Eleições conduzem democracia ao seu ápice

Grijalbo Coutinho*

O processo eleitoral em curso está, indelevelmente, vinculado a participação das diversas camadas da sociedade nos destinos políticos do país, materializado de forma embrionária no simples e indispensável denominado sufrágio universal. Invocar a democracia é trazer à tona a sua expressão política primeira conhecida na Grécia Antiga, poucos séculos antes de Cristo.

A revolução política – experimentada entre os helenos – rompeu com o determinismo (tradição) dos deuses como criadores do mundo e responsáveis por todos os atos da vida, naturais e humanos, inclusive o poder do estabelecimento, pelos reis, da ordem social. Mais de 2 mil anos se passaram depois da experiência democrática na Grécia, com a instalação de regimes autoritários no mundo afora, mas a humanidade continua a clamar por democracia, forma de governar pela vontade da maioria reivindicada por todas as células de poder na sociedade.

No modelo estatal contemporâneo, a realização de eleições livres e diretas para os mais diversos cargos dos poderes Legislativo e Executivo conduz a democracia a seu ápice. Além disso, o modelo contemporâneo também leva à crença de que há uma igualdade real entre todos os cidadãos.

Na verdade, existe a necessidade de fortalecer outros pressupostos para a obtenção de um equilíbrio mais razoável. Assim, a democracia pode ser exercitada dentro de parâmetros os mais legítimos possíveis.

Nos estritos limites das questões que interessam, de forma direta ao Poder Judiciário, estão significativamente resumidas as propostas dos quatro principais candidatos à Presidência da República.

Podemos notar que o candidato Luis Inácio Lula da Silva tem deixado claro, em todas as suas manifestações públicas, que pretende respeitar as decisões do Poder Judiciário, mesmo que contrariem as decisões do Governo. Quer criar novos juizados especiais, conferindo suporte orçamentário a esse segmento do poder estatal, além de propor uma reforma trabalhista precedida de ampla discussão com as entidades sindicais.

O candidato ainda prega maior agilidade na reforma do Poder Judiciário, o aumento do número de juízes, o combate ao nepotismo nos Três Poderes e as eleições diretas para os cargos diretivos dos tribunais.

Para diminuir a violência, o candidato José Serra compromete-se a trabalhar pela reforma das leis penais e de execução criminal, desde o aumento das penas ao cumprimento integral para os crimes hediondos. No contexto da relação capital e trabalho, o candidato é favorável ao projeto, em trâmite, no Senado Federal que altera o artigo 618, da CLT, com a prevalência do negociado sobre o legislado, além de estimular as soluções alternativas de conflitos.

O candidato Ciro Gomes fala em expansão do Judiciário, Federal e Estadual, e da implantação de centros de assistência jurídica em todo o país. Ele propõe a revitalização do mandado de injunção e o estabelecimento de discussão sobre as nomeações para os Tribunais Superiores e, principalmente, para o Supremo Tribunal Federal.

Ciro Gomes defende o acesso de advogados e membros do Ministério Público aos tribunais através do denominado quinto constitucional. Opõe-se ao controle externo na forma propalada. Por último, defende a reforma da CLT, não nos moldes propostos pelo Governo FHC, mas também não aponta, de forma precisa, quais seriam as alterações desejadas.

Já Anthony Garotinho afirma, em suas manifestações, que uma de suas metas, caso seja eleito, será democratizar o Poder Judiciário e criar novos juizados especiais. Ele entende que a justiça deve ser técnica e ignorar os problemas políticos. Garotinho propõe a federalização de vários crimes, a criação de ouvidorias, a reorganização da carreira da magistratura, a supressão de alguns recursos judiciais, o aumento do número de magistrados, o fim do nepotismo e alterações no Código Penal.

As associações de magistrados aplaudem todas as medidas para democratizar o Judiciário. Desde o combate ao nepotismo até a realização de eleições diretas para os cargos de dirigentes dos tribunais, com a criação de mecanismos para controle dos atos administrativos e de fortalecimento das ouvidorias.

As associações lutam pela instalação de debate sobre o poder imperial do presidente da República na escolha de juízes e ministros, especialmente para o Supremo Tribunal Federal, que envolve também, a existência do critério de ingresso na carreira através do chamado quinto constitucional. Porém, as associações repudiam o controle concentrado de constitucionalidade e suas derivações (súmula vinculante, avocatória, foro privilegiado e outros).

Os candidatos Lula, Ciro e Garotinho defendem a reforma trabalhista, mas não indicam quais seriam os aspectos propensos à alteração. Deixam o eleitor sem informação a respeito de um tema tão importante. Serra é mais explícito e apenas referenda a proposta que pretende tornar os acordos mais importantes do que as garantias previstas em lei, medida responsável pela destruição de alguns milhões de empregos nos países em que foi adotada.

Não se sabe a tendência política predominante entre os juízes brasileiros. É certo, porém, que como tudo na sociedade, o voto estará carregado de ideologia e de consciência crítica, sem nenhuma hipocrisia. Atentos também ao voto endereçado ao Parlamento, pois rejeitam o presidencialismo exercido de forma bonapartista.

Voltando à velha Grécia, os magistrados, assim como os demais cidadãos, nos dias destinados às eleições, farão das urnas a sua verdadeira Ágora, na esperança de dias menos tormentosos para a população brasileira.

Revista Consultor Jurídico, 1º de outubro de 2002.

Grijalbo Coutinho é juiz do trabalho em Brasília, presidente da Amatra da 10ª Região e vice-presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra).

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