela CNV, assim como as informações dadas à imprensa, cumprem o papel de garantir participação da população nos debates, mas que nem todos os depoimentos e audiências podem ser abertos ou divulgados ao público. “Trabalhamos com uma espécie de arqueologia. Da mesma maneira que investigações criminais, nem tudo pode ser público.

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