por Gláucia Milicio
Por melhor que seja a intenção do projeto de lei que garante pensão às mulheres grávidas, seu conteúdo é desastroso. É o que afirma a maioria dos advogados que trabalham com Direito de Família ouvidos pela revista Consultor Jurídico. O projeto aprovado no último dia 15 de julho aguarda sanção presidencial.
Para a advogada Maria Berenice Dias, uma das maiores especialistas na área, 75% do projeto deveria ser vetado pelo presidente Lula. Ela defende a sanção de apenas três dos 12 artigos apresentados pelo projeto: 1º, 2º e 6º.
O artigo 1º disciplina o direito dos alimentos e diz a forma como será exercido. O artigo 2º dispõe sobre as despesas que deverão ser suportadas pelo pai da criança e o 6ª diz que assim que for comprovada a paternidade, a pensão deverá ser paga até o nascimento do bebê. Depois esses valores serão revertidos em pensão alimentícia para a criança até que uma das partes solicite sua revisão. De acordo com Maria Berenice, esses são os únicos artigos sóbrios do projeto, mas “não absolvem todos os pecados do legislador”.
O PL 7.376/06, de autoria do senador baiano Rodolpho Tourinho (PFL), determina que futuro pai divida com a mulher grávida, de acordo com suas condições financeiras, as despesas adicionais do período de gestação. Ou seja, a mulher pode pedir na Justiça que o pai contribua com alimentação, exames médicos, remédios e parto. Para isso, a mãe terá de reunir provas de que o indicado é o pai da criança. Caso o suposto pai negue a paternidade, será preciso fazer exame de DNA.
Esse é um dos pontos mais criticados do projeto. Segundo especialistas, é consenso na comunidade médica que o exame de DNA em líquido amniótico pode comprometer a gestação. A advogada Sylvia Maria Mendonça do Amaral afirmou que, em tese, o projeto é bom, mas existem algumas falhas importantes que deveriam ser corrigidas. Ela explicou que o problema de muitos projetos está na metodologia de como é elaborado. “Os legisladores não têm conhecimento de todos os dispositivos envolvidos na questão”. Sylvia afirma que não ouviram a opinião de um médico sequer.
Outro ponto contestado é o fato de o projeto prever que a ação seja ajuizada no local onde mora o pai e não na cidade onde mora a autora. “É uma falha conceder foro privilegiado ao credor de alimentos”, diz Maria Berenice ao acrescentar que desta maneira não se está atendendo o interesse da gestante, que talvez tenha que se deslocar para ajuizar ação.
Maria Berenice Dias também afirmou à ConJur que existem diversas inconsistências no projeto de lei. “Ainda que a idéia seja boa, a forma é desastrosa.” Segundo ela, ainda que o projeto tente preservar o direito do nascituro, ele traz grandes retrocessos em relação à Lei de Alimentos (Lei 5.478/68), à contestação de paternidade e aos princípios constitucionais do acesso à Justiça, da responsabilidade parental e do melhor interesse da criança.
A advogada destacou que não é preciso criar uma nova lei para buscar direito a alimentos porque já existe a Lei 5.478, que regula a matéria de modo bem mais satisfatório, e há jurisprudência nesse sentido. Berenice também alertou para o risco de se colher material genético do feto.
Marcia Carraro Trevisioli, do Trevisioli Advogados Associados, seguiu a mesma linha de Maria Berenice. De acordo com ela, a Lei de Alimentos é bastante clara ao determinar que a pensão é devida a quem dela necessite em razão da ligação por linha parental determinada em lei. “Entendo a intenção da lei, mas não concordo com o seu conteúdo de forma integral até porque as despesas adicionais do curso da gravidez podem ser cobradas por meio de ação própria”, disse.
Ainda de acordo com a proposta, se o resultado do exame de DNA for negativo, a mãe poderá ser responsabilizada por danos morais e materiais. Maria Berenice Dias contesta essa parte do projeto. Segundo ela, o fato de a mãe ser punida afronta o princípio constitucional do acesso à Justiça porque “abre grave precedente de o réu ser indenizado pelo fato de ter sido acionado em juízo”.
Neste ponto, a especialista Sylvia do Amaral discorda de Maria Berenice. Para Sylvia, o projeto não nega o direito à Justiça, mas tenta apenas evitar que gestantes de má-fé saiam por aí pedindo indenização mesmo sabendo que o acionado não é o pai verdadeiro da criança. “Não resta dúvidas de que haverá pedidos infundados, sem qualquer critério, que poderão induzir o juiz a erro, determinando o pagamento de pensão àqueles que não são responsáveis pela paternidade.”
Para Márcia Trevisioli, não se pode descartar a possibilidade do mau uso da lei já que basta estar grávida para pedir a pensão. “O valor dos alimentos é devido, nestes casos especificamente, ao filho. E em razão da sua necessidade. A preservação do direito do filho deve ser considerada. Não podemos fazer desta lei um meio de ganhos fáceis”, ponderou.
Revista Consultor Jurídico
10 de dezembro
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