Da forma de intimação e contagem do prazo recursal nas licitações públicas

A Lei 8.666/93, consoante seu art. 109, prevê as hipóteses e prazos para a interposição de recursos dos atos praticados nos procedimentos licitatórios.

Ex vi do inciso I do referido artigo, temos como regra geral (exceção às modalidades pregão e convite), o prazo de cinco dias úteis para se recorrer das decisões das fases de habilitação, julgamento das propostas, anulação/revogação do certame, indeferimento/anulação/cancelamento do registro cadastral, rescisão do contrato e aplicação de penalidades.

A contagem do prazo recursal, frise-se, somente inicia-se após a efetiva ciência da decisão a ser recorrida.

Nesse diapasão, veja que o §1º do dispositivo legal em epígrafe determina que a intimação dos atos de julgamento da habilitação e das propostas, anulação/revogação do certame e rescisão do contrato será feita mediante publicação na imprensa oficial.

Ressalva a lei, apenas, no que tange aos atos de julgamento da habilitação e das propostas, a possibilidade de comunicação direta lavrada em ata, a ocorrer na própria sessão, quando presentes os prepostos das empresas.

Todavia, considerando que nem todos os licitantes comparecem ou se fazem representar na sessão, não haveria outra forma de comunicação, passível de substituir a publicação na imprensa oficial? Quer nos parecer que sim.

Nesse diapasão, veja que à época da aprovação da Lei 8.666/93, não era usual a comunicação através de outros meios, tais como e-mail ou fac-símile, razão pela qual a lei não contemplou esta previsão. Hoje, tais meios são comuns e rápidos, bem como diminuem os custos com publicação, privilegiando, assim, os princípios da eficiência e da economicidade.

Ademais, uma vez que a ratio legis do legislador dirige-se a que os licitantes tomem ciência dos atos praticados no curso da licitação, é certo que a adoção destes outros meios atende ainda com maior certeza esta finalidade, já que é possível a confirmação rápida do recebimento da intimação. Por sua vez, a publicação na imprensa oficial não é garantia real de ciência do ato pelos licitantes, que nem sempre tem acesso ou acompanham tais publicações.

Como medida complementar e para que outros cidadãos possam acompanhar os atos praticados no curso dos certames, poder-se-ia, outrossim, publicar cópia das decisões no átrio de cada repartição interessada.

Mas, como garantia da intimação dos interessados e medida de maior economicidade e rapidez, entendemos que possam ser utilizados estes outros meios de comunicação nos processos licitatórios, deixando para publicar-se na imprensa oficial apenas o resultado final do procedimento.

Nesse sentido, pondera Jessé Torres Pereira Júnior:

” Comissões de Licitação, no elogiável propósito de imprimir celeridade ao processamento dos recursos hierárquicos e de evitar os custos de publicação pelo diário oficial, têm entendido que a publicação do julgamento da fase de habilitação – o que, a nosso ver, pelas mesmas razões, estende-se ao julgamento das propostas – é desnecessária, se o licitante, mesmo ausente da sessão em que houve o julgamento, dele toma ciência por outro qualquer meio (fax, por exemplo) e remete à Comissão termo de renúncia do direito de recorrer. Correta a interpretação, dado que a serventia dessa publicação é a de cientificar os licitantes ausentes para que recorram da decisão, se o desejarem, certo que ninguém, além dos concorrentes que participam da licitação, ostenta legitimidade para recorrer administrativamente das decisões da Comissão” (cf. Comentários à Lei das Licitações e Contratações da Administração Pública, 6ª ed., Renovar, 2003, p. 919).

Por outro lado, há ainda que se indagar qual a data a ser considerada para efeitos de início de contagem do prazo recursal que, lembramos, deve observar a regra do art. 110 da Lei Federal de Licitações.

Entendemos que o que deve ser levado em consideração, para efeitos de início de contagem do prazo, é o momento em que a empresa toma efetiva ciência da decisão.

Destarte, se a licitante já sai intimada da decisão na própria sessão de julgamento ou, ainda quando ausente, desta decisão é comunicada por intermédio de fax ou e-mail, esta deve ser a data a ser considerada para efeitos de início de contagem do prazo recursal, ainda que eventual publicação na imprensa oficial ocorra posteriomente.

A respeito do tema, diz Marçal Justen Filho:

” O prazo iniciará seu curso a partir da intimação do ato ou lavratura da ata. Aplicam-se os princípios processuais na interposição do dispositivo. Significa que o prazo iniciará seu curso a partir da data da intimação do ato, seja essa intimação efetivada através da imprensa, por comunicação pessoal ou por ato público a que os interessados devam comparecer. Prevalecerá o princípio da ciência efetiva sobre o da intimação formal”. E assim completa: ” A Lei determina que os atos indicados nas alíneas “a”, “b”, “c” e “e” do inc. I devam ser objeto de intimação através da imprensa oficial. O descumprimento dessa imposição não acarreta maiores consequências, no âmbito estrito da faculdade recursal, quando a prática do ato tiver chegado efetivamente ao conhecimento dos interessados.” (cf. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 5ª ed., Dialética, 1998).

Assim, mesmo que eventual publicação do ato na imprensa ocorra, e. g., dois dias após a sessão, entendemos que, se as empresas foram intimadas da decisão na sessão ou, quanto aos ausentes, via fax ou e-mail com comprovante de recebimento, o prazo recursal deve ser contado desta intimação pessoal e não da publicação na imprensa.

A publicação na imprensa oficial, nestes casos, teria por finalidade propiciar a fiscalização do procedimento pelos cidadãos em geral. Mas, em relação aos licitantes, seria apenas um “plus”, uma vez que estes já haviam tomado ciência do ato.

E o que ocorre, por exemplo, se os licitantes presentes na sessão saem intimados e os ausentes somente são comunicados no dia seguinte? Nesta hipótese, parece-nos que o vencimento do prazo recursal se dará em datas distintas em relação aos licitantes presentes e aos ausentes na sessão. Essa exegese não fere e sim privilegia a isonomia, a fim de que à todos seja oferecido tempo igualitário para a elaboração de suas razões recursais.

Por fim e à título de ilustração, saliente-se que a Lei n.º 9784/99, nos termos de seu art. 26, §3º, privilegia a intimação de atos decorrentes de processos administrativos “por ciência no processo, por via postal com aviso de recebimento, por telegrama ou outro meio que assegure a certeza da ciência do interessado”.

Por sua vez, a Lei n.º 10177/98, conforme seu art. 34, também prevê a intimação pessoal dos atos administrativos, em detrimento da intimação na imprensa.

Com efeito, não se pode olvidar que a comunicação pessoal é muito mais econômica, célere e traduz maior segurança do seu recebimento, do que a publicação na imprensa oficial.

Por todas essas razões é que entendemos que a comunicação pessoal do resultado dos atos a que se refere o art. 109, I da Lei 8.666/93, seja na sessão ou por outros meios efetivos, atende ao princípio da publicidade e deve ser levada em consideração para efeitos de início da contagem do prazo recursal.

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Gisele Clozer Pinheiro Garcia
advogada em Campinas (SP), especialista em Direito Tributário pela PUC/Campinas

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