Lei de Migração coloca o Brasil na vanguarda da defesa de imigrantes

Autor: Carlos Eduardo Paz (*)   A Constituição Federal de 1988 é marco de extrema e induvidosa importância para o Brasil. Além de marcar a transição do regime militar para o Estado democrático de Direito, a Constituição Cidadã positivou uma série de garantias fundamentais de especial relevância. Ainda que possua uma série de dispositivos claramente voltados à garantia de direitos fundamentais, e passados já quase 30 anos desde sua promulgação, nem toda a legislação infraconstitucional se adaptou a essa realidade normativa constitucional. Um dos vários exemplos desse descompasso é a Lei 6.815/1980 (Estatuto do Estrangeiro). Essa lei, destinada a regular a condição do estrangeiro no Brasil, é norteada por critérios que divergem dos parâmetros reconhecidos pela Constituição Federal, claramente pautada pela prevalência dos direitos humanos. A falta de sintonia mostra-se ainda mais grave e relevante se considerado o aumento dos fluxos migratórios mundiais, em especial aqueles motivados pela violação de direitos. Diante desse cenário, encontra-se em trâmite no Congresso Nacional, e em fase avançada de discussão e tramitação, importante projeto de lei (SCD 7/2016, de relatoria do senador Tasso Jereissati) destinado a instituir uma nova Lei de Migração. A proposta legislação incorpora o espírito democrático do Brasil pós-1988 e atualiza o viés de hipertrofia da proteção à segurança nacional do ultrapassado Estatuto do Estrangeiro pelo respeito e prevalência aos direitos humanos face à ordem global. É importante ressaltar que o texto da nova legislação foi construído de forma ampla e democrática, através da constante interlocução do Congresso Nacional com a sociedade civil, em especial por meio de audiências públicas que contaram com a participação de entidades e instituições públicas, dentre as quais a Defensoria Pública da União. Nessas inúmeras ocasiões os legisladores ouviram todos os lados do debate, de modo que a discussão contou com considerações ligadas a direitos humanos, segurança nacional, questões burocráticas, acesso à justiça entre outras, o que possibilitou a construção de uma legislação efetivamente plural e moderna. Neste sentido, foram resguardados dispositivos voltados à segurança nacional, já que o necessário e eficiente controle migratório persistirá sob o pálio da nova legislação. A diferença verificável é que a segurança nacional, praticamente o principal, senão o único, critério para o estabelecimento da política migratória brasileira, passa a conviver com outros vetores igualmente importantes, em especial o respeito às questões humanitárias. Não custa lembrar que a observância a estes direitos decorre de compromissos que o Brasil assumiu internacionalmente, de modo que seu papel como ator global depende também do modo como nosso país encara essas obrigações. Além disso, não podemos esquecer jamais que o Brasil é um país de imigrantes. Pessoas das mais variadas culturas, etnias, países e continentes migraram para nosso território, em muitos casos fugindo de situações de fome, guerra, perseguição ou simplesmente buscando uma vida melhor, resultante na sociedade atual. Reconhecer nossa formação nos leva a adotar uma legislação que não impeça o desenvolvimento de projetos pessoais dos imigrantes que estejam de acordo com a legislação pátria e internacional. Mesmo vozes discordantes ao texto proposto podem ser recordadas da possibilidade de descenderem de algum imigrante que encontrou no Brasil, em tempos pretéritos, uma oportunidade de (re)construir sua vida. Portanto, o Congresso Nacional está diante de uma oportunidade única, já que a nova Lei de Migração, na íntegra de sua atual redação, sem descuidar de aspectos relevantes de segurança nacional e soberania, colocará o Brasil na vanguarda da defesa dos direitos fundamentais de imigrantes, em especial aqueles mais vulneráveis.         Autor: Carlos Eduardo Paz  é defensor-público-geral Federal.




Publicado em: 19/04/2017